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2.2.2.1 Mudança ambiental a partir do Sensoriamento remoto

Foram utilizadas imagens de satélite a fim de caracterizar a evolução da cobertura vegetal nas áreas dos municípios visitados. Para tanto, a imagem elaborada por Velloso et al (2002) com a distribuição das ecorregiões propostas para a Caatinga foi georreferenciada, no programa QGIS versão 2.18.13, a fim de se obter o shapefile das áreas de estudo. Em seguida, a obtenção das imagens de satélite, para os anos de 1985, 2004 e 2017, foi feita na página do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais-INPE. As informações de busca sobre ponto e órbita para os anos de 1985, 2004 e 2017 estão no apêndice 4. A escolha desses anos se justifica pelo fato de querermos mostrar as décadas que fossem o mais próximo dos períodos relatados pelos participantes da pesquisa, uma vez que visamos avaliar se há uma consonância entre os padrões gerados pelo uso de imagens com o etnoconhecimento.

Foram selecionadas imagens entre junho e setembro de cada ano, e todas no mesmo período, as quais apresentassem os níveis mais baixos de coberta de nuvens. Elas foram provenientes dos satélites Landsat 5 para anos de 1985 e 2004, e para o ano de 2017, utilizou-se as imagens provenientes do Landsat 8. A composição dos mosaicos e geração de composição de cores e verificação sobre o aumento ou diminuição nas manchas de vegetação das áreas indicadas, foi feita a partir da análise das bandas 3 e 417 referentes aos satélites Landsat 5 e 8 para anos de 1985, 2004 e 2017.

A coleta de imagens durante a estação seca tem sido bem-sucedida e justifica-se, pois, propriedades estruturais da vegetação são mais distintas durante a estação seca e melhora a aquisição de imagens com menos nuvens (PORTILLO-QUINTERO; SÁNCHEZ-AZOFEIFA, 2010). O período seco tem se consagrado como a melhor época para realizar diagnósticos a partir do sensoriamento remoto para mapeamento da Caatinga (CHAVES et al., 2012; LOPES et al., 2010; OLIVEIRA; CHAVES; LIMA, 2009). Após a obtenção das imagens de vegetação foi realizada a extração dos valores dos pixels em torno de cada ponto georreferenciado, e a partir das informações coletadas em campo (pontos georreferenciados com GPS Garmim nas propriedades visitadas), com as classes geradas que apresentaram

maior predominância de recobrimento foram obtidos seis intervalos de refletância e cinco alvos de superfície (Tabela 5).

Para a análise sobre a dinâmica da vegetação bem como seus valores de cobertura para cada área nas décadas escolhidas, o cálculo utilizado foi o Índice de Vegetação por Diferença Normalizada (Normalized Difference Vegetation Index - NDVI). Ele é obtido a partir da diferença entre a refletância do infravermelho próximo (NIR) e a refletância do vermelho (Red), dividida pela soma das diferenças das duas refletâncias (LAPIS, 2017). O NDVI varia entre -1 e +1 por pixel, de modo que quanto mais próximo de +1, maior a densidade da vegetação. Na medida em que esse valor diminui, a vegetação vai ficando esparsa, e quanto mais próxima de -1, maior indício de presença de solos descobertos e rochas (BARBOSA; CARVALHO; CAMACHO, 2017).

Tabela 5 Intervalos de NDVI e seus correspondentes para classe e alvos de superfície/uso do solo.

Intervalos NDVI Classes Alvos de superfície/Uso do Solo -1 - -0,11 1

Área sem vegetação

-0,1 - -0,19 2

0,2 - 0,34 3 Vegetação herbácea

0,35 - 0,47 4 Vegetação arbustiva aberta

0,48 - 0,58 5 Vegetação arbustiva-arbórea

0,59 - 1 6 Vegetação arbórea-arbustiva

Fonte: Laboratório de Etnoecologia e Biodiversidade/UFERSA.

Os valores negativos agruparam áreas sem vegetação (classes 1 e 2), e as demais classes correspondentes aos valores positivos para o índice, são indicativos para a presença da cobertura vegetal. As classes (4, 5, e 6) que estão apresentando coloração com variação entre verde claro e verde escuro, correspondem a vegetação com alta atividade fotossintética, em contrapartida, a classe 3 é indicativa de vegetação com baixa atividade fotossintética (BARBOSA; CARVALHO; CAMACHO, 2017). Como as áreas de pastagem e cultivo não foram indicadas nos mapas temáticos, estas foram incluídas nas classes com vegetação (classe 3 e 4).

Para as delimitações das áreas, e consequentemente o tamanho em quilômetros quadrados para cada uma, que foram de 50 km2, 80 km2 e 100 km2 (Apêndice 5), levou-se em consideração o padrão de fragmentação, heterogeneidade e o nível de generalização da paisagem, pois a imagem do satélite Landsat é originalmente composta por pixel de 30 x 30 metros, apresentando dificuldades para execução de classificação em escalas maiores, devido à granulação e à consequente redução da definição dos limites das unidades. Essas delimitações se justificam pelo fato de que não houveram visitas na área total de cada município. Os raios de distância correspondem à área de influência a partir dos pontos visitados. Apesar de terem sido amostrados 17 municípios, devido à proximidade foi possível fazermos a junções de alguns deles o que será apresentado nos mapas temáticos elaborados. O sistema de projeção cartográfico utilizado foi o Datum SIRGAS 2000 e todas as imagens foram georreferenciadas no programa QGIS 2.18.13, enquanto a finalização dos mapas foi realizada no programa ArcGis versão 9.

3.2.2.2 Histórico da Mudança Ambiental baseada no etnoconhecimento

Depois de terem sidos escolhidos as ecorregiões e os municípios a serem visitados, a escolha dos participantes para a presente pesquisa foi feita a partir do uso do método “bola de neve” (BERNARD, 2006), com o intuito de selecionar os especialistas locais que pudessem ter um conhecimento sobre as paisagens, e principalmente que conhecessem o uso das áreas em períodos passado e atuais, e que pudessem indicar outros especialistas locais. Participaram da pesquisa 67 pessoas, tendo sido entrevistados 53 homens e 14 mulheres. A idade dos participantes variou de 36 a 86 anos, com média de 60 (dp± 36,77) anos, enquanto seu tempo de moradia na região variou de 8 a 86 anos, com média de 47 (dp± 55,15) anos. Estando os especialistas de acordo em participarem do estudo, eles foram convidados a assinarem o Termo de Consentimento Livre (Apêndice 1), de acordo com as exigências do Comitê de Ética da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte/UERN. A saber, o presente estudo foi aprovado pelo Comité de Ética e Plataforma Brasil sob o número: CAAE: 63088416.0.0000.5294.

Os dados do conhecimento tradicional sobre as transformações das paisagens rurais foram coletados por meio de entrevistas semiestruturadas. Para a análise diacrônica das mudanças nas paisagens foi aplicado o método da “linha do tempo” (ALBUQUERQUE et al, 2010) (ALBUQUERQUE et al, 2010). Para complementar os dados obtidos com a linha do

tempo, foi utilizada o “gráfico histórico” (GEILFUS, 1997) com o intuito de representar graficamente as mudanças de uso da terra e unidades de recursos naturais que ocorreram ao longo do tempo. Para a elaboração dos gráficos tanto para a Linha do Tempo quanto para o Histórico foi obedecida uma ordem cronológica divididas nos seguintes intervalos de tempo: 40 anos atrás (1970), 30 anos atrás (1980), 20 anos atrás (1990) 17 anos atrás (2000) e o presente. A Linha do Tempo foi empregada para o reconhecimento de eventos dentro dessas décadas, enquanto o gráfico histórico permite a avaliação desses eventos a partir da atribuição de uma escala de intensidade: Muito, Regular e Pouco. A análise para os gráficos por ecorregião foi baseada na ordem da frequência das respostas dadas. Foram consideradas as respostas mais frequentes sobre a inclusão da representação de cada pessoa a partir do que foi descrito como “muito”, “regular” e “pouco” para cada intervalo de tempo, e posteriormente, juntamos para construir a frequência para as respostas coletivas.

2.3 RESULTADOS

2.3.1 Análise Temporal por imagens de satélite

A análise multitemporal sobre as mudanças observadas para o uso da terra obtidos a partir dos valores do NDVI para os períodos de 1985, 2004 e 2017 para as ecorregiões mostrou uma tendência geral de substituição de áreas com classe 5 (arbustiva-arbórea) e 6 (arbórea-arbustiva) para as áreas com classe 4 (arbustiva-aberta) e classe 3 (herbácea) (Figuras 7 a 24). Uma exceção ao padrão descrito ocorreu no município de Piracuruca/PI (Campo Maior), onde as áreas com vegetação praticamente mantiveram os valores de ocupação ao longo dos anos estudados. Os tipos vegetacionais classe 4 (arbustiva aberta), classe 5 (arbustiva-arbórea) e classe 6 (arbórea-arbustiva) apresentaram uma ocupação de mais de 50 % para cada ano amostrado. Ainda assim, as áreas com classe 3 (herbácea) e classe 2 (sem vegetação) apresentaram um leve crescimento nos anos de 2004 e 2017 (figura 7).

Para os municípios de Buriti dos Montes/PI e Crateús/CE (C. Ibiapaba-Araripe) os valores gerados pelo NDVI evidenciaram que a classe 3 (herbácea) foi a que mais se destacou quanto a ocupação das áreas amostradas, bem como mostram a evolução da classe 2 (sem vegetação) ao longo do tempo. Houve reduções significativas das classes 4 e 5 (vegetação arbustiva aberta e arbustiva-arbórea, respectivamente) entre os anos e a classe 6 (arbórea-arbustiva) apresentou baixos valores de cobertura nos três anos estudados (figura 9).

Os municípios de Lajes, Assú, Pedro Avelino e Angicos (todos no Rio Grande do Norte) (D.S.Setentrional) apresentaram uma diminuição dos tipos vegetacionais ao longo dos anos estudados, sendo o tipo vegetacional classificado como classe 6 (arbórea-arbustiva) o que apresentou maiores declínios entre os anos. Já as áreas ocupadas pela classe 3 (herbácea) apresentaram um aumento e aproximadamente 7% no ano de 2017 em comparação aos anos de 1985 e 2004. A classe 2 (área sem vegetação) também apresentou um padrão de aumento em 2017 em relação a 1985 e 2004 (figura 11). Os valores do índice referentes aos municípios de Santa Luzia/PB e Parelhas/RN (D.S.Setentrional) revelaram que as áreas vegetadas com os tipos vegetacionais da classe 5 (arbustiva-arbórea) tiveram sua diminuição ao longo do tempo, principalmente no intervalo entre os anos de 2004 e 2017. Já as áreas ocupadas pela classe 3 (estrato herbáceo) apresentaram aumentos significativos para o mesmo período (figura 13).

Ainda na ecorregião D.S.Setentrional, os dados gerados para os municípios de Patu/RN e Belém do Brejo do Cruz/PB mostraram-nos uma redução considerável da cobertura vegetal ao longo do período estudado. De acordo com o NDVI as classes 4, 5 e 6 (vegetação arbustiva aberta, arbustiva-arbórea e arbórea-arbustiva, respectivamente) foram diminuindo drasticamente ao longo dos anos amostrados. A classe 3 (herbácea) foi a que mais evoluiu entre o período estudado (figura 15). Já no município de Serra Negra do Norte/RN, as classes 4 e 5 (arbustiva aberta e vegetação arbustiva-arbórea, respectivamente) não sofreram alterações ao longo do período estudado. Por outro lado, a classe 6, representada por arbórea-arbustiva, foi a que mais sofreu diminuição em comparação aos anos estudados (figura 17).

Entre os anos de 1985 e 2006 no município de Parnamirim/PE (D.S.Meridional) as classes 4 (arbustiva- aberta) e 5 (arbustiva-arbórea) mantiveram os valores praticamente iguais. Contudo, para o ano de 2017, essa classe sofreu uma redução significativa. Chama-se a atenção para a classe 6 (arbórea-arbustiva) que apresentou ao longo do período de amostragem valores baixos, variando entre 3% a 6% da área total amostrada (figura 19).

Para os municípios de Araruna, Solânea e Cacimba de Dentro (todos no estado da Paraíba) (Planalto da Borborema) o NDVI evidenciou que entre os anos amostrados as classes 5 (arbustiva-arbórea) e classe 6 (arbórea-arbustiva) mantiveram-se constantes, enquanto a classe 4 (arbustiva-aberta) aumentou entre os anos de 2004 e 2017 (figura 21). Em relação ao município de Buíque/PE (Raso da Catarina) percebeu-se que as classes 4 (vegetação arbustiva aberta) e classe 5 (vegetação arbustiva-arbórea) foram diminuindo ao longo dos períodos amostrados (principalmente entre 2004 e 2017) simultaneamente ao aumento das classes 3 (herbácea) e 2 (áreas sem vegetação) (figura 23).

Herbácea Arbustiva aberta Arbustiva-arbórea Arbórea-arbustiva Sem vegetação

Figura 7 Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para o município de Piracuruca/PI (Campo Maior), comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017

Figura 8 Percentual das classes obtidas pelo Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para o município de Piracuruca/PI (Complexo Campo Maior), comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Herbácea Arbustiva aberta Arbustiva-arbórea Arbórea-arbustiva Sem vegetação

Figura 9 Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para os municípios de Buriti dos Montes/PI e Crateús/CE (C. Ibiapaba-Araripe) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Figura 10 Percentual das classes obtidas pelo Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para os municípios de Buritis dos Montes/PI e Crateús/CE (C. Ibiapaba-Araripe) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Herbácea Arbustiva aberta Arbustiva-arbórea Arbórea-arbustiva Sem vegetação

Figura 11 Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para os municípios de Assú, Angicos, Pedro Avelino e Lajes /RN (D.S.Setentrional) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Figura 12 Percentual das classes obtidas pelo Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para os municípios de Assú, Pedro Avelino, Lajes e Angicos/RN (D.S.Setentrional) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Herbácea Arbustiva aberta Arbustiva-arbórea Arbórea-arbustiva Sem vegetação

Figura 13 Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para os municípios de Santa Luzia/PB e Parelhas/RN D.S.Setentrional) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Figura 14 Percentual das classes obtidas pelo Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para os municípios de Santa Luzia/PB e Parelhas/RN (D.S.Setentrional) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Herbácea Arbustiva aberta Arbustiva-arbórea Arbórea-arbustiva Sem vegetação

Figura 15 Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para os municípios de Patu/RB e Belém do Brejo do Cruz/PB (D.S.Setentrional) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Figura 16 Percentual das classes obtidas pelo Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para os municípios de Patu/RN e Belém do Brejo do Cruz/PB (D.S.Setentrional) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Herbácea Arbustiva aberta Arbustiva-arbórea Arbórea-arbustiva Sem vegetação

Figura 17 Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para o município de Serra Negra do Norte/RN (D.S.Setentrional) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Figura 18 Percentual das classes obtidas pelo Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para o município de Serra Negra do Norte/RN (D.S.Setentrional) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Herbácea Arbustiva aberta Arbustiva-arbórea Arbórea-arbustiva Sem vegetação

Figura 19 Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para o município de

Parnamirim/PE (D.S.Meridional) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Figura 20 Percentual das classes obtidas pelo Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para o município de Parnamirim/PE (D.S.Meridional) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Figura 21 Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para os municípios de Araruna, Cacimba de Dentro e Solânea/ PB (P. Borborema) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Figura 22 Percentual das classes obtidas pelo Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para os municípios de Araruna, Solânea e Cacimba de Dentro/PB (P. Borborema) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Herbácea Arbustiva aberta Arbustiva-arbórea Arbórea-arbustiva Sem vegetação

Herbácea Arbustiva aberta Arbustiva-arbórea Arbórea-arbustiva Sem vegetação

Figura 23 Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para o município de Buíque/PE, (R.Catarina) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017.

Figura 24 Percentual das classes obtidas pelo Índice de vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) para o município de Buíque/PE (R.Catarina) comparação entre os anos de 1985, 2004 e 2017

2.3.2 Análise temporal baseada no etnoconhecimento

A reconstrução histórica sob a ótica sertaneja contribuiu para apontar as mudanças locais em cada ecorregião a partir da década de 1970 até o ano de 2017 (Figuras 25 a 30). Os históricos de usos das unidades de paisagens foram semelhantes, bem como o tempo de abandono das áreas após cada atividade relatada. Os principais usos das terras enfatizados pela maioria dos entrevistados foram aqueles destinados à geração de renda e consumo na propriedade (unidades de produção), tendo sido destacado com maior ênfase a prática do plantio do algodão (em praticamente todas as ecorregiões visitadas) consorciado com cultivo de culturas alimentícias anuais/ temporais (milho- Zea mays e feijão- Phaseolus vulgaris) e/ou com gramíneas forrageiras.

Na ecorregião Planalto da Borborema esta atividade esteve atrelada a outras: pecuária e plantação de agave (Sisalana perrine), principalmente. Já nas demais ecorregiões o modelo de uso das terras esteve ligado a formação do trinômio: algodão-pecuária-culturas alimentícias, bem como o uso consorciado do algodão com as gramíneas forrageiras de vários tipos, destacando-se a palma (Opuntia sp.) (muito citada pelos participantes da pesquisa na ecorregião da Depressão Meridional), também usada para forragem. Entre o final da década de 1970 e início da década de 1980 a cotonicultura começa a entrar em declínio, que segundo os entrevistados foi por conta da proliferação do besouro conhecido como bicudo-do-algodoeiro (Anthonomus grandis).

Segundo os entrevistados, os principais fatores que contribuíram para a diminuição da vegetação foram o desmatamento, a agricultura itinerante (coivara), solta dos animais para pastoreio, uso do arado, retirada de lenha (para fins energéticos), extração mineral, cerâmica, uso das plantas para carvão, “pragas” e longos período de seca. O desmatamento nas primeiras décadas amostradas foi atribuído principalmente ao plantio de algodão (Ecorregiões: D. Sertaneja Setentrional, D. Sertaneja Meridional, Planalto da Borborema e Raso da Catarina), Cana-de-açúcar (Saccharum officinarum) (Ecorregiões: Campo Maior e Chapada Ibiapaba-Araripe), mamona (Ricinus communis) (Ecorregião Raso da Catarina) e agave (Sisalana perrine) (Ecorregião Planalto da Borborema), bem como por cultivos para consumo na propriedade como milho (Zea mays), feijão (Phaseolus vulgaris) (todas as ecorregiões), mandioca (Manihot esculenta) (Ecorregiões: Campo Maior, Chapada Ibiapaba-Araripe e D. Sertaneja Setentrional), fruticultura irrigada e poços de petróleo (atividades

iniciadas nessas duas décadas, mas que se mantiveram nas décadas seguintes, principalmente os poços de petróleo (D.S.Setentrional) e palmas (D.S.Meridional e Planalto da Borborema).

Ainda na década de 1970 houve a inserção da espécie exótica algaroba (Prosopis juliflora). A inserção dessa espécie, segundo os entrevistados, deveu-se ao fato de que houve junto às práticas agrícolas uma maior intensificação da atividade pecuária. A planta seria uma possível “salvadora” para alimentação dos rebanhos. As áreas ocupadas pela algaroba tenderam a apresentar um maior aumento entre as décadas de 1980 até os dias atuais (principalmente nas duas ecorregiões da Depressão Sertaneja, e no Raso da Catarina), conforme os entrevistados. Segundo relatos, a introdução da planta e o aumento gradual desta deveu-se ao fato de que houve uma desvalorização das atividades agrícolas ao passar do tempo (1990- atual). Assim, boa parte que antes era ocupada por grandes extensões de plantio de milho e feijão, cedeu lugar a algaroba e a formação de áreas de capoeiras.

Na década de 1980 as áreas então ocupadas anteriormente pelo uso intensivo da cotonicultura, cultura do agave, mamona e cana-de-açúcar começam a se transformar em áreas de regeneração da vegetação nativa, e passaram a ser destinadas a prática de roças de médio e pequeno porte e áreas destinadas a pastos. Entre as décadas de 1990 a 2000, é intensificada a regeneração natural das áreas sem uso, e atualmente, as áreas rurais apresentam praticamente uma paisagem relativamente homogênea, dominada pelas espécies

Mimosa tenuiflora e a P. juliflora. Segundo os participantes que vivem nas ecorregiões da Depressão Sertaneja em praticamente todas as áreas que foram abandonadas depois do apogeu do algodão, hoje apresentam basicamente essas duas espécies. Da mesma forma, na ecorregião Chapada Ibiapaba-Araripe, há um bom predomínio de juremas em áreas de regeneração.

Os sertanejos observaram que a partir das décadas de 1990-2000 começou um processo de recuperação da vegetação nas áreas das propriedades, contudo, as práticas de desmate, retirada de lenha para cerâmica e principalmente a seca, foram citados como os grandes responsáveis pela diminuição de algumas espécies, eles relaram que algumas já não são mais evidentes ou foram diminuindo ao longo do nas propriedades, tais como murici, araticum e pequi (Ecorregião Campo Maior); cedro, murici e aroeira (C. Ibiapaba-Araripe); braúna, aroeira e pau d’arco (D.S.Setentrional); angico, aroeira e umbuzeiro (D.S.Meridional); pau d’arco, cumaru e oiticica (Planalto da Borborema) e imburana de cheiro, braúna, pau branco (Raso da Catarina).

Para o período de 2000-2017, apesar do aumento das áreas de capoeiras na ecorregião de Campo Maior, com destaque para a “mata branca”, “mata nativa”, “caatinga” aberta, moitas rasteiras e plantas nativas, os sertanejos relataram que grandes espaços com a vegetação nativa não se regeneraram por completo, devido ao desmatamento e ao período de estiagem. Nas áreas da C. Ibiapaba-Araripe entre os anos de 2000 a 2017 houve o relato para o aumento das áreas de capoeiras, junto com áreas de pastoreio, presença de “caatinga” e “carrasco”, entretanto, fatores como a seca, queimada (forragem) foram tidos como responsáveis pela diminuição da “caatinga”, do “carrasco” e da “mata seca”. Na D. Setentrional foi relatado que houve um aumento das capoeiras (com muitas juremas e algarobas), mata aberta, áreas de pastoreio, uma “caatinga” aberta, “matos” e “mata bruta”. Mas agricultura irrigada e atividade petrolífera e a estiagem, foram citados como os fatores que mais contribuíram para que as plantas não se recuperassem.

Já na D. Meridional, os participantes relatam o aumento das capoeiras, das plantas de “caatinga” em decorrência da diminuição das roças. Mas eles percebem que houve uma diminuição de plantas nativas como o marmeleiro, devido ao tempo longo de estiagem. Para o Planalto da Borborema foi relato que para esse período houve um aumento das áreas de recuperação (não só uma recuperação natural, mas também com a execução de ações voltados a recuperação de áreas degradadas, com o plantio do sabiá), e “mata do curimataú”. Entretanto, os participantes da pesquisa nessa ecorregião atribuem que o desmatamento e a seca, são responsáveis pela diminuição das grandes extensões de vegetação, principalmente “mata do curimataú” e “caatinga”. No Raso da Catarina, foi relatado que houve e há aumento das capoeiras, da “mata bruta”, das plantas de porte baixo (2 metros), porte médio e alto (mato grande: 6 a 7 metros), uso constante para plantação de palmas, pequenas áreas de cultivo de milho e feijão, e áreas com “caatinga”. Contudo houve diminuição das plantas de tamanho grande, devido à estiagem.

1970 1980 1990 2000 2017 Milho (c ) Feijão (c ) Arroz (c+v) Mandioca (c+v )

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