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2 ESTUDOS DA TRADUÇÃO E ESTUDOS DA INTERPRETAÇÃO:

2.5 CONCLUSÃO DO CAPÍTULO

A interpretação educacional vem sendo pesquisada no âmbito de pós-graduação no Brasil desde os anos 1990, advindo principalmente da área da Educação. Porém, nos últimos anos, as pesquisas no campo dos Estudos da Tradução têm sido realizadas sob perspectivas teóricas de outros campos, outros olhares epistemológicos para enriquecer as discussões a respeito dessa temática (ALBRES; COSTA, 2019).

Consideramos que a autoria é inerente à ação de interpretar, visto que o intérprete é sujeito munido de capacidade criativa, que transcria enunciados, vivendo o dinamismo da língua na produção de sentidos. Consideramos a interpretação como uma produção única, irrepetível, fascinante e desafiadora que, manuseando a linguagem, constrói discursos a partir de discursos de outros, numa relação interlocutória e produzindo efeitos em outros espaços enunciativos (SOBRAL, 2003).

Como sujeitos sociais, situados em determinado contexto histórico, produtores e consumidores de culturas, os sujeitos que compõem a escola – espaço para ensino e aprendizagem – estão a todo instante interagindo. Nessa interação, há momentos de negociação, de impasse, de concessões e posicionamentos, aproximações e distanciamentos, em que esses sujeitos lidam com seus próprios sentidos subjetivos e dos outros sujeitos, na movimentação imposta pela convivência.

A subjetividade dos intérpretes, além de contribuir para a formação da identidade, também determina as escolhas interpretativas, desde os modos de enunciar aos itens a serem exemplificados, ou mesmo interromper a intepretação para explicar um elemento que pensa não ser de fácil entendimento para o aluno até as escolhas de supressões ou acréscimos [...]. São todas situações que envolvem o sentido sobre o ser surdo, ou seja, o aluno surdo para quem interpreta em específico, para quem dirige sua atividade (ALBRES, 2019a, p. 107).

Culminamos em processos de intersubjetividades como uma rede de dimensões humanas, as diversas formas em que se expressam os sentidos subjetivos dos sujeitos, considerando também as emoções e os processos simbólicos como fatores que implicam nas suas ações, que podem ser intencionais ou não e que não são necessariamente apenas cognitivos (MARTINÉZ; GONZÁLEZ REY, 2017, p. 54).

Buscamos contextualizar o campo dos Estudos da Tradução nesse capítulo, dialogando com o subcampo dos Estudos da Interpretação e enfatizando a interpretação de/para língua de sinais no contexto educacional. Para tal, apontamos autores e suas pesquisas que discutiram esses temas, associado principalmente às especificidades desse campo de atuação.

Trouxemos alguns conceitos da Teoria da Subjetividade de González Rey para embasar essa pesquisa, argumentando que esta teoria está concebida epistemologicamente como qualitativa, pois entende o caráter construtivo na interpretação do saber, da mesma maneira que abarca a protagonismo do pesquisador, a partir do desenvolvimento dele durante a pesquisa (GONZÁLEZ REY, 2012).

Procuramos alinhavar essa perspectiva teórica e metodológica de forma que possamos analisar os discursos dos intérpretes participantes da pesquisa não pelo viés da prática de interpretação como atividade instrumental, mas trazer à tona a individualidade desses sujeitos como agentes de sua própria história, cientes das ações que escolhem executar e das posições que tomam em seu contexto de atuação.

A fim de abarcar também o contexto educacional e levantar as questões relacionadas aos serviços ofertados para educação de surdos, expomos no capítulo a seguir, as peculiaridades e problemáticas elencadas por alguns autores, perpassando o âmbito da política educacional e linguística no Brasil, convergindo para o estado de Santa Catarina e em seguida, para o município de Florianópolis.

3 EDUCAÇÃO DE SURDOS E A EMERGÊNCIA DO INTÉRPRETE EDUCACIONAL

Neste capítulo, discorreremos sobre as principais questões que tratam sobre a educação de surdos e abordaremos como se dá a prestação desses serviços o estado de Santa Catarina e no município de Florianópolis, inter-relacionando com publicações sobre o tema, destacando o profissional intérprete educacional e as questões que circundam sua atuação.

3.1 INTRODUÇÃO

A oferta de serviços educacionais se pauta em legislações nacionais, estaduais e municipais. A respeito da educação de surdos, não há um alinhamento em termos de políticas públicas, conforme concluem pesquisas sobre o tema34. Ao analisarmos a história da educação de surdos35 no Brasil, identifica-se uma gama de desafios, em que os surdos estiveram durante muitos anos sem acesso ao sistema de ensino. Em termos históricos, o Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES, criado em 1856, no Rio de Janeiro, por iniciativa de Éduard Huet, foi a primeira escola para surdos no país tornando-se referência em relação a educação, profissionalização e socialização de surdos, segundo o site da instituição. Denominado inicialmente de Collégio Nacional para Surdos-Mudos, “tem como uma de suas atribuições regimentais subsidiar a formulação da política nacional de Educação de Surdos”, conforme corroborado por diversos documentos legais (INES, 2018).

Após a promulgação de legislações a partir dos anos 1990, iniciou-se processualmente a disponibilização de recursos para dar início à mudança dessa realidade. Contudo, “a escola que os surdos precisam, defendida no Decreto nº 5.626 [de 2005] e a escola real oferecida aos surdos ainda são bastante diferentes” (LACERDA, 2012, p. 27). Como consequência, o percurso dos sujeitos surdos na escolarização, muitas vezes, se deu em condições pouco apropriadas às singularidades linguísticas e culturais desses sujeitos.

Corroborando com a problematização elaborada por Lacerda, está a perspectiva vygotskyana de que “as funções psicológicas especificamente humanas se originam nas relações do indivíduo e seu contexto cultural e social [...]. A cultura é, portanto, parte constitutiva da natureza humana” e “se dá através da internalização dos modos historicamente determinados e culturalmente organizados” (REGO, 1997, p. 41-42).

34 As pesquisas mencionadas serão citadas e descritas no decorrer deste capítulo.

35 A Educação de Surdos compreende os serviços educacionais ofertados para alunos surdos, surdocegos e

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Consideramos importante discorrer sobre os principais documentos nacionais, pois além de serem marcos legais, constituindo uma política educacional e linguística também são norteadores para criação e implementação de políticas públicas estaduais e municipais.