• Nenhum resultado encontrado

2 ABORDAGEM METODOLÓGICA

3.2 CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO INTEGRAL/EDUCAÇÃO EM TEMPO

Esta subseção traz à tona o debate teórico e conceitual acerca da educação integral/educação em tempo integral. Destacamos concepções/perspectivas de educação integral e de tempo integral, de modo que por meio dessa discussão, seja apresentado o referencial teórico referente a uma das categorias centrais da pesquisa - educação integral em tempo integral - o qual balizará as análises seguintes. A finalidade, portanto, desta subseção, é apresentar e discutir as várias concepções de educação integral/educação em tempo integral, sendo esta última referendada nas diversas visões de escola de tempo integral conhecidas no Brasil, de modo que tais perspectivas de educação integral possam auxiliar na identificação e caracterização na concepção de educação integral em tempo integral pensada para a escola pública brasileira, tendo como base de análise o Programa Mais Educação.

A subseção nº 3.1 deste relatório já demonstrou, a partir da análise de perspectivas concretas de educação integral/educação em tempo integral como é difícil e complexo definir essa temática, dada a sua manifestação e nomeação diferenciada em tempos, espaços e conjunturas também distintas. Entretanto, a etimologia e a semântica dos dois termos nos levam a uma compreensão mais original da expressão “educação integral”, o que nos faz adotar este viés como ponto de partida desta reflexão.

Segundo o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa a palavra “educação”, em latim educatione, proveniente do verbo latino educare, quer dizer ato ou efeito de educar ou educar-se; processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da criança e do ser humano em geral, visando à sua melhor integração individual e social; mais ainda: aperfeiçoamento integral de todas as faculdades humanas. Já o termo “integral”, proveniente de “íntegro”, do latim integru, quer dizer total, inteiro, global. Assim, com a conjugação semântica dos termos “educação” mais “integral” chegamos a seguinte definição para educação integral: ato ou efeito de educar, desenvolver ou aperfeiçoar o ser humano de forma total, inteira, global. Esse entendimento sobre educação integral, dentre outros, esteve e está

presente em muitas concepções e perspectivas de educação integral do nosso tempo. Os estudos realizados por Guará (2006, 2009), Cavaliere (2007) e Coelho (2009a; 2009b), acerca desse assunto, nos possibilitam conhecer e compreender, a partir da análise histórica das práticas de educação integral/educação em tempo integral e das atuais tendências desse fenômeno educativo no Brasil, várias concepções ou perspectivas de educação integral as quais serão apresentadas, neste relatório, para fins de referencial analítico do objeto de estudo em questão.

Guará (2006; 2009) concebe a educação integral no Brasil a partir de cinco perspectivas ou concepções: Educação Integral como formação integral do ser humano;

Educação Integral como articulação de saberes a partir de projetos integrados; Educação

Integral na Perspectiva de Tempo Integral, Educação Integral como ampliação da

aprendizagem e do tempo de estudo e Educação Integral x inclusão social.

Na perspectiva da ‘Educação Integral como formação integral do ser humano’ a autora afirma que

A concepção de educação integral que a associa à formação integral traz o sujeito para o centro das indagações e preocupações da educação. Agrega-se à ideia filosófica de homem integral, realçando a necessidade de desenvolvimento integrado de suas faculdades cognitivas, afetivas, corporais e espirituais, resgatando, como tarefa prioritária da educação, a formação do homem, compreendido em sua totalidade. (GUARÁ, 2006, p. 16).

Essa concepção de educação integral, em que o homem, enquanto ser uno, total, aparece no centro das atenções educativas, tem seu cerne na Paideia grega, onde se vislumbrava um ideal de formação que pudesse desenvolver os aspectos intelectuais, físicos, éticos, estéticos, dente outros, conforme afirma Coelho e Portilho (2009b, p. 90): “É importante relembrarmos que pilares sobre o sentido de formação do homem integral podem ser encontrados na paidéia (sic) grega [...]”. Tal concepção também se fez perceber no pensamento anarquista, integralista, católico e liberal do final do século XVIII às primeiras décadas do século XX. Apesar dos propósitos políticos e ideológicos desses movimentos serem diferentes um dos outros, foi no seio do pensamento e na prática educacional desses grupos que se defendeu, mais originalmente, a ideia da formação integral do homem. Considerando, ainda, o que diz Coelho e Portilho (2009b), essa ideia de formação integral do ser humano aproxima-se, também, do conceito de educação holística17 e da filosofia progressivista de Jonh Dwey e William Kilpatrick.

17 Para maiores esclarecimentos sobre o conceito de educação holística, ver YUS, Rafael. Educação Integral: uma Educação Holística para o Século XXI. Porto Alegre: Artmed, 2002.

Nessa concepção de educação integral o foco do processo formativo é o ser humano, suas várias dimensões e o caráter integrado do trabalho pedagógico, de tal modo que a escolarização deve incidir na totalidade do ser, promovendo assim, o seu desenvolvimento pleno. Conforme Maurício (2009) esta concepção de educação integral reconhece a pessoa como um todo e não como um ser fragmentado entre corpo e intelecto. A integralidade é construída por meio de diversas linguagens, em variadas atividades e circunstâncias. O desenvolvimento das múltiplas dimensões do ser humano se dá conjuntamente. Esta concepção de educação integral aposta na formação integral do indivíduo visando o seu desenvolvimento pleno, de modo que ele possa se autocompreender e compreender a sociedade na qual está inserido.

Já em relação à ‘Educação Integral como articulação de saberes a partir de projetos integrados’, Guará (2006) informa que

Algumas concepções sobre a educação integral remetem à ideia de projetos que articulam saberes em diferentes contextos, ampliando o foco do processo para a rede de espaços de aprendizagem. Isso vale tanto para os projetos de trabalho no âmbito da escola quanto para aqueles desenvolvidos em outros contextos educativos. O centro das preocupações com a aprendizagem está em permitir que as vivências e a ação pedagógica, organizada por projetos, leve a uma integração dos conhecimentos e saberes tanto da esfera acadêmica quanto da vida social. (p. 17).

Trata-se da concepção de educação integral em que os conhecimentos e saberes curriculares, bem como sua forma de organização no currículo, são os focos. A educação integral se dá, primordialmente, pela ênfase na articulação de saberes acadêmicos e comunitários, organizados sob a ótica do currículo integrado, interdisciplinar. A ideia de integralidade relaciona-se com o conceito de integração e interdisciplinaridade. A interdisciplinaridade é vista como uma possibilidade teórico-metodológica de integração da realidade fragmentada pela ciência moderna.

Uma terceira compreensão da educação integral é visualiza pela perspectiva da integração dos conhecimentos em abordagens interdisciplinares e transdisciplinares, focalizando especialmente o currículo escolar. A ênfase na articulação de conhecimentos e disciplinas que objetiva a integralização de experiências e saberes no processo educativo considera que as práticas educacionais devem abrir-se a experiências e conteúdos transversais. A interdisciplinaridade se funda na importância dada à unidade da realidade, cuja apreensão é compartimentada dentro do modelo de desenvolvimento da ciência moderna. Questionando esse paradigma que desagrega, fragmenta e formaliza os diversos campos do conhecimento em ciências específicas, estanques e sem visão de totalidade, esta concepção de educação propõe uma estreita articulação curricular que contemple o conhecimento de maneira mais abrangente, global e, portanto, integral. (IDEM, 2009, p. 70).

A concepção e prática de educação integral, nesta perspectiva, perpassam pela definição e integração dos saberes escolares, por meio de projetos integrados, necessários a uma formação mais completa possível ao ser social. Tal perspectiva de educação integral

aponta para os pensamentos educacionais de John Dewey, William Kilpatrick, Fernando Hernández , dentre outros, que defendem a organização do trabalho pedagógico e do ensino, propriamente dito, por projetos integrados. Além dessas características, enfatizam-se também a forma de organizar e desenvolver esse saber no âmbito da escola e para além dela. É nesse contexto que são defendidas as práticas curriculares ditas integradas e interdisciplinares, em espaços formais e não formais. As perspectivas atuais de educação integral, inclusive a prescrita no Programa Mais Educação, aludem a esses aspectos. Busca-se integrar no projeto pedagógico de educação integral os saberes do cotidiano familiar, do bairro ou comunidade local com os saberes escolares, acadêmicos, a serem trabalhados em projetos integrados na escola e fora desta, em espaços públicos ou privados, com possibilidades de aprendizagem.

No que tange à ‘Educação Integral na Perspectiva de Tempo Integral’ a autora pontua que a

Educação integral aparece também na perspectiva de tempo integral de atendimento de criança e jovens. Diversas experiências brasileiras de extensão da jornada escolar e de implantação de um período integral nas escolas públicas apresentam-se como propostas de educação integral. As duas experiências mais conhecidas de escola pública de tempo integral, no Brasil, são o projeto Escola classe e Escola Parque na Bahia, na década de 1950 (e, depois, no Distrito Federal), e, nos anos 1980, os Centros Integrados de Educação Pública – CIEPS, no Rio de Janeiro, cujo projeto foi repetido posteriormente nos Centros de Atenção Integral à Criança – CAIC, nos anos 1990. (GUARÁ, 2006, p. 18).

Apesar das experiências mencionadas pela autora terem surgido para dar respostas aos seus contextos sociais de origem e seus objetivos principais corresponderem ao alcance da melhoria desses cenários sociais, a característica mais marcante dessas iniciativas foi a ampliação do tempo escolar. O tempo ampliado passou a ser condição principal para o desenvolvimento do projeto de educação integral, que embora mencionasse o desenvolvimento integral do ser humano, centralizava-se em ações diversificadas de acolhimento, atendimento, atenção e proteção à criança e ao adolescente marginalizado.

Essa concepção de educação integral associada à ideia de ampliação do tempo escolar emerge, historicamente, no Brasil, com Anísio Teixeira e todo o Movimento dos Pioneiros da Educação Nova, na primeira metade do século XX. A difícil realidade social, econômica e cultural das crianças em idade escolar, a crescente urbanização e industrialização da sociedade brasileira impõem à escola novas funções e desafios, de modo que o trabalho escolar em um turno, com poucas horas, seria insuficientes para dar conta de todas as necessidades demandadas pelos estudantes. A ampliação do tempo escolar surge, então, nesse contexto, como possibilidade de dar à escola, meios de executar uma proposta político-pedagógica

comprometida, não somente com os aspectos educacionais, mas, sobretudo, com a dimensão assistencial e protetora dos estudantes.

Diferentemente dessas primeiras iniciativas de escola de tempo integral, em que o projeto de educação integral se realizava primordialmente na escola, com o tempo ampliado para esse fim, as que temos hoje no Brasil, diversificam-se. Temos escolas em que o projeto de educação integral acontece na própria escola com o tempo ampliado para poder desenvolver o referido projeto e escolas em que a educação integral é complementada em outros espaços e em tempos diferenciados.

De qualquer forma, a defesa do tempo ampliado nas propostas atuais de educação integral é uma inspiração dessas primeiras iniciativas, as quais ampliaram o tempo para dar conta de desenvolver as novas funções impostas à escola, dentre elas a função de assistência, cuidado e proteção da criança e do adolescente. Assim, a ampliação do tempo não se dá estritamente por uma questão da melhoria da qualidade da aprendizagem, como alguns tem argumentado, mas está associada ou tem acompanhado a ampliação das funções da escola, imposta pela política educacional mais ampla que, por sua vez, decorre de pressões sociais, por motivos diversificados.

A quarta perspectiva apontada por Guará (2009), ‘Educação Integral como ampliação da aprendizagem e do tempo de estudo’, é apresentada como decorrente

[...] da necessidade de expansão das experiências de aprendizagem e do tempo dedicado aos estudos pela articulação da escola com as muitas ações comunitárias que, em parceria com ela, podem compor um programa ampliado de educação no contraturno escolar, oferecendo uma diversidade de vivências dentro da rede de projetos sociais na comunidade. (p. 70-71).

Tendo como pressuposto a ideia de ter mais, diferentes e talvez melhores oportunidades de aprendizagem, a partir de um programa de atividades constituído pela parceria escola x comunidade, esta concepção de educação integral tem se configurado como uma marca das tendências atuais de educação integral no Brasil. Aprendizagem e tempo estão atrelados, ou seja, para se ter mais e novas experiências de aprendizagem é preciso estender a jornada de estudos. É preciso extrapolar o âmbito da escola e adentrar ao espaço da comunidade e da cidade, em geral, considerada como educadora por seus museus, bosques, bibliotecas, feiras, projetos, etc. Nestes termos, a integralidade corresponde à diversidade de aprendizagens vivenciadas dentro de um tempo superior ao do turno. Acredita-se que a formação integral do ser humano se dê pelas diferentes experiências de aprendizagem que o ser social venha a realizar ao longo de sua vida estudantil na escola e nos espaço de convívio, além desta. A finalidade desta perspectiva de educação integral é preparar o indivíduo para

responder aos desafios da vida social contemporânea por meio do contato com os vários saberes, conhecimentos e valores construídos socialmente e mediatizados pela escola, família, comunidade, dentre outros grupos sociais. Trata-se de aproximar a escola da vida e a vida da escola.

A quinta concepção ou perspectiva de educação integral articulada por Guará (2006, 2009) refere-se à ‘Educação integral x inclusão social’. Embora a autora utilize a expressão “inclusão social”, o sentido e fundamento dessa perspectiva encontram-se na doutrina da proteção integral da infância, especialmente de crianças, adolescentes e jovens em situação de risco e vulnerabilidade social. A educação integral, neste sentido, é compreendida pelos conceitos de formação e proteção integral. Tal perspectiva ampara-se nos marcos legais da Constituição Brasileira, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069/1990 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/1996.

A garantia legal é, portanto, uma salvaguarda relevante de promoção da equidade para os que se encontram mais prejudicados em sua cidadania, muitos dos quais também apresentam déficits de aprendizagem e vivem em famílias que não conseguem oferecer a seus filhos a atenção e a educação a que têm direito. (GUARÁ, 2009, p. 67).

A situação de pobreza geradora de vulnerabilidade social constitui, contemporaneamente, especialmente no Brasil, o cenário a partir do qual emerge essa concepção de educação integral. Acredita-se que em função da vulnerabilidade social muitas crianças têm dificuldades para manterem-se na escola e obterem sucesso escolar, tornando a pobreza um fator determinante para a melhoria da aprendizagem e para o êxito educacional dos estudantes. Em razão disso, propõe-se uma educação integral que conjugue formação e proteção integral, simultaneamente.

A população das escolas públicas que mais demandam uma educação integral é constituída, em parte, pela infanto-adolescência, cujas famílias ainda se mantêm em situação de pobreza. Por isso, a educação integral precisa ser conjugada com a proteção social, o que supõe pensar em políticas concentradas que considerem, além da educação, outras demandas dos sujeitos, sendo, a mais básica, a de uma sobrevivência digna e segura. (IDEM, 2006, p. 20).

Esta concepção de educação integral vincula-se, historicamente e, portanto, fundamenta-se, também, na concepção liberal e pragmática de educação, em que Dewey aparece como um de seus expoentes. Essa ideia de educar e proteger, ao mesmo tempo, a criança dos males provocados pelo avanço da sociedade capitalista aparece no contexto em que essa concepção educacional se fazia perceber nas experiências educativas da segunda metade do século XIX, especialmente nos Estados Unidos, conforme afirma Libâneo (2014, p. 3):

[...] Junto a isso, pedagogos mais sensíveis à precariedade das condições de trabalho passam a conceber escolas para a formação dos indivíduos em sua integralidade, para que fossem protegidos da exploração do trabalho, especialmente para proteger a infância. Para isso, seria recomendável que as crianças permanecessem o dia todo na escola, num local onde se pudesse ter aulas, mas também outras atividades de lazer, de esporte, de atividades lúdicas e artísticas, etc. A ideia era a formulação de um currículo que reproduzisse na escola a vida social, mas sem os problemas da vida social criados pela própria expansão da industrialização e as formas de exploração do trabalho. Assim é que ao longo da segunda metade do século XIX foram criadas muitas escolas de tempo integral, muitas delas no campo, onde se desenvolviam atividades sociais, desportivas, de trabalho manual, ocupações artísticas, viagens, estudos do meio.

Formar e proteger constitui, portanto, o duplo papel a ser viabilizado pelo currículo escolar nessa perspectiva de educação integral. Talvez por esse razão, as experiências de educação integral que priorizaram essa dupla finalidade, tiveram também que ampliar o tempo escolar. Atualmente essa concepção de educação integral, dentre outras, manifesta-se nas experiências brasileiras, conforme afirma Coelho (2009a) ao dizer que contemporaneamente existem várias tendências caracterizando a educação integral no Brasil. Entre elas destacam- se: a da educação x proteção; educação integral x currículo integrado e educação integral x tempo escolar. São tendências expressas em projetos e programas desenvolvidos em nível municipal, estadual e mesmo nacional, como é o caso do Programa Mais Educação.

Essas cinco concepções de educação integral destacadas por Guará (2006, 2009), reafirmam o caráter polissêmico desse fenômeno e sua relação com a sociedade e o tempo histórico onde são elaboradas e vivenciadas. São visões de homem, de sociedade e de educação diferentes, que visam responder a projetos político-sociais, filosóficos, epistemológicos e pedagógicos, também diferentes. Neste contexto, não podemos deixar de destacar, também, o papel do currículo como artefato viabilizador dessas várias concepções e perspectivas de educação integral, configurando-se, portanto, num instrumento pedagógico e político estratégico para a implementação de um tipo determinado de sociedade a que se quer formar.

Cabe destacar que muitas dessas concepções de educação integral se fizeram concretas por meio de experiências de educação integral em tempo integral, em que as escolas de tempo integral são as maiores referências. Por isso, cabe conhecer, ainda que brevemente, o estudo realizado por Cavaliere (2007) acerca das visões de escola de tempo integral, nos últimos 10 anos do século XX. Segundo a autora, pelo menos quatro concepções teórico-práticas de escola de tempo integral foram construídas no Brasil. Para ela, são projetos de escola nem sempre coesos teoricamente, ao contrário, muitos deles diluem-se e misturam-se filosoficamente. Segundo a autora, a escola de tempo integral no Brasil tem sido marcada por

visões que caracterizou como assistencialista, autoritária, democrática e multissetorial de

educação integral.

A visão “assistencialista” tem sido predominante entre os projetos de escola de tempo integral existentes no Brasil. Concebe a escola de tempo integral como uma instituição voltada aos desprivilegiados da sociedade, a qual busca suprir algum tipo de carência na formação do estudante, por meio de alguma atividade de socialização ou profissão.

A visão predominante, de cunho assistencialista, vê a escola de tempo integral como uma escola para os desprivilegiados, que deve suprir deficiências gerais da formação dos alunos; uma escola que substitui a família e onde o mais relevante não é o conhecimento e sim a ocupação do tempo e a socialização primária. Com frequência (sic), utiliza-se o termo “atendimento”. A escola não é o lugar do saber, do aprendizado, da cultura, mas um lugar onde as crianças das classes populares serão “atendidas” de forma semelhante aos “doentes”. (CAVALIERE, 2007, p. 1028- 1029).

Segundo esta visão, a escola de tempo integral volta-se, principalmente, para as crianças, adolescentes e jovens de camadas populares, com grau de cultura letrada ou formal limitado, com problemas na socialização primária, dentre outros aspectos. Busca-se, por meio dessa escola, compensar este público alvo com atividades de socialização primária que as famílias, devido sua estrutura econômica, psicológica e cultural precária, não conseguem atender. Neste sentido, a escola de tempo integral é vista como um espaço que supre as carências alimentícias, de lazer e de proteção, secundarizando a educação integral em uma perspectiva da formação e desenvolvimento global do ser humano.

Na visão “autoritária”, a escola de tempo integral reproduz, dissimuladamente, a concepção dos antigos reformatórios, frutos da delinquência juvenil. Centra-se na disciplina, na prevenção da delinquência e na formação para o trabalho.

[...] a escola de tempo integral é uma espécie de instituição de prevenção ao crime. Estar “preso” na escola é sempre melhor do que estar na rua. [...]. A ênfase está nas rotinas rígidas e é freqüente (sic) a alusão à formação para o trabalho, mesmo no