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Capítulo 4. Comitê Gestor do Pacto pela Vida, Gerência de Ações Governamentais e Gerência de

4.1. Reuniões do Comitê Gestor do Pacto pela Vida: a configuração do modelo Compstat aplicado

4.1.1. O Compstat em análise comparada

A configuração da estratégia de uso da informação criminal, aliada à descentralização operacional das atividades e operações de policiamento, atualmente em uso no Estado de Pernambuco, apresenta características semelhantes ao uso do Compstat em Nova York. Tal ferramenta é compreendida como um sistema computadorizado, cujo propósito é qualificar o trabalho de inteligência, na orientação das atividades policiais, a partir da compilação de estatísticas criminais.

Segundo informam Jang, Hoover e Joo, Compstat é uma abreviação do termo “computer comparison statistics”. A despeito de referenciar uma solução de tecnologia da informação, envolve uma inovação gerencial abrangente, direcionada, mas não limitada, às agências policiais. São quatro os princípios básicos que orientam o uso do Compstat, segundo a concepção do New York Police Department: “(a) inteligência precisa e imediata, (b) célere desenvolvimento de recursos e pessoas, (c) estratégias efetivas e (d) rigoroso acompanhamento e avaliação”. (JANG, HOOVER e JOO, 2010: 389)

O Compstat representa a ‘combinação de uma estratégia e estilo de gerenciamento’, envolvendo a especificação de problemas em um dado território e tempo e o desenvolvimento de soluções focais para resolução desses problemas específicos. Essa ferramenta de policiamento tornou-se popular, nos anos 1990, perseguindo uma significativa redução

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criminal em Nova York. O declínio da criminalidade, a partir dos indicadores arbitrados, em seguida a sua implementação, fomentou debates sobre a sua eficácia. Devido a sua conhecida história de sucesso em Nova York, o Compstat rapidamente se espalhou pelos Estados Unidos e, segundo os autores, tem sido ocasionalmente citado como a mais reconhecida gestão policial e estratégia no controle do crime. Foi absorvida por vários departamentos municipais de polícia, configurando-se como a forma mais rapidamente difundida de inovação das práticas policiais. Para alguns, inclusive, representou uma mudança paradigmática no policiamento, devido à rapidez de seus efeitos sobre a prevenção e redução criminal.

Intensivos encontros semanais ou mensais mantidos entre executores e gestores para discutir as respostas para padrões e tendências de crimes específicos são vitais para a estratégia Compstat. Eles servem como ferramenta de gestão para alcançar objetivos organizacionais, redução criminal e melhoria da qualidade de vida. Comandantes territoriais dividem seus planos estratégicos, progressos e resultados das operações na lida com os crimes na comunidade e questões de qualidade de vida, liderando a criação, avaliação e disseminação de novas estratégias. (JANG, HOOVER e

JOO, 2010: 390)

Segundo Moore (2003), há algumas perspectivas sobre as quais pode ser definido o Compstat. Na primeira, Compstat poderia ser entendido como um “sistema de coleta de um conjunto particular de estatísticas, oferecendo medições para serviços policiais demandados e níveis de atividade policial. Nesse sentido, constata-se o seu método de funcionamento, que consiste na disponibilidade de informações criminais territorialmente desagregadas e absorvidas em um espaço de tempo bastante atual. Por exemplo, em alguns poucos dias posteriores ao dia de referência das ocorrências criminais que, uma vez organizadas e sistematizadas, produzem a informação.

Interpretado numa perspectiva menos estreita, o Compstat seria compreendido como um sistema técnico e um sistema gerencial. As informações produzidas e sistematizadas garantiriam aos gestores a condução de ações e estratégias afinadas com a missão da organização. Nessa dimensão interpretativa, estaria afinada com uma filosofia de governança e atuação em redes, em vista de possibilitar, nas reuniões de planejamento de operações com uso do aparato informacional, a busca de auxílio, seja de setores internos à organização, seja de outras organizações, caso estas estejam previstas no escopo de atuação do Compstat.

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Ampliando a dimensão analítica, Compstat poderia ser entendido como um sistema gerencial tendente a reforçar o controle sobre as unidades operacionais e sobre os policiais, ainda que indutor de respostas criativas para a solução de problemas, os quais caberiam às forças policiais resolver. Como informa Moore, “também pode ser visto como parte de um novo estilo de gerenciamento policial que encoraja o foco no desempenho e na ênfase na experimentação e no aprendizado”. (MOORE, 2003: 531)

No sentido empregado acima, duas poderiam ser as repercussões do sistema, não excludentes entre si: indução ao uso de “tradicionais” estratégias de policiamento, as quais interpretam o trabalho policial como meio preferencial de obtenção do foco denotado ao sistema: a redução criminal. Por outro lado, pode contemplar também o trabalho articulado entre polícia e comunidade para o controle de crimes, desordens e medos.

No âmbito da investigação sobre os impactos do uso do sistema, e a despeito de sua popularidade, não são numerosas as pesquisas voltadas à avaliação de sua efetividade. Tampouco são comuns os trabalhos de análise de sua implementação fora do contexto norte- americano.

Um número de revisões do Compstat em Nova York tem uma forma de livros de defesa os quais assumem a efetividade. A maioria da pesquisa existente tem sido anedótica e qualitativa, portanto carecendo de generalização. Ademais, os poucos estudos que medem a efetividade do Compstat em Nova York encontraram resultados conflitantes quanto à relação casual entre a estratégia Compstat e o declínio das taxas criminais. (JANG, HOOVER e JOO, 2010: 388)

Os autores admitem as dificuldades implicadas no desenvolvimento de conclusões sobre a efetividade do Compstat para a redução das taxas criminais. Afirmam que pesquisas produzidas não foram convincentes em apontar resultados ou assumiram a impossibilidade de fazê-lo. Nesse sentido, torna-se necessária a realização de pesquisas adicionais que visem à avaliação do impacto do Compstat nas taxas criminais.

Ao analisarem a efetividade do Compstat, implementado no âmbito do Fort Worth Police Departament (FWPD), no Texas, concluem que os resultados indicam que a implementação do Compstat aumentou significativamente alguns tipos de aprisionamento Broken Windows (voltados ao cometimento de desordens e crimes de baixo potencial ofensivo), demonstrando o direcionamento da política local como uma aproximação a uma das filosofias do “Tolerância Zero”, de Nova York. Ademais, as análises produzidas indicaram significativas reduções em crimes de propriedade e nas taxas totais de crimes

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registrados, mas falharam ao mostrar mudanças significativas nas taxas de crimes violentos. Entretanto, se a estratégia de aproximação do Compstat, empregada por Fort Worth, pudesse se resumir em uma palavra, essa seria: focando (focusing). Finalizam sua análise concluindo que as pesquisas desenvolvidas paralelamente em duas localidades – Fort Worth (EUA) e Queensland (Austrália) – demonstram evidências da sua afirmação anterior. O componente primário do modelo Compstat seria, então, a aplicação do princípio focusing43.

Considerando as múltiplas possibilidades de observação e análise sobre o Compstat, Moore o define, em termos gerais, como “um sistema tecnologicamente baseado na mensuração de desempenho, contido em um sistema específico de gerenciamento, que organiza o uso dessa informação com o propósito de gerar accountability interna e aprendizado organizacional”. (MOORE, 2003: 532)

Moore referenda a constatação de que faltam pesquisas que avaliem a efetividade do modelo na redução criminal. Acrescenta também que é necessária a produção de investigações voltadas a entender em que medida as pressões e responsabilidades induzidas pelo sistema geram, factualmente, mudanças estratégicas nas relações profissionais. Também devem, na sua concepção, ser desenvolvidos estudos que busquem avaliar em que dimensão o Compstat contempla soluções e respostas criativas frente aos problemas, bem como serve como indutor do aprendizado e da mudança de paradigmas tradicionais, ao invés de se tomarem esses princípios como tácitos à implementação do sistema. “Penso que deveríamos observar o Compstat como um tipo específico de inovação administrativa no Departamento de Polícia, tratar a inovação como uma variável independente, para depois examinar os efeitos que essa inovação tem e como o Departamento de Polícia executa seu trabalho, tanto organizacionalmente, quanto substancialmente”. (Ibid).