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(ferramenta da pedagogia da alternância), cujo desenvolvimento deveria selecionar uma problemática a nível local e investigar possibilidades de intervenção. Além disso, tinha que escolher em sua comunidade um diretor de tese que acompanharia o seu desenvolvimento.

Para concluir

Em geral, todas as propostas de formação (inicial e contínua) para a docência rural (ensino primário e secundário) tendem a tratar de dois aspectos:

l a organização institucional, em particular a dos pluriníveis/plurianos - nesses

modelos se aprofunda a reflexão sobre a experiência cotidiana e são analisadas propostas de ensino específicas das áreas curriculares, concebidos para a situação de níveis agrupados;

l a situação de relativo isolamento dos docentes: estabelece espaços de

trabalho compartilhado e colaborativo entre professores de várias escolas, de modo que o trabalho em equipe possa superar o habitual trabalho individual e solitário.

Em ambos os casos, não há dúvida sobre a necessidade de incluir uma aproximação gradual aos saberes universais, aos avanços tecnológicos, as atualizações disciplinares, as ideias da didática geral e das diferentes áreas disciplinares.

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ARTIGO

CONDIÇÕES NECESSÁRIAS PARA A FORMAÇÃO DOCENTE RURAL

Também há um acordo sobre as responsabilidades dos professores de adequar seu desempenho ao contexto social e local em que está localizada a escola onde trabalha, pois isso possibilita que as suas intervenções promovam as melhores condições para a aprendizagem de seus alunos.

A dificuldade está em como conseguir que os princípios gerais da ação docente encontrem formas de realização adequadas para os espaços locais onde são realizadas, especialmente quando esses espaços não foram antecipadas pelos professores e se encontram com suas características no mesmo momento de assumir a tarefa. Vale a pena aprofundar os aspectos que devem saber todos os professores – os que estão em exercício atualmente e os futuros – em relação às particularidades que pode assumir o exercício da docência, por exemplo, em:

l contextos urbanos e rurais;

l pequenas paisagens ou ilhas isoladas;

l os arredores de grandes ou pequenas cidades ou os cordões fruti-hortícolas

que recebem populações migrantes, onde se encontram alunos que vêm de diferentes regiões ou países;

l as áreas onde se localizam populações bi ou multilíngues;

l regiões ou zonas onde todos ou a maioria dos alunos são descendentes dos

povos originários.

Formação inicial

Parece necessário que, durante a formação inicial, incluam-se unidades curriculares, especialmente concebidas para o conhecimento dos domínios rurais, de suas instituições educacionais, dos modelos organizacionais próprios e de certos conteúdos específicos relacionados à realidade local. Além disso, deve-se contemplar as tecnologias da informação e da comunicação, em função das possibilidades reais de disponibilidade.

Também deve-se considerar a aproximação às características e necessidades dos alunos a nível individual e coletivo. Em todos os casos, será necessário incluir conteúdos de disciplinas afins que fornecem explicações para compreender a situação de vida das diversas comunidades rurais e as suas potencialidades. Trata- se, em síntese, de incluir como objeto de estudo a ruralidade como contexto, a organização do trabalho escolar no âmbito do plurinível e a organização institucional própria dessas escolas.

Em contextos urbanos, a incorporação progressiva dos alunos às ações docentes se realiza, efetivamente, “indo do instituto para as salas de aula da escola primária”. O desafio que aqui se coloca é o de “levar a sala de aula rural ao instituto”. Durante todo o percurso de formação, será possível incluir progressivamente alternativas

diferentes que possibilitem uma maior aproximação desde o início da formação. É possível: abordar em uma primeira instância situações didáticas prefiguradas em sala de aula dos institutos por meio de observação de vídeos, relatos e análises de experiências, estudos de casos etc., avançando para uma caracterização mais acabada da realidade específica, considerar a possibilidade de desenvolver trabalhos de campo e micro aulas até alcançar a efetiva realização de práticas em contextos reais de desempenho, partindo das instituições mais próximas dos espaços urbanos até as escolas rurais mais isoladas. Uma contribuição central será a participação de docentes em exercício, a partir de acordos explícitos ou projetos compartilhados entre o instituto superior e as escolas.

Formação em serviço

Em relação aos professores em serviço, é necessário desenvolver alternativas que possibilitem a recuperação das práticas que desenvolvem; propor a análise de seus desempenhos atuais, porque foi na prática cotidiana que tiveram de produzir conhecimentos e desenvolver estratégias próprias para resolver as situações de ensino.

É necessário avançar em níveis de conceptualização a respeito do ensino de cada uma das áreas curriculares e dos modelos de organização institucional que foram instalados localmente a partir da experiência de cada um dos docentes.

Do mesmo modo, é necessário abordar problemáticas nodais, tais como: os processos de alfabetização inicial em plurinível, ainda mais em situações de ingresso tardio; conseguir levantar a crescente complexidade no tratamento dos conteúdos recorrentes nos diversos anos de escolaridade; propiciar a construção progressiva da autonomia na aprendizagem; a utilização de materiais de desenvolvimento curricular em diversos suportes; os modos de relação com as comunidades de referência e a participação das escolas em processos de desenvolvimento local.

Para que esse aprofundamento seja possível, é necessário criar alternativas que aproximem as diferentes áreas das propostas de formação e que promovam o trabalho compartilhado dos professores de escolas próximas, para colaborar com a superação do isolamento relativo das escolas e dos professores e, progressivamente, dos alunos e das comunidades.

Exige-se: ampliar a formação dos locais de residência e de trabalho; tomar a prática cotidiana como objeto de estudo e analisar as características e condições de ensino; gerar modelos de formação para aprender fazendo e em correspondência com a prática que se promove para diferentes modelos de organização institucional. Trata-se de formar em novas ruralidades, em modelos organizacionais próprios, em alternativas didáticas especialmente concebidas para o pluriano.

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ARTIGO POLÍTICA DE EDUCAÇÃO DO CAMPO NO BRASIL FO TO : S A M A R A N U N E S

Política de Educação

do Campo no Brasil

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Desde o início dos anos 2000, tem-se buscado construir no País uma política nacional de educação do campo. Pode-se dizer que a construção desta política é resultado do processo de redemocratização instaurado no final dos anos de 1980, do crescente protagonismo dos movimentos sociais e sindicais camponeses na cena pública e da instituição de uma agenda de políticas públicas, nas diferentes áreas de governo, voltada para o desenvolvimento sustentável e solidário do campo.

É, portanto, a partir da atuação de diferentes atores sociais que a política nacional de educação do campo vem ganhando materialidade na agenda dos sistemas de ensino brasileiros. Com isso, a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, sob o regime de colaboração e no âmbito de suas respectivas competências, vêm definindo marcos jurídicos e regulatórios, bem como instituindo e desenvolvendo programas e ações voltados para a promoção da educação do campo.

Na construção destes fundamentos legais, destacam-se, em âmbito nacional, as normativas do Conselho Nacional de Educação (CNE) que orientam e dão sustentação ao conjunto de ações desenvolvidas pelos entes federados na promoção da educação do campo, a saber:

l Parecer CNE/CEB nº 36/2001 e a Resolução CNE/CEB nº 1/2002 que instituíram

as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo;

1. A educação do campo é considerada uma modalidade específica integrante da educação básica no âmbito das políticas educacionais brasileiras. A acepção desta especificidade vem sendo construída desde a década de 1980, a partir das lutas dos movimentos sociais e de suas críticas à precariedade das escolas rurais, bem como à perspectiva desenvolvimentista, assistencialista e fragmentada que caracterizava a educação rural. Educação do campo, portanto, não é o equivalente direto das escolas rurais ou daquelas que tão somente se localizam em áreas rurais, dizendo respeito às políticas de educação específicas para as escolas com projetos pedagógicos adequados às populações do campo. Sendo assim, escolas situadas em ambiente urbano, mas que atendam a estudantes do campo também podem ser consideradas escolas do campo, uma vez que se encontrem identificadas com as demandas políticas e as referências culturais das populações campesinas. Do mesmo modo, as escolas indígenas e quilombolas ofertam modalidades de educação específica, não abordadas neste texto, embora o Programa Nacional de Educação do Campo tenha buscado contemplar, em algumas de suas ações, as comunidades quilombolas.

2. Doutora em Educação. Foi conselheira do Conselho Nacional de Educação (CNE) de 2012 a 2016 e gestora no Ministério da Educação (MEC) na área das políticas de educação escolar indígena, quilombola, do campo e para as relações étnico-raciais no MEC de 2015 a 2018.

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POLÍTICA DE EDUCAÇÃO DO CAMPO NO BRASIL

l Parecer CNE/CEB nº 1/2006 que trata sobre os dias letivos para a aplicação da

Pedagogia de Alternância nos Centros Familiares de Formação por Alternância (CEFFA);

l Parecer CNE/CEB nº 3/2008 que reexamina o Parecer CNE/CEB nº 23/2007,

que trata da consulta referente às orientações para o atendimento da Educação do Campo;

l Resolução CNE/CEB nº 2/2008 que estabeleceu as diretrizes complementares,

normas e princípios para o desenvolvimento de políticas públicas de atendimento da Educação Básica do Campo.

De maneira geral, estas normativas possuem como fundamento a Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) e as diretrizes nacionais para a educação básica em todas as suas modalidades. Neste sentido, os referidos documentos constituem a base legal para a construção da política, não apenas definindo seus princípios e diretrizes, mas também normatizando suas ações.

O corpus de diplomas legais que ancoram uma política nacional de educação do campo é constituído ainda pelo Decreto nº 7.352, de 4 de novembro de 2010, que dispõe sobre a política de educação do campo, coordenada pelo Ministério da Educação (MEC), e sobre o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), de responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). O decreto busca ampliar e qualificar o atendimento educacional às populações do campo da educação básica à superior. Dentre outras coisas, traz importantes definições sobre populações do campo, educação do campo, escola do campo, definindo também seus princípios, apresentados a seguir:

l respeito à diversidade do campo em seus aspectos sociais, culturais,

ambientais, políticos, econômicos, de gênero, geracional e de raça e etnia;

l incentivo à formulação de projetos político-pedagógicos específicos para as

escolas do campo, estimulando o desenvolvimento das unidades escolares como espaços públicos de investigação e articulação de experiências e estudos direcionados para o desenvolvimento social, economicamente justo e ambientalmente sustentável, em articulação com o mundo do trabalho;

l desenvolvimento de políticas de formação de profissionais da educação para

o atendimento da especificidade das escolas do campo, considerando-se as condições concretas da produção e reprodução social da vida no campo;

l valorização da identidade da escola do campo por meio de projetos

pedagógicos com conteúdos curriculares e metodologias adequadas às reais necessidades dos alunos do campo, bem como flexibilidade na organização escolar, incluindo adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas e

l controle social da qualidade da educação escolar, mediante a efetiva

participação da comunidade e dos movimentos sociais do campo.

É estabelecido no decreto, desse modo, que a política em comento é caracterizada pela promoção de ações educativas que reconhecem as especificidades das populações do campo, sobremodo no que se refere às suas necessidades específicas de formação para um desenvolvimento sustentável e reprodução sociocultural de suas comunidades. Trata-se, então, da proposição de uma política pública alinhada a uma agenda de governo que pretendeu firmar compromissos com movimentos e grupos sociais de construção democrática marcada pelas ações de valorização das diferenças e de promoção de justiça social no enfrentamento de situações de desigualdade educacional e econômica.

Todavia, não obstante a importância da existência destes documentos que dão amparo legal para a construção da política, a sua efetivação ainda apresenta muitos desafios. Pensando nisto, o MEC, com vistas a superar a fragmentação de ações e a inexistência de algumas tidas como prioritárias, criou em 2012, o Programa Nacional de Educação do Campo (Pronacampo). Este programa foi elaborado em colaboração com o Conselho dos Secretários Estaduais de Educação (CONSED), a União dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (CONTAG), o Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST), a Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar (FETRAF), a Rede de Educação do Semi-Árido Brasileiro (RESAB), a Universidade de Brasília (UnB) e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Além destes, outros sujeitos sociais contribuíram com suas discussões e proposições.

Com vistas a atender às demandas das populações do campo, em todos os níveis e modalidades da educação, o Pronacampo teve suas ações estruturadas em quatro eixos que articulam diferentes dimensões da política proposta de educação do campo, a saber:

l Gestão e Práticas Pedagógicas;

l Formação Inicial e Continuada de Professores;

l Educação de Jovens e Adultos e Educação Profissional e l Infraestrutura Física e Tecnológica.

Estes eixos são estruturadores das ações de promoção de uma política de educação do campo por meio da sua sistematização em ações coordenadas, visando conferir a elas maior e mais efetiva institucionalidade nos sistemas de ensino ao dizer respeito às diferentes competências dos diversos atores envolvidos: secretarias e conselhos de educação, universidades, movimentos sociais e demais órgãos da sociedade civil organizada.

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POLÍTICA DE EDUCAÇÃO DO CAMPO NO BRASIL

de livros didáticos específicos, os programas de formação docente e o apoio técnico e financeiro disponibilizado às secretarias de educação dos estados, do Distrito Federal e dos municípios para iniciativas locais voltadas para a promoção da educação do campo, por meio de seus Planos de Ações Articuladas (PAR).3

No âmbito da formação merecem destaque o Programa de Apoio à Formação Superior em Licenciatura em Educação do Campo (Procampo) e a Ação Escola da Terra. O Procampo foi criado com a finalidade de ampliar o atendimento educacional nos anos finais do ensino fundamental e ensino médio nas escolas do campo. Os cursos do Procampo são ofertados pelas Instituições Públicas de Educação Superior (IPES), em períodos de alternância de estudos (Tempo Universidade e Tempo Comunidade), com habilitação multidisciplinar nas áreas de linguagens e códigos, ciências humanas, ciências da natureza, matemática e ciências agrárias. Atualmente tais cursos são ofertados por 42 IPES, com a previsão de 13.770 professores serem formados até 2020. Não obstante os esforços do MEC e das IPES, o Procampo enfrenta grandes desafios que impedem sua consolidação como, por exemplo, a falta de financiamento específico para sua manutenção e expansão, bem como a inexistência ou precariedade de infraestrutura física para seu funcionamento.

Já a Ação Escola da Terra foi criada para promover a formação continuada de professores que atuam em classes/turmas multisseriadas dos anos iniciais do ensino fundamental nas escolas do campo. Trata-se do apoio técnico e financeiro do MEC para a oferta de cursos de aperfeiçoamento de 180 horas, realizados pelas IPES em parceria com as secretarias de educação. A ação também se destina à aquisição e à distribuição de materiais didáticos pelo MEC para as escolas, bem como ao apoio às IPES para a produção de recursos didáticos conforme as especificidades formativas das populações do campo.

O Programa Nacional do Livro Didático/Campo (PNLD Campo) destina-se ao atendimento de estudantes e professores do 1º ao 5º ano do ensino fundamental com livros didáticos específicos. As obras do PNLD Campo compreendem a alfabetização matemática, letramento e alfabetização, língua portuguesa, matemática, ciências, história e geografia, integradas em coleções multisseriadas ou seriadas, disciplinares, interdisciplinares ou por área do conhecimento. Os livros serão dos estudantes e professores, sem necessidade de devolução ao final do ano letivo. Além destes livros, as escolas são contempladas também com outros materiais do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), tais como dicionários e obras complementares.

3. O PAR é um instrumento de planejamento estratégico e de gestão das políticas públicas de educação, criado em 2007, no âmbito do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), visando o cumprimento do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação a fim de se promover melhorias nos índices educacionais brasileiros. Trata-se da forma de apoio técnico e financeiro ofertado aos sistemas de ensino pelo MEC, através do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), sendo concebido como um conjunto articulado de ações para a execução de programas de manutenção e desenvolvimento da educação básica. Para mais informações, consultar o endereço http://portal.mec.gov.br/par.