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5. Discussão

5.3 Comportamentos infantis

Para avaliar modificações no comportamento das crianças após a aplicação do PROPAIS II, ou mesmo mudanças nas percepções que os pais tinham em relação ao comportamento de seus filhos, foi utilizado o instrumento CBCL. Os relatos dos participantes acerca dos problemas comportamentais iniciais e as mudanças observadas também foram úteis para identificar possíveis efeitos do programa nessa variável.

Os escores do pré-teste do CBCL mostraram diversos problemas de comportamento nas crianças, classificados na faixa mais grave do instrumento. As falas dos participantes nas sessões iniciais do grupo também destacaram muitas dificuldades com as crianças, sobretudo com comportamentos externalizantes, entre eles: desobediência, birra, comportamentos disruptivos, problemas de conduta, desorganização e descumprimento de regras e limites. Quanto a problemas internalizantes foi ressaltado: pouca autonomia da criança, elevados níveis de preocupação e insegurança.

No momento da pré-testagem, foi superior o número de crianças problemas classificados na faixa clínica do que na faixa e normalidade, para todos os aspectos mensurados: competência social total, problemas internalizantes e externalizantes. Por se tratar de uma amostra não clínica a caracterização dos comportamentos dos filhos mostrou-se preocupante, já que os escores assemelham-se aos categorizados para amostras clínicas de crianças em atendimento psicológico (Borsa, Segabinazi, Stenert, Yates, & Bandeira, 2013).

Esses indicativos reiteram a necessidade de intervenções que identifiquem e auxiliem as crianças com problemas de comportamento. Seja para a prevenção de problemas futuros ou para que estes não sejam agravados até a busca de tratamento tardio.

Após a intervenção, foram observados no grupo como um todo, reduções nos escores de problemas de comportamento e mudanças da categoria clínica para a não-clínica no pós-teste nas três variáveis: social, problemas internalizantes e externalizantes. Houve também melhora de alguns problemas de comportamento após a aplicação do programa: a categoria Problemas Externalizantes como um todo e, dentro dela os comportamentos agressivos também apresentaram redução significativa.

No PROPAIS II não há avaliação direta do comportamento infantil, sendo as mudanças detectadas pautadas na observação dos pais. Conforme destaca Marinho (2005), estudos que contam com mudanças na avaliação do comportamento infantil apresentadas pelos pais podem indicar tanto que as crianças apresentaram melhoras em comportamentos antes considerados problemas, como também que os pais passaram a perceber seus filhos de modo diferente, não sendo as duas hipóteses excludentes. A autora destaca também que, independente de qual das explicações é mais provável nos programas que utilizam-se dessa forma de mensuração, o efeito da mudança no cotidiano das famílias tende a ser positivo: seja menor ocorrência de problemas infantis ou pela flexibilização da percepção dos pais acerca dos problemas e motivações infantis. De acordo com o modelo cognitivo de Beck mudanças de percepção e interpretação viabilizam mudanças de comportamentos e sentimentos, que podem também ocorrer no campo de interações familiares.

A diminuição de problemas externalizantes observada no PROPAIS II apareceu de forma semelhante em outros programas de orientação de pais que também utilizaram o CBCL como medida comportamental. Como exemplo, o programa voltado para pais de pré- escolares, com duração de 14 sessões, de Bolsoni-Silva e Marturano (2010), que acusou reduções significativas de problemas externalizantes e na escala total de problemas. A intervenção de Fernandes, Luiz, Miyazaki e Marques Filho (2009) com 10 sessões de 90 minutos, para pais de crianças com transtornos psiquiátricos mostrou redução significativa para problemas internzalizantes, externalizantes e totais, com estes últimos mantendo-se clínicos mesmo após a intervenção.

Deve-se atentar ao fato desses programas voltarem-se para amostras clínicas, em que problemas de comportamento graves ocorre com maior frequência, sendo ligeiramente superiores à da amostra do PROPAIS II. O estudo de Bolsoni-Silva, et al. (2008) voltado, por sua vez, para a prevenção de problemas de comportamento, mensurou mudanças positivas de categorias, com diminuição de classificações clínicas no pós-teste, semelhante ao encontrado no do presente estudo, no entanto sem indicação de comparações estatísticas.

Não foram detectadas mudanças nos comportamentos internalizantes das crianças após o programa, tampouco disponíveis na literatura de orientação de pais, diferenças estatísticas nessa categoria de problemas. Hipotetiza-se que os problemas de comportamento internalizantes, além de menos prevalentes na população, contam com uma difícil detecção por parte dos pais e professores, perdendo espaço para as queixas de comportamentos disruptivos dos filhos nos encontros de orientação de pais. Estudos como os de Gardner, Shaw, Dishion, Burton e Supplee (2007) e Eyberg, Nelson e Boggs (2008), apontam que o treinamento de pais é a modalidade de tratamento melhor estabelecida para tratamento de transtornos disruptivos em crianças, sendo justificável que o enfoque da maioria dos programas seja para esses problemas.

Por mais que o PROPAIS II volte-se para queixas diversas, a ênfase dos participantes em problemas externalizantes, expressos no CBCL e nos relatos, levam a maiores intervenções na busca de melhorá-los. Talvez por isso, ele e outros programas que enfocam modificação de comportamentos infantis obtenham resultados mais expressivos na redução de problemas externalizantes do que de internalizantes.

Os relatos dos participantes nas sessões finais do programa, de maneira diversa, se estenderam à melhora de problemas internalizantes, como ganho de autonomia para as crianças muito dependentes. Foi observado também que os pais compreenderam que, conforme eles mudam as crianças reagem e mudam também e, que essa mudança é gradual e decorrente de um processo de consistência e persistência. De acordo com seus relatos, a grande maioria terminou a intervenção do PROPAIS II motivada a manter-se nesse processo, na busca de melhor qualidade na interação com seus filhos.

Outro aspecto que pode ter influenciado na manutenção de diversos problemas comportamentais das crianças, detectados no pré-teste, é o tempo curto do programa. As seis sessões podem não ser suficientes para auxiliar os pais a, através da melhora de suas práticas educativas, melhorar o repertório comportamental de seus filhos. A mudança comportamental tende a ser demorada e pode não se instalar durante o breve intervalo das testagens, correspondentes a três meses.

A incorporação de follow-ups pode auxiliar a verificar se a mudança dos pais se mantém e começa a influenciar positivamente o comportamento infantil e/ou se seria necessária uma intervenção mais longa. Os próprios participantes, quando questionados na avaliação sobre a satisfação com o programa e sobre as sugestões que teriam, chamaram a atenção para a curta duração do grupo, afirmando que queriam participar de mais sessões. No entanto, reiteraram que não teriam disponibilidade de estarem presentes em mais sessões com

intervalos semanais, desejando que estas fossem espaçadas, o que dificultaria que se mantivesse a configuração de grupo, o que se tornaria inviável nesse estudo. É necessário avaliar, se a ampliação das sessões não acarretaria em uma perda ainda mais significativa da adesão dos pais, maior desafio encontrado durante a implantação do PROPAIS II.