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CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS

Para efeito dessa pesquisa, a principal abordagem clínica do trabalho empregada na análise dos dados produzidos será a Clínica da Atividade, a qual apresentaremos em seus principais conceitos em um capítulo à parte. Para complementar as análises, utilizaremos alguns pressupostos da Psicodinâmica do Trabalho, que oferece alguns pontos de diálogo com a Clínica da Atividade. Os pressupostos da Psicodinâmica do Trabalho serão convocados sempre que entendermos que eles sejam necessários para complementar a análise dos dados.

Apesar dessas abordagens clínicas do trabalho possuírem pressupostos epistemológicos, teóricos e metodológicos específicos, elas apresentam pontos de aproximação interessantes para ajudar a avançar na discussão sobre a organização, sofrimento, saúde, estratégias de cooperação e de ação no trabalho. Um dos pontos iniciais de convergência é que, tanto a Clínica da Atividade quanto a Psicodinâmica do Trabalho, partem de alguns pressupostos elaborados pela Ergonomia Francófona, citando como exemplo a ideia contida no par conceitual trabalho prescrito - trabalho realizado e as discussões suscitadas a partir dos estudos desse par conceitual, que indicam a existência de um hiato entre a concepção do trabalho e sua efetiva realização.

Se a Ergonomia é um terreno comum ou herança compartilhada entre essas duas abordagens clínicas do trabalho, as suas diferenças podem ser constatadas em relação às teorias que embasam suas metodologias e discussões a respeito do trabalho. De acordo com Clot (2001), a clínica Psicodinâmica do Trabalho além da Ergonomia, embasa suas pesquisas, metodologias, discussões e ações a partir principalmente da psicanálise, interessando-se pelas

“[...] dinâmicas intra e intersubjetivas que conformam o seu objeto” CLOT, 2001, pg. 2).

Sobre esse ponto, o autor acrescenta ainda que, de acordo com o próprio Dejours, o objeto central de análise da Psicodinâmica do Trabalho não é propriamente o trabalho e sim uma psicologia do sujeito no trabalho.

Podemos acrescentar ainda que, para a clínica Psicodinâmica do Trabalho, o exame dos sistemas defensivos psicológicos é o foco principal de interesse, dado que esses sistemas defensivos é que possibilitam conjurar o real que escapa a dominação técnica e as prescrições da organização do trabalho, podendo ser fonte de prazer ou sofrimento no trabalho. Sendo assim, a conjuração desse sofrimento pode indicar prazer, se esse trabalho é foco de reconhecimento pela organização do trabalho. Caso o trabalhador não perceba a existência desse reconhecimento a partir da organização do trabalho, os sistemas de defesa psíquica podem se voltar contra o trabalhador, levando-o a um estado de sofrimento que atenta contra sua saúde.

Apresentado o embasamento principal da Psicodinâmica do Trabalho, a saber, a psicanálise, passemos ao referencial da Clínica da Atividade. Segundo Clot (2001), o principal referencial orientador da Clínica da Atividade é representado pela corrente histórico-cultural em Psicologia e em Linguística, entre Bakhtin e Vygostski. De modo sucinto, a Clínica da Atividade se interessa pelo sujeito da ação que tem seus atos impedidos ou dificultados pela organização do trabalho e seu interesse principal está em analisar as relações entre atividade e subjetividade, sendo o trabalho entendido não como apenas trabalho psíquico, mas como uma atividade concreta e irredutível, constituindo-se como um continente oculto da subjetividade no trabalho (ATHAYDE, 2005).

Ainda segundo Athayde (2005), a Clínica da Atividade expressa uma crítica à abordagem Psicodinâmica do Trabalho ao se referir a despotencialização da saúde e valorização da normalidade, assim como considera equivocada a proposição de que o objeto de atenção nas análises seja o sujeito e não o trabalho.

Acreditamos ser profícuo apresentar mais alguns pontos de convergência entre Clínica da Atividade e clínica Psicodinâmica do Trabalho, à luz dos levantamentos de Bendassolli e Soboll (2011). Para os autores, podemos ter quatro pontos de convergência entre a Psicodinâmica do Trabalho e a Clínica da Atividade.

Um primeiro ponto de convergência é no que se refere à ação no trabalho, ou seja, ações em conjunto elaboradas pelos coletivos de trabalho visando superar as dificuldades e questões que se apresentam nas atividades cotidianas mais comuns.

O segundo ponto de convergência é relacionado ao entendimento sobre o que é o trabalho. O trabalho é concebido como sendo de transformação do real e como espaço de construção de significados pessoais e sociais, ou seja, ele contribui para o estabelecimento de uma rede na qual o trabalhador é reconhecido como pertencente e na qual ele dá a sua contribuição para a expansão dessa rede. Dessa forma o trabalho produz um olhar que se direciona a si mesmo, à atividade dos outros e para a atividade propriamente dita, envolvendo questões como estética, gosto, eficiência e propósito.

Um terceiro ponto a se considerar é que, o saber que se constrói ao analisar o trabalho não pode ser separado do ato, da experiência. Tanto a Clínica da Atividade quanto a Psicodinâmica do Trabalho empenham-se em questionar quaisquer tentativas de racionalização do trabalho. Com essa postura, elas empenham-se em restituir ao trabalho o sentido original de confronto do homem com a natureza, consigo mesmo e com os outros.

O quarto ponto de convergência seria a respeito da emergência do sofrimento no trabalho. Esse sofrimento pode ser analisado a partir de suas inscrições ou produções sociais – modos de organização e divisão do trabalho, ou numa perspectiva de processos psíquicos que operam nos sujeitos que sofrem, sofrimento este que advêm dos bloqueios, impedimentos dos atos ou nas falências/falhas nas defesas psíquicas. A intenção é não reduzir o sofrimento a uma dimensão individual, ou seja, a localização do sofrimento no sujeito, sem considerar as relações que esse estabelece com o meio no qual ele está inserido.

Definidas algumas questões referentes a utilização dessas duas abordagens, suas diferenças e aproximações, apresentaremos a seguir os principais pressupostos da Clínica da Atividade que serão utilizadas para a análise dos dados da pesquisa.

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