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Composição, modelo e dimensão do conselho de administração

Capítulo 2. Enquadramento teórico

2.7. Outros fatores passíveis de influenciar a remuneração e o desempenho das empresas

2.7.3. Composição, modelo e dimensão do conselho de administração

Apesar dos modelos formais que desenvolveram a teoria da agência de Jensen e Meckling darem contributos relevantes para a relação principal-agente, esta não ilustra fielmente a realidade de grandes empresas (Hermalin e Weisbach 1991). Considerando a dificuldade de muitos acionistas não conseguirem coordenar o design e a negociação de incentivos a conceder à gestão, esta responsabilidade é incumbida aos conselhos de administração (Hermalin e Weisbach 1991), sob eleição pelos acionistas (Hart 1995). Os conselhos de administração têm, ainda, a responsabilidade de supervisionar a atividade da gestão, dar conselhos, exercer o direito de veto perante más decisões e até demitir o CEO (Weisbach 1988). No limite, o conselho de administração pode substituir a equipa de gestão, incluindo o CEO (Hart 1995). Desta delegação no conselho de administração surgem conflitos de interesse, que envolvem administradores executivos e não executivos, se bem que estes últimos em menor grau (Hermalin e Weisbach 1991). Tal suporta-se no argumento de que estes possuem um maior papel de monitorização da gestão. Em teoria, estes últimos terão preocupações com eventuais danos reputacionais, assim como terão preocupações com o cumprimento das obrigações jurídico-legais. Por sua vez, os executivos terão menores preocupações em monitorizarem a sua própria atividade (Hart 1995). Neste sentido, diversas recomendações incidem sobre a estrutura

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dos conselhos de administração, com o objetivo de melhorar a sua eficácia (Hart 1995). Main et al. (1995) vão mais longe ao afirmar que um conselho de administração que não seja independente, leva a que a empresa se deteriore rapidamente, tornando-se numa atividade de rent-seeking.

Mecanismos de monitorização direta são tidos como substitutos dos mecanismos associados à remuneração (ou à sensibilidade remuneração-desempenho) (Qin 2012), pelo que - teoricamente e na generalidade - será de esperar uma relação negativa entre remuneração e variáveis que reflitam um maior nível de monitorização direta da atividade dos gestores. Dois exemplos são a existência de administradores não executivos - particularmente, não executivos e independentes - e modelos de conselho de administração que promovam uma maior monitorização da atividade dos executivos (e.g. o modelo dualista).

Nesta senda, existem estudos que identificam a existência de uma relação negativa entre o pagamento de remunerações e a percentagem de administradores não executivos (Gregg et al. 2012). Tal suporta-se na potencial maior monitorização dos administradores não-executivos ou porque, simplesmente, os administradores não- -executivos recebem apenas honorários ou senhas de presença (fees), na generalidade, e recebem menos que os administradores executivos (Gregg et al. 2012).

Todavia, o estudo de Fernandes (2008), dedicado à realidade portuguesa, associa a existência de administradores não-executivos ao pagamento de maiores remunerações aos administradores executivos. Neste sentido, Fernandes (2008) “acusa” os administradores não-executivos de não estarem a desempenhar as suas responsabilidades adequadamente, nomeadamente no capítulo da monitorização e da independência, apesar do governo societário ser aparentemente adequado, com uma boa fração de remuneração variável e um número de administradores não-executivos substantivo (Fernandes 2008). Ainda assim, o estudo realizado toma em consideração apenas o período compreendido entre 2002 e 2004.

Algumas das razões apontadas por outros autores para esta má monitorização são: (i) o parco interesse financeiro, visto que os administradores não-executivos não terão muito a ganhar com um melhor desempenho da empresa; (ii) a presença dos administradores não-executivos noutros órgãos, nomeadamente executivos noutras empresas, pelo que a

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disponibilidade temporal para dedicar à empresa será reduzida; (iii) os administradores não-executivos podem ter lealdade a quem os nomeou, nomeadamente a executivos, e podem querer ser reeleitos para continuar a receber a sua remuneração (Hart 1995).

Outra possibilidade frequentemente apontada para garantir um maior controlo e monitorização da atividade dos administradores executivos é a existência de um modelo de conselho de administração dualista.

No modelo monista ou unitário (one-tier), típico de países anglo-saxónicos, a assembleia geral elege o conselho de administração composto por administradores executivos e não executivos (Jungmann 2006; Pellegrini e Sironi 2016). Contrariamente ao modelo dualista, não existe uma separação rígida das funções de controlo e de gestão (Jungmann 2006). No entanto, o facto de não existir essa separação faz com que os administradores não executivos sejam envolvidos no processo de decisão, as reuniões sejam mais frequentes e o conhecimento dos administradores não executivos promova a adoção de decisões melhor informadas (Jungmann 2006).

Alternativamente, o modelo dualista (two-tier), típico de grandes empresas alemãs e austríacas, é constituído por um conselho de supervisão (Aufsichtsrat) que controla e monitoriza o conselho de administração executivo (Vorstand) (Tirole 2001; Rose 2005; Chizema e Buck 2006; Chizema 2010).

O conselho de supervisão reúne os principais stakeholders, nomeadamente as instituições bancárias, fornecedores, clientes e representantes dos trabalhadores. Não obstante, apesar da diminuição do papel dos primeiros enquanto acionistas diretos, os bancos continuam a exercer influência atuando como agentes para outros acionistas (Chizema e Buck 2006).

Segundo Jungmann (2006), algumas das vantagens apontadas ao modelo dualista face ao modelo unitário são a separação estrita das funções de controlo e de gestão e a independência resultante. Indicando o exemplo do modelo dualista alemão, Main et al. (1995) referem que é provável que os CEO’s ganhem menos neste país porque não têm capacidade de exercer influência social sobre os membros do conselho de supervisão. Ao nível das desvantagens, Jungmann (2006) apontam que o facto das funções de supervisão e gestão estarem separadas resulta em que a atividade dos constituintes do conselho de supervisão seja sempre reativa e não ativa, pelo que o seu papel de influência pode estar

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limitado. Ademais, a divisão cria grandes assimetrias de informação entre os dois órgãos: os trabalhadores não são obrigados a reportar diretamente ao conselho de supervisão, este recebe a informação do conselho de administração com funções executivas e os administradores do conselho de supervisão não podem recolher informação por eles próprios. Outros problemas são o facto das reuniões do conselho de supervisão serem esporádicas. As leis ou normas de codeterminação também têm fraquezas: não só agravam as assimetrias de informação supra referidas, visto que os administradores executivos são relutantes em divulgar informação a órgãos onde estão representantes dos trabalhadores, como os conselhos de supervisão têm geralmente muitos membros, o que pode tornar o órgão pouco eficiente. Há, ainda, que ter em conta a necessidade dos membros do conselho de administração possuírem conhecimentos (e.g. em economia, finanças e estratégia) para assegurar um trabalho de qualidade. Perante o exposto não é de surpreender que alguns autores (e.g. Shleifer e Vishny (1997)) considerem que a eficácia deste modelo face ao modelo unitário seja questionável. Neste sentido, a literatura existente não é totalmente clara e consensual ao estabelecer relações com a remuneração, desempenho das empresas ou com a qualidade do governo societário.

A nível europeu, destaque ainda para os países ibéricos, que optam por ambos os sistemas (Jungmann 2006). Já a Dinamarca estabeleceu em 1973 um modelo híbrido (semi-two-tier), em que os administradores executivos podem ocupar metade dos lugares no conselho de supervisão (Rose 2005).

Além da existência de uma percentagem de administradores não-executivos e independentes e de um modelo de conselho de administração dualista, crê-se que os conselhos de administração mais pequenos estejam associados a uma maior eficácia na monitorização dos CEO’s, sejam menos controláveis pelos gestores, mais eficazes no processo de decisão e que estejam associados a avaliações superiores (Denis 2001; Holmstrom e Kaplan 2003). Adicionalmente, empresas com um maior número de administradores tendem a pagar mais aos seus administradores como um todo (Gregg et al. 2012). Por outro lado, tal poder-se-á também suportar no facto de que as empresas são mais complexas, o que exige melhores administradores e, por inerência, uma remuneração acrescida (Gregg et al. 2012).

Regista-se, ainda, a influência da composição e dimensão do conselho de administração no desempenho da empresa: Baysinger e Butler (1985) admitem que “o

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movimento de reforma do governo societário está correto em sugerir que a proporção de administradores independentes nos conselhos de administração das maiores empresas é uma variável de desempenho potencialmente importante”32 (p. 121). Em termos de

evidência, os autores identificaram que empresas com maior proporção de administradores independentes no início da década, alcançaram um melhor desempenho no final da mesma. No entanto, Hermalin e Weisbach (1991) levantam dúvidas por não terem sido controladas variáveis não observáveis passíveis de distorcer esta análise.

Os próprios Hermalin e Weisbach (1991) efetuaram um estudo sobre 142 empresas cotadas na New York Stock Exchange para 1977 e para valores agrupados dos anos 1971, 1974, 1977, 1980 e 1983. Os autores concluíram que não existe relação entre a composição do conselho de administração e o desempenho da empresa, ou a existir esta tem pouca significância económica (Hermalin e Weisbach 1991). Uma das explicações avançadas foi que a composição pode não ter de facto relevo (e.g. porque os administradores externos podem ser melhores conselheiros, por possuírem um maior know-how das operações ou porque facilitam os processos de transição dos CEO’s). Outra explicação reside no facto de os testes não serem suficientemente sólidos. Denis (2001) corrobora esta posição de que não existe relação significativa entre proporção de administradores não executivos e independentes e desempenho da empresa, mas defende que, por outro lado, existe uma relação entre dimensão do conselho de administração e desempenho. Uma das razões que se aponta é a existência de ligações com os gestores atuais. Outro motivo associa-se às questões de endogeneidade que recorrentemente se levantam neste tipo de estudos: um administrador não executivo e independente pode entrar na empresa após registar-se um mau desempenho da empresa.

Ainda no que diz respeito à relação com desempenho, ao nível da dimensão do conselho de administração, Yermack (1996) identificou uma associação inversa entre o valor das empresas e a dimensão.

32 Originalmente: “In this regard, the corporate governance reform movement is correct in suggesting

that the proportion of independent directors appearing on the boards of major business corporations is a potentially important performance variable.”

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