• Nenhum resultado encontrado

Este trabalho teve como objetivos principais a caracterização de uma mina de turfa localizada no Estado de São Paulo, região do Vale do Rio Paraíba do Sul, e testar uma amostra representativa do seu minério, gerada através de blendagens de sub-amostras coletadas em sondagens, como adsorvente de metais pesados visando sua aplicação em processos de tratamento de efluentes líquidos.

O trabalho apresenta as principais classificações existentes para as turfas e seus depósitos – as turfeiras –, ilustradas com diversos exemplos nacionais e internacionais; propõe o agrupamento das turfeiras segundo dois critérios principais: um ecológico e outro geológico. Apresenta, adicionalmente, a tipologia dos principais depósitos brasileiros bem como um quadro atualizado de suas reservas, estimadas em 1,1.109m3, 20% das quais na categoria Medida.

A amostra representativa de turfa utilizada na experimentação é proveniente dos 2,5m mais superficiais da porção norte-ocidental do depósito de Eugênio de Melo, Estado de São Paulo. Apresentou-se como um material ácido (pH em CaCl2 = 3,82), e teor de cinzas de 18%, aqui considerado

como relativamente elevado. Reflexo deste indicador da contribuição dos constituintes inorgânicos presentes no minério, parâmetros como teor de carbono orgânico (17,6%) e CTC (34,89cmolc/kg),

importantes para a aplicação tecnológica em foco, encontraram-se em valores abaixo daqueles diagnosticados em estudos semelhantes. Também como fruto do valor obtido para o teor de cinzas, a massa específica aparente resultou bastante elevada (0,80g/cm3).

Elegeram-se como efluentes estudo de caso lixívias geradas em laboratório a partir de resíduos da mineração de sulfetos de chumbo e metais associados existentes no alto curso do Rio Ribeira de Iguape, região fronteiriça entre os estados de São Paulo e Paraná, acumulados sob a forma de extensos depósitos às margens de importantes drenagens. Estes materiais foram classificados como resíduos Classe I (perigosos), segundo metodologia preconizada pela Associação Brasileira de Normas Técnicas. Foram investigados depósitos de rejeitos da Mina do Rocha (município de Cerro Azul – PR) e de rejeitos e escórias metalúrgicas existentes na Mina de Panelas (município de Adrianópolis – PR). A possível mobilidade dos elementos químicos presentes nestes depósitos e sua eventual liberação para o ambiente foram avaliadas através de estudos granulométricos, mineralógicos e químicos em amostras provenientes de uma sondagem executada no corpo de rejeitos da Mina do Rocha. Estes estudos revelaram para o interior da coluna investigada, transformações minerais como degradação de sulfetos a sulfatos, além de neoformações, principalmente de argilominerais; degradação dos carbonatos na porção mais superior do perfil constitui indício de que a acidulação do meio encontra-se em andamento, fato que poderá gradativamente aumentar a liberação dos constituintes tóxicos para o ambiente. Esta situação é mais preocupante, em termos ambientais, no depósito de rejeitos de Panelas, cuja amostra representativa revelou pH 7,12, ao passo que o valor obtido para a amostra representativa da coluna

Análises químicas das lixívias obtidas revelaram que elas não são passíveis de descarte direto em corpos d’água: foram diagnosticados teores em Pb, Cu, Zn, Cd e Mn que suplantam os limites impostos pela legislação estadual e federal que regem a matéria.

Sendo o fenômeno adsortivo fortemente dependente do pH, o valor ideal deste parâmetro na adsorção dos metais em estudo pelas duas variedades de turfa (in natura e ativada) foi determinado como sendo 6,5.

Os dados experimentais obtidos dos ensaios de equilíbrio revelaram, através de coeficientes de correlação linear r superiores a 0,90, ajustes favoráveis ao modelo cinético de Langmuir; a variedade in natura da turfa ensaiada obteve valores de r superiores à sua congênere ativada.

A turfa in natura adsorveu, em sistemas de componente único, valores máximos de 34,00mg/g, 14,75mg/g, 7,25mg/g, 7,00mg/g e 6,00mg/g, respectivamente para Pb, Cu, Cd, Zn e Mn, definindo esta ordem de afinidade pelos metais em questão. Para a turfa ativada, os valores máximos obtidos, exceto para o Pb, situaram-se em patamares bem mais elevados: 33,75mg/g, 25,25mg/g, 17,75mg/g, 15,00mg/g e 12,75mg/g respectivamente para Pb, Cu, Mn, Cd e Zn, alterando a ordem de afinidade da variedade ativada da turfa para os 3 últimos metais da seqüência.

Em vista dos melhores valores de capacidade adsortiva obtidos, a turfa ativada foi escolhida para a realização de 5 ciclos sucessivos de contato com as lixívias.

A concentração dos contaminantes aliada à natureza do efluente, temperatura e pH foram diagnosticados como fatores de vital importância no processo de adsorção envolvendo múltiplos componentes.

Cálcio e magnésio, por se apresentarem em quantidades significativas nas lixívias, foram ensaiados em conjunto com dois dos metais em estudo - Pb e Zn - visando avaliar possível interferência no processo de adsorção destes últimos. Diagnosticou-se que a adsorção de Pb e Zn foi afetada em proporções variáveis entre 2 e 98%, conforme a quantidade de interferentes adicionada. Diagnosticou- se, também, que a temperatura de realização destes ensaios, cerca de 12ºC mais baixa que aquela em que se realizaram os ensaios de equilíbrio, propiciou um incremento na adsorção do Pb e do Zn, pela turfa ativada, de, respectivamente, 3,48% e 154,17%.

Quanto às etapas de submissão das lixívias ao contato com o adsorvente, mais de 90% do Pb e Cu presentes na lixívia do Rocha foram retidos no terceiro ciclo de contato, embora, para o Pb, o teor tolerável para descarte só tenha sido atingido no 5º ciclo. Para o caso de Panelas, embora se tenha atingido 98,15% de retenção para o Pb no 5º ciclo, o teor remanescente ficou além do permitido pela legislação de descarte. O tratamento das lixívias pela turfa ativada não conseguiu atingir os padrões exigidos pela legislação, mesmo após sua submissão a 5 ciclos de contato: os teores para Mn, no caso da mina do Rocha, e Pb, Zn e Mn para o caso da mina de Panelas, foram superiores aos valores permitidos em lei.

A turfa em análise comportou-se como um bom adsorvedor de Pb em sistema de componente único, tendo seu desempenho muito pouco prejudicado em sistemas de componentes múltiplos. Este fato foi evidenciado quando da comparação entre os níveis de saturação da turfa atingidos nos dois sistemas: para o caso da lixívia do Rocha, a saturação obtida para os 4 primeiros ciclos de contato turfa-

lixívia alcançou 82%, 35%, 78% e 89% dos índices obtidos quando da construção das isotermas; para o caso da lixívia de Panelas, a saturação obtida nos ciclos de contato foi algo mais modesta, alcançando índices, respectivamente para os ciclos 1 a 5, de 75%, 74%, 26%, 71% e 74% daqueles obtidos para as isotermas. Exceto para o 2º e 3º ciclos, respectivamente para as lixívias do Rocha e de Panelas, houve uma diminuição pouco expressiva dos índices de saturação do adsorvente para o elemento Pb quando em condições de adsorção competitiva. A mesma situação não se verificou, entretanto, para o Zn e Mn, que ocorrem de modo significativo na lixívia de Panelas.

O pior desempenho adsortivo em sistemas de componente único foi obtido para Zn e Mn. Nos sistemas multicomponentes a adsorção destes elementos, apesar de fortemente inibida, foi mais favorável quando eles se encontraram em concentrações menores em solução: os teores de 4,82mg/L para Zn e 3,87mg/L para Mn, presentes na lixívia do Rocha propiciaram níveis mais elevados de adsorção ao término do 5º ciclo (54,77% e 36,95%, respectivamente) quando comparados aos resultados obtidos para a lixívia de Panelas, onde as concentrações originais foram da ordem de 139mg/L para o Zn e 30mg/L para o Mn, com retenções de 9,35% e 13,33%, respectivamente.

Disso decorre que as possibilidades de utilização desta turfa como auxiliar na descontaminação de efluentes líquidos de componentes múltiplos deverá ser mais efetiva como etapa complementar, ou de polimento, ao tratamento de precipitação química habitualmente adotado na maioria dos processos, quando as concentrações dos constituintes tóxicos se encontrarem em patamares mais baixos que aqueles aqui considerados, preferivelmente sem ultrapassar a casa de 10mg/L.