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3. O EXERCÍCIO DO DIREITO DE VOTO PELOS CIDADÃOS DEFICIENTES VISUAIS

3.1 CONCEITO DE PESSOA COM DEFICIÊNCIA

3.1.2 CONCEITO À LUZ DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE DIREITO

As críticas lançadas aos modelos acima e à classificação adotada pela Organização Mundial de Saúde, qual seja a ICIDH - Classificação Internacional de Deficiências, Incapacidades e Desvantagens -, elaborada sob forte influência do modelo

189“Se, por um lado, teoriza-se que em uma sociedade ideal, adaptada e sem discriminação, a deficiência não

existiria, assim como as questões decorrentes dos outros casos de discriminação, por outro há autores que acreditam que alguns tipos de deficiência e suas consequências persistiriam mesmo nesse tipo de sociedade ideal. Santos (2008) citando Diniz fala que há tipos de pessoas com deficiência que jamais terão uma vida independente e produtiva na sociedade, de acordo com parâmetros normais.”. PEREIRA, Fábio Queiroz – A teoria das incapacidades e o estatuto da pessoa com deficiência. 1.ª ed. Belo Horizonte: Editora D’plácido, 2018. p. 41.

190 MADRUGA, Sidney – Pessoas com deficiência e direitos humanos. 2.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 38. 191 MADRUGA, Sidney – Pessoas com deficiência e direitos humanos. 2.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 39. 192 MADRUGA, Sidney – Pessoas com deficiência e direitos humanos. 2.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 39.

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médico, propiciaram a busca por novos critérios. Como resultado, adveio a International Classification of Functioning, Disability and Health, também chamada de CIF.

Dotada da tarefa de fornecer subsídios para definição e mensuração das incapacidades, a CIF divergiu de sua antecessora, primeiramente por não adotar um modelo etiológico, haja vista que “as deficiências podem ser parte ou uma expressão de uma condição de saúde, mas não indicam, necessariamente, a presença de uma doença ou que o indivíduo deva ser considerado doente” 193. Seguindo esta linha de pensamento, a CIF optou por descrever os aspectos caracterizadores das incapacidades sem a pretensão de fornecer um conceito fechado.

Quando se alia funcionalidades e incapacidade aos fatores contextuais, depreende- se a escolha da CIF por um modelo biopsicossocial, sendo a deficiência concebida como o resultado da interação dinâmica dos Estados de saúde – doenças, lesões, traumas, etc. - com os elementos ambientais – quais sejam aqueles externos ao indivíduo e relacionados com o meio físico, social e atitudinal, os quais podem exercer efeitos tanto positivos quanto negativos às suas condições de saúde - e pessoais nos quais encontra-se inserida.

Imagine-se que um indivíduo idoso com acuidade visual moderada, entretanto, com limitações de ordem física que não lhe permitem fazer esforços físicos intensos, necessita adentrar num prédio público cuja única forma de acesso consiste numa rampa lisa.

Caso adotássemos as lições da CID, a acuidade visual moderada não seria suficiente para incluir o cidadão em discussão na categoria de pessoa com deficiência. Contudo, tomando por base as lições advindas da CIF, a correta constatação e delimitação da deficiência exigiria além da aferição da acuidade visual monocular ou binocular para curtas ou longas distâncias, a inclusão dos fatores pessoais e ambientais. Na situação sob exame, o fator ambiental caracterizado pela ausência de um meio adequado para o acesso ao prédio público em conjunto com a condição pessoal representada pela impossibilidade de o indivíduo realizar intensos esforços físicos, possibilitaria reconhecer uma deficiência capaz de o impedir do direito de adentrar no recinto público194.

193[Em linha]. [Consult. 25 de novembro 2018]. Disponível em https://www.who.int/classifications/icf/en/ 194O exemplo acima exposto tem por base considerações similares constantes da versão em língua portuguesa da

CIF: “Os factores ambientais devem ser codificados sob a perspectiva da pessoa cuja situação está sendo descrita. Por exemplo, as rampas com piso liso podem ser codificadas como um facilitador para uma pessoa em cadeira de rodas, mas como uma barreira para um invisual. O qualificador indica até que ponto um factor é um

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Seguindo essas balizas propostas pela CIF, após inúmeros debates travados a partir do ano de 2001, em 2006 foi pactuada pelos membros das Nações Unidas a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência particularizada por uma intensa participação popular representada por organizações sociais em defesa dos direitos dos deficientes, agências internacionais, entre outros, bem como, concebida sob influência dos princípios da dignidade humana e da isonomia, reconheceu no preâmbulo do seu texto que a “deficiência resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas” forneceu o seguinte conceito para pessoa com deficiência195:

“Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas”.

Ao adotar o termo “pessoa com deficiência”, a convenção conferiu ao deficiente importância, respeito e valorização enquanto pessoa cujas limitações de ordem física, intelectual ou mental devem ser encaradas como diferenças normais entre os indivíduos integrantes de uma sociedade.

Da mesma forma, o abandono do termo “necessidades especiais”, longe de denotar um descrédito para com a pessoa deficiente, representa sim uma tentativa de modificação do imaginário coletivo, rompendo com o conceito há tanto consolidado de que o deficiente é alguém sofrido, digno de pena e merecedor de caridade e exclusão, noções estas que muito violaram sua dignidade.

facilitador ou uma barreira. Há vários motivos pelos quais um factor ambiental pode ser um facilitador ou uma barreira, e em que medida. No caso dos facilitadores, o avaliador deve ter em mente questões como a disponibilidade de um recurso, se o acesso está garantido ou é variável, se é de boa ou de má qualidade e assim por diante. No caso de barreiras, pode ser relevante saber com que frequência um factor limita a pessoa, se a dificuldade é grande ou pequena, evitável ou não. Deve-se ter em mente também que um factor ambiental pode ser uma barreira tanto pela sua presença (por exemplo, atitudes negativas em relação a pessoas com incapacidades) quanto pela sua ausência (por exemplo, não dispor de um serviço necessário)”. [Consult. 25 de novembro 2018]. Disponível em https://www.who.int/classifications/icf/en/

195PIOVESAN, Flávia - Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 13.ª ed. São Paulo:

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3.2 PRINCÍPIOS ORIENTADORES DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS