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5.3 VÍNCULOS COM O TRABALHO E DESEMPENHO: TESTANDO OS MODELOS

5.3.2 Modelos parciais dos vínculos com o trabalho e o desempenho

5.3.3.3 Comparação da influência do comprometimento com a organização no esforço

Mais uma vez as diferenças expressas entre os modelos mostram-se deveras significativas demonstrando que para o caso do esforço instrucional nota-se diferenças fortes entre as dimensões que levam a determinadas posturas instrucionais por parte dos docentes

que atuam em ambas as instituições: públicas e privadas. Destaca-se que há dimensões do comprometimento organizacional que explicam um tipo de esforço instrucional em um grupo e não explicam no outro grupo, como por exemplo, a explicação do esforço instrucional docente exigente de IES pública é formada pela dimensão falta de recompensas e oportunidades, enquanto este esforço instrucional em docentes de IES privada não é explicado por esta dimensão falta de recompensas e oportunidades.

Observando as Tabelas 30 e 31 nota-se que o esforço instrucional é mais explicado pelas dimensões do comprometimento organizacional do que pelos vínculos com a carreira. Enquanto que os vínculos com a carreira têm um poder explicativo que varia de 13 a 40% do esforço instrucional, o comprometimento organizacional explica entre 22 a 65% do esforço instrucional.

Nas IES públicas, o comprometimento organizacional afetivo somente é significativo na explicação do esforço instrucional docente técnico, sendo que é negativo; enquanto que no grupo de docentes de IES privadas, esse comprometimento organizacional afetivo é significativo e negativo na explicação dos esforços instrucionais: encorajador, protetor e técnico. Inicialmente, este resultado parece contraditório, mas a realidade é outra. Esta dimensão denominada por Medeiros (2003) de internalização de valores e objetivos organizacionais denota o envolvimento causado pela congruência entre os valores individuais e organizacionais, e também a introjecção dos valores organizacionais. Envolve a internalização dos objetivos, valores e normas da organização, sendo este envolvimento positivo e intenso na direção dos objetivos organizacionais. Esta internalização dos valores da organização ocorre quando estes são coerentes com o que os trabalhadores valorizam ou consideram como desejável.

Ressalta-se que em algumas IES privadas há particularidades distintas de IES públicas que precisam ser levadas em conta para ser possível entender o resultado desta pesquisa que é contrário à teoria: o comprometimento afetivo com a organização leva a um menor desempenho. Destaca-se que muitos docentes têm como objetivo profissional a educação e o aprendizado de seus alunos, se sentindo com a obrigação de levar seus alunos a apreenderem o conhecimento que a disciplina sob sua responsabilidade abrange.

Entretanto, há IES privadas que têm como objetivo somente o lucro, e nestes casos muitos docentes não compartilham deste objetivo institucional, pois vai contra sua formação ética e moral. Rowe e Bastos (2007b) revelam essa desconexão, apontando que há docentes de IES privadas que não têm apoio e respaldo de suas instituições para ensinar e avaliar o aluno, adequadamente. Há IES privadas que solicitam ao docente que ‘alivie’ a

cobrança do aluno. Muitas destas IES se preocupam em ‘agradar’ seus alunos, de forma, ás vezes, contrária aos princípios éticos do educador, da sua ideologia, do sentimento de responsabilidade do docente. Como por exemplo, ter que alterar a nota, para o aluno não ser reprovado. Há docentes que não compactuam com atitudes como estas de certas IES privadas, se tornando céticos em relação ao sistema das IES privadas. Com um olhar sobre este fato, torna-se claro por que em alguns tipos de esforço instrucional, o comprometimento organizacional afetivo do docente de IES privada influencia negativamente o esforço instrucional: porque em muitos casos, os objetivos da IES privada não abarcam um bom esforço instrucional. Por outro lado, destaca-se que nas IES públicas não existe este problema, o que permite a seus docentes focarem mais no ensino, na pesquisa e na extensão, com maior liberdade e autonomia em seu trabalho, do que seus colegas que trabalham em IES privadas.

A dimensão afiliativa somente se mostra significativa e negativa em alguns tipos de esforço instrucional nos docentes de IES públicas: encorajador, protetor e perfeccionista.

A dimensão obrigação pelo desempenho, que é da base normativa, denota um sentimento de obrigação por parte do indivíduo em buscar atingir os objetivos organizacionais, bem como melhores resultados para a organização (MEDEIROS, 2003). Nessa pesquisa, essa dimensão se destaca por ser a de maior peso e também por ser a dimensão que influencia todos os tipos de esforço instrucional, em ambos os grupos: IES públicas e privadas. Ou seja, o que mais explica o esforço instrucional dos docentes é a obrigação que eles sentem em desempenhar bem suas funções na IES, procurando se esforçar para que a IES tenha os melhores resultados possíveis.

Tabela 31 – Modelo de comprometimento com a organização e esforço instrucional: comparação por grupo de docentes - IES públicas e privadas

CONSTRUTOS GRUPO DE IES INDEPENDENTES:

comprometimento organizacional

DEPENDENTES:

esforço instrucional PÚBLICAS PRIVADAS

Falta de recompensas 0,31*** 0,28***

Linha consistente de atividade -0,48*** -0,21*

Escassez de alternativas 0,09 0,18*

Afiliativa -0,18* 0,09

Obrigação pelo desempenho 0,80*** 0,79***

Obrigação em permanecer 0,03 0,19* Afetiva DOCENTE ENCORAJADOR R2 públicas = 0,42 R2 privadas = 0,44 -0,14 -0,46*** Falta de recompensas 0,25** 0,12

Linha consistente de atividade -0,17 -0,12

Escassez de alternativas -0,08 0,15

Afiliativa -0,06 0,01

Obrigação pelo desempenho 0,51*** 0,59***

Obrigação em permanecer -0,02 0,07 Afetiva DOCENTE EXIGENTE R2 públicas = 0,25 R2 privadas = 0,22 0,01 -0,1 Falta de recompensas 0,23** 0,15*

Linha consistente de atividade -0,29*** -0,26**

Escassez de alternativas 0,07 0,24***

Afiliativa -0,24*** -0,02

Obrigação pelo desempenho 0,80*** 0,78***

Obrigação em permanecer 0,09 0,27*** Afetiva DOCENTE PROTETOR R2 públicas = 0,40 R2 privadas = 0,43 -0,03 -0,32*** Falta de recompensas 0,28*** 0,17*

Linha consistente de atividade -0,26** -0,16

Escassez de alternativas 0,08 0,12

Afiliativa -0,26*** -0,11

Obrigação pelo desempenho 0,78*** 0,76***

Obrigação em permanecer -0,02 0,14 Afetiva DOCENTE PERFECCIONISTA R2 públicas = 0,37 R2 privadas = 0,35 -0,12 -0,16 Falta de recompensas 0,29*** 0,25***

Linha consistente de atividade -0,26** -0,3**

Escassez de alternativas -0,1 0,26***

Afiliativa -0,03 -0,01

Obrigação pelo desempenho 0,94*** 0,97***

Obrigação em permanecer -0,05 0,14 Afetiva DOCENTE TÉCNICO R2 públicas = 0,62 R2 privadas = 0,65 -0,19* -0,19*

FONTE: Dados da pesquisa

*Significativo ao nível de 5% unicaudal (p < 0,05). **Significativo ao nível de 1% unicaudal (p < 0,01). ***Significativo ao nível de 0,1% unicaudal (p < 0,001).

R2 - percentual de variância explicada.

A outra dimensão de base normativa desta escala de Medeiros (2003) é a

significativa e positiva somente na explicação de dois tipos de esforço instrucional em docentes de IES privadas: encorajador e protetor. Os dados revelam que quanto mais estes docentes ‘não deixam a IES porque têm uma obrigação moral com as pessoas desta IES e em permanecer nela; mesmo se fosse vantagem, ele sente que não seria certo deixar sua IES; se sentiria culpado se deixasse a IES’; maior é o seu esforço instrucional.

A dimensão escassez de alternativas, da base instrumental, abarca a percepção de que teria poucas alternativas de trabalho se deixasse a IES, portanto não deixaria este emprego agora devido à falta de oportunidade de trabalho. Esta dimensão faz parte da explicação do esforço instrucional denominado encorajador, protetor e técnico, porém, somente nas IES privadas, demonstrando que quanto mais estes docentes percebem escassez de alternativas de trabalho, mais eles se desempenham no seu esforço instrucional. Tudo leva a crer que este maior desempenho resulta do receio de perder seu trabalho, tendo em vista que suas alternativas de trabalho são escassas. Para Meyer e Allen (1991), o comprometimento instrumental é percebido como custos associados a deixar a organização, e os empregados com comprometimento instrumental permanecem na organização porque precisam.

A dimensão falta de recompensas e oportunidades, da base instrumental, abrange: a dedicação do docente a IES depende do quanto ele receba em troca; a menos que seja recompensado de alguma maneira, o docente não vê razões para despender esforços extras em benefício da IES, e a quantidade do esforço que o docente despende na IES é uma decorrência do quanto ele esteja recebendo em troca. Esta dimensão se destaca nesta análise multi grupos devido a não ser explicativa somente do esforço instrucional docente exigente de IES privadas, sendo parte explicativa, portanto, com esta exceção, de todos os outros tipos de esforços instrucionais, de ambos os grupos: públicos e privados. Isto significa que em ambos os contextos, IES públicas e privadas, os docentes valorizam o reconhecimento e as oportunidades no seu ambiente de trabalho e essas características levam a um maior esforço instrucional por parte dos docentes participantes desta pesquisa.

Os dados demonstram que a efetividade do comprometimento requer mão dupla. Ou seja, o que a organização faz para aumentar o comprometimento do seu trabalhador reflete no fortalecimento do vínculo do indivíduo. Especificamente, neste caso, requer que o docente perceba um comprometimento da instituição para com o próprio docente. Porém, isto não ocorre plenamente nas IES privadas, uma vez que os docentes não têm total autonomia e estabilidade em seu trabalho. E, por sua vez, a gestão de pessoas das IES públicas também deixa a desejar, por exemplo, ao não punir o docente que não se engaja plenamente nas atividades de seu departamento e nem por premiar os docentes que participam ativamente.

A Tabela 31 evidencia que todas as dimensões do comprometimento organizacional fazem-se relevantes na explicação do esforço instrucional. Destaca-se o esforço instrucional denominado exigente, em docentes de IES privada, que é explicado por apenas uma dimensão do comprometimento organizacional: obrigação pelo desempenho. Por outro lado, o esforço instrucional protetor, nos docentes de IES privada, é explicado por seis dimensões do comprometimento organizacional (com exceção da dimensão afiliativa). Portanto, conclui-se pela relevância de todas as sete dimensões do comprometimento organizacional para explicar o esforço instrucional do docente participante desta pesquisa.

A seção seguinte apresenta dois modelos gerais que abrangem todos os vínculos com o trabalho: comprometimento organizacional, comprometimento com a carreira e entrincheiramento na carreira, com o desempenho dos docentes.