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2 CONTEXTO TEÓRICO

3.2 MODELO DE PESQUISA EMPÍRICA

3.2.2 Cenário de Representação da Política

O Cenário de Representação Política (CR-P) é uma formação discursiva contextual que funciona como um palco para a disputa da hegemonia entre as diferentes interpretações da realidade. Segundo o criador do conceito:

[...] o CR-P é o espaço específico de representação da política nas ‘democracias representativas’ contemporâneas, constituído e constituidor, lugar e objeto da articulação hegemônica total, construído em processos de longo prazo, na mídia e pela mídia, sobretudo na e pela televisão. Como a hegemonia, o CR-P não pode nunca ser singular. Temos, portanto, que acrescentar ao conceito de CR-P o conceito de contra-CR-P ou de CR-P alternativo. (LIMA, 2001, p. 182-183)

Além do conceito de CR-P, Lima enuncia ainda duas hipóteses sobre a relação entre Mídia e Política. São elas [...]

[...] O CR-P dominante, [que] embora não prescreva os conteúdos da prática política, demarca os limites dentro dos quais as idéias e os conflitos se desenrolam e são resolvidos, podendo neutralizar, modificar ou incorporar iniciativas opostas ou alternativas; [...] candidato em eleições nacionais e majoritárias dificilmente vencerá as eleições se não ajustar sua IP ao CR-P dominante. A alternativa é a construção de um CR-P contra-hegemônico ou alternativo. (2001, p. 198).

Para Lima, o período de análise das mensagens da mídia para formação de um CR-P da eleição deve ser bem anterior ao período da campanha. Por exemplo:

as razões que elegeram Collor devem ser buscadas no CR-P “constituído na/pela TV em um período anterior a junho de 1989 e não no HGPE”. (LIMA, 2001, p. 213).

Há três tipos básicos dos Elementos Constitutivos (EC’s) do CR-P: a) a propaganda política; b) o jornalismo; e c) o marketing dos candidatos.2

Atualmente, há três formas de propaganda política no Brasil: a propaganda institucional dos governos, a propaganda partidária e o HGPE. Os programas de propaganda institucional e partidária são utilizados durante todo o período de governo pelos atores políticos, criando ou reforçando IP’s, visando às eleições. É preciso ressaltar a importância e a originalidade brasileira da instituição do HGPE em relação às campanhas eleitorais de outras democracias, uma vez que retira o poder de enunciação da IP, o lugar da fala, dos jornalistas e empresários da indústria cultural e a coloca temporariamente nas mãos dos partidos políticos e seus candidatos.

Quinze anos após ter escrito a tese de doutorado (1999) que cunhou o termo HGPE, Albuquerque faz um balanço de toda a pesquisa produzida sobre o horário eleitoral nas quatro eleições presidenciais, bem como de sua evolução histórica (2004). Apesar das diversas leis eleitorais3 e de uma variação acentuada de formatos, o HGPE desenvolveu uma linguagem própria, um “estilo comunicativo

2 A curto prazo, Lima chama atenção para os debates televisionados e para o efeito retroalimentador

das pesquisas de opinião, veiculadas pela mídia sobre a intenção de voto (LIMA: 2001, p. 204), mas afirma que a centralidade dos meios de comunicação sobre a intenção de voto se dá não apenas através da imprensa (os jornais impressos, telejornais, debates); mas através da mídia como um todo (também pelas telenovelas, programas de humor, filmes com temas conexos, etc) e durante um período de tempo muito anterior ao da eleição.

3 O Horário Eleitoral foi instituído em 1976 pelo regime militar através da lei Falcão (6.339). Em 85, a

lei 7.332 deu ao TSE a missão de organizar as eleições e, a partir de então, cada eleição presidencial foi regida por uma legislação diferente, principalmente no que se refere ao tempo e aos critérios de participação dos HGPE’s. Também houve restrições e limites técnicos. Em 93, através da lei 8.713, foram proibidas cenas externas, efeitos de edição e participações. A lei 9.100 de 97, responsável pelo aparecimento das vinhetas de 30 segundo (ou spots) durante a programação, derrubou as proibições a nível municipal, que voltaram no ano seguinte nas eleições presidenciais.

particular”, como diz Albuquerque (2004, p. 469); e se consolidou na vida política brasileira, não como um fator de mudança na intenção de voto, mas como um espaço de debate em que os atores políticos podem se expressar livremente.

Nesse sentido, além de Albuquerque, há pelo menos dois trabalhos científicos importantes sobre propaganda política brasileira a serem citados: Intenção de Voto e Propaganda Política: Efeitos e gramáticas da propaganda eleitoral (FIGUEIREDO; ALDÉ, 2004); e Em busca das razões do voto: o uso que o eleitor faz da propaganda política (VEIGA, 2002).

Figueiredo e Aldé demonstram estatisticamente o efeito da propaganda eleitoral nas pesquisas quantitativas nas eleições presidenciais. Casos como os de Collor em 89, de Roseana Sarney e da queda de Ciro Gomes, em 2002, são provas de que a propaganda política tem poder sobre a opinião dos eleitores. Não é apenas a propaganda política na TV, mas sim o marketing, que manda releases e compra matérias na imprensa. Como determinar a parcela da TV na queda de Ciro pela propaganda negativa de Serra e não as brigas pelos sites ou pela imprensa? O foco desta pesquisa não é determinar a parcela da TV na mudança da intenção de voto, mas sim analisar através do discurso político na TV o efeito avassalador da propaganda política.

E para Veiga, o HGPE diminui o custo da informação necessária à tomada de decisão do voto dos eleitores com baixo interesse por política, baixa renda e escolaridade. É a fonte de informação eleitoral mais simples e barata. Aliás, explique-se que o horário é gratuito para os candidatos e partidos, mas é pago às empresas de comunicação, pelo contribuinte, através do abatimento de impostos -

expediente idealizado pelo ministro da Fazenda FHC no governo Itamar Franco, ganhando a simpatia da mídia como candidato.

E enquanto a propaganda política constrói as Imagens Públicas; a imprensa e o jornalismo as limitam e contextualizam. Aliás, pode-se dizer que a Imagem de Lula foi, nas primeiras eleições, mais construída pela mídia do que pelo HGPE e que apenas na campanha de 2002 o candidato conquistou o poder sobre a própria visibilidade. Porém, como se verá adiante, isto não deve ser considerado uma ‘vitória’ da propaganda política sobre o jornalismo, mas sim como o resultado da mudança de sua estratégia política (incluindo aí a uma política de alianças mais ampla e um programa social democrata) e de seu marketing eleitoral.

Além da publicidade e do jornalismo, também é necessário levar em conta o papel do marketing político na constituição das Imagens Públicas. A publicidade trata da mudança e/ou divulgação de um produto, podendo no máximo, digamos assim, propor uma nova embalagem. A atividade de marketing comercial por sua vez é um planejamento da finalidade e da qualidade do produto, podendo até mudar o próprio produto. Imitando este comportamento do marketing comercial, o marketing político consiste em identificar as necessidades e desejos do eleitorado antes da campanha eleitoral propriamente dita, através não só de pesquisas qualitativas, mas também da absorção das reivindicações de entidades locais e setoriais na plataforma do candidato. Este condicionamento tem como aspecto positivo o compromisso programático dos candidatos com as necessidades práticas das comunidades, o que amplia realmente a participação democrática; mas, em contrapartida, despolitiza os programas do ponto de vista ideológico, fazendo com que todos os candidatos se pareçam muito porque defendem as mesmas bandeiras.

A questão passa então a ser a das garantias, de quem realmente será capaz de cumprir o que está prometendo. O discurso de convencimento eleitoral se desloca ‘do que fazer’ (que passa a ser definido pelo próprio eleitor) para ‘do como fazer’ (que distingue o candidato de seus adversários). Há, no entanto, vários tipos de garantia: a credibilidade ética que garante que se está dizendo a verdade, a capacidade administrativa já demonstrada, etc.

A publicidade partidária aliada ao marketing eleitoral, desde Collor (que através dela se lançou candidato e alcançou a dianteira nas pesquisas antes do início da campanha), tem uma grande relevância na vida política brasileira. FHC e Roseana Sarney também usaram a publicidade partidária com finalidades eleitorais antes do início oficial da campanha. Também o marketing político e a publicidade dos governos ganharam importância estratégica para as Imagens Públicas.

No entanto, o HGPE ainda tem um papel decisivo na definição do voto, muito embora ele não seja propriamente um fator de definição, mas um dos espaços em que os fatores condicionantes se configuram. Devido a este papel de destaque no cenário eleitoral, vários autores e mesmo candidatos ressaltaram a oportunidade de se utilizar deste espaço, em contraposição à mídia, tentando influenciar os eleitores a terem um enquadramento alternativo ao que estava sendo formatado pelos meios de comunicação. Mas, como se verá ao longo das quatro campanhas, essa possibilidade é irrealista por vários fatores.

Para distinguir a abrangência e a duração dos Cenários de Representação em relação à sua permanência e transitoriedade, Lima compara seu conceito com outras noções semelhantes às de outras correntes de pensamento, tais como: Imaginário Social (Bacsko), Cultura Política (Almond) e Hegemonia (Gramsci).

Para ele, a noção de Imaginário Social é a mais ampla e de longa duração, podendo haver diferentes culturas políticas em um imaginário social. O mesmo ocorre em relação à analogia entre as noções de Cultura Política e Hegemonia (originalmente criada por Gramsci e atualizada Willimans): uma mesma Cultura Política permite, pelo menos, duas formas diferentes de interpretação e proposição política, a do poder instituído e a dos que o contestam. Nessa ordem, uma determinada hegemonia contém vários CR-Ps (tanto no sentido de diferentes tipos de cenário simultâneos – político, ecológico, econômico – como no sentido de cenários sucessivos de um mesmo tipo) e uma mudança de cenário de representação não implica em uma crise hegemônica ou de legitimidade do poder. E o conceito de CR-P engloba ainda o de Conjuntura Política, uma vez que há duas formas opostas de representar uma determinada situação dos atores sociais.

IMAGINÁRIO SOCIAL