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Capítulo I |Uma abordagem ao talento no contexto da Gestão de Recursos

3. O conceito de competências

O conceito de competências é relaIvamente recente no domínio da sociologia das Organizações, do Trabalho e das Empresas, cujo desenvolvimento teve origem em meados dos anos 80 do século XX, como resposta às transformações laborais e empresariais que ocorreram na época. É um conceito que surge como resposta às flutuações constantes vividas nos sistemas organizacionais e do trabalho e que de algum modo caracterizam a atualidade (Cit. por, Dadoy, 2004).

Este é um conceito que ganhou representaIvidade num período marcado pelo aparecimento de novas profissões e o consequente desaparecimento de outras, as relações contratuais eram instáveis e flutuantes e no mercado de trabalho as qualificações e competências revelavam-se escassas. É neste senIdo que surgem as

Gestão Administra4va de Recursos Humanos Gestão de Talento

As pessoas como recursos produIvos, orientados para lucro

As pessoas enquanto recurso valioso, provedor de altos níveis de desempenho, com competências-chave

para organização Era industrial Era do potencial humano Gestão padronizada, uniforme, administraIva e

operacional - modelo de gestão mecanizado (centralizado na produIvidade)

Gestão segmentada, individualizada e personalizada - modelo de gestão orgânico (centralizado nas pessoas)

PolíIcas e práIcas não formalizadas - hierárquicas

PolíIcas e práIcas abertas, justas, formalizadas e estratégicas - processual

Universalista e uIlitário Estratégico e desenvolvemenIsta Recrutamento externo e com foco nos

interesses organizacionais.

Recrutamento interno e externo, mais sofisIcado, assente na busca sistemáIca de funções-chave, que

contribuem para a vantagem compeIIva da organização.

PráIcas essencialmente operaIvas e administraIvas.

Sistemas de compensações e bene†cios, transparentes, justas e moIvadores, que viabilizam

recompensar altos desempenhos. Condições e ambiente de trabalho agradáveis; flexibilidade dos horários de trabalho, trabalho

desafiador. Trabalho isolado e pouco parIcipaIvo

Cultura organizacional comunicaIva, parIcipaIva, acolhedora, empreendedora, atraIva (employer

primeiras problemaIzações acerca do conceito dentro da sociologia, encarando-o como um sucessor histórico e teórico do conceito de qualificação e não como uma mera subsItuição do termo. As competências remetem para uma nova forma de interpretar e encarar a realidade, que de alguma forma acompanha a mudança económica e tecnológica vivida nas úlImas décadas (Parente, 2004), resultado da intensificação das tecnologias da informação e da comunicação.

Segundo Stroobants (1999) a abordagem acerca das competências não surge com a finalidade de colocar em causa ou gerar reforma nas conceptualizações sociológicas sobre a qualificação, pois as propostas de análise e definição do conceito derivam da mesma natureza - a aIvidade laboral, alterando-se apenas os critérios formais de avaliação isto é, ultrapassam-se os critérios formais e rigorosos de apreciação provenientes somente de classificações profissionais e/ou de cerIficações escolares e estabelecem-se novos critérios que permitem definir uma separação clara entre aquilo que é “estar qualificado” para uma dada função e aquilo que é o nível de “qualificação do trabalhador”.

A inexistência de um entendimento consensual e unanime acerca das competências é percepvel, uma vez que representa um termo bastante amplo e divergente, com propostas conceptuais que emergem das mais diversas áreas do saber cienIfico, desde- Sociologia das Organizações e do Trabalho, a Gestão dos Recursos Humanos, a Psicologia, entre outras. Este é um termo heurísIco e interdisciplinar que traz consigo algumas limitações, nomeadamente no que se refere à definição das principais fronteiras limítrofes do termo, assim como as conotações concretas que lhes estão subjacentes.

No entanto, no que se refere às abordagens sociológicas existem dois aspetos consensuais que se manifestam sobre as diferentes propostas: (1) primeiramente as competências apenas se manifestam dentro do campo de trabalho, na qual se caraterizam como “competências em uso”. Isto é são conhecimentos cogniIvos que são colocados em práIca em contexto laboral. (2) Para além disso as “práIcas cogniIvas dos trabalhadores”, integram aquilo que são as competências e que não devem ser confundidas com cerIficações e formações profissionais e/ou escolares formalizadas (Malglaive, 2004, cit por. Parente).

As competências podem ser definidas como o “(…) resultado da relação estabelecida entre as práIcas e as capacidades cogniIvas dos sujeitos e o seu reconhecimento numa dada situação de trabalho, determinada por condicionalismo de ordem organizacional e gesIonária. (…) As competências reportam para a capacidade de combinar e fazer uso dos recursos internos e externos, concreIzando-se desta forma em saberes em uso.” (Parente, 2004, pág.302). Por outras palavras, remetem para a combinação entre a vontade dos trabalhadores de aplicarem os saberes que detém, mobilizando-os em competências e as condições “organizacionais e gesIonárias” criadas, que possibilitam que estas se manifestem e se concreIzem dentro de uma organização ou empresa (Parente, 2004).

A obra “Gestão e Desenvolvimento de Competências” - (2006) de Mário CeiIl esboça uma análise detalhada sobre algumas propostas conceptuais acerca do conceito de competências, inserindo-o no domínio da Gestão dos Recursos Humanos e da Psicologia. Na sua abordagem o autor destaca quatro perspecIvas centrais sobre as competências, na qual podem ser descritas como: (1) atribuições, (2) qualificações, (3) caracterísIcas pessoais e (4) comportamentos.

No que se refere às abordagens das competências enquanto atribuições, considera que estas são adquiridas de forma externa aos indivíduos. As competências “ (…) são consideradas prerrogaIvas que determinadas pessoas podem (ou devem) usar e que são inerentes ao exercício de determinados cargos, funções ou responsabilidades” (CeiIl, 2006, p.24). Surgem associadas a conhecimentos obrigatórios para o exercício de uma dada função ou seja, uma vez que os indivíduos ocupam um cargo, existem funções e responsabilidades a ter por inerência (CeiIl, 2006).

RelaIvamente às perspeIvas das competências como qualificações, o termo surge como “(…) um conjunto de saberes ou de domínios de execução técnica que as pessoas podem adquirir, seja por via do sistema formal de ensino, seja por via da formação profissional (…)” ou até pela própria experiência pessoal (CeiIl, 2006, p.25). Neste senIdo, dizemos que uma pessoa está qualificada para o desempenho de uma dada função quando esta possui um conjunto de formações reconhecidas e formalizadas, que validam e cerIficam a qualidade do seu desempenho. Nesta

perspecIva e à semelhança da anterior, as competências também provém de agentes externos aos indivíduos, não sendo por isso uma caracterísIca intrínseca.

Segundo esta perspecIva as competências são encaradas como independentes do desempenho na medida em que, os indivíduos podem possuir as competências necessárias para o exercício de uma função. Contudo, isto não significa que o seu desempenho seja o esperado, face aquilo que é expectável para aquela função ou seja, o grau de qualificação académica que um indivíduo possui não significa que o seu desempenho seja equivalente (CeiIl, 2006). Segundo CeiIl, as abordagens das competências enquanto caracterísIcas pessoais, são dentro das propostas das competências as mais amplamente difundidas e bem aceites ao nível da sua consistência e coerência teórica. Na qual disInguem-se alguns autores emblemáIcos como: McClelland (1973), Boyatzis (1982) e Spencer & Spencer (1993).

McClelland (1973) define o conceito de competência como uma caracterísIca intra-pessoal de um indivíduo, sendo que esta caracterísIca pode estar relacionada com uma elevada performance na realização de uma dada tarefa ou situação. Ou seja, as competências referem-se a um conjunto de capacidades diferenciais que os indivíduos possuem e que são mobilizadas em situações específicas e necessárias, refleIndo-se em resultados específicos. Este conceito designam talento, como um algo natural de uma pessoa que pode ser aprimorado com habilidades e demonstrado na práIca.

Boyatzis (1982) à semelhança da proposta anterior também encarou as competências como “uma caracterísIca intrínseca de uma pessoa que resulta em efeIva ou superior performance na realização de uma aIvidade “ (Boyatzis, 1982, p. 21). Porém na sua abordagem foi ainda mais longe, procurando demonstrar a forma através do qual é possível idenIficar estas mesmas caracterísIcas diferenciadoras. Concluindo que não é apenas um fator que determina um indivíduo de alta performance, mas sim múlIplos fatores que interligados entre si conduzem a esta diferenciação, nomeadamente: qualidades pessoais, moIvações, experiência, caracterísIcas comportamentais, evidenciados em contextos específicos.

No seguimento das conceções apresentadas surge ainda Spencer & Spencer (1993), definindo o conceito como uma “(…) caracterísIca intrínseca aos indivíduos

que apresenta uma relação de causalidade com critérios de referência de efeIva e superior performance, numa dada situação.” (Cit. por Spencer & Spencer, 2006).

Por fim, no que remete às perspeIvas das competências enquanto comportamentos, aquilo que realmente importa não são as caracterísIcas pessoais que os indivíduos possuem, que os diferenciam e que se refletem num potencial bom desempenho numa dada função. Aquilo que aqui importa é a capacidade de aplicar as suas caracterísIcas em situações práIcas. Assim podemos dizer “(…) que a pessoa tem possivelmente a capacidade e o potencial para desempenhar bem determinadas aIvidades, contudo não tem as competências necessárias” (CeiIl, 2006, p.34). E se relacionarmos isto com aquilo que é a estratégia de gestão de talento concluímos que para procedermos à idenIficação de potenciais talentos, aquilo que importa observar não são as competências que os indivíduos possuem, mas sim a manifestação de competências específicas e a sua aplicação em situações práIcas. Entendemos que as competências são essenciais no processo de idenIficação de talento na medida em que “quando o fazemos” estamos a analisar o alinhamento entre as competências que são expectáveis para o desempenho de uma dada função e as competências que os indivíduos são capazes de manifestar na práIca.

Capítulo II | O estágio e a inves4gação: diálogos de uma estratégia