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Conclusão

No documento Alentejo(s) (páginas 148-156)

DE JOSÉ RODRIGUES MIGUÉIS

3. Conclusão

DA CHARNECA ALENTEJANA À TERRA PROMETIDA 147

Onde está a «Terra de Promissão»? Para Rodrigues Miguéis, tal como para o engenheiro Sarmento, a resposta não parece encontrar-se no lugar, mas sim no tempo: a “terra do futuro” é a de um Alentejo ameno e harmó- nico, estabelecendo laços com outros lugares amenos ancestrais a que alu- dem intertextualmente: “Quisera vê-lo regado de águas cristalinas, som- breado de bosques e pomares, cortado de estradas e canais, salpicado de brancos e alegres casais, de granjas e silos, de escolas e estações agrárias, povoado e risonho, rebentando em frutos e canções” (p. 122). O romance manifesta, enfim, a virtualidade dessa paisagem, tal como constrói o mapa para a alcançar, porque a “Planície despertara por um breve instante, para logo recair no sono multissecular, talvez por muitos anos. Até que algum dia...” (p. 268).

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Notas

1 Esta designação justifica-se devido à quantidade e à qualidade das variantes que existem, confrontando-se a versão do romance publicada em folhetins com a definitiva, dada à estampa em volume. Na verdade, de acordo com Ernesto Rodrigues, «Apesar dos sobressaltos iniciais […], os 49 folhetins transcorrem quase normalmente entre 13-XI-1975 e 9-XII-1976. Porque há diferenças assinaláveis em relação ao impresso em volume, talvez não devêssemos considerar (como se generalizou) o folhetim enquanto primeira edição, mas singular ante- -texto de um gesto criador a entrever nos seus momentos mais significativos» (Rodrigues, 1998, p. 367). Para uma análise detalhada das variantes, veja-se o resultado do cotejo levado a cabo pelo mesmo ensaísta, nas partes «XVII» a «XIX» do «Apêndice» de Mágico Folhetim (Rodrigues, 1998, pp. 426-443).

2 Sobre as relações entre a dimensão romanesca e a dimensão testemunhal em O Pão não cai do Céu, veja-se o estudo de Agnès Levécot (Levécot, 2016).

opiniões coincidentes com as de Rodrigues Miguéis (facto, de resto, comprovado pelas múltiplas notas de pé de página da responsabilidade do autor). Assim, como refere Ronald W.

Sousa, em O Pão não cai do Céu “a narração é feita na terceira pessoa apoiada por um conjunto de personagens – mais especificamente José Boleto e Sarmento –, cada qual tornando-se, por vezes, o centro de consciência da obra, enquanto o narrador na terceira pessoa desempenha, nessas alturas, uma função meramente técnica de relatar os processos mentais dessa personagem.” (Sousa, 2001, pp. 81-82). Acerca da identificação de José Rodrigues Miguéis com a personagem de José Boleto, veja-se a opinião de Mário Neves (1990, pp. 87- 88). Sobre “a ligação deste romance à família de David Ferreira” vd. (Marques, 1993, p. 149).

4 Acerca do entendimento histórico-literário que Miguéis teve da República, veja-se A. P. D.

Oliveira (2018).

5 Leia-se ainda o seguinte excerto: “– Viveu sempre alheio à sorte deste povo, a quem desprezava talvez um pouco: quase um estranho. A desgraça transfigurou-o. [...] Desceu ao fundo do problema pela via do sofrimento, e voltou de lá solidarizado com o insurreccionismo latente [...]. Também pode ser que ele pense sobretudo na sua vingança pessoal: mas se esta coincide com os anseios do povo, não acha que é legítima? Todos aí lhe chamam o

“Vingador”. O povo adora-o!” (Miguéis, 1982, pp. 141-142).

6 Chega mesmo a tentar convencer a sua mulher a ultrapassar os seus medos: “Para ver se lhe tirava o medo, e talvez por amor da sua companhia, dera ultimamente em levá-la na carrinha pela charneca, onde ela esperava, transida e gelada, que ele voltasse com a carga de contrabandos finos” (Miguéis, 1982, p. 13).

7 Atestando este aspecto, vejam-se os seguintes exemplos, de natureza embora diversa: “Em novo tinha jogado a vermelhinha pelas feiras e festas, descamisando lavradores, marchantes, recoveiros, e até ciganos de verdade: mas repugnava-lhe uma arte que se nutria da cegueira, ambição e estupidez dos homens, e para mais sem perigo, que era o seu desporto e gosto. Nunca lhe tocara com um dedo, à mulher, e se não tinha as ternuras e mimos que enfraquecem e deleitam mesmo a mais retraída, não lhe faltava com amparo e carinho” (Miguéis, 1982, p. 13).

8 A representação do espaço lisboeta e citadino na obra de José Rodrigues Miguéis já foi objecto de estudo aprofundado, da autoria de Teresa Martins Marques (1994).

9 Desenvolvendo e especificando esta problemática, o ensaísta refere: “tais modificações operam-se frequentemente quer no início quer no final de certos capítulos e, sobretudo, pela ocorrência e recorrência, às vezes sistemática, de anotações ou de breves excursos formulados entre parênteses”; e acrescenta: “observar que a “voz” introduzida por estes meios parentéticos ou afins é muito amiúde a “voz” do próprio autor; e, de modo mais curioso, enquanto nas narrações na primeira pessoa essa “voz” se pretende geralmente camuflar, sentimo-la incomparavelmente mais desejosa de manifestar-se quando o recurso à terceira pessoa lhe ofereceria uma facílima camuflagem” (Mourão-Ferreira, 1989, p. 190).

10 Apontamos apenas alguns exemplos de conteúdos parentéticos: “(Foi nesta passagem, aplaudida com estrondo, que a polícia me interrompeu.)” (Miguéis, 1982, p. 26); “Muito embora as suas vitórias possam vir a ser temporárias (assim o esperamos!) e ele não possa em última análise vencer a onda democrática que percorre o mundo, o fascismo, dispondo de dinheiro, de força, dinamismo e espectaculosidade demagógica, ameaça alastrar, entrin- cheirar-se, e causar estragos talvez irreparáveis, retardando a progressão da Democracia, destruindo muitas conquistas da civilização e da cultura, e até precipitando-nos talvez em guerras sem precedentes na história”. (p. 124); “Pensando neles, na comunidade do perigo

que corriam, o engenheiro transbordava de amor e ansiedade. Que iria passar-se? que iam, que podiam eles fazer? (Que posso eu?)” (p. 236).

11 As referências a Mário de Castro no romance são duas: para além da citada neste passo, há outra, em que se refere a amizade com a personagem do engenheiro Sarmento: “Sobretudo, via nele [no Alentejo] a terra do futuro, a ‘Terra de Promissão’ como lhe chamara Mário de Castro, seu amigo” (Miguéis, 1982, p. 122). No entanto, a importância do livro deste advogado, dedicado a Afonso Duarte e precisamente intitulado Alentejo, Terra de Promissão (Castro, 1933), excede as duas ocorrências mencionadas, tal como, aliás, fica patente na explicação com que termina a «Nota do Autor»: “Devo ainda esclarecer que O Pão Não Cai do Céu está impregnado pelo pensamento político-social de Mário de Castro, autor de O Alentejo, Terra de Promissão, alentejano ilustre, conhecedor e amante da sua província, jurista de grande estatura, e teórico-praticante do Socialismo, a quem, infelizmente, uma grave doença impede agora de se manifestar” (Miguéis, 1982, p. 274). Sobre esta ligação umbilical do romance ao “ideário seareiro” e aos seus construtores, vd. Alves (2001, p. 212).

NB: O autor escreve com a ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.

CAPÍTULO 8

Ilustração de Joaquim Rosa para “Suão” (2012, pp. 12 e 13)

Foto: Albertina Raposo

Resumo

De Suão (1960) a “Suão” (2012): O clima e o ambiente eco-humano do Alentejo na ficção de dois escritores nativos

Neste capítulo abordam-se da perspetiva ecocrítica duas obras de dois escritores alentejanos: o neorrealista Antunes da Silva (1921-1997), natural de Évora (Alto Alentejo) e o nosso contemporâneo Vítor Encarnação (1965-), nascido em Ouri- que (Baixo Alentejo). Essas obras são: o romance Suão1 e o premiado conto

“Suão”. Publicados com um intervalo de meio século, ambos usam como elemento narrativo e base semântica essenciais o fenómeno climático que lhes serve de tí- tulo. O nosso objetivo é demonstrar que, para além da sua valia literária destinada a um largo público e da sua temática de cariz fortemente social, os dois textos facultam informação fidedigna sobre o ambiente climático e o património florís- tico local, assim como sobre os modelos de aproveitamento humano dos recursos naturais da região: o romance reporta-se a seis décadas do século XX e o conto aflora a evolução do quadro natural e humano desde os anos 1960 até à atualidade.

Palavras-chave: Clima. Ecocrítica. Literatura portuguesa. Antunes da Silva. Vítor Encarnação.

Abstract

From Suão (1960) to “Suão” (2012): The Climate and the ecohuman environment of Alentejo in the fiction of two native writers

This chapter assesses from an ecocritical perspective two texts by two Alentejo wri- ters: the neorealistic Antunes da Silva (1921-1997), born in Évora (Alto Alen- tejo) and our contemporary Vítor Encarnação (1965-), born in Ourique (Baixo Alen- tejo). These works are: the novel Suão and the awarded shortstory “Suão”. Published with a time gap of half a century, both include as a major narrative component and as a semantic basis the Climate phenomenon that entitles them. Our aim is to de- monstrate that, besides their remarkable literary value directed to a wide public and their strongly social theme, these literary works provide reliable information on the climatic environment and the natural botanical patrimony, as well as of the human patterns used over time to exploit the Alentejo’s natural resources: the novel refers to six decades of the XXth century and the shortstory points out the evolution of the natural and human context from the 1960’s to nowadays.

Keywords: Climate. Ecocriticism. Portuguese literature. Antunes da Silva. Vítor Encarnação.

DE SUÃO (1960) A “SUÃO” (2012): O CLIMA E O

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