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COMENTÁRIOS À PERSPETIVA DE EUCLIDES

No documento Francisco de Melo : obras matemáticas (páginas 114-122)

Perspectiua Euclidis cum Francisci de Mello commentariis Suppositiones

Supponatur ab oculo visus emissos in rectas lineas ferri interualumque quoddam inuicem efficientes. et sub visibus figuram comprehensam esse conum verticem habentem ad oculum basim vero ad fines rerum visarum.

Ea videntur ad quae visus perueniunt.

Ad quae visus non perueniunt ea non spectantur. Sub maiori angulo spectata maiora apparent. Sub minori angulo minora.

Aequalia vero videntur quae aequalibus angulis spectantur. Quae sub sublimioribus radiis spectantur sublimiora apparent.

Sublimiorem radium vocat eum qui cum demissa ab oculo in subiectum planum perpendiculari maiorem angulum ad oculum constituit contra vero humiliorem qui minorem angulum cum eadem efficit dextrum vero aut sinistrum secundum aspi- cientis positum exempla facile aduertenti succurrent.

Quae vero sub humilioribus radiis videntur humiliora apparent.

Et similiter quae sub dexterioribus spectantur radiis dexteriora apparent. | Quae uero sub sinisterioribus radiis spectantur, sinisteriora apparent. Quae sub pluribus angulis spectantur expeditius apparent.

Theorema primum. Eorum quae sub aspectum cadunt, quicquam simul totum aspici

minime potest.

| Sub aspectum oculi .a. cadat visibile .bc. in quod procidant radii .ab. .ac. .ad. Dico .bc. totum simul ab oculo .a. aspici minime posse.

Quoniam enim per primam suppositionem visus ab oculo in rectas lineas feruntur interuallum quoddam efficientes sub quibus visibile comprehenditur. Sint .ba. .ad. proximi uisus consequenter se habentes sub quibus visibile specte- tur angulum efficientes1 .bad. minimum sub quo .a. oculus possit quidam spectare. Et in linea .bd. suscipiatur ex arbitrio signum .e.

1 efficientes O, effecientes S

[S28r, O27r]

[S28v]

Perspetiva de Euclides com os comentários de Francisco de Melo

Suposições

[1] Suponhamos que os raios visuais emitidos do olho se estendem em linha reta, estabelecendo uma certa distância entre si, e que a figura compreendida sob os raios visuais é um cone que tem o vértice no olho e a base nos extremos das coisas vistas.

[2] Coisas a que chegam raios visuais vêem-se.

[3] Coisas a que não chegam raios visuais não se veem. [4] Coisas vistas sob um ângulo maior aparecem maiores; [5] [coisas vistas] sob um ângulo menor, [aparecem] menores; [6] e as [coisas] que se veem sob ângulos iguais vêem-se iguais.

[7] Coisas que se veem sob raios mais elevados aparecem mais elevadas.

Chama «raio mais elevado» àquele que constitui, com a perpendicular baixada do olho para o plano subjacente, um ângulo maior no olho; «raio mais baixo», àquele que faz, com ela, um ângulo menor; «raio à direita» e «raio à esquerda», de acordo com a posição do observador; os exemplos facilmente virão à cabeça de quem está a acompanhar [o raciocínio].

[8] Coisas que se veem sob raios mais baixos aparecem mais baixas.

[9] Da mesma maneira, coisas que se veem sob raios mais à direita, aparecem mais à direita;

[10] e coisas que se veem sob raios mais à esquerda, aparecem mais à esquerda. [11] Coisas que se veem sob maior número de ângulos aparecem mais nitidamente.

Teorema primeiro. De coisas que caem no olhar, não conseguimos ver nenhuma no seu

todo ao mesmo tempo.

| No olhar do olho A, caia o visível BC, e nele incidam os raios AB, AC e AD. Afirmo que não se consegue ver BC na sua totalidade e ao mesmo tempo a partir do olho A.

Como, pela primeira suposição, os raios visuais sob os quais o visível está com- preendido, se estendem a partir do olho em linha reta estabelecendo entre si uma certa distância, sejam BA e AD raios visuais vizinhos1 e sucessivos, sob os quais se vê o visível, fazendo o ângulo BAD o mais pequeno ângulo sob o qual o olho A consegue ver algo. Na linha BD, tome-se, arbitrariamente, o ponto E.

1 Ou seja, sem nenhum de permeio.

[S28r, O27r]

[S28v]

[O27v]

Dico itaque .eb. minime spectari ab oculo .a.

Quoniam enim proximi visus consequenter se habentes sub quibus visibile spectatur sunt .ba. .ad. angulum efficientes .bad. minimum sub quo fit visio ab oculo .a. Minor <vero> est angulus .bae. angulo .bad. igitur .ab. .ad. visus consequenter se habentes non perueniunt ad .be. Quare per tertiam suppositionem .be. non specta- tur. Eadem ratione neque .de. Itaque ipsum .bc. quod sub aspectum .a. cadit totum simul non potest videri. Vniuersa enim spectantur immutantque visum, sed non singula nisi ex accidenti.

Theorema secundum. Equalibus interuallo magnitudinibus positis propius positae

euidentius spectantur.

Sint enim aequales magnitudines .gf. .cd. interuallo | positae ad lineam .dbe. sintque

parallele. Oculus autem .e. a quo procidant visus .eb. .ea. .ec. .ed. productis .eac. .ebd. Sitque .ab. propinquior connectanturque .ef. .eg.

Dico quod .gf.2 euidentius spectatur.

2 .gf., .af. SO

Fig. 19 Afirmo que EB não se vê do olho A.

Como os raios visuais vizinhos e sucessivos sob os quais se vê o visível são BA e AD, que fazem o ângulo BAD, o menor sob o qual se vê a partir do olho A, [e] o ângulo BAE é menor do que o ângulo BAD, então os raios visuais sucessivos AB e AD não chegam a BE. Por isso, pela terceira suposição, não se vê BE. Pela mesma razão, também não se vê DE. Em consequência, não se consegue ver o próprio BC, que cai sob o olhar de A, na sua totalidade ao mesmo tempo. A verdade é que o conjunto de todas estas coisas se vê e altera o que se vê, mas não cada uma delas em separado, a não ser acidentalmente.

Teorema segundo. Se grandezas iguais forem colocadas à distância, as [grandezas]

colocadas mais próximo vêem-se mais nitidamente.

| Sejam GF e CD grandezas iguais, colocadas à distância na linha DBE e sejam para- lelas. Seja E o olho, e dele procedam os raios visuais EB, EA, EC e ED, estendidos [como] EAC e EBD. Esteja AB mais próximo e ligue-se E a F e E a G.

Afirmo que GF se vê com mais nitidez.

d

b

c

a

fig 19

e

[S29r] [Fig. 20]

Quoniam enim in parallelas rectas lineas .ab. .cd. cadit recta linea .ed. est per

29am primi elementorum | angulus .eba. aequalis angulo .edc. Rursus quoniam in

easdem rectas3 cadit linea .ec. erit per eandem angulus .ecd. aequalis angulo .eab. estque et angulus qui ad .e. duobus triangulis .cde. .abe. communis. Aequianguli ergo

erunt .cde. .abe. trianguli. Per 4am igitur 6ti elementorum sicut .de. ad .eb. ita .cd. ad.

.ab. Est autem .de. maior .eb. .dc. igitur .ab. maior est. Estque .fg. ipsi .cd. aequalis .fg.

igitur ipsa .ab. maior est .ce. igitur linea diuidit lineam .gf.4 Quare per 4m nostrum

corrogatum in Elementa Euclidis .ce. diuidit angulum .gef. Quicunque igitur visus perueniunt ad .cd. perueniunt et ad .fg.5 Perueniunt tamen nonnulli ad .gf. qui non ad .ab. vel .cd. puta qui ad .g. et .f.6 feruntur .gf.7 igitur pluribus visibus spectatur quam .cd. et concisius et per minores partes videtur pluribusque angulis. Quare per

11am suppositionem euidentius videtur .ab. quam .cd. Quod fuit probandum.

Theorema tertium. Eorum quae spectantur vnumquodque longitudinem interualli

habet aliquam qua aduentante non amplius spectatur.

Ab oculo .a. spectatur .bc.

Dico esse quandam longitudinem interualli qua aduentante non amplius spec- tabitur8 .bc. ab oculo .a.

3 in easdem rectas, in eadem recta SO

4 .gf., .af. SO 5 ad .fg., ad .fb. SO 6 .f., .b. SO 7 .gf., .gb. SO 8 spectabitur, spectabatur SO [O28r]

Fig. 20

Como a linha reta ED cai nas linhas retas paralelas AB e CD, [então,] pela

vigésima nona [proposição] do primeiro [livro] dos Elementos, o ângulo EBA é igual

ao ângulo EDC. Novamente, como a linha [reta] EC cai nas mesmas retas, [então,]

pela mesma [proposição dos Elementos], o ângulo ECD será igual ao ângulo EAB.

Além disso, o ângulo em E também é comum aos dois triângulos CDE e ABE. Então, os triângulos CDE e ABE serão equiângulos. Assim, pela quarta do sexto dos

Elementos, DE:EB=CD:AB. Mas DE é maior do que EB; logo, CD é maior do que

AB. Mas FG é igual a CD; logo, FG é maior do que AB. Então, a linha CE divide a

linha GF. Por esta razão, pelo nosso quarto corrogado dos Elementos de Euclides,

CE divide o ângulo GEF. Portanto, quaisquer raios que cheguem a CD, também chegam a FG. No entanto, alguns raios chegam a GF, mas não a AB (ou a CD), como, por exemplo, os que chegam a G ou a F. Portanto, GF vê-se por meio de um maior número de raios visuais do que CD. Vê-se também dividido em mais partes e em partes mais pequenas por meio de um maior número de ângulos. Por isso, pela suposição undécima, AB vê-se mais nitidamente do que CD. O que se queria provar.

Teorema terceiro. Para cada objeto avistado há um certo comprimento da distância2,

atingido o qual, [o objeto] deixa de se ver.

| Do olho A, veja-se BC.

Afirmo que há um certo comprimento da distância, atingido o qual, se deixará de ver BC a partir do olho A.

2 Trata-se aqui da distância entre observador e objeto.

d

b

c

a

fig 20. a

Teo. II

e

g

f

[Fig. 21]

Procidant enim visus .ac. .ab. qui quoniam non sunt continui per primam sup-

positionem | consequenter proximi se habeant .ac. .ad. vt sit .cad. minimus angulus

sub quo .a. oculus potest spectare et in linea .dc. suscipiatur pro libito signum .e. et ducatur .ae. per primum postulatum. Et sicut se habet .ce. ad .bc. sic se habeat .ac. ad

.af. per 11am 6ti elementorum.

Dico quod in .f. .cb. posita non spectatur.

Excitetur enim | .fg. parallela ipsi .cb. per 31am primi elementorum et quoniam

.ae. .fg. non sunt parallelae (quia alias .ce. .ae. essent parallelae per 30. primi ele- mentorum) productae tandem concurrent per diffinitionem sit concursus in .g.

Quoniam igitur in .fg. .ce. parallelas recta cadit linea .ag. per 29am primi elemento-

rum .fga. .cea. anguli aequales sunt. Et per eandem .gfa. .eca. aequales sunt et .eac.

communis .ace. .agf. ergo triangula aequiangula sunt, et per 4am 6ti elementorum

sicut .ac. ad .af. sic .ce. ad .fg. posita est autem .ce. ad .cb. vt .ac. ad .af. per 11am ergo

quinti elementorum sicut .ec. ad .cb. ita .ec. ad .fg. et per 9am quinti .fg. .cb. aequales

sunt. Posita igitur .bc. in .fg. conuenient per 8am communem sententiam .bc. .fg. Et

quoniam minor est angulus .fag. angulo .cad. per 9am communem sententiam qui

tamen angulus .cad. minimus est sub quo videt oculus .a. Igitur consequenter se

habentes visus .af. .ad. non perueniunt vsque ad .fg. quare per 3am suppositionem .fg.

siue .bc. posita in .f. non amplius spectabitur. Quod erat probandum.

Visus autem consequenter se habentes voco proximos quibus propositus oculus cernere quidquam potest.

[S29v]

Fig. 21

Estendam-se os raios visuais AC e AB. Como não são contínuos3, pela primeira suposição, sejam AC e AD, os [raios visuais] vizinhos e sucessivos, de tal forma que CAD seja o menor ângulo sob o qual o olho A consegue ver. Na linha DC, tome-se um qualquer ponto E e trace-se AE, pelo primeiro postulado. Ponha-se

CE:BC=AC:AF, pela décima primeira [proposição] do sexto [livro] dos Elementos.

Afirmo que não se vê a [linha] CB colocada em F.

Trace-se FG, paralela a CB, pela trigésima primeira do primeiro dos Elementos.

Como AE e FG não são paralelas (porque, de outra maneira, CE e AE seriam para-

lelas pela trigésima do primeiro dos Elementos), mas, por definição, serão concorren-

tes quando prolongadas, seja G o ponto de concorrência. Como a linha reta AG cai

nas paralelas FG e CE; [então], pela vigésima nona do primeiro dos Elementos, os

ângulos FGA e CEA são iguais. Pela mesma [proposição dos Elementos], GFA e ECA

são iguais. Mas EAC é comum. Então, os triângulos ACE e AGF são equiângulos.

Pela quarta do sexto dos Elementos, AC:AF=CE:FG. Mas pôs-se CE:CB=AC:AF;

logo, pela décima primeira do quinto dos Elementos, EC:CB=EC:FG, e, pela nona

do quinto, FG e CB são iguais. Então, se se colocar BC em FG, BC e FG sobrepõem-

-se, pela oitava noção comum [do primeiro livro dos Elementos]. Como o ângulo

FAG é menor do que o ângulo CAD, pela nona noção comum [do primeiro livro dos Elementos], e o ângulo CAD é o menor ângulo sob o qual o olho A vê, então os

raios visuais sucessivos AF e AD não chegam a FG. Por isso, pela terceira suposição, FG (ou BC colocada em F) deixará de se ver. O que se queria provar.

Chamo «raios sucessivos» aos [raios mais] próximos [um do outro] por meio dos quais o olho proposto consegue discernir alguma coisa.

3 Aqui, «continui» refere-se, portanto, à distribuição.

d

b

c

a

fig 21.a

Teo. III

e

g

f

h

Notas:

No documento Francisco de Melo : obras matemáticas (páginas 114-122)

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