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Capítulo 2 Transtorno do Pânico

2.3. Etiologia – Teorias

A etiologia do Transtorno do Pânico é, provavelmente, multifatorial, incluindo fatores genéticos, biológicos, cognitivo-comportamentais e psicossociais que contribuem para o aparecimento de sintomas de ansiedade, muitas vezes, durante a infância, e com manifestações variáveis durante o ciclo vital (MANFRO, 2002).

Embora uma série de autores defenda a hipótese de que o surgimento desse transtorno depende de processos mentais (cognitivos) que podem vulnerabilizar o indivíduo para uma primeira crise ou para a recidiva de crises anteriores, estudos genéticos apontam para o fato de que até 70% da variância (chance de surgimento do fenômeno) depende de fatores herdados. Estudos em familiares de primeiro grau de pacientes com TP apontam para um risco de morbidade provável de 7,7% a 20,5%, contra 0% a 4,2% dos grupos de controle. Entretanto, fatores genéticos não são suficientes para a eclosão do transtorno, uma vez que a concordância para o diagnóstico de TP em gêmeos monozigóticos é de 55% (BERNIK, 2004).

Assim, vários fatores têm sido implicados na etiologia do Transtorno do Pânico: biológicos, genéticos, psicológicos, cognitivos e ambientais (GODDARD e CHARNEY, 1997). A seguir serão vistas as principais teorias envolvidas nas hipóteses causais.

2.3.1 Teoria Neuroanatômica

Diversas evidências sugerem que o locus coeruleus (LC) está envolvido em funções complexas como aprendizado, memória, estresse e extinção de comportamentos, principalmente, pelo seu papel no processamento de múltiplas

aferências sensoriais, em especial no que diz respeito ao significado do estímulo (BALLENGER,1989).

O locus coeruleus possui cerca de 50% dos neurônios noradrenérgicos do Sistema Nervoso Central (SNC), e é responsável pela produção de até 70% de toda a noradrenalina cerebral. É ele também que provê a principal inervação noradrenérgica para os córtices cerebral e cerebelar, para o sistema límbico, tronco cerebral e várias regiões da medula. Também recebe aferências de quase todas as áreas do Sistema Nervoso Central (MACIEL, 1993 ; GORMAN et al., 2000).

Adicionalmente, sua estimulação produz quase todas as reações fisiológicas e autonômicas do pânico. O LC se conecta ao nervo vago, que se estende às regiões do tórax e do abdômen, podendo explicar a origem do mal-estar abdominal, sensação de sufocação e taquicardia, que são freqüentes nas crises de pânico. O LC está situado na ponte, que possui também amplas conexões com o Sistema Límbico (SL), onde estão localizadas as reações de medo e ansiedade. Além disso, a ponte é caracterizada por estar fora da área onde se pode exercer influência voluntária como no córtex, o que poderia explicar a origem inesperada e incontrolável das crises (MACIEL, 1993).

Apesar de a estimulação do LC levar a um comportamento de medo ou ansiedade, e sua lesão, seja anatômica ou funcional, levar a uma outra situação desse comportamento, principalmente em situações de grupo em estudos com animais, deve-se lembrar que os efeitos tidos como mediados por neurônios noradrenérgicos podem ser o resultado da alteração de outros sistemas neurotransmissores no cérebro. Em todo caso, os dados anatômicos e funcionais ressaltam a importância do LC em qualquer modelo neuroanatômico do TP pela sua localização e abrangência única de conexões (MACIEL, 1993 ; GORMAN et al., 2000).

2.3.2 TeoriaComportamental

A abordagem cognitivo-comportamental dos quadros de ansiedade nos fornece um outro modelo etiopatogênico interessante na tentativa de revolver o debate em curso. Os autores dessa orientação teórica adotam uma abordagem empírica dos fenômenos psicológicos e psicopatológicos, com ênfase na metodologia experimental. Partem do pressuposto que os processos de pensamento filtram e organizam as percepções e sua interação com os comportamentos motor e verbal (MACIEL, 1993).

Vários princípios comportamentais estão envolvidos no desenvolvimento do pânico: o condicionamento clássico, o princípio do medo do medo, a teoria da interpretação catastrófica e a sensibilidade à ansiedade (CASEY et al., 2004).

Segundo Clark (Apud Casey et al., 2004), os Ataques de Pânico são o resultado de interpretações cognitivas erradas de certas sensações corporais. Essas sensações (palpitações, falta de ar, vertigem, etc.) estariam relacionadas com respostas a um estado de ansiedade normal do indivíduo; entretanto, poderiam também ser causadas por eventos rotineiros (por exemplo, exercício físico) ou até mesmo por outros estados emocionais (por exemplo, excitação, raiva e felicidade) não relacionados com ansiedade. Porém, por um defeito de interpretação cognitiva, o indivíduo passa a perceber essas sensações, essencialmente benignas e normais, como evidência de perigo iminente (teoria da interpretação catastrófica).

No princípio do condicionamento clássico, o paciente desenvolve o medo a partir de um determinado estímulo e, sempre que é novamente exposto a esse estímulo, a recordação de medo é evocada, fazendo com que o mesmo associe a idéia do medo ao local onde se encontra.

2.3.3 Teoria Psicanalítica

A teoria psicanalítica afirma que as crises de pânico decorrem do escape de processos mentais inconscientes até então reprimidos. O modelo de Neurose de Angústia elaborado por Freud apontava para um aumento da quantidade de energia no interior do aparelho psíquico, que se traduziria diretamente em angústia ou na forma de uma excitabilidade generalizada carregada de expectativa ansiosa ou na forma de acessos de angústia. A base teórica dessa hipótese repousa na idéia de que quando existe no inconsciente um processo como uma idéia, um desejo, ou uma emoção com o qual o indivíduo não consegue lidar, as estruturas mentais trabalham de forma a manter esse processo fora da consciência do indivíduo. O surgimento da angústia se dá pela incapacidade do cérebro de realizar uma elaboração psíquica dessa quantidade de energia. Entretanto, quando esse processo é muito intenso ou quando os mecanismos de defesa enfraquecem, os elementos reprimidos podem surgir de maneira desautorizada na consciência do indivíduo por meio da crise de pânico. A mente, nesse caso, trabalha no sentido de mascarar a crise de tal forma que o indivíduo continue sem perceber conscientemente o que de fato está acontecendo.

Assim, se essa energia psíquica está recheada de sentimentos negativos ou desejos proibidos, a estrutura mental do indivíduo trabalha no sentido de mantê-los longe da consciência e reprimidos. No entanto, se apesar do esforço esses elementos negativos conseguem ultrapassar esses bloqueios, o aparato mental os transforma em outra imagem, podendo ser uma crise de pânico. Uma vez que o equilíbrio mental foi ameaçado o funcionamento mental inconsciente transforma o conteúdo da repressão numa crise de pânico (MACIEL, 1993).