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3.5 Trajetória metodológica

3.5.3 Coleta de dados

Para a coleta dos dados com as famílias utilizei o método de pesquisa de Etnoenfermagem de Leininger, através do uso do Modelo Observação-Participação- Reflexão (OPR) e do Modelo Estranho-Amigo, que foram aplicados ao longo de todo o estudo.

Roper e Shapira (2000)referem que os primeiros encontros na imersão do campo causam simultaneamente excitação e constrangimento, pois tanto o pesquisador é considerado uma pessoa estranha para os informantes, como, do mesmo modo, o pesquisador os desconhece. Entretanto, esse momento não deve ser descartado, pelo contrário, deve ser visto como um mundo aberto para ser desvelado.

A Teoria da Diversidade e Universalidade do Cuidado Cultural e o Modelo Sunrise foram relevantes durante toda a coleta, pois possibilitaram apreender o modo de vida das famílias. Conforme Frota e Barroso (2003) o Modelo Sunrise auxilia como mapa cognitivo e tem sido desenvolvido e refinado para prover um quadro geral dos componentes inter-relacionados da teoria, orientando e representando as influências e os maiores conceitos com uma visão total integrada das dimensões.

O Modelo OPR, composto por 4 fases, guiou-me durante a coleta dos dados, sendo:

Primeira fase: observação e escuta ativa, que consiste na capacidade de observar diretamente o cenário cultural. Nesse momento realizei a pré-seleção

das crianças com risco para obesidade na própria escola e a seleção das famílias que aceitaram participar do estudo, e a partir disso me apresentei como pesquisadora-enfermeira, esclarecendo sobre o estudo que pretendia desenvolver junto à criança e sua família.

A avaliação antropométrica ocorreu durante uma semana para cada creche-escola, no horário das atividades educacionais, de acordo com a permissão da professora da criança. A receptividade das crianças foi imediata, mostrando-se curiosas quanto aos instrumentos (balança digital e antropômetro) da avaliação.

Expliquei à família sobre a relevância de sua participação para que eu pudesse compreender como vem se dando o crescimento e desenvolvimento da criança obesa ou com sobrepeso, e ressaltei que o anonimato de todos os informantes seria assegurado. Vale enfatizar que durante esta fase me mantive mais como observadora e ouvinte.

O contato com os informantes ocorreu durante um período de três meses. Primeiramente, selecionei a criança pela obtenção dos dados antropométricos aferidos na própria escola, conforme dito anteriormente. Em seguida, o contato com a família foi iniciado através de visitas domiciliares periódicas, segundo a necessidade da apreensão dos dados, dos informantes e da pesquisadora, sendo semanal ou quinzenal, acertadas de acordo com a disponibilidade das famílias.

Durante as visitas domiciliares e escolares, ocorridas em momentos diferentes, utilizei o guia facilitador do Modelo Estranho-Amigo, que tem como finalidade modificar a posição da pesquisadora de pessoa estranha para pessoa confiável, facilitando que esta penetre e permaneça com as famílias estudadas em seu próprio ambiente, alcançando dados fidedignos e acurados e observando seu modo de vida em relação ao cuidado com a criança pré-escolar com risco para obesidade. Este guia me auxiliou a perceber como estava acontecendo a relação pesquisadora-família, colaborando nas minhas atitudes e comportamento para observar, participar e, principalmente, realizar a entrevista aberta.

As observações feitas, informações obtidas do cotidiano da família, minhas impressões sobre os comportamentos expressos, assim como a comunicação não-verbal, os gestos, atitudes e silêncio, foram, todos, registrados em

um outro diário de campo diferente do usado para as entrevistas, e foram utilizados para somar aos significados apreendidos durante todo o decorrer do estudo.

Sendo assim, no primeiro contato com as famílias, algumas mães se mostraram surpresas ao saber que a escola do filho estava promovendo a saúde infantil através de um estudo com a finalidade de investigar a obesidade infantil: Bom você pesquisar obesidade na criança. Não sabia que a escola dela estava fazendo isso; e Você não acha ruim esse encontro ser aqui na escola? É até mais fácil, porque eu já venho pegar ele. Não sabia que eles estavam se preocupando com esse tipo de coisa.

• Segunda fase: observação com participação limitada das situações do cotidiano das famílias. Esta fase me permitiu ainda, observar o ambiente familiar durante as visitas, procurando interagir um pouco mais com os informantes da pesquisa, a fim de apreender o modo de vida da família e sua forma de cuidar da criança.

Aproveitei essa interação para obter informações sobre as condições sócio-culturais e clínicas das famílias, que foram consideradas a partir do preenchimento de um formulário, com os seguintes dados: idade, sexo, profissão/ocupação, cor, escolaridade, grau de parentesco, número de membros da família, renda mensal familiar, tipo de família, condições do lar e da comunidade na qual estão inseridos, crença religiosa, laços afetivos, peso da criança ao nascer, estatura, tipo de parto, se foi amamentada em aleitamento exclusivo ou não, etc. (APÊNDICE B)

• Terceira fase: participação com observação, sendo que nesta fase o ato de observar o ambiente é limitado, pois nesta etapa a participação é o foco principal. Neste momento procurei realizar a entrevista aberta através de duas perguntas norteadoras: (1) Você vê seu/sua filho(a) como uma criança com risco para

obesidade?; (2) Como é para você conviver com um(a) filho (a) que pode se tornar um adulto obeso?

Nessa fase meu papel principal foi de participante, embora não excluísse a observação em face de apreender os significados culturais semelhantes que emergiram dos informantes a partir da entrevista. Ressalto, ainda, que as perguntas surgiram no decorrer da entrevista, guiadas pela visão de mundo dos informantes dentro do seu contexto cultural, social e familiar, que puderam ser registradas por escrito em um diário de campo para as entrevistas.

A utilização da entrevista aberta para a coleta de dados possibilitou que os informantes discorressem livremente sobre o tema proposto; e o diário de campo, que tem como finalidade permitir o registro dos dados a partir da percepção da pesquisadora, facilitou a construção dos detalhes percebidos, que Minayo (2002) salienta como aspectos importantes na pesquisa.

Durante a entrevista, sendo esta uma técnica clássica da pesquisa qualitativa, fiz perguntas que pudessem ajudar a romper com a concepção de que tanto a pesquisadora-enfermeira quanto os informantes tivessem culturas idênticas. As perguntas contrapuseram-se a essa concepção, pois foram considerados a cultura e o modo de viver de cada família com toda a singularidade que lhe pertence.

Tive, ainda, a oportunidade de participar de uma refeição com algumas das famílias, a convite das mães do estudo, em que pude vivenciar algumas práticas alimentares particulares às famílias, apesar de já ter observado a alimentação da criança em outros momentos, como nos lanches em casa e na merenda escolar.

Leininger (1991) ressalta, através do Modelo Estranho-Amigo, que quando o pesquisador não se sente mais como um estranho nem é percebido pelos informantes como um desconhecido, nesse momento ele foi aceito. Dessa forma, quando pude compartilhar com as famílias uma refeição, participei e observei de dentro para fora do ambiente do estudo, fortalecendo a relação pesquisadora- família.

Quarta e última fase: reflexão, a partir dos achados ratificados pelos informantes e pela própria condição da pesquisadora-enfermeira durante a coleta de dados. Esta fase permitiu que procurasse validar os significados culturais advindos do fenômeno durante todo o processo de interação entre pesquisadora e informantes.

Um ponto a ser ressaltado é o término desta fase, ao qual me fez estar atenta para, no momento adequado, conduzi-la a um fim, sendo importante perceber quando não mais aparecem informações novas. Isso vem a ser um indicativo de que os dados coletados já foram confirmados.

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