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A complexidade do objeto de pesquisa, a escolha pela epistemologia qualitativa e por

3. PERCURSO METODOLÓGICO

3.1. A complexidade do objeto de pesquisa, a escolha pela epistemologia qualitativa e por

Em virtude da complexidade do nosso objeto de pesquisa: o diálogo entre os diferentes sujeitos que interagem no contexto da aprendizagem escolar da Matemática nos anos finais do ensino fundamental, fizemos a opção por uma abordagem que resgata o caráter epistemológico e a perspectiva construtiva, interpretativa e dialógica da produção de conhecimentos na pesquisa em ciências humanas e sociais (GONZÁLEZ REY, 2005a, 2005b).

Para González Rey (2005b, p. 3), sem uma revisão epistemológica, a pesquisa corre o risco, como de fato vem ocorrendo, de assumir uma posição instrumentalista em que o qualitativo é legitimado por meio dos instrumentos e não “pelos processos que caracterizam a produção do conhecimento.”

Na perspectiva aqui assumida, a produção de conhecimento em que o ser humano é ao mesmo tempo sujeito e objeto de pesquisa requer a redefinição do paradigma denominado qualitativo. Em razão disso, o percurso metodológico proposto leva em conta os três princípios ou atributos gerais, apontados por González Rey (2005a, 2005b), em sua epistemologia qualitativa:

i) o conhecimento é uma produção construtiva-interpretativa;

ii) a produção do conhecimento possui um caráter interativo e portanto dialógico;

iii) na produção do conhecimento a singularidade é um nível legítimo.

Considerar que a produção do conhecimento possui um caráter construtivo e interpretativo significa reafirmar que o conhecimento é uma produção humana que não está dado a priori e que não pode ser organizado por categorias universais (GONZÁLEZ REY, 2005b)

Nesse sentido, a produção do conhecimento é feita a partir de sucessivas construções e interpretações e da interação entre sujeitos singulares, alicerçada na comunicação, especialmente no diálogo, dos quais um é o próprio pesquisador.

Ao considerar o dialogismo um dos atributos da produção do conhecimento, González Rey (2005b) afirma que “a comunicação é uma via privilegiada para conhecer as configurações e processos de sentido subjetivo que caracterizam os sujeitos individuais e que permitem conhecer o modo como as diversas condições objetivas da vida social afetam o homem.”

Assim, para investigar o diálogo entre os diferentes sujeitos que interagem no contexto da aprendizagem escolar da Matemática nos anos finais do ensino fundamental, foi necessário construir um espaço dialógico que possibilitasse o acesso às múltiplas implicações das ações e reflexões dos sujeitos sobre o grupo e sobre a organização do trabalho pedagógico, bem como as implicações desses nas ações e reflexões dos sujeitos (estudantes, professor, professor- pesquisador).

Na epistemologia qualitativa, o pesquisador é também sujeito ativo e dialógico. Em razão disso, a percepção dos diálogos entre os vários sujeitos só foi possível porque foi estabelecida uma relação dialógica entre a pesquisadora e os sujeitos participantes da pesquisa. Para González Rey (2005a, p. 56) isso significa que

toda pesquisa qualitativa deve implicar o desenvolvimento de um diálogo progressivo e organicamente construído, como uma das fontes principais de produção de informação. No diálogo se criam climas de segurança, tensão

intelectual, interesse e confiança que favorecem níveis de conceituação da experiência que raramente aparecem de forma espontânea na vida cotidiana. Para se chegar a esses níveis de produção de informação, necessita-se de maturidade e interesse nos sujeitos estudados, os quais só surgem como resultado da maturidade dos processos de comunicação gerados de forma diversa no desenvolvimento da pesquisa.

Diante da complexidade de se ter o diálogo como objeto e método de pesquisa, assumimos que a produção das informações na pesquisa tinha caráter construtivo e interpretativo e que a singularidade do objeto, dos sujeitos e do próprio ambiente eram fontes de produção teórica que permitiam lançar luzes sobre a relação entre comunicação, especialmente o diálogo, e a aprendizagem da Matemática.

Assim, a opção por uma pesquisa participante (HAGUETTE, 2001) foi feita em razão da efetiva participação da pesquisadora no desenvolvimento do trabalho junto aos estudantes. Na pesquisa de campo, esta é denominada professora-pesquisadora, porque participa ativamente dos diálogos tanto dos estudantes entre si, como destes com ela própria e com as professoras colaboradoras do estudo.

Para Haguette (2001, p. 109), a pesquisa participante tem sido mais caracterizada do que definida. De modo geral, é possível dizer que a pesquisa participante envolve processos investigativos, educacionais e de ação. Do mesmo modo, Demo (2008, p. 93) afirma que a pesquisa participante “integra investigação social, trabalho educacional e ação”.

Nesse sentido, a adoção da pesquisa participante foi importante porque possibilitou: a) a rápida inserção da pesquisadora no ambiente da pesquisa, diminuindo o

estranhamento dos participantes e permitindo que esta se tornasse um membro aceito na comunidade;

b) a observação dos diálogos no momento em que eles ocorriam, permitindo fazer intervenções que provocassem novas enunciações dos sujeitos;

c) compreender como os diálogos eram constituídos nos pequenos e grandes grupos; d) acompanhar a produção matemática oral e escrita dos estudantes, permitindo

compreender suas construções conceituais, especialmente os processos cognitivos e metacognitivos implicados nessas construções;

e) compreender a natureza do trabalho pedagógico desenvolvido pelas professoras, no momento em que ele era organizado;

f) participar de todas as etapas da organização do trabalho pedagógico, do planejamento à avaliação;

g) vivenciar dificuldades inerentes ao trabalho pedagógico das professoras na mediação da aprendizagem matemática;

h) conhecer os sujeitos participantes da pesquisa, identificando suas percepções, expectativas, angústias, estados emocionais que, de algum modo, ofereciam indicadores das suas histórias de vida e também dos seus processos de aprendizagem.