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2.3 Tuberculose

2.3.6 O Complexo Antigênico Ag85

O complexo Antigênico 85 (Ag85) consiste de três proteínas: Ag85A (Rv3804c), Ag85B (Rv1886c) e Ag85C (Rvo129c), com peso molecular entre 30-32kDa, codificadas por três genes (fbpA, fbpB, fbpC2, respectivamente) que estão localizados em diferentes regiões do genoma da micobactéria (Content et al., 1991). Juntas, essas proteínas constituem a maior porção das proteínas secretadas por M. tuberculosis e M.

bovis (Wiker et al., 1990; Wiker et al., 1992) e, embora presentes em grande

quantidade nos filtrados da cultura, elas também podem ser encontradas em associação com a superfície da bactéria (Schou et al., 1985).

As proteínas do complexo Ag85 possuem atividade micolil-transferase, participando da síntese do ácido micólico, que constitui a parede celular bacteriana. Este ácido, por sua vez, contribui para a manutenção da integridade e patogênese destas bactérias (Belisle et al.,1997; Harth et al., 2002). Em adição à sua importância na biosíntese da parede celular, este complexo também pode estimular a captura da micobactéria por macrófagos humanos através da interação dessas proteínas com a fibronectina, presente na matriz extracelular. Esta interação resulta em um aumento da fagocitose do bacilo, mediada pelos receptores do complemento presentes nos macrófagos do hospedeiro (Abou-Zeid et al., 1988).

Além disso, as proteínas Ag85 são fortemente imunogênicas devido à sua capacidade de estimular tanto a resposta imune celular quanto humoral. Este complexo é capaz de induzir forte proliferação de células T, produção de interferon gama (IFN- ) e linfócitos T citotóxicos (CTL) em indivíduos infectados com M. tuberculosis ou

56 (Huygen et al., 1992; Launois et al., 1994; Munk et al., 1994; Silver et al., 1996). Desta forma as proteínas deste complexo são considerandas candidatas promissoras ao desenvolvimento de vacinas contra TB (Denis et al.,1998).

As proteínas secretadas são consideradas moléculas mais acessíveis para o sitema imune. Um índice que avalia a concentração relativa dos antígenos micobacterianos localizados extra ou intracelulares é o índice de localização. Este índice relaciona a quantidade do antígeno no fluido cultural e a quantidade do mesmo antígeno no sonicado bacteriano. Assim, valores altos deste índice indicam alta eficiência de secreção, sendo o índice de localização do Ag85A o maior deste complexo estudado (Wiker et al., 1990; Wiker et al., 1991; Wiker et al., 1992).

2.3.6.1 Ag85A como um antígeno vacinal

Em 1996, Sato e colaboradores e Huygen e colaboradores foram os primeiros a reportar a vacinação com DNA nu contra TB, através da utilização de DNA codificando a proteína de shock térmico de 65-kDa e a mycolyltransferase de 32-kDa ou antígeno 85A de M. tuberculosis, respectivamente (Huygen et al., 1996, Sato et al.,1996). A partir destes dados uma ampla variedade de antígenos contra a TB, a serem utilizados em vacinas gênicas, com diferentes graus de immunogenicidade e profilaxia, vêm sendo estudados (Huygen, 2003).

A identificação de Ag85A como um antígeno imunodominante para células T nos primeiros estágios da infecção levou a uma investigação mais detalhada do seu papel na imunidade da TB.

Pesquisas realizadas por Denis e colaboradores avaliaram a imunogenicidade de uma vacina de DNA carregando a ORF Ag85A em comparação com a imunogenicidade gerada pela infecção intravenosa com M.tuberculosis, em modelo murino. Estes pesquisadores observaram que a vacinação com DNA foi capaz de gerar uma forte resposta imune celular, de padrão Th1, e ativação de linfócitos citotóxicos (CTL), ao contrário do que foi observado em ratos infectados com M. tuberculosis, onde não foi possível observar a detecção da atividade citolítica nestes animais e nem naqueles vacinados com a BCG. Estes autores atribuem o resultado da pesquisa ao

57 fato das micobactérias residirem no fagossoma, o que dificulta o acesso dos antígenos protéicos ao sistema imune do hospedeiro (Denis et al., 1998). Outra abordagem em que o antígeno Ag85A foi utilizado foi a vacina MVA-85A, a qual utiliza como vetor o vírus vaccínia Ankara recombinante, modificado pela adição da ORF Ag85A. O objetivo da construção desta vacina foi aumentar o nível de resposta de células T induzida pela BCG, através da expansão de células T Ag85 específicas (McShane et al., 2004; McShane et al., 2005). Várias pesquisas demonstraram que MVA-85A induziu a produção de INF- , com picos de produção da referida citocina entre uma e duas semanas após a vacinação (Brookes et al., 2008; Sander et al., 2009). Dois estudos recentes reportaram que a MVA-85A se mostrou segura e imunogênica quando administrada em indivíduos adultos com HIV e também em indivíduos que apresentavam TB e HIV (Minassian et al., 2011; Scriba et al., 2012). Utilizando essa vacina como reforço da primeira imunização com BCG, observou-se indução de proteção contra TB em camundongos, além de níveis significativos de células CD4+ e CD8+ antígeno-específicas em relação aos animais imunizados somente com a MVA- 85A (Goonetilleke et al., 2003).

Outra tentativa com o intuito de incrementar a eficácia da BCG foi o estudo do potencial de uma vacina de DNA codificando a proteína imunodominante mycoyl- transferase Ag85A, administrada seja como priming ou como boosting à BCG. O estímulo prévio com a referida vacina de DNA incrementou significativamente a eficácia protetora da BCG, indicado pela redução de caquexia e pelo prolongado tempo de sobrevivência dos animais, como também pelo significativo aumento de IL-17 e INF- (Romano et. al., 2006).

Dou e colaboradores estudaram o efeito imunogênico de uma vacina gênica codificando o fator estimulante de colônias de granulócitos e macrófagos de ratos mGM-CSF (do inglês mouse Granulocyte Macrophage-Colony Stimulating Factor) e Ag85A, em modelo murino. Estes pesquisadores concluíram que essa nova construção de vacinas gênicas foi capaz de induzir ratos a gerarem potentes respostas imunes contra o antígeno Ag85A (Dou et al., 2005). Quatro anos mais tarde estes mesmos autores realizaram a estratégia priming-boosting utilizando a vacina BCG como estímulo, e a construção Ag85A-mGM-CSF como reforço, a fim de aumentar o efeito

58 imune e protetor frente ao desafio com M. tuberculosis. Resultados satisfatórios foram obtidos no que concerne a imunidade mediada por células como também à imunidade humoral contra o patógeno (Dou et al., 2009).

Assim, todos estes trabalhos realizados com a proteína secretada Ag85A de M.

tuberculosis apresentaram um modelo promissor de indução de imunidade contra a TB,

conduzindo a extensos programas para o desenvolvimento de novas vacinas, mais eficazes.

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