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3 CONCEITOS E M ETODOLOGIA

No documento E BOOK Estudos de Paisagem Ia (páginas 110-132)

GEOM ORPHOLOGY AND CULTURAL LANDSCAPE IN SIERRA ARGA Andreia Amorim Pereira e Lúcio Cunha

3 CONCEITOS E M ETODOLOGIA

A metodologia obedeceu a duas fases sequenciais e interdependentes. A primeira consistiu na cartografia de unidades de paisagem cultural da área de estudo, sendo para tal imprescindível fixar a definição do conceito de unidade de paisagem, adotando-se a proposta por Pinto-Correia (2001): “ áreas com características relativamente homogéneas no seu interior, não por serem

exatamente iguais em toda a área, mas por terem um padrão específico que se repete e que

diferencia a unidade em causa das envolventes” . Em consonância, a identificação e delimitação

de unidades de paisagem cultural na Serra de Arga alicerçou-se na avaliação do carácter da paisagem, adaptando o método “ Landscape Character Assessment” (Swanwick et al., 2002; Swanwick, 2004), o qual define o “ caráter da paisagem” como um padrão distinto e reconhecível de elementos que ocorre de forma consistente e sistemática. Combinações específicas entre substrato geológico, formas de relevo, solos, vegetação, uso do solo, estrutura fundiária e sistema de povoamento produzem um determinado carácter de paisagem. A cartografia de unidades de paisagem cultural na Serra de Arga assentou na realização de trabalho de campo e na análise correlacionada em sistema de informação geográfica dos seguintes dados de base georreferenciados: litologia - folhas 1-C (Teixeira e Perdigão, 1962) e 5-A (M edeiros, 1970) do M apa Geológico de Portugal à escala 1: 50.000; altimetria, vetorizada a partir das folhas nº. 27, 28, 40 e 41 das cartas militares de Portugal; modelo de elevação digital do terreno e mapa de

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declives, gerados a partir da altimetria; esboço geomorfológico; carta de uso e ocupação do solo (Direção-Geral do Território, 2007) e carta do património histórico-arqueológico georreferenciado.

Numa segunda etapa, procedeu-se à análise cruzada entre o esboço geomorfológico (figura 2), a cart ografia das unidades de paisagem cultural (figura 3) e o mapa do património (figura 4), a fim de diagnosticar relações entre diferentes formas de relevo de escala intermédia e tipologias do carácter da paisagem.

4- RESULTADOS

4.1 - Interpretação geomorfológica

O esboço geomorfológico (Fig. 2) evidencia a importância da tectónica na elevação e na configuração da Serra de Arga. A Serra de Arga alicerça-se no M aciço Hespérico, sendo a orogenia alpina responsável pela sua elevação, através do rejogo dos alinhamentos de falhas tardi-hercínicas, que definem os limites setentrional e meridional. Verifica-se igualmente uma vincada expressão morfológica dos alinhamentos de falha de direção NW-SE, que traçam a delimitação oriental e ocidental da Serra. É plausível a continuidade da movimentação durante o Quaternário, por rejogo neotectónico da rede de falhas e fraturas pré-existentes, o que, para além da resistência mecânica dos granitos, contribui para explicar a conservação do vigoroso relevo da Serra de Arga.

A delimitação proposta para a Serra de Arga (Fig. 2) contempla o maciço granítico central e os terrenos metassedimentares silúricos situados a Est e do carreamento basal de Vila Verde, também designado por carreamento de Orbacém, e a Oeste do desligamento Vigo-Régua, localmente denominado por desligamento de Romarigães (Pereira, 1992). O bat ólito granítico da Serra de Arga constitui um plutonito alóctone (Pereira, 1987), de instalação diapírica (Pamplona et al., 2006), encaixando na mancha metassedimentar envolvente. Corresponde a um granito de duas micas, de grão médio a grosseiro, com fraca tendência porfiróide. Dias (1987) propõe uma idade de 305 M a para este granito. A instalação do maciço da Serra de Arga é simultânea da deformação regional compressiva com componente de cisalhamento transcorrente, tardi-D3, que ocorre no sector (Dias e Boullier, 1985). Este maciço de forma oblonga encontra-se rodeado por alinhamentos hercínicos evidenciando paralelismo relativamente ao carreamento basal de Vila Verde e ao desligamento Vigo-Régua. Na secção do

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vale do rio Âncora compreendida entre as freguesias de Orbacém e Gondar evidenciam-se igualmente áreas de deposição fluvial quaternária.

Fig. 2: Esboço Geomorfológico da Serra de Arga

4.2 - Compreender a evolução e a dinâmica da paisagem através dos vestígios histórico-arqueológicos

O património construído fornece informação significativa para a compreensão da evolução das paisagens culturais, permitindo identificar os processos históricos mais relevantes para a organização do território a nível regional.

Pelo menos oito marcos devem ser tidos em conta na evolução das paisagens agro-silvo-pastoris de média montanha no Noroeste de Portugal:

a) a revolução neolítica, considerada o primeiro grande momento da intervenção humana na paisagem como resultado da agricultura itinerante e do pastoreio (Bettencourt , 2009; Sanches, 2003; Jorge, 2000);

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b) a Idade do Bronze tardia e a Idade do Ferro, que correspondem a um período de densificação da ocupação do território e de alteração do padrão de povoamento, remodelado pelos sistemas fortificados castrejos, bem como de intensificação da humanização da paisagem, através do aumento do desmatamento das áreas de média vertente associada ao desenvolvimento de uma sociedade agro-pastoril baseada no comunitarismo (Tereso, 2013; Almeida, 2008; Silva, 1986);

c) a romanização da Península Ibérica, responsável pela ocupação das terras baixas (solos mais férteis das planícies aluviais), extensas obras de drenagem, centralização da organização administrativa do território, introdução da noção de centro urbano e do conceito de propriedade privada, bem como pela construção da principal rede de transporte terrestre (Alarcão, 1990, 1998; Almeida, 2003; Carvalho, 2008);

d) a Idade M édia com a formação do sistema senhorial relacionado com o desenvolvimento de uma nova organização social do espaço e uma reorganização administrativa ligada, em primeiro lugar, às instituições eclesiásticas (Andrade, 1997, 2001; Coelho e Homem, 1996; M at toso, 1992; 1995);

e) o desmatamento maciço induzido pela expansão da indústria naval exigida pelas descobertas marítimas portuguesas (Devy-Vareta, 1985).

f) a introdução do milho na região do M inho no século XVI, que alterou profundamente todo o sistema agrícola, transformando o campo aberto em campo fechado, modificando a importância relativa e a distribuição das culturas, bem como as estruturas agrícolas. Foi necessário construir celeiros e eiras, construir terraços agrícolas, expandir e melhorar os sistemas de irrigação e até mesmo reformular a arquitetura tradicional da casa agrícola, com a criação de áreas para secar e armazenar a grande quantidade de cereal que a nova cultura forneceu (Ribeiro, 1987);

g) a Lei do Povoamento Florestal de 1938, responsável pelo mais importante processo de mudança de paisagem desencadeado pelas políticas agroflorestais do Estado Novo (ditadura port uguesa de 1926-1974) que afetaram o Norte de Portugal, determinando a maciça florestação das áreas montanhosas, principalmente por Pinheiros. O Perímetro Florestal da Serra de Arga foi criado por decreto de 6 de março de 1940, submetendo ao regime florestal parte dos terrenos baldios dos municípios de Viana do Castelo, Paredes de Coura, Caminha, Ponte de Lima e Vila Nova de Cerveira. (Reboredo e Pais, 2014, García-M orena,

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et al., 2007, Lopes, 2011, Barros, 2013, Devy-Vareta, 1993, 2003, Baptista, 1978,

2010, Estevão, 1983).

h) o despovoamento gradual das áreas rurais desde os anos 60, causado pelos movimentos migratórios que induziram o crescente abandono da exploração e gestão das áreas agroflorestais e de pastoreio (Baptista, 2010, M eneses, 2015).

A distribuição espacial dos vestígios arqueológicos e históricos destas diferentes fases de ocupação do território na área de estudo permite compreender como a paisagem cultural foi construída e evoluiu através de uma adaptação progressiva às condições ambientais.

Fig. 3: Pat rimónio hist órico-arqueológico da Serra de Arga

4.3 - Proposta de delimitação de unidades de paisagem cultural na Serra de Arga

A delimitação cartográfica das unidades de paisagem cultural da Serra de Arga proposta na figura 4, apresentaquatro grandes unidades:

a) Unidade pastoril superior, corresponde ao núcleo granítico central que compreende o planalto de Arga, com uma altitude ent re os 700 e os 800 metros, e as vertentes circundantes que se desenvolvem até aos 500 / 400 metros, sendo

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ambas as subunidades ocupadas por pastagens de montanha pobres e vegetação arbustiva e herbácea, onde se destacam afloramentos graníticos.

b) Unidade agro-pastoril serrana, que integra diversas rechãs que se desenvolvem entre os 500 e os 300 metros de altitude. Os diferentes substratos litológicos influenciam contrastes paisagísticos significativos, quer ao nível do coberto vegetal, quer do uso cultural do solo, justificando a diferenciação de subunidades de paisagem. Nas rechãs sobre rochas granitóides prevalece o uso agropastoril, com importante presença de urzais-tojais e culturas de irrigação. Nos substratos metassedimentares, mais pobres, predominam as comunidades arbustivas xerófilas, bem como os matos degradados.

c) Unidade florestal e matos de média vertente, que se estende entre os 400 e os 200 metros de altitude, sendo constituída principalmente por povoamentos florestais de eucalipto e pinheiro, bem como por povoamentos mistos e matos arborescentes.

d) Unidade de agricultura de baixa altitude e fundo de vale, ocupando vertentes com cota inferior a 200 metros e áreas de planície aluvial. As subunidades distinguem áreas de uso agrícola sobre depressões, socalcos agro-pastoris de transição entre baixa e média vertente e as áreas agrícolas sobre solos aluvionares, onde dominam as culturas de regadio.

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4.4 - Exemplos de associação entre o carácter da paisagem e as formas de relevo intermédias

A cartografia das unidades de paisagem cultural evidencia a existência de uma forte relação com os condicionantes geomorfológicos, como será demonstrado através de um conjunt o de exemplos concretos que revelam contrastes paisagísticos influenciados quer pela variação de substrato litológico, quer por formas de relevo como planaltos, rechãs, depressões, alvéolos ou planícies aluviais.

4.4.1 - Planalto da Serra de Arga

O planalto da Serra de Arga corresponde a um nível aplanado somital que se desenvolve entre os 700 e os 800 metros de altitude. O substrato é constituído pelo designado Granito da Serra de Arga, um granito de grão grosseiro de duas micas com raros megacristais (Pereira, 1992). Este relevo de feição planáltica corresponde a um retalho soerguido da Superfície Fundamental do Soco Hercínico (Ferreira, 2004). O planalto apresenta uma grande geodiversidade, marcada pelo modelado granítico. As formas graníticas de escala intermédia ou de detalhe surgem em elevado número, seja de modo isolado ou em conjuntos coerentes. Entre as formas isoladas destacam- se os numerosos exemplos de bolas de granito, thors, castle koppies, formas em pedestal, tafoni, vascas, fendas e sulcos lineares. Evidenciam-se ainda os caos de blocos que se dispersam por toda a área planáltica.

O coberto vegetal é essencialmente constituído por turfeiras, biótopos higrófilos e cervunais. As características destas comunidades vegetais definem-se na transição entre o Pleistocénico e o Holocénico. Nesta passagem, as condições climáticas das montanhas do Noroeste Ibérico, favoráveis ao desenvolvimento de turfeiras e de comunidades arbustivas, limitaram o aumento do limite arbóreo para 700-600 metros (M orales-M olino e García-Antón, 2014; M uñoz Sobrino

et al., 2001; M uñoz Sobrino et al., 2004, M uñoz Sobrino et al., 2007, Santos, et al., 2000, Ramil-

Rego et al., 1998, M uñoz Sobrino et al., 1997). Assim, as charnecas têm sido um componente importante da paisagem natural desses territórios.

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Fig. 5: Urzal-t ojal galaico-port uguês na Serra de Arga (abril de 2013)

Durante o Neolítico tardio (finais do Vº e princípio do IVº milénio a.C.), os planaltos graníticos, que existem em grande número no Noroeste, terão sido as áreas preferencialmente escolhidas para o desenvolvimento da agricultura. Deste modo, o recuo da floresta processa-se do planalto para o vale.

Verifica-se nesta unidade a prática ancestral da pastorícia extensiva ou itinerante de gado bovino, caprino e equino. Não obstante, o excesso de pressão resultante do past oreio excessivo por garranos e gado bovino tem conduzido à perda da diversidade florística dos cervunais (Nardus stricta).

4.4.2 - Rechãs de média montanha

As principais aldeias serranas e o seu espaço agrícola adjacente desenvolvem-se, em regra, à cota dos 400 - 550 metros num nível de rechãs que corresponde a uma área de contacto litológico entre rochas granitoides e xistentas, com o afloramento de filões aplo-pegmatíticos e quartzosos.

Os núcleos rurais de Arga de S. João, Arga de Baixo, Arga de Cima e Cerquido obedecem à lógica da aglomeração do povoamento serrano e possuem habitações cuja traça respeita as

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características da arquitetura popular89, bem como diversos exemplares de espigueiros

tradicionais (Fig.s 7a e 7b). Na área envolvente das aldeias, localizam-se as parcelas de agricultura de subsistência, onde o regime de policultura se caracteriza pela conjugação das culturas permanentes e temporárias, com destaque para as hortícolas e cerealíferas. Em muitos casos, as parcelas culturais expandem-se para a base das vertentes, através de socalcos (Fig.s 6a e 6b).

Fig.s 6a e 6b: Socalcos t radicionais nas aldeias de Arga de Cima e Arga de Baixo

89 A casa agrícola t radicional do Alt o M inho, const ruída predominant ement e por granit o e carvalho, associa a habit ação familiar e as funções agrícolas. A arquit et ura vernacular dit a que as casas sejam de plant a ret angular e geralm ent e compost as por dois pisos baixos. O andar superior dest inado à habit ação geralment e possui um sobrado. O piso t érreo alberga as cort es do gado, arrumos para as alfaias agrícolas e, por vezes, o celeiro. Uma escada de pedra de um só lanço sobe ao longo da fachada at é à varanda, cobert a com alpendre, dando acesso ao sobrado. Na Serra de Arga, as varandas, para prot eger do frio, são frequent em ent e baixas e vedadas, est reit os os respiros e os post igos. cobert ura t ípica, geralment e de duas águas pouco inclinadas, é de t elha caleira ou, nos casos mais rúst icos, de colmo e giest a. À volt a da casa dispõe-se a eira, as medas ou moreias, o poço, as cort es e os inseparáveis espigueiros, frequent em ent e em granit o, seguindo o modelo da Galiza. As variações locais ao modelo da casa t ípica da região do M inho explicam-se fundament alment e por diferenças de riqueza dos propriet ários ou quest ões climát icas. Nas freguesias de Cabração, M oreira do Lima e Est orãos (Concelho de Pont e de Lima) as varandas de m adeira suport adas por pilares eram com uns. Nas aldeias da Serra de Arga, os sobrados eram mais baixos e fechados para prot eção cont ra o frio, com abert uras est reit as e janelas. (Correia, 2000; Associação dos Arquit ect os Port ugueses, 1988)

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A progressiva redução da área agrícola que atualmente se verifica abre caminho ao crescimento dos matos, frequentemente com expansão de espécies exóticas invasoras, como por exemplo a

Acácia sp.

Fig.s 7a e 7b: Espigueiro e medas em Arga de Baixo

A maioria dos solos com aptidão agrícola existentes nestas rechãs está relacionada com a erosão do granito do maciço central. Os cursos de água entalhados nas vertentes graníticas desfrutam de grande disponibilidade de material para transportar, favorecendo assim a deposição de sedimentos fluviais nas áreas de menor declive situadas a jusante, proporcionando a fertilidade dos solos. A importância do maciço granítico central da Serra de Arga enquanto área de infiltração e acumulação de água, evidencia-se através de numerosos sistemas de moinhos hidráulicos em cadeia que aproveitam pequenos ribeiros que descem as vertentes graníticas desde o planalto, destacando-se a sequência dos moinhos do Covão / Reconco e de M eijão de Água.

Verifica-se nestas rechãs o surgimento de pequenos bosques de carvalho que crescem na proximidade dos cursos de água. A investigação antracológica realizada em 15 estações arqueológicas dispersas pelo Noroeste Português, datadas de cronologias diversas - desde o Calcolítico até à Idade do Ferro, identificam dois “ componentes essenciais da cobertura vegetal

do NW, pelo menos desde a primeira metade do III ao I milénios AC. Trata-se dos carvalhos e das

fabáceas” (Figueiral e Bettencourt, 2007), correspondendo esta última à família das plantas

leguminosas, onde se incluem as giestas, o tojo e os codessos. Do género Quercus são reconhecidas as espécies Quercus robur (Carvalho alvarinho) e Quercus pyrenaica (Carvalho negral).

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A ocupação antrópica desta sequência de rechãs, documentada desde a Idade do Ferro, é influenciada não só pela existência de condições propícias à prática agrícola a nível morfológico, edáfico e de disponibilidade hídrica, bem como pela presença de jazidas minerais em Arga de Baixo, Arga de Cima e Estorãos, nos lugares de Cavalinho, Cova dos M ouros (Ouro) e Cerquido (Volfrâmio).

4.4.3 - Vale intermédio do rio Âncora

O sector intermédio do vale do rio Âncora desenvolve-se ao longo de uma ampla depressão delimitada a este pela falha de orientação NNW - SSE que se desenvolve desde o nível aplanado M ontaria - Pedras Frias (Dém), cuja altitude varia, sensivelmente, entre os 340 e os 270 metros. Os depósitos fluviais plistocénicos e holocénicos, surgem inseridos numa mancha de xistos negros, com intercalações de pelitos e psamitos.

Tendo em linha de conta a interpretação morfogenética e a classificação dos alvéolos proposta por Cordeiro (2014), que considera que as depressões alveolares podem ser encontradas em áreas de contacto entre rochas graníticas e outras litologias, surgindo frequentemente associados a corredores de erosão, defendemos que esta secção do vale do rio âncora pode ser entendida como correspondendo a um alvéolo. O alvéolo corresponde a uma área deprimida, com larguras que variam desde a centenas de metros até uma escala quilométrica, sendo predominantemente originados por erosão diferencial (Vieira, 2007).

Fig. 8: Depressão do rio Âncora ent re Gondar e Orbacém.

A ocupação desta área da Serra de Arga é testemunhada por vestígios que recuam ao Neolítico e à Idade do Ferro, tendo sido estimulada não só pelas condições favoráveis à prática agrícola, mas também pela abundância de recursos minerais.

A presença humana no Neolítico tardio é comprovada pela mamoa do Chão da Pica (datação conjuntural III milénio a.C.: Leal, 1992; Bettencourt, 2009; Direção Geral do Património Cultural,

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s/ d), localizada numa rechã da vertente que limita o sector superior do rio Âncora, em face da Estrada Nacional 305 e da Estrada M unicipal para S. Lourenço da M ontaria.

A exploração das jazidas minerais encontra-se documentada no Alto da Bouça da Breia e Folgadoiro, freguesias de Amonde e M ontaria, onde existiu uma mina romana de ouro. No limite entre Gondar e Orbacém, no lugar de S. M artinho / Fojo, verifica-se a ocorrência de estanho na veiga associada a filões aplito-pegmatíticos (Lima, 2006; Alves, 2014).

Nas vertentes que limitam o sector intermédio da planície aluvial do rio Âncora são numerosos os povoados fortificados da Idade do Ferro e os vestígios de romanização. Em Dém surge o Castro do Germano, no lugar de Boucinha do Castro, e ainda o topónimo Alto do Castro. Em Amonde, Viana do Castelo, num ponto elevado, com um excelente domínio sobre o vale do ribeiro de Amonde e a portela de acesso ao vale do rio Âncora, conhecido por Alto da Coroa, encontra-se um castro romanizado. Insere-se numa área de diversas jazidas minerais, designadamente de estanho, volfrâmio e ouro. Almeida (1996) equaciona a possibilidade deste povoado estar ligado à exploração mineira desde a época pré-romana, dada a proximidade das minas do Folgadouro (ouro e estanho) e da Bouça da Breia (ouro e estanho). Numa pequena colina na vertente do Alto das Folgueiras, junto ao vale do ribeiro de Amonde, foram encontradas tégulas em alguns muros e terrenos, vestígios que segundo Almeida (1996), poderão corresponder a um pequeno casal romano.

Almeida (1996) identifica 31 povoados castrejos na bacia terminal do rio Lima. Uma análise sumária do padrão de distribuição dos castros tradicionais (habitats defensivos, muralhados, de média vertente) nesta região mostra que sua localização não favorece as altitudes mais elevadas, mas locais com boas condições de defesa natural e bem posicionados em relação ao controlo das acessibilidades naturais. A localização dos castros tradicionais também se encontra, quase sempre, dependente da proximidade de uma linha de água e perto de áreas favoráveis à agricultura e ao pastoreio. A necessidade de terras aráveis e pastagens no território de influência de cada castro favoreceu a desflorestação, impedindo o crescimento da vegetação, mesmo a arbustiva, nas vertentes superiores das áreas montanhosas mais próximas (Almeida, 2008).

4.4.4 - Sector intermédio e final do vale da ribeira de Nogueira: vertentes ocupadas por socalcos agrícolas

A ocupação humana desta área, testemunhada por vestígios que remontam à Idade do Ferro, incluindo povoados de baixa altitude, reflete a vantagem da existência de pequenas elevações, com a proximidade de terrenos propícios à prática agrícola, quer a meia encosta, aproveitados

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através de estruturas de socalcos, quer em áreas aluvionares de fundo de vale, designadamente a nível de disponibilidade hídrica e da fertilidade dos solos.

O sector intermédio e final do vale da ribeira de Nogueira corresponde a uma área de contact o litológico entre rochas granitoides e xistentas. Na sua planície aluvial os aluviões holocénicos

No documento E BOOK Estudos de Paisagem Ia (páginas 110-132)