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Capítulo 7 Conclusão e Perspectivas Futuras

7.1. Conclusão

O objetivo geral desse trabalho de pesquisa foi criar um modelo neurocomputacional para o Transtorno do Pânico, a partir das idéias propostas por Goddard e Charney (1997) e Windmann (1998) que se pautam na programação filogenética do sistema amidalóide como memória instintiva. Essa abordagem tem como ponto principal o papel da amígdala na geração e coordenação de funções cerebrais envolvidas com medo e ansiedade. A hipótese básica dos autores sinaliza que, erros de avaliação do sistema amidalóide, classificando estímulos não perigosos como perigosos, comprometem o estado de homeostase do organismo levando ao surgimento da sintomatologia presente na condição.

A atuação da AMD, como instrumento de defesa primitiva, e com respostas rápidas é desejável até o ponto em que não interfere no desempenho normal do organismo. Cabe ao CTX, realinhar as classificações equivocadas da AMD, reconduzindo os sistemas cognitivo e fisiológico ao equilíbrio.

A hipótese central do modelo proposto está centrada na ocorrência de um sistema amidalóide superexcitado e na incapacidade do CTX de inibir os efeitos decorrentes. Pelo fato de ser um modelo reducionista ele se mostrou bastante implementável do ponto de vista computacional.

A solução do problema envolveu a modelagem das principais estruturas envolvidas com o medo e ansiedade, que para o modelo em questão são a AMD e o CTX. A partir de propostas descritivas para o transtorno, foram criados modelos computacionais matemáticos de cada uma das partes do circuito neuronal envolvido.

Na construção do modelo foram consideradas as seguintes hipóteses:

• Estímulos grosseiramente perigosos já estão filogeneticamente pré-programados na AMD. Ou seja, a AMD possui, desde o seu desenvolvimento primitivo gravado dentro dela, alguns estímulos que são considerados perigosos (P) e outros que são considerados não perigosos (NP).

• Na dúvida, a AMD sempre classifica um estímulo como perigoso (nocivo). Assim, biologicamente, pode-se considerar que a AMD julga pelas aparências.

• É função do CTX tentar reclassificar esses estímulos, ou seja, só é perigoso o que de fato representa ameaça. Assim, é o CTX que aprende ao longo da vida a detectar o que é de fato perigoso, além das aparências dos estímulos. O papel do CTX é diferenciar aparência da realidade.

• Existe no organismo todo um controle que sinaliza se um estímulo é ou não perigoso.

Por suas características auto-organizáveis e inspiração biológica, a modelagem utilizada foi baseada em redes SOM, pois nos pareceu a solução mais indicado para o propósito do modelo. Dessa maneira, foram criadas duas redes SOM, uma para a AMD e outra para o CTX. Na rede da AMD, foram usados poucos neurônios, de maneira a refletir suas características biológicas, ou seja, um órgão primitivo, pouco discriminativo e com um mecanismo de reposta rápido. A rede do CTX foi criada com muitos neurônios, de maneira a reproduzir computacionalmente suas características, ou seja, um órgão mais moderno dentro da cadeia filogenética, mais discriminativo; porém, mais lento.

Para implementar o modelo foi montada uma estrutura composta de 3 módulos: treinamento; geração de alarmes e circuito desinibitório cortical. Os detalhes de utilização do algoritmo que implementa a estrutura estão no Apêndice-A.

O módulo de treinamento é bastante parametrizado e permitiu treinar as redes SOM considerando várias alternativas. No nosso modelo, os dados de entrada foram considerados sem normalização. Essa característica, pouco usual em redes SOM, resultou em um esforço computacional não desprezível na fase de treinamento das duas redes. No entanto, ela se mostrou necessária no momento de gerar mapas corticais mal formados, que resultam na degradação do sistema e no surgimento dos sintomas do transtorno. No treinamento das redes foram escolhidos 4 padrões para representar os estímulos de entrada, sendo 1 (um) padrão para os estímulos considerados perigosos (P) e 3 (três) para os estímulos considerados não perigosos (NP). Assim, foram geradas 4

nuvens aleatórias cada uma com 250 observações. A rede da AMD foi treinada com 100 neurônios em uma grade bidimensional (10×10) e a do CTX com 400 neurônios em uma grade (20×20).

O processo de treinamento se revelou bastante sensível a um subconjunto de parâmetros, entre eles: valor inicial da dispersão da gaussiana de treinamento; taxa de decréscimo da gaussiana; taxa de aprendizado; decréscimo da taxa de aprendizado; intervalo de atualização dos parâmetros e o número de neurônios na rede.

A qualidade do treinamento das redes da AMD e do CTX foi avaliada utilizando-se duas métricas: os testes próximos e os mapas de risco. As redes responderam como esperado, ou seja, similaridades no domínio foram mapeadas em neurônios próximos na imagem.

Após a fase de treinamento a patologia foi simulada através de treinamentos mal realizados nas redes da AMD e do CTX. A parametrização do algoritmo permitiu uma escolha adequada de valores para os parâmetros que determinam a qualidade da formação dos mapas corticais. A idéia subjacente é a de que redes mal treinadas geram sobreposição de regiões, fazendo com que, estímulos não perigosos sejam classificados como perigosos e disparem sinais de alarme inadequados.

Neste ponto da pesquisa as redes da AMD e do CTX estavam treinadas e a patologia pôde ser observada através da deterioração dos mapas gerados. No entanto, uma rede SOM não é capaz de gerar sinais de alarme necessários para o modelo em questão. A solução adotada foi a criação de um neurônio de alarme para cada uma das redes utilizando um neurônio linear. A técnica de modelagem usada consistiu em passar uma gaussiana de risco em torno do neurônio vencedor dos estímulos perigosos (P*). O valor do alarme gerado por um estímulo externo (S) foi calculado considerando dois parâmetros: o valor do risco associado ao estímulo e sua ativação. O risco é o valor da gaussiana de risco e depende da distância entre o neurônio mapeado por (S) e o centro dos estímulos perigosos (P*).

Para avaliar se os alarmes gerados pelos neurônios de saída da AMD (NSA) e do

CTX (NSC) estavam de acordo com o esperado, foram utilizados os Mapas com Alarme.

Esses mapas avaliaram duas medidas:

• se estímulos perigosos geravam alarmes maiores que estímulos não perigosos;

• se semelhanças no domínio correspondem a semelhanças na imagem;

Os testes foram realizados para redes com mapas bem formados e também para as redes com a presença da patologia (mapas mal formados). O modelo respondeu de

maneira consistente a todos os testes realizados e se credenciou para a próxima fase que envolveu a investigação de falhas nas conexões entre a AMD e o CTX.

O modelo pressupõe que a patologia pode se manifestar por defeitos neurobiológicos na AMD, no CTX ou nos dois simultaneamente. O elenco de simulações realizadas até essa fase foi capaz de corroborar essas três hipóteses. Defeitos na AMD e no CTX estão associados pelo nosso modelo a mapas mal formados, na medida que geram sobreposição de regiões e erros de classificação.

O último módulo da estrutura proposta (Circuito Desinibitório Cortical) foi construído para avaliar as conexões entre o CTX e a AMD, já que possíveis defeitos nesse segmento do circuito podem gerar a patologia. A modelagem desse circuito envolveu:

• os valores dos alarmes da AMD (SA) e do CTX (SC) gerados pelos seus respectivos

neurônios de saída (NSA e NSC);

• um neurônio Marca Passo responsável pela inibição ou desinibição da AMD; • um conjunto de parâmetros que regulam as conexões;

• os valores da gaussiana de risco (largura e altura);

Foram realizadas várias simulações para verificar se a circuitaria proposta consegue reproduzir os defeitos nas conexões entre a AMD e o CTX, e gerar os sintomas presentes no transtorno. Os resultados das simulações corroboram as hipóteses dos vários modelos descritivos propostos para o transtorno – em especial, o de Goddard e Charney, que coloca a AMD no centro de uma rede geradora de medo e ansiedade.

Assim, esse trabalho de pesquisa buscou um modelo que explica de forma integrada o Transtorno do Pânico, a partir de uma hipótese reducionista dentro do contexto de complexidade que envolve a origem da patologia. Essa complexidade foi determinante para a elaboração de uma proposta mais reducionista, de maneira que, uma primeira aproximação na tentativa de explicar o transtorno pudesse ser formalizada e implementada através de um modelo neurocomputacional para os principais mecanismos cerebrais envolvidos com o transtorno. Apesar de reducionista a hipótese é bastante racional e biologicamente plausível, permitindo explicar o transtorno tanto do ponto de vista biológico como cognitivo. O modelo de três camadas permite avaliar várias hipóteses para o desenvolvimento da condição como: a má formação dos mapas corticais obtidos a partir de redes SOM mal treinadas; a reação dos mecanismos de

defesa e resposta do organismo diante de condições de stress e também déficits biológicos na AMD, no CTX e nas suas respectivas conexões.

As simulações foram realizadas contemplando determinadas situações típicas do circuito, normalmente situações extremas de excitação ou de inibição. Nessas situações típicas foi possível observar que as reações realmente espelham neurobiológica e cognitivamente o que se lê do TP. Dessa maneira o modelo desenvolvido se coloca como uma ferramenta atraente para auxiliar no entendimento da doença.

Adicionalmente esse modelo pode ser utilizado para investigar o desenvolvimento de outros transtornos mentais relacionados à ansiedade, já que considerou uma estrutura que contempla os principais componentes do Sistema Límbico envolvidos biológica e cognitivamente com medo e ansiedade.

Dado o exposto, pode-se destacar que as principais contribuições deste trabalho incluem:

• a criação (elaboração) de um modelo neurocomputacional reducionista para o Transtorno do Pânico, envolvendo as estruturas neurobiológicas relacionadas com medo e ansiedade;

• o desenvolvimento de uma estrutura neurocomputacional amplamente parametrizada com os seguintes módulos e funcionalidades:

ƒ um algoritmo de rede SOM amplamente parametrizado e que permite a utilização de vários tipos de dados de entrada e um módulo de avaliação dos treinamentos realizados incluindo duas métricas distintas;

ƒ um módulo gerador de sinais de alerta para as redes SOM treinadas utilizando um neurônio linear a partir das gaussianas de risco;

ƒ um módulo capaz de avaliar possíveis defeitos nas conexões entre AMD e CTX (Circuito Desinibitório Cortical);

• a comprovação de que as hipóteses dos autores sobre a importância do sistema amidalóide no Transtorno do Pânico está correta;

• a ampliação da proposta dos autores em relação às possíveis causas do transtorno com a possibilidade de avaliar também defeitos no CTX e nas conexões;

• a possibilidade de avaliar outras causas para o transtorno através da manipulação dos parâmetros das gaussianas de risco. Essas causas envolvem os efeitos do nível de ansiedade (stress) no grau de excitação da rede e na intensidade do sinal de alarme tanto na AMD como no CTX;