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A palavra complexidade manifesta os sentimentos de desconforto do indivíduo, ao expressar a incapacidade que os sujeitos têm para definir de modo simples e claro suas ideias. Em outro olhar, pode ser definida como aquilo que é tecido junto, confeccionado de modo sistemático como uma teia, os acontecimentos, ações, interações, retroações, determinações, acasos que constituem o mundo fenomênico (MORIN, 2007).

Para Morin (2007), esse termo emergiu a partir da década de sessenta, através da teoria da informação, da cibernética, da teoria dos sistemas, do conceito de auto-organização. Não está vinculada aos termos confusão e complicação, ao contrário, implica a ligação entre a experiência, o raciocínio lógico e a razão, entre outras dimensões do ser humano e do meio com o qual se relaciona.

A Complexidade é uma palavra-problema e não uma palavra-solução (MORIN, 2007). Não elimina a simplicidade, mas a integra às articulações de diferentes dimensões do conhecimento. Traz a reintegração, a religação do sujeito ao meio e ao objeto pesquisado. Integra e religa opostos, que, para a Complexidade, são, ao mesmo tempo, antagônicos e complementares.

Reconhece ainda, a relação ordem-desordem, racional-irracional e transita entre esses campos, dialoga com eles. Não concebe uma oposição absoluta e sim relativa (MORIN,

2010a), de trocas, de mútuas influências, de comunicação. A natureza complexa não se opõe aos paradigmas tradicionais positivistas, ao contrário, busca interagir com eles.

[...] para a perspectiva tradicional de natureza positivista, a realidade é ordenada, objetiva, uniforme no tempo e no espaço, estática e fragmentada, e nela sujeito e objeto estão separados. [...] a causalidade é linear e mecânica e, conseqüentemente as relações entre sujeito e objeto são lineares e diretas, [...] (MORAES; VALENTE, 2008, p.19).

Pelo viés da Complexidade, a realidade não é estática, sofre mutações e possui várias dimensões, ao mesmo tempo é contínua e descontínua, estável e instável. Essa perspectiva destaca que a ordem se relaciona com a desordem, que o indeterminado, as emergências estão presentes em qualquer processo, (MORAES; VALENTE, 2008), em diversos níveis de realidade, seja global ou local.

[...] é também crucial reconhecer que o nosso mundo funciona [...] de maneira complexa. [...] A complexidade é, portanto, um fator constitutivo da vida e de seus processos revelando assim sua natureza dinâmica, processual, muitas vezes ambígua e ambivalente. (MORAES; PESCE; BRUNO; 2008, p. 26).

A visão de sujeito (figura 1), dentro da perspectiva da Complexidade, é de um ser multidimensional, integral, no qual as dimensões do ser e do fazer vão modelando-se mutuamente no seu viver/conviver, nutrido pelo emocional, pelo racional e pelo espiritual que, a cada momento, influenciam as ações, os comportamentos, as decisões, as reflexões e as condutas (MORAES, 2008).

Em suas relações com a realidade, o ser aprendiz participa com toda sua inteireza, com toda sua corporeidade, inseparável de sua história de vida (MORAES, 2008), construindo uma dinâmica relacional de natureza complexa.

No que se refere à educação, a Complexidade evidencia a dinâmica não-linear presente nos processos de construção de conhecimento e de aprendizagem. Esclarece a impossibilidade de se aceitar a escola reprodutora de conhecimento, a educação bancária denunciada por Paulo Freire. Portanto, práticas pedagógicas instrucionistas não combinam com a dinâmica complexa, pois esta valoriza o pensamento articulado, mediador, auto- organizador e emergente (MORAES, 2008).

Dessa forma, ao se considerar a Complexidade como uma teoria que abrange diversos aspectos e dimensões, suas diretrizes influenciam, de forma ampla e profunda, a maneira como se compreende o ser e sua realidade (ontologia), a maneira como se constrói e se organiza o conhecimento (epistemologia), e a maneira do ser humano agir e fazer suas atividades (metodologia).

Para orientar tanto a reflexão teórica, quanto a reflexão das práticas educativas, a Complexidade possui princípios metodológicos que se configuram como ferramentas para um pensar complexo (MORIN; CIURANA; MOTTA, 2009). Uma das principais articuladoras dessa teoria esclarece que:

Os operadores cognitivos do pensamento complexo são instrumentos ou categorias de pensamento que nos ajudam a compreender a complexidade e a colocar em prática esse Pensamento. São princípios-guia constitutivo de um pensar complexo [...] colaboram para uma melhor compreensão dos fenômenos educativos [...] facilitam a compreensão dos processos de intervenção a partir do desenvolvimento da pesquisa. Eles nos ajudam a “pensar bem” como nos diria Edgar Morin. (MORAES, 2008, p. 96-97).

Esses princípios-guia para um pensar complexo foram estabelecidos por Morin e seus colaboradores (MORAES, 2008), entre eles destacam-se: o sistêmico organizacional, o hologramático, o retroativo, o recursivo, o dialógico, o princípio da auto-eco-organização, a reintrodução do sujeito cognoscente, o ecológico da ação, a enação e o princípio da ética.

Cabe aqui, mesmo que de forma resumida, definir cada operador cognitivo abordado no parágrafo anterior. Assim, para uma elucidação a esse respeito, o texto foi confeccionado de acordo com os autores Moraes (2008) e Moraes e Valente (2008).

a) O princípio sistêmico organizacional estipula a impossibilidade de conhecer o todo de um processo ou objeto, sem conhecer as partes e vice-versa;

b) o princípio hologramático coloca em evidência que não somente a parte está no todo, mas, o todo está inscrito nas partes;

c) o princípio retroativo informa que toda causa age sobre o efeito e este retroage informacionalmente sobre a causa em questão, a partir de processos reguladores. É o chamado feedback;

d) o princípio recursivo vai além da noção de auto-regulagem, pertinente ao princípio retroativo, para entrar na fase de auto-organização, de auto-re- organização. Este princípio revela o fato de o indivíduo produzir a sociedade e ser por ela, simultaneamente, produzido. Gera uma dinâmica autoprodutora de sua própria organização;

e) para o princípio dialógico, a ordem e a desordem são complementares, tornando possível manter dualismos integrados na unidade a partir de certo nível de realidade. As relações que aparentemente são contraditórias, (dentro/fora, branco/preto, trevas/luz, bom/mau), em realidade, são visões e interpretações de um processo que permite a associação de noções opostas;

f) o princípio da auto-eco-organização explica a relação existente entre dependência e autonomia. O sujeito cria suas próprias estruturas e novas formas de comportamento a partir das relações que vivencia em seu meio, portanto, a autonomia desenvolvida é dependente do meio;

g) o princípio da reintrodução do sujeito cognoscente afirma que o sujeito é autor e co-autor de suas ações. O ser humano, ao mesmo tempo em que ensina, também aprende. A complexidade resgata a importância do sujeito na construção da história, como um sujeito proativo, criativo, pensante, criador e autor da sua própria história;

h) para o princípio ecológico da ação, toda ação, é uma ação ecologizada, pois escapa à vontade do sujeito para entrar no jogo das inter-retroações que ocorrem no ambiente. É a ação ecologizada que gera um circuito contínuo de inter-relações que varia de acordo com os resultados que vão sendo produzidos. Informa que qualquer ação, além de repercutir em outros elementos da rede, pode ser imprevisível, já que escapa à vontade daquele que a produziu Assim, o princípio ecológico da ação traz consigo a questão da imprevisibilidade, da incerteza, da não-linearidade e do indeterminismo;

i) outro princípio que se refere à ação é o da enação. Para ele, toda ação cognitiva é uma ação perceptivamente guiada. Percepção e ação são inseparáveis;

j) o princípio da ética se revela no respeito pelo outro, na solidariedade, na cooperação e na preservação de uma cultura comum a todos. As relações e inter- relações entre os seres humanos devem ser por ela permeadas. Na perspectiva do princípio ético, os demais princípios se encontram e se relacionam de forma dinâmica e aberta.

A escolha da teoria da Complexidade, nesta pesquisa, justifica-se por tal abordagem integrar diversos modos de pensar, recusando o unidimensionalismo. No contexto desta pesquisa, a Complexidade surge para ajudar a compreender a dinâmica relacional que ocorre no processo de estágio docente supervisionado a partir da percepção do aluno estagiário, das suas relações tecidas com os outros sujeitos pertinentes a este cenário e com o ambiente.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

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