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Capítulo II – Sobre ombros de gigantes 38

2.2   Ciência da Informação como Ciência Social 40

As discussões em torno da Ciência da Informação em geral se iniciam com a conceituação de dado, informação e conhecimento e, por vezes, são incluídas a inteligência e a sabedoria. Um interessante ponto de partida está na abordagem de Capurro (2007, p.156), ao mostrar as origens do termo informação sob as perspectivas tangível e intangível, sendo a primeira, no sentido de dar forma a algo, apoiando-se em um contexto biológico, e a segunda, no sentido de modelar pessoas com relação a preceitos morais e pedagógicos. Discorre histórica e filosoficamente sobre o termo, passando por vários personagens e várias épocas. Capurro (2007) estabelece uma ligação conceitual que nos guia a um passeio entre os termos dados, informação e conhecimento, mostrando o entrelaçamento e a interdependência deles e destaca a interdisciplinariedade da Ciência da Informação. Este argumento é também demonstrado por Tarapanoff (2006, p.19):

Ciência da Informação é uma ciência de caráter eminentemente interdisciplinar, que tem por objetivo o estudo das propriedades gerais da informação (natureza, gênese e efeitos). [...] contribui principalmente com estudos das necessidades informacionais, do estudo do fluxo e uso da informação.

Da mesma forma como a informação gera ambiguidades em sua conceituação, o mesmo ocorre com o conhecimento. A conceituação de conhecimento é algo que vem sendo estudado há séculos. A discussão sobre conhecimento é iniciada, de forma mais sistemática, na Antiguidade, com Platão e Aristóteles, e o conhecimento na modernidade é claramente representado por Descartes e Leibniz, com o racionalismo, e Locke com o empirismo. O racionalismo tem como pressuposto a razão pura, em que o conhecimento não é fruto de experiências sensoriais, e sim de elaborações a partir de um conhecimento a priori. Já o empirismo afirma que todo nosso conhecimento é adquirido pela via do sensorial.

Essas duas correntes ocidentais do pensamento foram reunidas por alguns pensadores na tentativa de aproveitar seus conceitos. Entre eles, citamos Kant e Marx. O primeiro acreditava na experiência como base do conhecimento, mas não a única fonte. Karl Marx relatou que “a percepção é uma interação entre o conhecedor e o conhecido”.

Uma outra corrente de pensamento é a oriental descrita, em Nonaka e Takeuchi (1997), que descrevem a visão, especificamente dos japoneses, com relação ao conhecimento. Esta visão baseia-se em três aspectos básicos: (1) a unidade do homem e da natureza, (2) a unidade do corpo e da mente e (3) a unidade do eu e do outro. Estes aspectos mostram que o pensamento japonês está voltado para a interação física com a natureza e os seres humanos, diferentemente da corrente ocidental, baseada no dualismo cartesiano, segundo o qual o “eu pensante” busca o conhecimento isoladamente da natureza e das outras pessoas.

Um conceito extraído de Davenport e Prusak (1998, p. 6) diz que:

conhecimento é uma mistura fluída de experiência condensada, valores, informação contextual e insight experimentado, a qual proporciona uma estrutura para a avaliação e incorporação de novas experiências e informações. Ele tem origem e é aplicado na mente dos conhecedores. Nas organizações, ele costuma estar embutido não só em documentos ou repositórios, mas também em rotinas, processos, práticas e normas organizacionais.

Essa conceituação de Davenport e Prusak leva ao pensamento do conhecimento nas empresas como algo já explicitado por meio de relatórios, documentos, bancos de dados, porém Nonaka e Takeuchi, em sua obra “Criação do conhecimento na empresa”, enfatizam o lado humanístico do conhecimento e o desafio de extração ou criação do conhecimento das pessoas.

Como num encadeamento, o conhecimento é derivado das informações e as informações são derivadas dos dados. Isso mostra uma relação estreita entre esses conceitos. No caso dos dados e informações, pressupõe-se que estão descritos sob alguma forma de linguagem. O conhecimento, por sua vez, além de usufruir dos dados e informações para a construção de modelos e padrões úteis, está calcado nas experiências individuais e nos modelos mentais existentes.

Para alguns autores, o conhecimento é o recurso mais importante nas organizações. Drucker (1999, p.5) argumenta que o conhecimento não é mais um recurso, ao lado dos fatores de produção trabalho, capital e terra, mas o “único” recurso significativo atualmente. Para este autor, será por meio dos trabalhadores do conhecimento que a sociedade usufruirá de produtos oriundos de conhecimento e esses produtos terão valor em função da produtividade e da inovação da aplicação do conhecimento. Para Toffler (1995), o conhecimento é fonte de poder e possibilita a mudança de poder, ou seja, em um ambiente em que o valor do capital deixa sua característica tangível para algo intangível, cria novas formas de poder e, à medida

que está disseminando, compartilha também o poder. Assim, na visão de Drucker e Toffler, o poder econômico e de produção está relacionado com o capital humano que provê a capacidade intelectual e de ação, diferentemente do poder oriundo dos ativos imobilizados, como terra, instalações e equipamentos. Assim, a informação e o conhecimento fazem parte do capital existente nas organizações e devem ser alvo de estudos amplos para a maximização de seu uso na geração de produtos e serviços.

Com base nisso, a Ciência da Informação pode estabelecer, como foco de seus estudos, as propriedades e funções da informação e do conhecimento existentes em seus relacionamentos e suas influências no ambiente.

A Ciência da Informação é uma ciência moldada a partir das necessidades de outras, o que a faz, em sua essência e nas relações com outras áreas do conhecimento, interdisciplinar. Saracevic (1995) demonstra a interdisciplinariedade da Ciência da Informação corroborando as idéias de Wersig e Neveling (1975), porém restringe essa interdisciplinariedade a 4 campos principais: a biblioteconomia, a ciência da computação, as ciências cognitivas e a comunicação. A Ciência da Informação, conforme Wersig e Neveling (1975), fornece uma visão originada das necessidades advindas do trabalho prático de documentação e de recuperação da informação. Este trabalho prático era uma necessidade de diversas áreas do conhecimento, o que colocou o selo da interdisciplinariedade na Ciência da Informação de forma mais abrangente. Assim, com a evolução das ciências e da própria Ciência da Informação, algumas visões, segundo os autores, foram estabelecidas na tentativa de sistematizar alguns pontos de vista sobre a origem e as exigências sociais que devem ser atendidas pela Ciência da Informação. Entre estas visões, encontra-se a orientada para os fins, a qual possui a conotação social, em que a Ciência da Informação deve servir às necessidades sociais e desenvolver o trabalho prático relacionado a essas necessidades. Aqui se entende como trabalho prático a documentação, que hoje faz parte dos estudos da Ciência da Informação.

A visão sob o prisma social remete Wersig e Neveling (1975) para a responsabilidade social da Ciência da Informação. Segundo os autores, a necessidade de informação foi originada no campo científico e tecnológico. Naquela época (séculos XVII e XVIII), surgiram os periódicos secundários para suprir a demanda pelas publicações, ocasionando, assim, por meio de necessidades impostas historicamente, a criação de novos campos do conhecimento, e

consequentemente, de novas profissões. Com o crescimento e a especialização das ciências, surgem os grupos dos produtores e dos usuários de informação e de conhecimento e, com isso, as exigências científicas, os processos de comunicação e as tecnologias se tornaram mais complexos, fazendo com que os profissionais da informação se voltassem ao estudo do objeto informação.

A informação apenas como objeto nos leva à reflexão sobre se a estaríamos estudando apenas sob o ângulo de sua captura, classificação e organização, ou seja, com uma visão calcada apenas no pensamento realista da teoria do conhecimento. Ao se tratar a informação sob o prisma social, seus estudos serão realizados com fundamento nas necessidades sociais e, em consequência, o objeto da informação. Esse posicionamento é o que defende Wersig (1998) ao destacar “a necessidade de um novo esforço organizado para mediar o conhecimento científico às necessidades humanas (e vice-versa: as visões dos problemas humanos à ciência)...” (tradução nossa). Wersig e Neveling (1975) já tratavam dessa questão ao questionarem o lugar da disciplina Ciência da Informação, em face de sua característica interdisciplinar, em que propõem duas abordagens: uma voltada para a informação como objeto e outra baseada na necessidade social específica e seu objeto.

Este trabalho baseia-se na visão da Ciência da Informação (CI) sob a égide da responsabilidade social da ciência e, por conseguinte, da responsabilidade social empresarial, e se alicerça nas palavras de Wersig e Neveling (1975):

“Hoje, o problema da transferência do conhecimento para aqueles que dele necessitam é uma responsabilidade social e esta responsabilidade social parece ser o motivo real da ‘Ciência da Informação’” (tradução nossa).