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3 A PERCEPÇÃO DAS ELITES SOBRE INTEGRAÇÃO REGIONAL

JORNALISTAS ONGs

5. POBREZA E A PERCEPÇÃO DAS ELITES

5.1. Conceituando Pobreza e Desigualdade

Os países sul-americanos compartilham altos níveis de pobreza e desigualdade, os quais condicionam a vida política, econômica, social e cultural da sua população, além de consistir em um dos maiores entraves para a consolidação da democracia (CIMADAMORE; CATTANI, 2007; BURCHARDT, 2012). Além disso, a região representa um dos casos mais emblemáticos dos efeitos regressivos decorrentes do alto nível de desigualdade, o qual resulta em pobreza e miséria (KLIKSBERG, 2002).

A relação entre pobreza e desigualdade, advém do fato que essas dimensões estão diretamente relacionadas pela impossibilidade de combater a pobreza sem diminuir a desigualdade elevada (CIMADAMORE; CATTANI, 2007). Ambos os fenômenos são construções sociais que se desenvolveram e consolidaram a partir de estruturas, agentes e processos e se concretizaram ao longo da história. Ademais, estão intimamente relacionados, retroalimentam-se e reproduzem-se conforme as condições políticas, econômicas e sociais que favorecem esse circuito. Ou seja, desigualdade gera pobreza quando a distribuição do estoque de recursos econômicos se traduz em um jogo de soma zero. Portanto, é impossível diminuir a pobreza sem reduzir a desigualdade.

As dimensões e as múltiplas facetas da desigualdade e pobreza afetam o desenvolvimento e futuro das sociedades sul-americanas. Além de não representar um fenômeno recente, produto das últimas décadas, a desigualdade permeou todo o decorrer da história latino-americana. Na literatura específica, a desigualdade se originou como produto da estrutura e funcionamento da economia. Desde o princípio, as estruturas produtivas da região latino-americana

se caracterizaram pela distribuição concentrada da renda, determinando os estratos específicos e privilegiados que comporiam o mercado interno (DÍAZ, 2007). Além disso, alguns especialistas indicam que as políticas neoliberais contribuíram para o aumento da desigualdade na região (HOFFMAN; CENTENO, 2004; LACLAU, 2006; VILLA; URQUIDI, 2006), afetando a recém redemocratização dos Estados latino-americanos.

O conceito mais usual para estimar pobreza, classifica como pobre uma pessoa cuja renda esteja abaixo da "linha de pobreza" ou quando sua renda não satisfaz suas necessidades primordiais. No caso de indigência, a linha reflete apenas o custo das necessidades mínimas de sobrevivência. Mais recentemente, o Banco Mundial estipulou US$ 2 dólares diários por pessoa como medida para linha de pobreza, e apenas US$ 1 dólar diário por pessoa para a linha de indigência (AGÊNCIA BRASIL, 2010). No entanto, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) utiliza outra medição, ao realizar cálculos sobre os custos da cesta básica por área geográfica para estimar a pobreza. Assim, há um questionamento amplo sobre estas medições, sendo inegável a complexidade para definir e estipular pobreza.

Nos seus estudos, Amatya Sen (2001) intenta uma melhor compreensão do termo. Segundo ele, a “linha de pobreza” não é uma medida precisa e suficiente, pois este conceito não revela o quanto é preciso agregar à renda para que os pobres tenham acesso às necessidades fundamentais e qualidade de vida. Para o autor, a pobreza consiste em um fenômeno econômico e social de séria complexidade, ao envolver inúmeras dimensões e determinantes, mas que pode ser sintetizada na “privação da liberdade humana”. Sen defende que liberdade humana consiste no objetivo principal do indivíduo, incluindo atividades sociais, econômicas e políticas (SEN, 2001):

1. poder econômico, o qual permite a sua participação no comércio e na produção, com o intuito de consumo, produção ou troca;

2. liberdade política, incluindo os direitos civis e políticos, através da livre expressão, direito de voto, de escolha e seleção dos governantes e participação política nas decisões sobre os rumos da comunidade;

3. vantagens sociais estabelecidas pela própria sociedade, além dos serviços básicos de educação e saúde. Além de serem importantes para a vida pessoal, também facilitam a participação mais efetiva nas atividades econômicas e políticas;

4. garantia de transparência, a qual inibe a corrupção, a irresponsabilidade financeira e transações ilícitas;

5. rede de segurança social que impediria o alastramento da miséria, da fome, e a morte prematura, evitando crises de fome coletiva e desemprego (SEN, 2001).

Dentro destes parâmetros, a pobreza é compreendida pelo autor não apenas como inadequação de renda, mas como privação destas capacidades, na qual a carência renda é a principal causa, embora não seja a única. Para combater as privações das capacidades fundamentais, devem-se garantir liberdades individuais substantivas, como elementos essenciais ao desenvolvimento. Assim, o crescimento econômico, como o aumento do PNB, não necessariamente implica em melhorias nas condições de vida dos indivíduos.

Além disso, para Sen (2001) não deveriam estabelecer uma linha de pobreza e aplicá-la rigidamente a toda população, sem considerar características e circunstâncias pessoais e locais. Ser pobre, não implica somente viver abaixo da linha imaginária de pobreza, mas sim, ter um nível de rendimento insuficiente para executar as funções básicas, considerando as circunstâncias e requisitos da sociedade em que está inserido. Portanto, pensar na pobreza não é supor somente a ausência de renda e riqueza, mas também reflete o acesso desigual e inexistente dessas liberdades.

Na busca de melhor compreensão sobre a produção da pobreza na América Latina, Cidamamore e Cattani (2007) defendem que a pobreza seja um fenômeno complexo em que interagem diferentes processos econômicos, sociais, políticos, culturais e étnicos, que podem ser analisados ao longo da história. Este evento é fruto da interação entre estruturas e agentes concretos que produzem e reproduzem, em diferentes níveis, as condições que geram e multiplicam a pobreza e a desigualdade.

Conforme mencionado anteriormente, na América Latina, atrelada à pobreza, está o fenômeno da desigualdade, o qual também pode ser discutido sob diferentes prismas. A desigualdade econômica caracteriza-se por aquela situação que denota diferença de renda e capacidade de consumo entre cidadãos e sociedades. A desigualdade política constitui a diferença com que se exercem os direitos políticos e o acesso ao próprio poder político. A desigualdade sociocultural representa a distinção entre os grupos humanos por etnia, gênero, ideologia, capital, cultura e status social. Tais desigualdades se relacionam e se influenciam, tornando mais complexo esse campo de análise (DÍAZ, 2007). A desigualdade impede, muitas vezes, que os indivíduos se manifestem como cidadãos com plenos direitos e de maneira igualitária no âmbito público, corroendo a inclusão social e econômica dessa população e contribuindo ao agravamento da pobreza (PNUD, 2004). Portanto, a solução da pobreza exige a diminuição da desigualdade, sobretudo econômica.

Desta forma, compreender o fenômeno da pobreza na América do Sul requer entendimento das características, condições e circunstâncias de cada sociedade que compõem a região, e também implica em desvelar as estruturas sociais e agentes que agravam o evento. Neste contexto, a superação da pobreza e desigualdade demanda medidas e políticas voltadas para este cenário, que não necessariamente são as mesmas aplicadas em outras regiões. Ao mesmo tempo, conhecer quais políticas ao possuem maior sustentação entre aqueles que estão no cume da sociedade, pode ajudar na compreensão do possível caminho que a região pode adotar.