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Capítulo I: Perspectiva histórica das reformas tributárias: a Constituição

3. Conclusões Preliminares

A partir dos anos 60, até meados dos 70, o Estado interveio fortemente na economia, no acelerado processo de desenvolvimento econômico do país, ou o chamado “milagre econômico”. Neste sentido, a concentração de recursos tributários pelo Governo Federal promoveu grandes distorções no aparelho tributário, fragilizando o orçamento de estados e municípios, que, a partir de então, tiveram seus recursos reduzidos, com a conseqüente perda de sua capacidade de gasto. Dentro deste contexto, a Reforma Tributária implantada em 1966 era utilizada como financiadora deste processo de crescimento, ajustando-se ao novo padrão de competição internacional:

Os objetivos da Reforma Tributária traziam importantes implicações, sobretudo por centralizarem, na esfera da União, as decisões a respeito do modo de aplicar os recursos estaduais e municipais, a fim de compatibilizá-los com as metas do desenvolvimento nacional. Além disso, essa centralização consubstanciava-se na transferência de alguns impostos para a competência da União, no controle sobre as alíquotas dos impostos estaduais (as alíquotas do então ICM passaram a estar subordinadas à decisão do Senado Federal) e no veto às outras esferas de governo para decretação de novos impostos. Portanto, a centralização envolvia a concentração dos recursos, da competência quanto à arrecadação e da própria administração dos recursos transferidos, em prejuízo dos estados e dos municípios que tiveram suas bases tributárias reduzidas. (BOVO, 1999, p. 69).

A Reforma Tributária representava, pois, naquele momento, um instrumento de política econômica, de forma a garantir uma maior concentração de recursos para o setor público, os quais seriam empregados em áreas que o governo central julgasse prioritárias, contribuindo, neste sentido, para o crescimento econômico do país. Entretanto, se, por um lado, tal Reforma garantia a expansão do crescimento, por outro, proporcionava a deterioração das contas de estados e municípios, o que, a longo prazo, traria implicações para o governo central, causando distúrbios no funcionamento do

Além disso, entre os anos de 1968 a 1976 os Fundos de Participação de estados e municípios foram reduzidos, promovendo uma diminuição considerável nas receitas destas esferas, uma vez que estas transferências tinham um peso significativo em seus orçamentos, principalmente em estados e municípios menos dinâmicos. Contribuiu para o agravamento da situação dos municípios, principalmente, o fato de haver um grande adensamento urbano, conseqüência das transformações ocorridas principalmente na agricultura e na indústria, o que implicava num aumento da demanda por serviços públicos13. “As despesas cresceram, sem que os municípios tivessem capacidade de

arrecadação compatível”. (BOVO, 2001, p. 72).

O II Plano Nacional de Desenvolvimento do Governo Geisel (1974-1978) aprofundou os conflitos existentes na sociedade brasileira, principalmente entre o empresariado brasileiro e o Estado autoritário, pois a estatização representava um perigo para os primeiros. O desgaste dos laços do Estado com a sociedade brasileira associado à crise econômica fortaleciam a corrente dos adeptos à volta da democracia. Concomitantemente a estes problemas, o sistema tributário que até então era utilizado para o financiamento do crescimento acelerado do país, demonstrava-se insuficiente para gerar recursos e para contribuir para tal processo.

Algumas alterações no sistema tributário começaram a ser discutidas, por iniciativa do Congresso Nacional, demonstrando a insatisfação com a centralização e com o regime autoritário. Tratam-se das Emendas Passos Porto e João Calmon. A primeira, detalhada acima, propunha o aumento da participação de estados e municípios no montante arrecadado, promovendo, desta maneira, mudanças no Federalismo. De acordo com Bovo (1999), a Emenda João Calmon, por sua vez, determinava o repasse de 13% do orçamento da União para a Educação, sendo que para os estados e municípios, o percentual foi estabelecido em 25%. Tais Emendas sinalizavam que mudanças estavam por acontecer na sociedade brasileira, que passava por um momento bastante conturbado:

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No início dos anos 70, segundo Bovo (2001), modernas indústrias começam a serem instaladas no interior, através de vários incentivos fiscais concedidos, desenvolvendo um processo de urbanização rápido e caótico. Neste sentido, estes municípios passam a, de um lado, obter crescimento pela vinda de tais indústrias, mas por outro lado, devem arcar, a partir de então, com uma demanda crescente por

O agravamento da crise financeira do Estado brasileiro, além de seus componentes políticos, passava a ser preocupante do ponto de vista social, desde que impunha limites à ação governamental. Tais limites rebatiam cada vez mais tanto na quantidade como na qualidade dos serviços públicos, reduzindo a capacidade de realização das políticas públicas. A grave crise fiscal da União implicava na recomposição de suas receitas tributárias e, por sua vez, a precária situação financeira dos estados e municípios só poderia ser revertida no âmbito de uma profunda e urgente reforma tributária que conseguisse restaurar suas finanças e repor sua autonomia, por meio da descentralização das decisões e dos recursos tributários. (BOVO, 1999, p. 79-80).

Como já ressaltado, a estrutura tributária aprovada com a Constituição de 1988, promoveu maior autonomia para estados e municípios, mas em contrapartida, não contribuiu para a configuração de um novo Federalismo. A necessidade da descentralização traduziu-se na defesa por maior participação nas receitas da União, aguçando os desequilíbrios existentes no Federalismo brasileiro, a medida em que fomentava uma repartição cada vez maior das receitas fiscais. Este processo acentuou os desequilíbrios entre as unidades federativas, uma vez que os critérios de partilha não foram alterados.

Neste sentido, entre os problemas não resolvidos pela nova Constituição, encontrava-se o da equalização fiscal, ou seja, de medidas que tinham por objetivo reduzir as desigualdades entre entidades subnacionais e entre regiões. Desigualdades que podem ser verificadas quando analisamos a distribuição dos Fundos de Participação dos estados, por exemplo. Segundo Bovo (1999), as regiões Norte, Nordeste e Centro- Oeste possuem 85% de participação neste Fundo, enquanto que o Sul e o Sudeste permanecem com 15% da participação. Os estados favorecidos com os recursos do FPE são Bahia, Ceará, Maranhão e Pernambuco, enquanto que os menores coeficientes de partilha se concentram em São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Espírito Santo. O autor fornece-nos alguns dados que nos permite uma observação profunda dos percentuais de partilha do FPE:

Em 1991, a distribuição do FPE entre as regiões era a seguinte: Norte (25,37%); Nordeste (52,46%); Centro-Oeste (7,17%); Sudeste (8,48%); e Sul (6,52%). No entanto, apenas quatro estados da região Nordeste (Bahia, Ceará, Pernambuco e Maranhão) receberam 30,4% do total. (BOVO, 1999, p. 85).

Oeste recebem, em média 51,2%, enquanto que os municípios das regiões Sudeste e Sul têm uma participação em torno de 31,3% e 12,5%, respectivamente. Além disso, os critérios para a distribuição dos recursos deste Fundo são bastante confusos, como um exemplo fornecido por Barrera e Roarelli (1995), sobre o município de Londrina, que, em 1991, contava com 389 mil habitantes e estava entre os 500 municípios mais desenvolvidos do país. Entretanto, segundo dados apresentados por estes autores, este município recebeu recursos do FPM muito superiores aos de São João do Meriti e Duque de Caxias, que são municípios mais populosos e com infra-estrutura bem inferiores aos de Londrina.

Diante destas questões e devido a estes problemas, depois de três anos da promulgação da nova Constituição, o debate sobre a necessidade de revisão das regras que norteiam o sistema tributário brasileiro ressurgiu, provando, que o mesmo necessita de algumas remodelações, a fim de encontrar o caminho para uma maior ordem fiscal no país.

Analistas apontam que alguns problemas permanecem sem solução, tais como: a União, a fim de retomar os investimentos e sanar os déficits, promove um aumento de suas dívidas, aumentando, também, seus tributos. Em contrapartida, os estados e municípios, mesmo favorecidos com a ampliação dos recursos tributários promovidos pela Constituição de 88, queixam-se de dificuldades financeiras.

No entanto, a questão do aumento de impostos é, todavia, questionável, pois o volume de impostos não está ligado a distribuição de renda. A população de baixa renda pode ser favorecida pelo aumento dos tributos, os quais permitem ao Estado ampliar os serviços públicos, favorecendo, no curto prazo, os setores de baixa renda. Se há uma redução da desigualdade, rapidamente há o aumento do consumo interno (o que eleva a produção, que gera renda, emprego e consumo, criando um círculo virtuoso já previsto por Keynes). Enfim, este é um eterno debate entre Keynesianos e Pós-Keynesianos, Liberais e Neo-Liberais.

Assim, chega-se aos anos 90 com vários conflitos regionais e locais, com conflitos entre os entes federados (a União reclamando para si a reconcentração de recursos) e com desequilíbrios financeiros entre as esferas que compõem a federação. Em meio a

idéia de Reforma Tributária encontra uma série de divergências no sentido de qual reforma se pretende alcançar. O Governo Federal e mais especificamente, a União, declaram que a elevação dos tributos, bem como sua reconcentração - descentralizada pela Constituição de 1988 -, são as melhores alternativas. Entre os empresários e contribuintes, porém, prevalece a idéia de redução da carga tributária, a fim de atrair investimentos. Estados e municípios, por sua vez, reivindicam uma melhor repartição do bolo tributário nacional, com o intuito de reduzir as desigualdades da estrutura econômico-social brasileira, marcada por intensas disparidades e heterogeneidades regionais, que influenciam, muitas vezes, a guerra fiscal entre os estados.

Observa-se, pois, que vários atores ocupam o palco onde é debatido o tema da Reforma Tributária, o qual faz emergir conflitos de natureza diversa, mas que necessita de um ponto de convergência, para que mudanças estruturais possam ocorrer, a fim de tornar o sistema mais virtuoso. A seguir, no capítulo 2, serão analisadas as questões que envolvem o Federalismo e de que maneira estas distorções contribuem para a paralisação do debate sobre a reestruturação do sistema tributário brasileiro.

Capítulo II: O Federalismo brasileiro e suas variações: a União,