2 A PROVA PROCESSUAL PENAL E O VALOR DO INQUÉRITO
2.1 A Prova no Processo Penal
2.1.1 Conceito e Função da Prova
Com relação ao conceito de prova, diz-se que constitui uma atividade
probatória, isto é, o conjunto de atos praticados pelas partes, além de outras
pessoas participantes do processo, como as testemunhas, peritos, e até mesmo pelo
magistrado, quando age de ofício, buscando averiguar a verdade dos fatos e formar
sua convicção. (MIRABETE, 2003).
Atendendo-se ao resultado obtido, ou ao menos tentado, “provar” é produzir um estado de certeza, na consciência e mente do juiz, para sua convicção, a respeito da existência ou inexistência de um fato, ou da verdade ou falsidade de uma afirmação sobre uma situação de fato, que se considera de interesse para uma decisão judicial ou a solução de um processo. Levada ao processo, porém, a prova pode ser utilizada por qualquer desses sujeitos: juiz ou partes. (MIRABETE, 2003, p. 256, grifo do autor).
Pode-se dizer, de um modo amplo, que a prova é a demonstração de alguma coisa. No processo penal, ela deve ser entendida como a maneira pela qual os fatos e a responsabilidade penal do agente de um crime devem ser demonstrados [...] Logo, a prova deve-se constituir na grande preocupação das partes, já que do êxito de sua demonstração, depende o êxito de suas alegações no processo. (SILVA JÚNIOR, 2000, p. 112-113).
No ministrar de Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e
Cândido Rangel Dinamarco (2003, p. 348):
Toda pretensão prende-se a algum fato, ou fatos, em que se fundamenta. Deduzindo sua pretensão em juízo, ao autor da demanda incumbe afirmar a ocorrência do fato que lhe serve de base, qualificando-o juridicamente e dessa afirmação extraindo as conseqüências jurídicas que resultam no seu pedido de tutela jurisdicional.
Entretanto, as afirmações feitas em juízo, pelo autor podem ou não
corresponder à verdade, sendo contrárias a elas as alegações do réu, que também
podem ser verdadeiras ou não. Visando dirimir as dúvidas sobre a veracidade ou
falsidade das afirmações, buscando a prestação jurisdicional, o julgador para vê-las
resolvidas irá valer-se da prova produzida, e assim ter a certeza sobre a matéria de
fato. “A prova constitui, pois, o instrumento por meio do qual se forma a convicção do
juiz a respeito da ocorrência ou inocorrência dos fatos controvertidos no processo.”
(CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2003, p. 348).
A prova diz respeito aos fatos. Mas não a todos os fatos: não deve ser admitida a prova dos fatos notórios (conhecidos de todos), dos impertinentes (estranhos à causa), dos irrelevantes que, embora pertençam à causa, não infuem na decisão), dos incontroversos (confessados ou admitidos por ambas as partes), dos que sejam cobertos por presunção legal de existência de veracidade (CPC, art. 334) ou dos impossíveis (embora se admita a prova dos fatos improváveis). (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2003, p. 350, grifo do autor).
Nas palavras de Tourinho Filho (2002, p. 215-216, grifo do autor):
Provar é, antes de mais nada, estabelecer a existência da verdade; e as provas são os meios pelos quais se procura estabelecê-la. Entende-se também, por prova, de ordinário, os elementos produzidos pelas partes ou pelo próprio juiz, visando a estabelecer, dentro do processo, a existência de certos fatos. É o instrumento de verificação do thema probandum. Às vezes, emprega-se a palavra prova com o sentido de ação de provar. Na verdade, provar significa fazer conhecer a outros uma verdade conhecida por nós. Nós a conhecemos; os outros não. Cumpre-nos, então, se quisermos provar, isto é, se quisermos tornar conhecida de outros a verdade de que temos ciência, apresentar os necessários meios para que dela tomem conhecimento.
Para Capez (2003, p. 251, grifo do autor):
Do latim probatio, é o conjunto de atos praticados pelas partes, pelo juiz (CPP, arts. 156, 2ª parte, 209 e 234) e por terceiros (p. ex., peritos), destinados a levar ao magistrado a convicção acerca da existência ou inexistência de um fato, da falsidade ou veracidade de uma afirmação. Trata-se, portanto, de todo e qualquer meio de percepção empregado pelo homem com a finalidade de comprovar a verdade de uma alegação.
Paulo Rangel (2009, p. 419, grifo do autor):
A prova, assim, é a verificação do thema probandum e tem como principal finalidade (ou objetivo) o convencimento do juiz. Tornar os fatos, alegados pelas partes conhecidos do juiz, convencendo-o de sua veracidade. Portanto, o principal destinatário da prova é o juiz; porém, não podemos
desconsiderar que as partes são também interessadas e,
consequentemente, destinatárias indiretas das provas, a fim de que possam aceitar ou não a decisão judicial final como justa. A irresignação das partes em aceitar como expressão da verdade a decisão judicial fundamentada em determinado material probatório é que irá, em princípio, motivar o exercício ao duplo grau de jurisdição. Assim, primordialmente, as provas destinam-se ao juiz e, secundariamente, às partes.
A função da prova refere-se aos próprios fatos em si, ou seja, aquilo que deve
ser demonstrado, o fato material, considerando a autoria, circunstâncias, tanto as
objetivas como as subjetivas, de uma forma abrangente, em todos os sentidos,
visando apurar a responsabilidade penal de determinado agente, ou então, ao
contrário, demonstrar de forma inequívoca a sua inocência. (SILVA JÚNIOR, 2000).
Neste sentido, a prova não tem a finalidade única de incutir a alguém uma
sanção penal, não é ela formada com o exclusivo cunho condenatório, mas também
deve ser fomentada para apontar a inocência, e assim evitar decisões condenatórias
infundadas. (SILVA JÚNIOR, 2000).
O objetivo ou finalidade da prova é formar a convicção do juiz sobre os elementos necessários para a decisão da causa. Para julgar o litígio, precisa o juiz ficar conhecendo a existência do fato sobre o qual versa a lide. Pois bem: a finalidade da prova é tornar aquele fato conhecido do juiz, convencendo-o da sua existência. (TOURINHO FILHO, 2002, p. 216).
Como já referenciado, a prova é um direito das partes, direito esse que irá dar
vivacidade ao princípio do contraditório, e assegurar que possam ser ouvidas em
juízo e terem examinadas as suas suscitações, em suma, reclamar dos órgãos
jurisdicionais a atenta consideração aos argumentos e provas trazidos à baila
processual. (FERNANDES, 2002).
Por outra banda, como é por intermédio das provas que se busca demonstrar
a ocorrência ou inocorrência dos fatos, e dúvidas que surgem no decorrer do
processo em comparação com a verdade objetiva, tem-se entendimento que não
haveria
nenhuma
restrição
a
sua
produção,
mas
isso
demonstra-se
desaconselhável, tendo em vista aquelas obtidas por meio ilícito. (CINTRA;
GRINOVER; DINAMARCO, 2003).
A experiência indica, todavia, que não é aconselhável a total liberdade na admissibilidade dos meios de prova, ora porque não se fundam em bases cientificas suficientemente sólidas para justificar o seu acolhimento em juízo (como o chamado soro da verdade); ora porque dariam perigoso ensejo a manipulações e fraudes (é o caso da prova exclusivamente testemunhal para demonstrar a existência de contrato de certo valor para cima) [...] ora porque ofenderiam a própria dignidade de quem lhes ficassem sujeito, representando constrangimento pessoal inadmissível (é o caso da tortura, da narcoanálise, do detector de mentiras, dos estupefacientes etc.). (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2003, p. 349).
O art. 5º, LVI, da Constituição Federal dispões que: “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. Daí advém a expressão “prova proibida, defesa ou vedada”, entendendo-se como tal toda aquela que não pode ser admitida nem valorada no processo. Discute-se qual seria
o alcance da expressão “provas obtidas por meios ilícitos”. Entendemos que prova vedada ou proibida é aquela produzida em contrariedade a uma norma legal específica, e, portanto, de forma ilícita. A prova vedada comporta duas espécies distintas: (a) prova ilegítima e (b) prova ilícita. (CAPEZ, 2003, p. 253-254, grifo do autor).