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2 ANTECEDENTES: A GUERRA DE 1991 E O INÍCIO DA

2.5 CONCLUSÕES PRELIMINARES

O presente capítulo perseguiu, simultaneamente, três objetivos bastante distintos, mas interligados pela temática comum da Guerra do Iraque, quais sejam:

a) examinar as mudanças doutrinárias que condicionaram o planejamento das operações na Guerra do Iraque, que culminaram com a Transformação Militar guiada por Donald Rumsfeld;

b) determinar em que condições se encontravam o Estado iraquiano e suas capacidades militares no período que antecedeu a Guerra do Iraque; e

c) examinar o contexto político da Guerra do Iraque, qual seja o da Guerra ao Terror e da Doutrina Presidencial Bush, buscando lançar uma luz sobre os motivos que levaram os EUA ao envolvimento no Iraque.

Dessa forma, procura-se sintetizar aqui os resultados dos esforços empreendidos acima.

Dada a conjuntura pós-Vietnã, o processo de reforma do Exército (profissionalização, centralização da formulação e ensino da doutrina e mudança da

mesma) corresponderia ao primeiro movimento de transformação consciente e voluntário do Perfil de Força estadunidense: de um exército de massas, conscrito, dependente da mobilização nacional; para um Perfil de Força profissional, altamente tecnológico, mas que ainda era, em parte, dependente da logística militar tradicional. Este novo Perfil de Força entraria em combate no Iraque em 1991 – na ocasião da Guerra do Golfo, demonstrando toda a nova gama de capacidades dos EUA, à época, superpotência inconteste da arena internacional.

O Iraque, entretanto, foi extremamente debilitado na décadade1990. Isto devido aos prejuízos causados pela Guerra do Golfo de 1991 e, também, pelas sanções econômicas impostas ao país, as quais impediram sua recuperação produtiva, econômica e em termos de capacidade militar. Ademais, os anos 1990 tiveram o mérito de consolidar a controvérsia acerca das inspeções da UNSCOM na opinião pública mundial. Consequentemente, notou-se o efeito desta alegação – mesmo que de mérito disputável – na condenação ou aceitação da guerra praticada pelos EUA. Assim sendo, evidentemente, considera-se que o Iraque era um Estado ainda mais fraco no final da década do que no seu início, quando recém havia saído da confrontação de quase dez anos com o Irã. Em realidade, não se pode afirmar que sua invasão por Forças Armadas do calibre das estadunidenses constitua um feito tão glorioso.

Nesse ínterim, ganhou maior espaço no debate sobre a Grande Estratégia estadunidense a tese da Guerra de Quarta Geração de William Lind e seu entendimento da carência de uma reforma militar no país. Em conjunto com a gestão da Política Externa e de Defesa promovida pelo presidente Bush Pai, o projeto de Paul Wolfowitz traz novas adequações no plano fiscal e doutrinário. Por fim, Donald Rumsfeld concretiza a Transformação Militar das Forças Armadas dos EUA: afastando-se do Modo Americano de Fazer a Guerra de Weigley e da antiga era industrial, o governo de Bush Filho deu prioridade a um Perfil de Força mais enxuto e com maior mobilidade, adaptado às necessidades da era informacional.

É importante destacar aqui três decorrências da Doutrina Wolfowitz que se repetiriam na Doutrina Bush e, portanto, nas justificativas para a Guerra ao Terror:

a) a primeira é de que se acredita que a paz mundial será mantida através da supremacia estadunidense

b) da promoção da democracia liberal e

c) da presença militar em Bases Avançadas para atuação nas regiões. Ou seja, a paz mundial seria mantida através da disseminação das democracias

liberais, garantidas por uma força de mobilidade estratégica global para intervir em diferentes situações. Trata-se de uma perversão da Teoria da Paz Democrática de Michael Doyle (1986): assumindo-se que países democráticos não entram em guerra, o comprometimento estadunidense passa a ser com a disseminação da democracia liberal (inclusive no sentido econômico) como forma de manter a paz. Em suma, trata-se de um comprometimento com a mudança de regime de todos que não se conformarem à democracia liberal. E esta mudança de regime seria operada pelas forças de mobilidade estratégica global.

Estas forças de deslocamento contam com repercussões próprias:

a) a troca da presença em bases pela mobilidade estratégica a nível global exige que os equipamentos que acompanham a Força também sejam facilmente transportados pelo globo, implicando contingentes e equipamentos leves para que possam se deslocar com agilidade.

b) o sustento da Força pela logística tradicional passa a ter um custo muito alto (deslocamento não apenas do equipamento pelo globo, mas também do suprimento). A reposta dada a este problema veio através da utilização da

Supply Chain global como forma de sustentar as tropas, ou seja, a

terceirização da logística. Esta terceirização não implica o abandono de sua proteção, pelo contrário. Entretanto, ao invés da logística puramente militar, a Força em si não fica mais responsável pela segurança da linha de suprimentos.

c) entram para exercer esta tarefa as forças de segurança privadas, contratadas pelas próprias companhias que fazem a logística. Por mais nobre que esta tarefa seja, as Companhias Militares Privadas (PMCs, sigla em inglês de

Private Military Companies) não estão suficientemente preparadas para

exercê-la. É o que nos mostrou o exemplo de Faluja, do qual trataremos no último capítulo deste trabalho.

Assim, pretende-se ter dado conta dos dois primeiros objetivos e parcialmente do terceiro. Resta, portanto, retomar as conclusões preliminares acerca dos objetivos da Guerra do Iraque.

Viu-se acima que existem razões para suspeitar-se de uma incompatibilidade entre as razões declaradas da Guerra do Iraque – quais sejam impedir o Iraque de desenvolver armas de destruição em massa e coibir o apoio iraquiano à organizações

terroristas internacionais – e suas razões reais. Argumentou-se que o motivo não- declarado da Guerra do Iraque tenha sido o desmonte do Capitalismo Monopolista de Estado no Iraque, com o objetivo de abrir seus mercados para o investimento estadunidense.

3 A GUERRA DO IRAQUE (2003)

Este capítulo tem o objetivo de analisar o planejamento e as operações de combate da Guerra do Iraque. Deste objetivo, deriva a pergunta central que guia o capítulo: Quais as características principais do planejamento e das operações no Iraque?

Como hipótese provisória, considera-se que o planejamento para a Guerra do Iraque foi marcado pelos cortes de contingente e pela displicência com a qual foram tratadas às fases de estabilização da Guerra. As operações, de fato, foram marcadas pelo sucesso, mas contra um adversário formal em condições de extrema desvantagem tecnológico qualitativa.

É preciso destacar, desde já, que a vitória militar não se traduziu diretamente em uma vitória política estadunidense, uma vez que a fase seguinte da guerra, correspondente à estabilização e construção de um Estado iraquiano, acarretou um envolvimento custoso e prolongado aos Estados Unidos que, ao fim e ao cabo, resultou na derrota política da criação de uma ameaça terrorista ainda maior, correspondente ao Estado Islâmico.