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2 CONHECIMENTO, APRENDIZAGEM, ENSINO E SUAS ARTICULAÇÕES NA EDUCAÇÃO

2.5 PARADIGMA INTERACIONISTA

2.5.1 Concepção construtivista

Para Matui (1995, p. 32, grifos meus), “o construtivismo é um sistema de epistemologia que fundamenta a construção da mente e do conhecimento sobre bases anteriores, num processo extremamente dinâmico e reversível de equilibração majorante”.

Para o autor, os processos dinâmicos explicam a evolução cognitiva, envolvendo a

assimilação54, a acomodação55 e a equilibração56, as quais são atribuídas aos mecanismos

interativos do sujeito, considerados de origem biológica. (BRONCKART, 2006, p. 183, grifos

do autor).

Para que isso fique claro, cabe explicar que a equilibração mostra-se, para Piaget, importante, porque a aprendizagem ocorre quando acontece um conflito cognitivo. Complementam esse processo a assimilação e a acomodação. A primeira refere-se à ação do sujeito de interpretar as informações provenientes do meio, utilizando as estruturas conceituais que estão à sua disposição, o que o modifica. A segunda permite ao indivíduo adquirir novos conceitos ao modificar outros já existentes, havendo uma reinterpretação do que já era conhecido decorrente da construção de novos esquemas. Assim, os processos de

assimilação e de acomodação estão necessariamente unidos, necessitando haver equilíbrio

entre eles para resultar no progresso das estruturas cognitivas. (POZO, 1998).

Nesse sentido, Segundo Pozo (2002), valorizar o conhecimento prévio do aluno mostra-se fundamental, pois os novos conhecimentos provêm de interações entre as informações dadas e aquilo que o sujeito já sabe. Assim, para aprender, é necessário construir modelos para a interpretação de informações novas. O autor esclarece que, a partir do contato com a nova informação, o aprendiz modifica o conhecimento já adquirido, reestruturando-o e ressignificando-o. Portanto, não se trata de uma construção estática, consistindo em apenas assimilar o novo e reproduzir o conteúdo. Para Pozo,

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Destaca-se que, apesar de ser difícil classificar o pensamento de Piaget, para muitos comentaristas, ele situa-se na origem do pensamento construtivista.

54 Ocorre a incorporação e a modificação do meio ao passo que a ele o sujeito tenta adaptar-se. (DELVAL,

1997).

55 Ocorre uma modificação no próprio sujeito. (DELVAL, 1997). 56 O sujeito reorganiza o conhecimento e o modifica. (DELVAL, 1997).

não mudam os elementos isolados (estímulos e respostas), mas as estruturas de que fazem parte (teorias e modelos); enfim, não é uma mudança mecânica, e sim que requer um envolvimento ativo, baseado na reflexão e na tomada de consciência, por parte do aprendiz. (POZO, 2002, p. 50).

Para esclarecer essa questão, é possível referenciar Matui (1995), o qual recorre à Emília Ferreiro, pesquisadora argentina de forte influência piagetiana, para afirmar que os conhecimentos construídos se modificam ao longo do tempo porque, à medida que o sujeito assimila algo novo, aqueles conhecimentos anteriores, necessariamente, reconstroem-se em um movimento dinâmico. Essa reconstrução também pode ocorrer quando há a transposição daquilo que foi conhecido sobre o objeto a partir da experiência dos sentidos para o nível do raciocínio lógico. Reconstruir esse conhecer, então, permite “extrair todas as relações possíveis: de classe, seriação, causalidade e outras explicações lógicas”. (MATUI, 1995, p. 34).

Percebe-se, diante disso, que a construção do conhecimento acontece quando há interações entre “o sujeito e o objeto da aprendizagem”, isto é, para conhecer, esses elementos se pressupõem. Pelo fato de o indivíduo formar estruturas mentais lógicas, interagindo com o objeto, é possível construir os conhecimentos. Essas estruturas, explicadas por Piaget, originam-se e desenvolvem-se principalmente em dois períodos: das operações concretas e das operações formais. O primeiro compreende a etapa de formação de estruturas lógicas básicas, como “reversibilidade, conservação, classificação, seriação, número, tempo, espaço, volume etc”. No segundo, as estruturas lógico-formais são constituídas, como “combinatória, pensamento hipotético-dedutivo, dupla reversibilidade etc”. (MATUI, 1995, p. 32).

Com relação ao ensino e à aprendizagem, Matui (1995, p. 33) lembra que houve interpretações inadequadas do construtivismo. Uma delas foi o entendimento de que “construção” é o mesmo que ação. Nesse caso, o autor explica que não se pode tomar um termo como sinônimo do outro para não correr o risco de apenas “provocar atividades”, o que seria superficial. Para haver construção, é necessário, primeiramente, levar em conta que o conhecimento não é dado como pronto, imutável, mas ao contrário: está sempre sendo reelaborado. Além disso, muitos professores iniciam projetos de forma construtivista e, no andamento deles, passam a utilizar as tendências comportamentalistas, havendo, assim, uma espécie de disfarce.

Ademais, o fato de a experiência mostrar-se integrante do processo de aprender aproxima, por um lado, a teoria construtivista das posições empiristas, porém, por outro lado, há um distanciamento acentuado porque o construtivismo propõe que “a aprendizagem é sempre uma construção e não uma mera réplica da realidade” (POZO, 2002, 49).

Perraudeau (2009, p. 17) destaca que à noção convencional de construtivismo foi acrescentado o elemento social. Assim, não há mais somente foco na relação do sujeito com o meio (objetos do conhecimento), mas se aceita também a relação de interação entre um sujeito e outro como forma de favorecer a aprendizagem dos envolvidos no processo. O autor chama isso de passagem de aceitação de modelo bipolar de aprendizagem, ou seja, aquela que envolve a interação do sujeito com o objeto, para um modelo tripolar, em que é possível um sujeito interagir com outro e com o objeto. Isso parece ser significativo ao levar em conta que, no ambiente escolar, geralmente, o aluno está em contato com os outros, como colegas, professores, etc. Nas palavras de Perraudeau (2009, p. 18), ele está “inserido em um conjunto de redes interativas que facilita ou complexifica seus processos de aquisição”.

Na sequência, para sistematizar o que foi exposto, será apresentado um quadro comparativo dos paradigmas inatista, empirista e construtivista, relacionando-os a diversas variáveis. Busca-se, inclusive, estabelecer relações entre esses paradigmas e as concepções de ciência descritas.

Quadro 4 - Paradigmas do conhecimento

Variáveis Inatismo Empirismo/behaviorismo Interacionismo/construtivismo

Foco Sujeito Objeto Interação: sujeito e objeto

Conhecimento

Está no interior do sujeito. É reflexo das ideias inatas.

Está no exterior do sujeito. É produto da experiência (o sujeito é uma “tábula rasa”).

É construído a partir da interação entre sujeito e objeto. A socialização mostra-se fundamental nesse processo. Aprender É o processo de exteriorização dos conhecimentos que estão dentro do sujeito. Compreende reproduzir informações, em um processo que ocorre por meio da “transmissão” e de associações entre estímulos e respostas.

Designa, a partir de interações, internalizar informações, relacioná-las com aquilo que o sujeito já sabe, sistematizá-las, reelabora-las e, então, formar novos conceitos. Ligações teóricas Relaciona-se, sobretudo, ao pensamento de Platão (teoria da reminiscência). Conecta-se à concepção de ciência cartesiana- newtoniana, também chamada de paradigma dominante (percepção, observação, experiência). Liga-se ao paradigma emergente (visão sistêmica, complexidade, valorização do contexto sócio-histórico).

Fonte: elaborado pela autora.

Depois de descrever, brevemente, o modo com o sujeito conhece a partir dos paradigmas inatista, empirista e construtivista, passa-se a mostrar consequências geradas por essas construções nos processos de ensinar e de aprender.

2.6 ENSINAR E APRENDER

As questões relacionadas ao ensino e à aprendizagem envolvem uma amplitude de aspectos. Por exemplo, objetivar que os alunos, nas aulas de língua materna, desenvolvam habilidades de leitura e de escrita e que ampliem o léxico pressupõe auxiliá-los a apropriar-se de conhecimentos diversos, em um processo de constante aprendizagem, que pode ser formal ou informal. O presente trabalho se restringirá aos aspectos referentes ao processo formal, isto é, aquele relacionado ao ensino na escola, aprofundando a noção de ensino de língua.

Para que o professor possa atingir o objetivo anteriormente descrito, entende-se que é viável, primeiramente, refletir sobre a aprendizagem dos alunos para, então, planejar as práticas docentes, ou seja, pensar em como ensinar. Nesse sentido, Paviani (2013) afirma que, muitas vezes, os conceitos de ensinar e de aprender são entendidos como se um não estivesse vinculado ao outro, isto é, como se o ensino garantisse o aprendizado. Para a referida autora,

[...] a escola possui (a) tarefa de ensinar as novas gerações; (b) o objetivo de levá-las a aprender a vida e o mundo, a sociedade; (c) a possibilidade via formação de criar condições aos jovens e adultos de estes exercerem ocupações e profissões. Por isso, o aprender não é apenas um a posteriori do conceito de ensinar. É um conjunto de ações das práticas pedagógicas que se dão concomitantemente e num continuum. (PAVIANI, 2013, p. 28, grifos do autor).

A partir disso, entende-se que não se trata apenas de o professor ensinar, pensando, por fazer isso, ter cumprido seu papel, mas de ter o compromisso de organizar as práticas pedagógicas com vistas a auxiliar o aluno a construir conhecimentos, a apropriar-se de diversos saberes. Para tanto, parece ser importante ele ter clareza sobre o significado do

aprender e do ensinar.

Sobre essa questão, Paviani (2003, p. 15), com base no postulado de Heidegger de que ensinar trata-se de “deixar aprender”, realiza uma reflexão que parte do fato de a transição entre o ensinar e o aprender não ser “lógica nem natural”. Para o autor, a aprendizagem precisa ser assumida pelo aprendiz com seriedade e comprometimento, já que “uma informação, um conhecimento só se torna aprendizagem, um saber-fazer, ou uma competência, quando tem base na compreensão livre e voluntária daquilo que é ensinado”. (2003, p. 16).

Diante disso, o autor (2003, p. 15) conclui que “o fenômeno do aprender só pode ser determinado até certo ponto”. Por outro lado, o professor consegue ensinar de modo adequado