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PARA CLORIDRATO DE DRONEDARONA EM COMPRIMIDOS E EM COMPLEXOS DE INCLUSÃO COM CICLODEXTRINAS

1.2.3 Ciclodextrinas e complexos de inclusão

1.2.3.1 Ciclodextrinas

As ciclodextrinas (CD) são oligossacarídeos cíclicos, constituídos por um número variável de unidades de D-glicose, obtidas a partir da degradação enzimática do amido pela enzima ciclodextrina-α-glicosil-transferase (CGtase). As ciclodextrinas naturais mais comuns apresentam seis, sete ou oito unidades de D- glicopiranose unidas por ligações α (1,4) e são denominadas α-, β-, γ-ciclodextrinas, respectivamente (SA BARRETO; CUNHA-FILHO, 2008).

A estrutura molecular das ciclodextrinas apresenta a forma tronco-cônica com propriedades únicas (Figura 3). Essa forma é devido à ausência de livre rotação das ligações glicosídicas e da conformação em cadeira das moléculas de glicose. Nessa conformação, todos os grupos hidrofílicos estão orientados para o exterior da molécula, conferindo-lhe um caráter hidrofílico e promovendo a sua solubilização em meio aquoso. A cavidade apresenta natureza hidrofóbica devido à formação de dois anéis de grupos C-H e de um anel composto por átomos de oxigênio incluídos nas ligações glicosídicas (JAMBHEKAR, BREEN, 2016).

Figura 3 – Estrutura química da β-ciclodextrina (a) e representação esquemática da estrutura tronco-cônica (b), respectivamente.

Fonte: (JAMBHEKAR, BREEN, 2016).

A β-CD é a ciclodextrina mais empregada em formulações farmacêuticas. Isso se deve a sua fácil produção e consequentemente baixo custo, seu preço médio é de aproximadamente 5 dólares/kg. Entretanto, sua solubilidade aquosa é limitada,e por isso é inadequada para administração parenteral. Essa limitação impulsionou o desenvolvimento de derivados da β-CD, através da substituição das múltiplas hidroxilas da β-CD em ambos os anéis da molécula. A 2-hidroxipropil-β-ciclodextrina (HP-β-CD) é um derivado da β-CD e pertence ao grupo das ciclodextrinas hidroxialquiladas. É obtida por condensação do óxido de propileno com a β- ciclodextrina. A solubilidade aquosa dos derivados é superior a solubilidade das ciclodextrinas naturais (Tabela 1), pois as últimas se apresentam no estado cristalino, caracterizado por fortes ligações de hidrogênio entre as moléculas, enquanto que os derivados apresentam uma redução da cristalinidade (a ligação de cadeias orgânicas causa a quebra das ligações de hidrogênio intermoleculares (LOFTSSON; DUCHÊNE, 2007; KURKOV, LOFTSSON, 2013).

Tabela 1 – Propriedades físico-químicas das ciclodextrinas

Propriedade β-CD HP-β-CD

Massa molecular (g/mol) 1135 1400a

Solubilidade em água (mg/ mL) 25°C 18,5 >600

Faixa de fusão (°C) 255-265 -

pKa a 25°C 12,2 -

a

Valor informado pelo fornecedor ou calculado de acordo com o grau de substituição. Fonte:(MURA, 2014; JAMBHEKAR; BREEN, 2016; IACOVINO et. al., 2017).

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Dentre os excipientes farmacêuticos, as CD tem um perfil toxicológico mais favorável em relação a surfactantes, polímeros solúveis em água e solventes orgânicos. Devido a sua origem, a partir de degradação enzimática do amido, e sua característica hidrofílica, considerando o elevado número de hidrogênios doadores e receptores, sua biodisponibilidade oral é muito baixa (abaixo de 4%) e, portanto atua como um carreador. Após administração oral, as CDs são muito pouco absorvidas na circulação sistêmica e são metabolizadas pelo trato gastrintestinal principalmente por digestão bacteriana, formando oligossacarídeos, monossacarídeos e gases como hidrogênio, dióxido de carbono e metano. Os derivados das CDs, como a HP- β-CD, possuem um perfil toxicológico melhorado em relação as CDs naturais de origem e por isso têm sido amplamente utilizados em formulações injetáveis. Após administração parenteral, as ciclodextrinas hidrofílicas são excretadas inalteradas por via renal com depuração plasmática total próxima a taxa de filtração glomerular (LOTFSSON; BREWSTER, 2012; LOFTSSON et. al., 2016).

As ciclodextrinas são utilizadas em inúmeras áreas, incluindo a indústria farmacêutica e cosmética, agroquímica, alimentar, entre outras. O uso de ciclodextrinas em formulações farmacêuticas deve-se, sobretudo, às suas propriedades de complexação, permitindo aumentar a solubilidade aquosa de fármacos lipofílicos, sua estabilidade e biodisponibilidade, quando a solubilidade e a dissolução são fatores limitantes na liberação do fármaco. Ciclodextrinas amorfas como a HP-β-CD são úteis para a inibição da transição polimórfica e taxa de cristalização de fármacos pouco solúveis em água durante o armazenamento, que pode consequentemente manter as características de elevada dissolução e biodisponibilidade oral dos fármacos (UEKAMA, 2004; LOFTSSON; DUCHÊNE, 2007).

Além disso, as ciclodextrinas podem ser utilizadas para mascarar odores e sabor desagradáveis de certos fármacos, na prevenção de interações e incompatibilidades e na conversão de fármacos líquidos em produtos sólidos. O aumento da atividade do fármaco e a redução de seus efeitos colaterais podem ser obtidos através da formação de complexos de inclusão. Esse grupo de excipientes farmacêuticos úteis e seus complexos de inclusão podem ser utilizados na preparação de formas farmacêuticas sólidas, líquidas e semissólidas com aplicação nas vias de administração oral, parenteral, pulmonar, nasal, bucal, sublingual, retal, ocular e dérmica (LOFTSSON; DUCHÊNE, 2007; SA BARRETO; CUNHA-FILHO,

2008).

1.2.3.2 Complexos de inclusão com ciclodextrinas

Os complexos de inclusão são compostos moleculares com a estrutura característica de um aduto, em que um composto (designado como hospedeiro) encerra outro no seu interior (o hóspede). A complexação ocorre quando uma molécula hóspede preenche totalmente ou parcialmente a cavidade interna da ciclodextrina que, devido ao caráter apolar, favorece a formação de complexos de inclusão com moléculas hidrofóbicas. Ligações covalentes não são formadas ou rompidas durante a formação do complexo de inclusão e, em soluções aquosas, os complexos são prontamente dissociados (OLIVEIRA; SANTOS; COELHO, 2009).

Em solução aquosa, moléculas livres do fármaco estão em equilíbrio com moléculas ligadas a ciclodextrinas. As características mais importantes dos complexos são sua estequiometria e os valores numéricos de suas constantes de estabilidade (K). Se m moléculas do fármaco (D, “drug”) se associam a n moléculas de ciclodextrina (CD) para formar um complexo (Dm / CDn), então o seguinte

equilíbrio é alcançado (LOFTSSON; MÁSSON; BREWSTER, 2004):

(1)

O tipo de complexo de inclusão mais comum é o que possui estequiometria 1:1 (fármaco: ciclodextrina), no qual uma molécula do fármaco (D, do inglês drug) forma um complexo com uma molécula de ciclodextrina (CD) (LOFTSSON; HREINSDÓTTIR; MÁSSON, 2005):

(2)

Ressalta-se também que, para fármacos ionizáveis, a constante de estabilidade é muito maior para a forma não ionizada em relação à forma ionizada Portanto, pode-se melhorar a solubilização de fármacos ionizáveis em ciclodextrinas através da modificação do pH (LOFTSSON; HREINSDÓTTIR; MÁSSON, 2007; LOFTSSON; BREWSTER, 2012). A complexação também pode ser melhorada através da formação de complexos ternários entre a molécula do fármaco,

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ciclodextrina e um terceiro componente. A adição de pequenas quantidades de polímeros solúveis em água ao meio de complexação, seguido de aquecimento em autoclave, pode aumentar significativamente a constante de estabilidade do complexo fármaco-ciclodextrina (MIRANDA et. al., 2011).

O resultado final é uma alteração das propriedades físico-químicas da molécula-hóspede, incluindo sua solubilidade, estabilidade e biodisponibilidade. A molécula da ciclodextrina pode proteger o fármaco do ataque de várias moléculas reativas, reduzindo assim a hidrólise, oxidação, rearranjo estérico, racemização e degradação enzimática dos fármacos (POPIELEC; LOFTSSON, 2017).

Existem vários métodos para o preparo de complexos de inclusão, como a liofilização, pasta, mistura física, co-precipitação, atomização e fluidização supercrítica. Dentre esses métodos, destaca-se a atomização, devido à maior complexação das moléculas e menor tempo de preparo (DA CUNHA FILHO; SÁ- BARRETO, 2007; IACOVINO et.al, 2017).