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Em consequência da possibilidade de ocorrência destas contaminações deliberadas à cadeia alimentar, surgiu a necessidade de criar medidas de defesa para a resolução dos problemas que destas advêm. Assim, surge o conceito de defesa alimentar, ou em inglês, food defense.

Os autores Paula Severino e Domingos Almeida, no seu livro “Food defense” definem defesa alimentar como sendo:

“o domínio da proteção do sistema alimentar que se ocupa da prevenção de adulterações ou contaminações intencionais dos alimentos que os tornem prejudiciais à saúde e que sejam motivadas ideologicamente como, por exemplo, num ato de terrorismo.” Como já referido no capítulo anterior, o prejuízo económico, a intencionalidade, a morbilidade e o alarme social são características das contaminações deliberadas dos alimentos que serão objeto da defesa alimentar. Estes atos, para além dos grupos terroristas, podem ser executados por colaboradores vingativos, por concorrentes ou até por consumidores. Este conceito pode ser simplificado ao atribuir defesa alimentar como um conjunto de esforços cujo objetivo é reduzir o risco de contaminação deliberada de géneros alimentícios por perigos para a segurança alimentar e minimizar os impactos de possíveis ocorrências (Severino & Almeida, 2017).

A Food and Drug Administration (FDA) define defesa alimentar como a proteção do fornecimento de alimentos de uma nação de atos de contaminação ou adulteração deliberados ou intencionais (Dalziel, 2009). O United States Department of Agriculture (USDA) acrescenta que é o estabelecimento de medidas e a colocação das mesmas em prática para reduzir as possibilidades de a cadeia alimentar ser contaminada intencionalmente usando agentes biológicos, químicos outras substâncias perigosas para causar dano (USDA, 2008).

Importa distinguir que a defesa alimentar atua em situações de contaminações deliberadas, mas também em situaçãoes de fraude alimentar. O que distingue estas duas situações é a motivação com que são praticadas. Enquanto que as contaminações intencionais são provocadas com o propósito de atingir populações humanas ou animais motivadas por uma ideologia, a fraude alimentar é perpretada por motivos económicos.

33 A intencionalidade é um atributo que a defesa alimentar e a fraude alimentar partilham, mas cuja motivação difere nas duas. Na figura 5, podemos ver as diferentes frentes onde pode atuar um sistema de gestão de segurança alimentar.

Figura 5 – Sistema de gestão de Segurança Alimentar nas três vertentes. Fonte: Nestlé, (2016)

A defesa alimentar e segurança alimentar são conceitos distintos. A segurança alimentar aborda a contaminação acidental de produtos alimentares durante o armazenamento e transporte e foca-se nos perigos biológicos, químicos e físicos. Esta contaminação pode ocorrer por negligência ou más práticas durante toda a cadeia produtiva. A defesa alimentar, por sua vez, aborda a contaminação intencional (USDA, 2008).

Cada um dos conceitos presentes na tabela 5, têm diferentes significado, mas todos convergem para o mesmo objetivo que é a garantia da proteção dos alimentos.

Tabela 5 – Matriz de proteção alimentar. Fonte: Severino & Almeida, (2017).

AÇÃO Involuntária Intencional M OTI V A Ç Ã O Ganho

económico Qualidade alimentar Fraude alimentar Efeito nocivo Segurança alimentar Defesa alimentar

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Defesa alimentar a nível mundial

O conceito de defesa alimentar surgiu nos Estados Unidos da América após os atentados do 11 de setembro de 2001, de forma a garantir que existiam medidas que protegessem os alimentos de atos criminosos e terroristas. Todas as IAA, incluindo empresas de produção, embalamento e armazenagem, tinham de notificar previamente o país das importações que iriam ocorrer e foram também incentivadas a implementar um plano de defesa alimentar para minimizar os riscos de ataques terroristas, contaminações deliberadas ou fraude (Severino & Almeida, 2017).

O USDA e a FDA foram pioneiras no desenvolvimento de guias com orientações de segurança e na definição de metodologias a ser implementadas num plano de defesa alimentar (USDA, 2014). Hoje, existem já softwares de suporte, recursos formativos e educativos e metodologias de análise que permitem o desenvolvimento de sistemas de gestão de defesa alimentar.

Na UE, a legislação da defesa alimentar ainda não teve um lugar bem definido. O país que mais se aproximou dos desenvolvimentos dos Estados Unidos foi o Reino Unido, ao criar e publicar a especificação técnica PAS96, Guide to Protecting and Defending

Food and Drink from Deliberate Attack, que fornece orientações para proteção dos

alimentos, pela Instituição Britânica, BSI (Severino, 2016).

Portugal apresenta-se ainda muito atrasado no que diz respeito a adoção de medidas de defesa alimentar, em comparação com os seus países vizinhos. O Governo de Portugal estabeleceu um Conceito Estratégico de Defesa Nacional, no qual estão definidos aspetos de estratégia de defesa e segurança nacional e onde reconhece que a alimentação poderá ter uma incidência estratégica, uma vez que é bastante vulnerável a atos de adulteração (Governo de Portugal, 2013). As empresas do SAA implementam normas de certificação, uma vez que lhes permite acompanhar e definir um plano específico para a defesa alimentar, para além de controlar todos os seus processos produtivos.

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Terrorismo alimentar e crime alimentar

Como referido anteriormente, não é de hoje que surgem atos de contaminação e destruição de alimentos com o objetivo de debilitar ou até provocar a morte a inimigos em guerra, ou como atos isolados de terrorismo.

Apesar desta dissertação se focar na defesa alimentar para atos de terrorismo alimentar, ou mais especificamente, agroterrorismo, importa fazer distinção entre este conceito e o de crime alimentar. No capítulo anterior, foi definido o conceito de terrorismo alimentar e agroterrorismo. Mas podemos relembrar e generalizar este termo com a definição de Weinberg (2004), que refere o terrorismo como sendo uma tática que envolve uma ameaça ou o uso da força, motivada politicamente, na qual a publicidade deste ato desempenha um papel importante. Por sua vez, crime alimentar são atos de adulteração de alimentos ou de interferência na cadeia alimentar que têm, geralmente, uma motivação económica. Como crime alimentar existem diferentes tipos como a fraude alimentar através da adulteração, contrafação, falsificação, sabotagem, entre outras (Severino & Almeida, 2017).