5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS
5.3 Comparação da estrutura dos fluxos de compras e as entrevistas
Com as análises dos fluxos de compras por meio de sua estrutura e através das entrevistas, foi possível ter uma visão mais abrangente e funcional das relações de poder que se fazem presentes na rotina e na estrutura organizacional. Segue abaixo uma esquematização entre os dados coletados destacando as seguintes categorias: o agente do processo, o processo decisório, a legislação, a estrutura organizacional e os mecanismos disciplinatórios.
Quadro 8 – Esquematização dos dados coletados
Categorias analíticas
Dados da Análise do Fluxo do Processo de Compras
Dados da Análise das Entrevistas Agentes do processo
Os agentes do processo são determinados pela estrutura formal estabelecida pela
hierarquização do organograma da instituição.
As relações de poder dos agentes são determinadas pela
estrutura formal.
Processo Decisório
O poder formal estabelecido pela estrutura organizacional estabelece uma
relação de poder, onde o gestor estabelece as ações a serem executadas pelo subordinado, respeitando a estrutura
do processo e da linha de autoridade determinada pela estrutura
organizacional.
Os agentes que fazem parte do processo executam as decisões
e controlam as ações pertinentes as tomadas de decisão que irão fazer o fluxo
atingir seu propósito.
Legislação
A legislação norteia todo o processo de licitação, ou seja, o processo administrativo que oficializa o pedido de
compras está em sua essência embasado nas leis que regem todo o processo de
compras na esfera das instituições públicas.
Os documentos administrativos, a legislação e
até mesmo a própria estrutura combinam técnicas que vigia e
normalizam o processo com o intuito de disciplinar e
controlar.
Estrutura organizacional
A linha de autoridade se estabelece através de uma descentralização
verticalizada A estrutura regularizada, hierarquizada, disciplinarizada do fluxo do processo Mecanismos disciplinatórios
A estrutura hierarquizada estabelecida normatiza e padroniza as ações e o fluxo do processo desde o seu começo até o seu
fim.
A esquematização da tramitação dos processos administrativos que circulam dentro de ambos os fluxos, pode ser vista
como um mecanismo de regulação
O poder disciplinatórios apresenta-se desde como os agentes estão distribuídos em
seus espaços de autoridade, quanto os documentos administrativos que fazem
parte do processo.
Fonte: Elaborado pela autora (2018)
Essa comparação nos faz perceber que a estrutura organizacional estabelece uma rede de relações de poder disciplinarizada, hierarquizada e padronizada. A legislação que norteia as ações e os procedimentos necessários para a existência do processo administrativo de compras, exige dos agentes posturas e ações que tornem o fluxo do processo padronizado e regularizado. A estrutura e as relações de poder se complementam e nos fazem perceber que a esquematização da tramitação dos processos circula dentro de um ambiente altamente disciplinarizado.
A estrutura hierarquizada, além de normatizar o fluxo, inconscientemente normatiza as ações e o comportamento dos agentes, nos mostrando uma materialização e naturalização das relações de poder. Isso nos permite refletir que o controle se torna inerente ao perfil do agente do processo, não porque ele é controlador, mas porque a própria estrutura naturaliza
esse tipo de comportamento entre eles. A ideologia institucional estabelecida passa a ser seguida e torna-se verdade a ser seguida. É tão verdade que se observarmos as respostas dos agentes, será possível ver uma semelhança em suas respostas e em suas ações em diferentes situações dentro do fluxo dos processos. A estrutura dos processos de compras exige dos seus agentes e de seus subordinados um comportamento disciplinarizado e padronizado e a própria estrutura exige isso, criando uma cultura de controle que se naturaliza através de suas ideologias, através de seus rituais, protocolos e procedimentos administrativos.
De acordo com Silveira (2005) A disciplina faz “funcionar” um poder relacional que se autossustenta por seus próprios mecanismos e substitui o brilho das manifestações pelo jogo ininterrupto dos olhares calculados. Ainda nesse raciocínio, Silveira (2005) relata que Graças às técnicas de vigilância, a “física” do poder, o domínio sobre o corpo se efetua segundo as leis da ótica e de mecânica, segundo um jogo de espaços, de linhas, de telas, de feixes, de graus, e sem recurso, pelo menos em princípio, ao excesso, à força, à violência.
As Leis (o Normal) dentro de uma estrutura jurídico-discursiva se estabelece como princípio de coerção no ensino, com o surgimento de uma educação padronizada e a criação das instituições normalizadas que se estabelece na regularização dos processos e dos produtos industriais.
Os processos administrativos colocam os indivíduos num campo de vigilância que os situa igualmente numa rede de anotações escritas, comprometendo toda uma quantidade de documentos que os captam e os fixam. Segundo Foucault (1987), os procedimentos de exame são acompanhados imediatamente de um sistema de registro intenso e de acumulação documentária. Um “poder de escrita” é constituído como uma peça essencial nas engrenagens da disciplina. Em muitos pontos, modela-se pelos métodos tradicionais da documentação administrativa. (FOUCAULT, 1987).
Finalmente, o documento administrativo (exame) está no centro dos processos que constituem o indivíduo como efeito e objeto de poder, como efeito e objeto de saber. É ele que, combinando vigilância hierárquica e sanção normalizadora, realiza as grandes funções disciplinares de repartição e classificação, de extração máxima das forças e do tempo, de acumulação genética contínua, de composição ótima das aptidões. (FOUCAULT, 1987).
Amparados por Foucault (1987), podemos afirmar que poder disciplinar é absolutamente indiscreto, pois está em toda parte e sempre alerta, pois em princípio não deixa nenhuma parte às escuras e controla continuamente os mesmos que estão encarregados de controlar; e absolutamente “discreto”, pois funciona permanentemente e em grande parte em
silêncio. O poder na vigilância hierarquizada das disciplinas não se detém como uma coisa, não se transfere como uma propriedade; funciona como uma máquina.