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3 O DIREITO À PROPRIEDADE E SUA FUNÇÃO SOCIAL

3.2 CONCEITO DE PROPRIEDADE

A propriedade é o mais complexo, mais importante e mais sólido de todos os direitos subjetivos e constitui o centro, o eixo, em todo do qual gravita o direito das coisas. Pode ainda ser vista como um conjunto de direitos, “como uma estrutura que incentiva as relações humanas, ou como um feixe de direitos por intermédio dos quais se torna possível

promover as trocas”, conforme aduz Armando Castelar e Jairo Saddi (2005, p.94).

O direito de propriedade é a forma mais extensa de disposição privada sobre os bens. É um dos pilares da civilização ocidental e deve ser entendida como uma relação jurídica estabelecida entre uma pessoa e uma coisa e não como mera relação de domínio.

Trata-se de instituto de dificílima definição. Seria um direito civil ou um direito natural, como expresso na Declaração de Direitos. No direito romano, não há uma definição exata do que seja propriedade. Proprietas, manipium ou dominium, são palavras originárias da palavra latina proprium, ou seja, pertencente a alguém, ou próprio da pessoa.

Washington de Barros (1994) aduz que o direito de propriedade é a pedra fundamental de todo o direito privado.

Fora da propriedade e da comunidade, ninguém concebeu uma sociedade possível. Segundo Pierre-Joseph Proudhon (1988, p.241) “a comunidade procura a igualdade e a Lei – a propriedade fruto da autonomia da razão e do sentimento de mérito pessoal almeja acima de

tudo a independência e a proporcionalidade”.

Em verdade é a propriedade essencial para subsistência do regime capitalista, além de garantir a ordem pública e o direito de cada um de utilização de seus bens.

O titular deste direito tem a prerrogativa de usar, gozar e dispor de seus bens, submetendo a coisa corpórea ao seu poder de forma absoluta, exclusiva e perpétua.

Com o advento do Estado, este passou a determinar a organização da propriedade que tem como denominador a Lei e a própria natureza humana.

Segundo Denis Lerrer Rosenfield (2010) a propriedade possui um sentido amplo, que se refere tanto a bens físicos quanto espirituais, materiais e imateriais que dizem respeito à capacidade humana subjetiva de livre escolha.

Não é a propriedade apenas posse legalizada de um bem determinado, mas abarca a vida de cada um, a sua segurança física e jurídica, bem como a sua própria liberdade, e como tal, em um Estado Democrático de Direito, os cidadãos devem busca no Estado a solução para seus problemas sociais, devendo este proteger a propriedade privada.

O conceito de propriedade trás também a ideia de responsabilidade. A propriedade é o lugar em que se realizam a liberdade do individuo, a liberdade de ação e a liberdade de escolha, razão pela qual deve ser tão observada e protegida pelo Estado, assim como deve ter a sua utilização pelo fiscalizada.

Nesta linha de pensamento, aduz Diogo de Figueiredo Moreira Neto (2003) que a propriedade é expressão da liberdade humana de dispor amplamente dos frutos do trabalho criativo e produtivo, mas que, do mesmo modo, tem seu exercício limitado e condicionado pelos parâmetros estabelecidos pela ordem jurídica, sintetizados no atendimento de sua função social.

Ressalte-se que as normas que protegem o direito de propriedade para serem legítimas devem refletir o querer, a vontade do povo representada pelo governo democrático.

Nas palavras de José Afonso da Silva (2010) a propriedade é um direito atual, cuja característica é a faculdade de usar, gozar, dispor e reivindicar da coisa do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha, conforme disposto no artigo 1.228 do Código Civil Brasileiro. Referido autor destaca que o regime jurídico da propriedade não é uma função do direito civil, mas de um complexo de normas administrativas, urbanísticas, empresariais e civis, sob o manto da Constituição.

Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald (2009, p.168) aduzem que a propriedade é a

feição econômica e jurídica que representa formalmente o bem, “dotando o proprietário de

uma situação ativa que lhe permita o transito jurídico de titularidades e a proteção plena do

aparato jurisdicional”.

Partindo dos elementos intrínsecos e extrínsecos da propriedade Marcos Aurélio

Bezerra de Melo (2008, p.85) define propriedade como sendo “o poder de senhoria que uma

pessoa exerce sobre uma coisa, dele excluindo qualquer ingerência de terceiros”.

No ordenamento pátrio a propriedade é tratada em muitas ocasiões como sinônimo de domínio.

Maria Helena Diniz (2010, p.113) conceitua propriedade como sendo “o direito

que a pessoa natural ou jurídica tem, dentro dos limites normativos, de usar, gozar e dispor de um bem, corpóreo ou incorpóreo, bem como de reivindica-lo de quem injustamente o

detenha”.

Em uma visão moderna e consolidada, Caio Mario da Silva Pereira (2009) ensina que não há um conceito inflexível de propriedade e a conceitua usando seus poderes de forma analítica usando como fundamento o artigo 1228 do Código Civil.

Para Marco Aurélio Greco (1990, p. 112) que o direito de propriedade nem é

pleno, nem é benesse atribuída pelo Estado, “é algo construído dia-a-dia pela participação dos

homens. Com sua ação concreta sobre um bem fisicamente identificável e num contexto

social, assumindo diferentes dimensões e conotações, conforme a época considerada”.

Apresenta-se como um direito real fundamental, espinha dorsal do direito privado, cuja plenitude, caráter exclusivo e ilimitado encontra previsão no ordenamento pátrio no artigo 1.231 do Código Civil Brasileiro, segundo o qual, “a propriedade presume-se plena e

Apesar de referido dispositivo legal, a defesa e proteção plena do direito de propriedade não significam direito de propriedade como direito absoluto. Trata-se de direito amplo no sentido de abarcar todos os poderes de usar, gozar e dispor sobre a coisa, objetivamente considerados. Nem sempre, como já destacada todas as faculdades de um direito de propriedade poderá ser exercida sem limites. Quando há algum tipo de desmembramento dos seus elementos constitutivos, passa-se a chamar a propriedade de restrita ou limitada.

Assim, quanto ao caráter ilimitado da propriedade deve se entender que o direito de propriedade não é limitado em sua essência, mas na sua extensão da expressão prática dos poderes afetados ao direito de propriedade. A Constituição Federal, o Estatuto da Cidade, o Código Florestal, a Lei de proteção ao meio ambiente são exemplos de instrumentos normativos que trazem restrições ao exercício prático do direito de propriedade.

Para Vladimir da Rocha França (1999, p.12) a propriedade consiste “no anteparo

constitucional entre o domínio privado e o público havendo a sua tutela constitucional em razão da limitação imposta ao Estado no campo econômico, pois a apropriação particular dos

bens econômicos não pode ser sacrificada”.

Destaca Denis Lerrer Rosenfield (2012, p.23-24) que se

a propriedade fosse plena, se os indivíduos pudessem fazer livre uso dos seus bens, se o estado de direito fosse plenamente assegurado, então a livre iniciativa preponderaria sobre políticas públicas, que apenas podem vicejar em territórios que se caracterizam pela precariedade da posse.

Conforme exposto no item anterior, a propriedade partiu de uma concepção coletiva, para uma ideia absoluta e individual, até uma concepção na qual, embora assegurada individualmente, deverá atender a sua função social.

Segundo André Ramos Tavares (2011, p.148) a recente relativização da

propriedade correu paralelamente com o “deslocamento do instituto do Direito privado para o Direito público”.

Aduz Ingo Wolfgang Sarlet (2007, p.4-5) que o direito de propriedade “abrange toda a sorte de direitos subjetivos privados de natureza patrimonial, o que acabou por levar à

afirmação de um conceito funcionalista da propriedade”.

Pelo exposto, percebe-se que apesar de conservar a mesma terminologia, a propriedade não conserva conteúdo idêntico ao da sua origem histórica no direito romano. Apesar de possuir os mesmos atributos a seguir descritos, de usar, gozar e dispor, as restrições e limitações ao seu exercício tendentes a coibir abusos são grande tendência.

3.3 O DIREITO DE PROPRIEDADE SEGUNDO A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1998