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A partir das contribuições de diferentes pensadores sobre comunidade e aprendizagem pretende-se, neste espaço, iniciar um diálogo com os conceitos apresentados visando a compreensão do que é uma Comunidade Aprendente ou de Aprendizagem (CA) no contexto dos Coletivos Educadores (CE).

3.3.1 Um breve resgate do termo Comunidades de Aprendizagem

O termo Comunidade Aprendente ou de Aprendizagem (CA) surge a partir do contexto escolar, na década de 70.

Com o passar do tempo e a percepção do potencial de uma comunidade aprendente para além dos muros da escola, este termo passa a ser utilizado para explicitar o que acontece com diferentes grupos e que tem a aprendizagem, considerando toda a sua magnitude de significados como bem apontado por Demo (2001), permeando todo o processo de busca pela melhoria da qualidade de vida.

Maria Rita Torres, pesquisadora de CAs no contexto da América Latina e Europa, observa que

...o termo Comunidade de Aprendizagem foi estendido nos últimos anos, com acepções diversas.

... Assim, alguns se referem à escola (formal ou não-formal) ou à sala de aula como CA; outros referem-se a um âmbito geográfico (a cidade, o bairro, o povoado rural); outros, a uma comunidade virtual mediada pelas modernas tecnologias (redes de pessoas, de escolas, de instituições educativas, de comunidades profissionais, etc.). Alguns vinculam a CA a processos de desenvolvimento econômico, desenvolvimento de “capital social” ou desenvolvimento humano em sentido amplo; outros dão ênfase a temas como cidadania e participação social (TORRES, 2001, p. 1).

O conceito de Comunidade Aprendente há tempos ultrapassou a barreira da comunidade escolar e, portanto, é um equívoco dizer que está intimamente ligada ao ensino formal.

Brandão (2005), ao perceber isto, explicita que as Comunidades de Aprendizagem ou Aprendentes (CA), são lugares onde ao lado do que se faz como

um motivo principal (vocação), as pessoas também estão trocando saberes entre elas, estão se ensinando e aprendendo.

O ser humano é por natureza um ser aprendente e, portanto, vivencia infinitos momentos de aprendizagem no decorrer da sua vida. Aprendizagem esta que não se limita ao ambiente escolar, mas acontece a cada momento da nossa vida em diferentes situações e locais, “pois estamos sempre, de um modo ou outro, trabalhando EM, vivendo COM ou participando DE unidades sociais de vida cotidiana onde pessoas aprendem ensinando e ensinam aprendendo” (Op. cit, 2005, p. 88).

Este aprender e ensinar constante se dá porque, segundo Brandão (Op. Cit.), na vida experienciamos duas dimensões de acontecimentos de socialização: a socialização primária, que acontece desde o nosso nascimento, onde a aprendizagem acontece em “diferentes dimensões de nós, em nós, entre nós nos tornando seres capazes de interagir com uma cultura e em uma sociedade”; e a socialização secundária, que acontece nas unidades sistemáticas de ensinar-e- aprender (instituições de ensino) onde aprendemos a lidar com outras dimensões do conhecimento (conhecimento técnico-científico).

3.3.2 A concepção das Comunidade Aprendentes: um olhar a partir da experiência do coletivo educador ambiental de Campinas

Ao experimentar a vivência na coletividade, a partir da proposta dos Coletivos Educadores, o COEDUCA, no seu processo formador, traz para a pauta do seu processo pedagógico a constituição de Coletivos Locais de Ação Socioeducativa (CLs), grupos que estão embasados pelo conceito de comunidades aprendentes.

Mas de que comunidade aprendente estamos falando?

Uma Comunidade Aprendente que, enquanto comunidade nos permite propor um espaço que seja de indivíduos interdependentes (BAUMAN, 2003), de se sentirem participantes de um espaço-tempo (TÖNNIES, 1995), de viver em si- mesmo e no outro (BUBER, 1987), espaços de decisão política e de relações de poder (FOUCAULT, 1985), onde buscam uma vivência comum (BUBER, 1987) pela constituição não de um grupo mas de uma comunidade (HELLER, 2008)

Que este pertencer à comunidade seja pela escolha autônoma do indivíduo já desenvolvido, indivíduo que busca uma nova perspectiva para o desenvolvimento

humano (HELLER, 2008), um indivíduo que busca uma comunidade ética, onde compreenda que somos todas/os interligadas/os no mundo globalizado, informatizado, e que o compartilhar não é para “fracos” mas uma forma de enfrentarmos tarefas que sozinhos é mais difícil do que na coletividade (BAUMAN, 2003).

Sendo um espaço de enfretamentos de tarefas, é um espaço de tomada de decisão, político e, portanto, permeado por relações de poder; mas que seja um poder que não leve à sujeição.

Foucault (1985) explicita o poder não como um conjunto de instituições e aparelhos que garantam a sujeição das/os cidadãs/ãos em um estado determinado, não como modo de sujeição que tenha a forma de regra e nem como um sistema geral de dominação exercida por um elemento ou grupo que atravessam o corpo social inteiro, mas como algo que está em toda a parte.

O poder está em toda a parte; não porque englobe tudo e sim porque provém de todos os lugares. E o poder, no que tem de permanente, de repetitivo, de inerente, de auto-reprodutor, é apenas efeito de conjunto, esboçado a partir de todas essas mobilidades, encadeamento que se apóia cada uma dela e, em troca, procura fixá-las. O poder não é uma instituição e nem uma estrutura, não é uma certa potência de que alguns sejam dotados: é o nome dado a uma situação estratégica complexa numa sociedade determinada (FOUCAULT, 1985, p. 89).

Trazer a compreensão do poder para processo que tem a participação e, nela, a tomada de decisão como estratégia se faz pertinente.

Um espaço onde a história tenha sentido e possa ser um espaço de construção de valores que explicitem a essência humana (HELLER, 2008).

Que essa comunidade enquanto aprendente, seja um local onde a experiência permeie o processo, que a experiência da vivência coletiva seja algo que me passe e que não apenas passe deixando o sujeito imodificado (LARROSA, 2004)! Que seja um espaço de memória, de sujeitos históricos capazes de construir e reconstruir a própria história. Um espaço afetivo, de compreensão da complexidade humana. Complexidade esta que compreende o ser humano como um ser físico, biológico, psíquico, cultural, social, histórico e, assim, “à tomada de conhecimento,..., de consciência, da condição comum a todos os humanos e da muito rica e necessária diversidade dos indivíduos, dos povos, das culturas, sobre nosso enraizamento como cidadãos da Terra” (MORIN, 2003, p. 61).

Um lugar “centrado em experiências respeitosas de liberdade” (FREIRE, 2007), promovendo o fortalecimento da autonomia de seus participantes já que esta é um “amadurecimento do ser para si, é processo, é vir a ser” e que, para tanto, este espaço seja” (Op. cit.). E, desta forma, potencializar o indivíduo coletivo e a coletividade.

Sendo essa comunidade um espaço de aprendizagem, educador, a dialogicidade é imprescindível. É importante que seja um espaço onde o diálogo permita

desvendar-se e desvelar o Outro, num eterno entrelaçar de significados. Dialogando expomos nossa essência e ganhamos mais consciência de nós mesmos, nossas fragilidades e fortalezas, virtudes e falhas. Percebendo o que queremos e o que não concordamos, vamos encontrando nosso lugar na sociedade (ALVES et al., 2010, p. 20).

Uma comunidade aprendente onde, como parte do amadurecimento de todo o processo, se desenvolva a capacidade de auto-análise, de auto-organização e autogestão. Para Baremblitt (2002), a auto-análise consiste no processo no qual comunidades são protagonistas de seus anseios e têm claro os seus interesses e onde querem chegar. A auto-análise, para o autor, é simultânea ao processo de auto-organização, na qual a comunidade se articula, organiza para conseguir os recursos de que necessita para a melhoria da qualidade de vida.

Aqui foi feito o exercício de compreender a complexidade de uma Comunidade Aprendente e é, a partir dela, que a análise da constituição dos Coletivos Locais de Ação Socioeducativa, nesta dissertação, estará pautada.

4 CONTEXTUALIZANDO A EXPERIÊNCIA DO COEDUCA

O COEDUCA, como já mencionado anteriormente, foi constituído a partir da política pública de educação ambiental proposta pelo DEA/MMA, através do Programa de Formação de Educadoras e Educadores Ambientais (ProFEA).

Este programa está pautado pelos princípios contidos na Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA) e no Programa Nacional de Educação Ambiental (ProNEA, 2005).

Este capítulo não tem como propósito a descrição e análise detalhadas do que foi o processo de formação de educadoras/es ambientais proposto pelo COEDUCA, que será desenvolvido no capítulo "Resultados e Análise", mas fazer uma breve apresentação de como o mesmo atuou desde sua constituição até os dias atuais.