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2. Processos e fases da produção do bordado de Caicó

2.2. Cobrindo

Uma vez transferido o desenho, passa-se ao momento de bordar. A expressão mais comum para essa tarefa é cobrir o bordado. Cobrir é realizar a ornamentação dos tecidos, é o ato mesmo de bordar. Para tal, usa-se agulha e linha para perfurar o tecido já desenhado com os motivos escolhidos.

O material de bordar compreende tecido, agulha, linha e bastidor. Os tecidos mais usados para a concepção dos enxovais são percal (100% algodão), polialgodão (50% algodão e 50% poliéster), linho, piquê e organdi para os detalhes. Linho e cambraia de linho são muito usados para roupas, principalmente camisas. Além da cambraia de linho, seda e cetim são tecidos escolhidos tanto para camisolas como para roupas de festa. A malha tem sido muito usada para camisetas, contudo, os bordados não se limitam aos tecidos mais usados nos bordados, de geral, empregando também o jeans, o couro e o veludo.

O acesso aos tecidos não é simples. Existem três fornecedores na cidade de Caicó, com pouca diversidade de produtos e muita variação de preço, que vendem por metro ou a peça inteira. O tecido é cortado de acordo com a peça que se deseja bordar, isto é, é escolhido a partir das peças que se pretende criar. Cada peça tem uma metragem determinada e, no momento de bordar, o tecido é pensado em relação à peça e ao destino que ela terá. São também escolhidas as cores e os tipos das linhas, bem como os desenhos correspondentes.

As bordadeiras que têm uma maior produção de bordados – como Iracema, Irene e Iasnaia – normalmente buscam os tecidos em Fortaleza. Iracema, por exemplo, compra uma média de 10 a 12 peças, a preço de atacado, duas vezes ao ano101. Ela diz ser ―muito vantajoso, porque além dos preços mais baixos, ir a Fortaleza serve para pesquisar os novos tecidos para o bordado‖. Como ela, é comum as bordadeiras irem buscar os tecidos fora da cidade, entretanto, para tal tipo de investimento, é necessário o pagamento à vista, o que nem sempre é possível. Na cidade de Caicó, paga-se, em

101 Para ir à Fortaleza, Iracema embarca em uma van que sai de Caicó. A passagem custa R$80,00 e tem o

direito de trazer duas peças, desde que acompanhada com nota fiscal. Quando não pode ir à Fortaleza, o seu fornecedor leva o material no estacionamento da van de Caicó, isso lhe custa R$20,00 por pacote (duas peças).

geral, de modo parcelado, sem um crédito formalizado, confiado apenas no compromisso de quitar posteriormente as dívidas.

A agulha é uma haste fina de aço, outrora feita com osso ou espinha de peixe, com um orifício em uma das pontas, onde se enfia os fios para costura e bordado. Tem a função de carregar as linhas para ornamentar o tecido, por meio da perfuração. Geralmente, no bordado de Caicó, usa-se agulha n. 11 e, em a necessidade de maior detalhamento, usa-se a agulha n.9, principalmente nos bordados à mão e nos detalhes que precisam ser tratados com maior precisão.

A escolha da linha102 é igualmente importante. Usa-se linha Mercê Crochê, n. 60, para desenhos especiais, normalmente os considerados mais delicados, como aqueles a serem aplicados no organdi e a na seda. A linha Mercê Crochê, produzida pela empresa Linhas Corrente, é pouco utilizada, devido ao valor e os usos mais específicos das peças a que se destinam.

Nos bordados mais usuais, como os feitos para o enxoval do dia a dia ou para as camisetas, usa-se a linha Música, branca e colorida. Atualmente, a linha de seda tem sido introduzida, no bordado, por conta da diversidade das cores e pelo brilho. Nas peças de enxoval mais tradicionais e finas, usa-se a linha Camila. Essas últimas, são produzidas pela Empresa Policron.

Em parceria com a linha, há o uso da tesourinha de ponta fina, que se destina a cortar as linhas e desfiar a bainha. Ela é imprescindível para preparar o crivo (como veremos adiante) e cortar o matame para o acabamento. A marca de tesourinha mais comum usada em Caicó é a ―Tesoura Mundial‖, modelo específico para bordado.

Abaixo, vemos uma toalha já engomada, em fase de acabamento. Foi feita em linho, ornamentada com a linha ―Música‖ colorida. O destaque da imagem é o uso da tesourinha para recorte do matame, que é o acabamento da peça.

102 Uma das tarefas mais importantes da Associação das Bordadeiras do Seridó é a compra, em grande

volume, de linhas e demais suprimentos para o bordado, principalmente a linha Mercê Crochê. Com um fornecedor em São Paulo, a linha Mercê Crochê chega, em Caicó, muito mais barata do que as encontradas nas lojas de armarinho da cidade. Muitas bordadeiras se filiam à Associação apenas para obter das linhas com valor abaixo do comércio local, capitaneado pela Alvorada Máquinas, a maior empresa de suprimentos para bordado, em Caicó e região.

Figura 19 - Iracema no corte/arremate do matame. Foto: Thaís Brito.

Outro instrumento fundamental para a execução do bordado, produzido em Caicó, é o bastidor. O bastidor é uma peça de apoio para o bordado e para a bordadeira, sendo usado por todas as profissionais que encontrei na cidade, independente de bordarem à mão ou à máquina (máquina de pedal ou industrial).

Trata-se de um aparelho de bordar, sem quaisquer referências de quando foi inventado e por quem. Feito usualmente em madeira e, nos últimos dez anos, em PVC, é composto de um anel interno e um externo, cujos aros devem se encaixar um no interior do outro, formando um caixilho para prender o tecido escolhido e previamente riscado.

Figura 20 - Uso do bastidor para o bordado à mão, peça de Rosalba. Foto: Thaís Brito.

A moldura, proporcionada pelo bastidor, sustenta e mantém o tecido esticado, deixando-o tenso a ponto de garantir a sua imobilidade, durante o processo de trabalho. Ao manter-se esticado, o bastidor promove o apoio para as mãos da bordadeira e, consequentemente, entre aquelas que bordam à máquina, proporciona maior destreza para a condução do tecido na máquina de bordar. O bastidor serve tanto ao bordado à mão quanto ao trabalhado à máquina.

Figura 21 - Uso do bastidor para o bordado à máquina. Bastidor feito de PVC, material alternativo à madeira, peça de Iracema. Foto: Thaís Brito.