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A figura jurídica do contrato tornou-se, na contemporaneidade, um dos pilares da cultura sociojurídica ocidental, dadas as noções de liberdade e autonomia da vontade que passaram a reger as relações interpessoais e sociais. Nas palavras de Mauricio Godinho Delgado, foi nesse contexto que “o contrato emergiu como instrumento hábil a incorporar esse padrão específico de relacionamento entre os indivíduos, à medida que essencialmente o contrato é que se destacava como veículo jurídico de potenciamento ao exercício da liberdade e da vontade”110. De acordo com a doutrina clássica, o contrato é um negócio jurídico bilateral, baseado na autonomia da vontade das partes envolvidas, vontades estas que convergem para que uma das partes se obrigue a dar, fazer, ou não fazer alguma coisa em troca de uma contraprestação, pecuniária ou não, a qual se obriga a outra parte.

Na definição dos civilistas Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, o contrato “é um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas próprias vontades”111. Maurício Godinho Delgado, por

108 DELGADO, op. cit., p. 310.

109 BRASIL. Decreto-Lei n° 5.452, de 1° de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho.

Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm. Acesso em: 28 nov. 2017.

110 DELGADO, op. cit., p. 573.

111 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil – Contratos: Teoria

sua vez, entende que contrato é “o acordo tácito ou expresso mediante o qual ajustam as partes pactuantes direitos e obrigações recíprocas”112.

A finalidade do contrato pode ser adquirir, resguardar, modificar e/ou extinguir direitos e obrigações. Trata-se, portanto, da mais corriqueira e mais importante fonte de obrigações, em função de suas múltiplas formas e incontáveis repercussões no mundo jurídico113.

Uma destas múltiplas formas é o contrato de trabalho ou contrato de emprego. Assim como os demais tipos de contrato, o contrato de trabalho também é pautado na autonomia da vontade, uma vez que pressupõe a liberdade de trabalho, consagrada no art. 5º, inciso XIII, da CF/88. A liberdade negocial, por outro lado, não é plenamente exercida na relação de trabalho, uma vez que existe uma parte hipossuficiente: o empregado.

Na relação de trabalho, o empregado, na maioria absoluta das vezes dependente da contraprestação oferecida pelo empregador, teme negociar, pelo menos individualmente, os seus direitos, ficando à mercê da vontade do empregador. Por isso, fala-se até do contrato de trabalho como um contrato de adesão. Nesse sentido, Maurício Godinho defende a existência de uma faceta enigmática do contrato de trabalho. Isto porque, ao mesmo tempo em que a presença das noções de liberdade e autonomia da vontade demonstram o potencial de ampliação do cumprimento do contrato de trabalho, está-se diante de um dos mais expressivos exemplos de contratos de adesão, no qual o exercício da liberdade e da autonomia da vontade de uma das partes, notadamente o empregado, encontra-se contingenciado em face da necessidade de ser admitido ou de permanecer no emprego114.

O Direito do Trabalho, regulando o contrato de emprego, pretende contrabalancear a hipossuficiência do empregado e evitar, dessa forma, que os seus direitos trabalhistas sejam desrespeitados. Trata-se, pois, o contrato de trabalho de um instrumento de proteção da relação empregatícia.

A CLT, em seu art. 442, caput, conceitua o contrato individual de trabalho como “o acordo tácito ou expresso, correspondente a relação de emprego”115. Esta definição, além de incompleta, na medida em que não revela as características do contrato, estabelece uma relação incorreta entre a relação jurídica de emprego e o contrato de emprego. Como já foi visto no início deste capítulo, segundo a doutrina contratualista, atualmente majoritária, a relação de

112 DELGADO, op. cit., p. 573.

113 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. v. 3. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 21. 114 DELGADO, op. cit., p. 574.

115 BRASIL. Decreto-Lei n° 5.452, de 1° de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho.

emprego e o contrato de emprego não se confundem: em verdade, a relação nasce do contrato, sendo, portanto, uma relação jurídica contratual.

Segundo Mauricio Godinho Delgado, a redação do referido artigo celetista resultou de um acordo teórico entre os doutrinadores contratualistas e anticontratualistas, já que destacou, ao mesmo tempo e sem maiores diferenciações, tanto a noção de relação de emprego quanto a noção de contrato de emprego, em claro prejuízo à melhor técnica jurídica116.

Por essas razões, prevalece, no ordenamento jurídico brasileiro, o conceito doutrinário de contrato de trabalho, extraído, por sua vez, dos arts. 2° e 3° da CLT, que, ao definirem as noções de empregador e empregado, traçam os elementos caracterizadores da relação de emprego, quais sejam prestação por pessoa física, pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação.

Assim, para Mauricio Godinho Delgado, o contrato de trabalho é o “negócio jurídico expresso ou tácito mediante o qual uma pessoa natural obriga-se perante pessoa natural, jurídica ou ente despersonificado a uma prestação pessoal, não eventual, subordinada e onerosa de serviços” ou, ainda, “o acordo de vontades, tácito ou expresso, pelo qual uma pessoa física coloca seus serviços à disposição de outrem, a serem prestados com pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação ao tomador”117.

Para José Augusto Rodrigues Pinto, por sua vez, o contrato individual de emprego é “o ajuste tácito ou expresso que faculta ao empregador utilizar a energia pessoal e permanente de empregado, mediante subordinação e retribuição, para a realização dos fins de sua empresa”.118

Já José Cairo Júnior define o contrato de trabalho como “o pacto, expresso ou tácito, verbal ou escrito, pelo qual o empregado, pessoa física, compromete-se a prestar serviços não eventuais e subordinados e o empregador a pagar a retribuição respectiva, seja esta convencionada ou imposta pela lei”119.

Alice Monteiro de Barros propõe um conceito que vai além dos mencionados. Para a autora, o contrato de trabalho é “o acordo expresso (escrito ou verbal) ou tácito firmado entre uma pessoa física (empregado) e outra pessoa física, jurídica ou entidade (empregador), por meio do qual o primeiro se compromete a executar, pessoalmente, em favor do segundo um serviço de natureza não eventual, mediante salário e subordinação jurídica”120.

116 DELGADO, op. cit., p. 575. 117 Ibidem.

118 PINTO, op. cit., p. 189.

119 CAIRO JÚNIOR, José. Curso de direito do trabalho: direito individual e coletivo do trabalho. 7. ed., rev.,

ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2012. 1176 p.

O contrato de trabalho é, portanto, o acordo expresso ou tácito do qual deriva a relação de emprego e que tem por características a subordinação do empregado, sendo este pessoa física, a não-eventualidade, a onerosidade e a pessoalidade. Observe-se que a existência de uma pessoa com deficiência em um dos polos da relação contratual trabalhista não interfere em nenhuma destas características, portanto, o conceito de contrato de trabalho não se modifica quando se trata de empregado com deficiência.