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IMPORTÂNCIA ECONÔMICA DOS CAMARõES-DE-áGUA-DOCE

CICLO DE VIDA

Embora M. acanthurus e M. carcinus sejam animais dulcícolas, suas larvas necessitam de água salobra para completar o desenvolvimento (LEWIS; WARD, 1965; CHOUDHURY, 1970; 1971a, b, c; DOBKIN, 1971). Assim, provavelmente, todos os indivíduos dessas duas espécies presentes nos rios tiveram seu desenvolvimento larval na região estuarina dos mesmos, tendo, posteriormente, migrado para o montante. Os movimentos migratórios de jovens em direção ao interior têm sido observados em várias espécies do gênero Macrobrachium, inclusive em M.

acanthurus (CANO, 1980). Por outro lado, sabe-se que M. carcinus pode migrar mais de 300 Km rio acima (HORNE; BEISSER, 1977).

A maneira como as larvas de M. acanthurus e M. carcinus atingem o estuário para a realização do desenvolvimento larval é ainda discutida, não tendo sido encontrados na literatura trabalhos conclusivos. Alguns autores, como Carvalho (1973), Hughes e Richard (1973), Chávez-Alarcón e Chávez (1976), Cano (1980) e Silva et al. (1981) admitem que as fêmeas procuram a região estuarina na época reprodutiva. Hughes e Richard (1973) realizaram um experimento em laboratório, no qual observaram que as fêmeas ovadas de M. acanthurus tendem a nadar a favor da corrente, invertendo o sentido do movimento logo após a eclosão das larvas. Lewis et al. (1966), Dugan e Frakes (1973) e Dugan et al. (1975) admitem que as larvas sejam carregadas ao estuário pela correnteza, que é acelerada pelas chuvas, sempre abundantes no período reprodutivo dessas espécies (LEWIS et al., 1966; CARVALHO, 1978; SILVA et al., 1981).

No Rio Ribeira de Iguape, um grande número de fêmeas com ovos nos estágios iniciais e finais do desenvolvimento embrionário e recém-desovadas de M. acanthurus foi capturada a vários quilômetros de distância da região estuarina, ou seja, nos municípios de Eldorado, Sete Barras e Registro (Figura 3), indicando que esta espécie se reproduz em toda a extensão do Rio Ribeira de Iguape, não havendo preferência pela região de Iguape, que é o local mais perto do estuário, região propícia para o desenvolvimento das larvas (BERTINI, 2010). Além disso, Oba et al. (1980), analisando amostras de plâncton na região de Registro, encontraram larvas de M. acanthurus e M. carcinus nos estágios I e II de desenvolvimento. Estas informações indicam, portanto, que a fecundação, a postura dos ovos e a eclosão das larvas dessas populações possam ocorrer em água doce.

Segundo Choudhury (1971a, b), larvas das duas espécies podem permanecer em água doce até cerca de uma semana após a eclosão. Este tempo seria suficiente para elas atingirem o estuário levadas pela correnteza do rio. Assim, sugere-se que, para estas populações, seja válida a hipótese de Lewis et al. (1966), Dugan e Frakes (1973) e Dugan et al. (1975), ou seja, que a reprodução ocorra ao longo do rio, sendo as larvas arrastadas para o estuário, onde passam o período de metamorfose, podendo retornar posteriormente à água doce. É possível, porém, que possa ocorrer um movimento das fêmeas ovadas rio abaixo, de acordo com as observações de Hughes e Richard (1973), para aumentar a probabilidade de as

larvas atingirem a salinidade adequada, sem que estas necessitem atingir o estuário para ocorrer a eclosão das larvas.

As larvas de M. acanthurus e M. carcinus nascem como zoea e passam por 10 e 12 estágios larvais, respectivamente (CHOUDHURY, 1970; 1971a).

Em laboratório, o tempo de desenvolvimento larval é de 30-40 e 45-60 dias, respectivamente (VALENTI, 1985). Após a metamorfose, a maioria da população de pós-larvas e juvenis irá migrar para água doce, onde ocorrerá o crescimento e desenvolvimento dos animais até atingirem a fase adulta. A fêmea passa por um período cíclico de maturação gonadal, que envolve 4 estágios: imaturo, em maturação, maduro e esgotado (Figura 4) (CARVALHO; PEREIRA, 1981; VALENTI et al., 1986). Acredita-se que os machos adultos sejam continuamente férteis.

No entanto, observa-se que machos adultos de mesmo tamanho apresentam diferenças morfológicas e comportamentais significativas (VALENTI, observação pessoal), sugerindo a existência de morfotipos diferentes. Estes podem apresentar características reprodutivas diferentes, como foi demonstrado para M. rosenbergii (RA’ANAN; COHEN, 1985).

Quando os ovários estão maduros, as fêmeas sofrem a muda pré-nupcial, que é seguida pelo acasalamento. Este é sempre precedido por um comportamento de corte, isto é, um ritual de movimentos e toques, importante para o reconhecimento da espécie (VALENTI, 1987). Durante a cópula, o macho deposita um espermatóforo, que é uma massa gelatinosa contendo o sêmen, próximo aos poros genitais femininos. Após algumas horas, os ovos vão sendo liberados e fertilizados à medida que passam pelo espermatóforo. Estes são depositados na câmara incubadora abdominal, onde permanecem aderidos aos pleópodos até que ocorra a eclosão das larvas, fechando o ciclo (Figura 5).

As duas espécies apresentam características eurihalinas (CARVALHO et al. 1976; GENOFRE; LOBÃO, 1976; COELHO et al., 1978). Portanto, é possível a ocorrência de indivíduos adultos habitando permanentemente a região estuarina dos rios. Neste caso, o crescimento, a maturação e a reprodução podem ocorrer em água salobra.

Figura 3 - Macrobrachium acanthurus. Distribuição das fêmeas ovígeras com ovos em estágio inicial e final do desenvolvimento embrionário, nos municípios de Eldorado, Sete Barras, Registro e Iguape, no período de janeiro a dezembro de 2007.

Figura 4 - Macrobrachium acanthurus. Fotos ilustrativas dos estágios do desenvolvimento gonadal das fêmeas. A - ovários (ov) no estágio

“em maturação” com coloração verde claro; B - ovários maduros com coloração verde escuro ocupando toda a cavidade cefalotorácica; C - ovários esgotados, observados em fêmeas portando ovos em estágio inicial do desenvolvimento embrionário.

Figura 5 - Ciclo de vida provável de Macrobrachium acanthurus e M. carcinus. Fotos de Bertini, G.. Desenhos das zoea I e X de Quadros et al. (2004) e juvenil de Choudhury (1970). CT = comprimento total.

HáBITOS E HáBITAT

Macrobrachium acanthurus e M. carcinus apresentam larvas plactônicas e principalmente carnívoras (VALENTI, 1985). Ao sofrerem a metamorfose, assumem o hábito bentônico e alimentação onívora. Vivem preferencialmente entocados sob pedras, troncos ou entre a vegetação aquática no fundo dos corpos d’água (COELHO, 1963). Normalmente, caminham sobre o fundo, usando os pereiópodos, mas podem também nadar com os pleópodos. Podem sair da água e caminhar em terra firme por algum tempo. Como consequência de seu ciclo de vida, já descrito no item anterior, realizam grandes migrações rio acima, podendo ser encontrados a mais de 300 km dos locais de nascimento. Apresentam maior atividade ao final da tarde e durante a noite. Alimentam-se principalmente da necromassa animal e vegetal, mas podem comer também organismos vivos, tais como: algas, larvas de insetos, moluscos ou outros crustáceos (VALENTI, 1985). O canibalismo é frequente.

No documento POLO DE BIOTECNOLOGIA DA MATA ATLÂNTICA (páginas 160-163)