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5.3 Conteúdos do instante

5.3.3 As Colunas

As colunas fixas são instrumentos importantes na narrativa retórica e persuasiva da Folha Corrida. Elas desempenham papel fundamental de comunicação dentro da configuração da página. Na área reservada para “+ Colunas”, não há um número exato de notas. A quantidade de texto pode variar de um a três, todos com uma média com 420 caracteres.

A importância dos assuntos, com temas mais polêmicos ou não, é que vai determinar o número de artigos que serão selecionados, pois, ao contrário das

informações contidas em “Rápidas”, esse espaço é dedicado aos assuntos de opinião e não aos noticiosos.

Em “+ Colunas”, será possível encontrar textos de colunistas, de políticos, ativistas, escritores, médicos. Nomes como: Xico Sá, Melchiades Filho, José Sarney, Marina Silva, Fernando Rodrigues, Rosely Sayão, Ruy Castro, César Benjamin, Dráuzio Varela, entre outros, são comuns nesse espaço. Reserva-se, portanto, um lugar na Folha Corrida para uma prática que há anos fulgura nas páginas da Folha de São Paulo, que são comentários intensos de densidade literária, que relembram contos, fábulas, os chamados sueltos, ou os folhetos populares na Península Ibérica no século XV. Mais uma vez, reafirmando a mimese que existe na seção, configuram- se e reconfiguram-se informações para que elas se ajustem a uma temporalidade em que impera a leitura rápida, a boa apreensão do sentido, mas em textos curtos e esparsos, em uma diversidade de temas que aborda desde as notícias, à opinião. Para reforçar a atenção do leitor sobre os temas escritos em “+Colunas”, seus subtítulos são escritos em cinza e os nomes dos colunistas na cor azul, azul que transmite a plenitude, a imensidão, o divagar, qualidades pertinentes a um articulista e que são transmitidas pela sensação dada pelas cores. Cores que, associadas à tipografia do texto, passam a sensação que somente as letras não poderiam passar. Mudando o direcionamento do olhar, mas seguindo a narratividade dos textos curtos e informativos, o foco da coluna “Você viu?” são os assuntos curiosos, extraordinários, extravagantes.

Não são as cores que destacam os títulos, mas as formas gráficas. São os colchetes-cinza, cor esta que mescla o preto e o branco, o vazio com o cheio, o tudo e o nada, que delimitam as informações visuais e textuais. Outra peculiaridade é a inserção de imagens, fotos ou ilustração. Texto e imagens se fundem, complementam-se numa simbiose de estilo e linguagem. Nos exemplos abaixo, pode se observar essa narrativa:

Você viu?

Pisando errado – Parte externa da rampa de acesso ao Senado é feita com um lado inverso do granito, ficar antiderrapante,e o lado polido é que recebe o cimento;O Senado explica que usou o granito porque já tinha a pedra em estoque. Brasil (A9), Publicado em 10 de dezembro de 2008

(FOLHA CORRIDA, 2008, p.1).

Você viu?

Vale mais que mil palavras – Caixão feito de pedra calcária com representações esculpidas foi encontrado por missão japonesa em tumba que pode ter pertencido a neta de Ramsés 2º. Publicado em 10 de

março de 2009 (FOLHA CORRIDA, 2009, p.1).

Você viu?

Morte pode ter sido acidental - David Carradine, 72, que atuou no

seriado de TV “Kung Fu” e nos filmes da série Kill Bill, morreu anteontem em hotel em Bancoc (TAI). A polícia investiga a possibilidade de acidente por sufocamento, causado por prática conhecida como asfixia autoerótica, em que ausência de oxigênio levaria ao clímax sexual. Segundo um policial, o corpo foi encontrado nu com uma corda amarrada no pescoço e outra em sua genitália. Publicado em 10 de junho de 2009 (FOLHA CORRIDA, 2009, p.1).

Nesse contexto, os fatos sociais ganham adornos de feature, da narrativa pitoresca, dos assuntos insólitos, dramáticos ou cômicos. São, na expressão de Roland Barthes (2003), os fait-divers, a informação completa que se esgota, que contém em si todo o seu saber, não exige que o leitor tenha nenhuma informação anterior para compreender aquilo que lê ou ouve. São as anomalias, as situações dramáticas que afloram nas páginas do jornal pelo sensacional, pelo extraordinário. Para Barthes,

[...] não é preciso conhecer nada no mundo para consumir fait divers; ele não remete formalmente a nada além dele próprio; evidentemente o conteúdo quase sempre envolve desastres, assassínios, raptos, agressões, acidentes, roubos, esquisitices, tudo isso remete ao homem, a sua história, a sua alienação, a seus fantasmas, a seus sonhos, seus medos [...] (BARTHES, 2003, p.59).

São as casualidades perturbadas, evidenciadas pela construção do enunciado, das narrativas. É o interesse pelo cúmulo. Assim, o fait-divers, entendido como uma aberração normativa das relações sociais do homem com seu meio, contribui para a explicação da ideologia da prática jornalística que faz do enunciado anômalo o paradigma do valor-notícia. Aqui, se mostram as pinceladas dos artifícios da imprensa popular para imprimir novos contornos ao jornalismo de referência. Como salientamos no início deste capítulo, é outra Folha dentro da própria Folha.

No jornalismo, por mais que se prime pela reprodução da realidade e dos acontecimentos do dia a dia, a narratividade permanece no campo do imaginário, próximo ao das fábulas e ao dos contos. Assim, como nos conteúdos da coluna “Você viu?”, nos fait-divers, o sentido é imanente do acontecimento e não externo a ele, como no caso de uma notícia política ou econômica. O sentido é extraído e evoca um fundo de significações e emoções, como amor, ódio, raiva e morte.

“Você viu?” aparece na Folha Corrida como o lugar do lazer, o lugar da diversão. Como em um almanaque, a coluna mostra o inusitado, a carta enigmática. Na Folha Corrida e no almanaque, o espírito lúdico, presente nas páginas da seção, se caracteriza pelo jogo-distração, recreação, entretenimento. É o espaço de relaxamento das atividades do cotidiano, uma ligeira transgressão à ordem rotineira dos fatos, é um excesso permitido. É o enquadramento alegre, descontraído das ruas – seja pelas informações curiosas ou bizarras – que vai para o espaço sério das casas ou do trabalho.

Casa Nova (1996) destaca que outro aspecto do lazer do almanaque é o de ensinar ou ajudar a ensinar. Nos almanaques, era comum encontrar colunas como “você sabia?”, que traziam informações curiosas sobre tamanhos de monumentos, datas, recordes etc. Com histórias engraçadas e figuras lendárias, por meio de anedotas, mostravam-se, no reino do popular, concepções dos conhecimentos oficiais e eruditos. Na Folha Corrida, não se busca passar nenhum conhecimento específico, mas informar de forma lúdica acontecimentos “curiosos” ou inusitados do dia a dia. A coluna “Você viu?” está presente em todas as edições semanais da Folha Corrida, exceto aos domingos. Dessa vez, a cor vermelha usada no título tem outra conotação, agora é o vermelho do extraordinário, o vermelho do excêntrico, o vermelho das paixões. Aqui, a cor é usada para mostrar deliberadamente emoção e, nesse caso, o vermelho é uma das cores que mais transmitem essa sensação.