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Confiabilidade da prova oral

1 DOS SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS E DAS PROVAS NO PROCESSO

2.3 Confiabilidade da prova oral

Inúmeros feitos são julgados com base unicamente nos depoimentos das vítimas ou das testemunhas, coligados a um sinal qualquer. A prova oral, muitas vezes, é a única a embasar não só a acusação, como a defesa, bem como também a condenação, diante da ausência de demais provas (LOPES JR, 2012).

Mendroni (2010) acredita que as provas orais detém, por sua natureza, um maior convencimento do Magistrado, em virtude de ser sempre carregada de certo teor de parcialidade. Ao passo que as ciências naturais criminais tem traçado um caminho para que cada vez mais tenhamos provas técnicas e menos provas testemunhais.

Mas ainda não pode ser dispensada tal prova, uma vez que há muitas situações que necessitam do depoimento testemunhal, para uma maior clareza acerca dos fatos, onde apenas os sentidos humanos conseguem captar e passar os detalhes do fato ocorrido.

No entanto, é necessário pensar sobre a afirmação de que um testemunho é uma prova direta, quando tenha presenciado inteiramente os fatos, ou prova indireta quando aquele depoimento decorre de uma pessoa que soube dos fatos porque uma terceira pessoa tenha presenciado e relatou.

Mendroni (2010, p. 75), tece algumas considerações acerca da prova testemunhal:

De se considerar ainda que a prova testemunhal tem valor relativo e diretamente proporcional à própria situação relatada. Por estas razões deve incumbir ao Juiz de Direito a interpretação dos testemunhos, considerando mais ou menos valiosos à comprovação de fatos e situações, conforme esteja convencido serem mais ou menos convincentes em relação às situações que destinam retratar.

Entretanto, a prova testemunhal torna-se rival da busca da verdade real no momento em que a testemunha sente-se intimidade e receosa ao depor, por algum motivo, ou até mesmo por medo de sofrer repressão por parte do acusado. Como

relata Mendroni (2010), neste ponto já não se trata de obter o depoimento com casual distorção da compreensão, mas imbuído de temeridade, seguida de distorção dos fatos de forma favorável para beneficiar o acusado que pode chegar a ser absolvido, e dessa forma a testemunha sente-se protegida de eventual repressão.

Mendroni (2010, p.76) considera a prova testemunhal como “uma prostituta das provas”, que pode incidir em versão mentirosa dos fatos, mas claro há no ordenamento jurídico mecanismos para a testemunha que praticar falso testemunho, ser processada (art. 342, Código Penal). O referido autor acredita que:

Quanto mais importante for a prova testemunhal, tanto mais difícil fazer contraprova da sua mentira, já que considerada essa situação, que ela revela-se de fato importante na causa, tanto quanto mais

raras sejam outras provas dentro do mesmo processo.

(MENDRONI, 2010, p.76).

Ou seja, se a prova testemunhal for muito importante para o deslinde da causa, percebe-se que há poucas outras provas a ser produzidas, ou ainda pode ter outras provas que se direcionem para o mesmo sentido (LOPES JR., 2012).

Diante disso, conclui-se que o processo aspira por provas técnicas, ou por provas variadas de forma que umas complementem, formando-se um argumento probatório variado e assim se possa, com maior firmeza alcançar a persuasão a respeito da demonstração da verdade real.

2.3.1 Falsas memórias

Como já referido um dos meios de provas mais utilizado no processo penal é a prova testemunhal, a qual ao mesmo tempo é perigosa, manipulável e pouco confiável. Segundo Lopes Jr. (2012, p. 670) “esse grave paradoxo agudiza a crise de confiança existente em torno do processo penal e do próprio ritual judiciário”.

Marcelo Marcante Flores (2010, p. 67) traz um significado da palavra memória:

O significado da palavra memória abrange diversos mecanismos, desde os que operam nas placas dos computadores, até a história de cada povo, país, civilização, bem como as memórias individuais dos animais e das pessoas.

A memória humana é feita, gravada e evocada por uma rede de células nervosas, sendo moduláveis pelas emoções. De acordo com Flores (2010), esta não armazena os fatos como uma filmadora, o que entra como informação não é necessariamente o que sai, o substancial pode mudar devido a diversos aspectos.

Nas palavras de Lopes Jr. (2012, p. 670), as falas memórias e mentira possuem diferenças:

As falsas memórias se diferenciam da mentira, essencialmente, porque, nas primeiras, o agente crê honestamente no que está relatando, pois a sugestão é externa (ou interna, mas inconsciente), chegando a sofrer com isso. Já a mentira é um ato consciente, em que a pessoa tem noção do seu espaço de criação e manipulação.

Tanto as falsas memórias, quanto a mentira são perigosas para a credibilidade da prova testemunhal, no entanto, as falsas memórias são consideradas mais graves, em razão de que a testemunha escorrega no imaginário, sem ter consciência.

Destaca-se que a memória do ser humano pode ser de curto ou longo prazo. A primeira envolve as informações guardadas na memória por poucos instantes. A segunda considera as informações que ficam armazenadas por mais tempo, podendo perdurar por horas, dias, anos ou mesmo décadas (FLORES, 2010).

Bernardo de Azevedo e Souza (2012, p. 04), afirma que com o passar do tempo, há uma grande tendência nas pessoas em esquecer os detalhes permanecendo apenas as lembranças do momento dramático:

Considerando que o crime gera uma emoção para quem o vivencia ou o presencia, a narrativa do fato, quando externada, será completamente deficitária, uma vez que a tendência da mente humana é guardar apenas a emoção do acontecimento. Assim,

aquilo que era importante de ser relatado no processo, em verdade, não o será, pois estará esquecido e perdido.

Assim, toda vez que uma pessoa se recorda de determinado objeto ou pessoa não está obtendo, em verdade, uma reprodução perfeita, mas uma mera interpretação.

Ainda, segundo Juciméri Silvia Machado Wilbert (2011, p.02):

O processo de falsificação da memória ocorre quando, por distintos motivos, os mecanismos de armazenamento ou recuperação falham, levando as pessoas ao erro, seja por indução de terceiros, seja por recriação fantasiosa da própria pessoa.

A qualidade e a confiabilidade da prova testemunhal são influenciadas por inúmeros fatores, como por exemplo: a mídia, o transcurso de tempo, e a metodologia de inquirição.

O transcurso do tempo tem influência com o ritmo do cotidiano, que possui ligação direta na formação da memória, uma vez que a velocidade dos acontecimentos muitas vezes não permite que os fatos sejam armazenados, o que exige acima de tudo, tempo para a materialização e posterior evocação.

Desta forma, aquele depoimento prestado na fase policial, possui uma grande validade para o deslinde do processo, uma vez que esses depoimentos são prestados logo após o momento do crime, no calor do momento, onde as testemunhas têm em sua memória todos os fatos e imagens, de como efetivamente ocorreu, não sofrendo das falsas memórias em razão do decurso de tempo. No entanto, em face de não haver contraditório15 na fase policial, ditos depoimentos devem ser apreciados com cautela pelo magistrado, pois eles terão que ser confirmados em juízo, sob o crivo do contraditório (RANGEL, 2013).

15

Acerca do contraditório a Constituição Federal prevê no inciso LV do artigo 5° que: “LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

Nesse sentido, o Magistrado não pode fundamentar sua sentença exclusivamente em elementos colhidos na investigação, devendo formar sua convicção pela livre apreciação das provas produzidas em contraditório judicial, como dispõe o art. 155 do Código de Processo Penal.

Para Souza (2012, p. 7) a metodologia da inquirição é um dos artifícios mais importantes:

A inquirição das testemunhas e das vítimas de um crime é o componente mais importante das investigações e o principal elemento de prova no processo criminal.

Assim, para que não ocorra um prejuízo nos depoimentos prestados pelas testemunhas, o processo penal se utiliza de alguns mecanismos de controle das regras de produção de provas, como o contraditório.

Ainda, tem a mídia ao expor sua opinião pode confundir a testemunha sobre aquilo que realmente entendeu no momento do crime. Uma vez que quanto mais passar o tempo, maior pode ser a contaminação da testemunha.

Souza (2012, p. 14) acredita que:

Diante da inviabilidade de solução das falsas memórias, bem como da impossibilidade de abandonar completamente a utilização da prova testemunhal no âmbito do processo penal brasileiro, o que se busca, no mínimo, são medidas de redução de danos, com a finalidade de aprimorar o conjunto probatório constante no processo e, da mesma forma, evitar contaminações nos depoimentos.

Algumas dessas medidas acima referidas, segundo Souza (2012) seria a colheita da prova em um prazo razoável, a adoção de técnicas de interrogatório e entrevista cognitiva, e à gravação das entrevistas tomadas na fase pré-processual.

3 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL

Após analisar todos os aspectos da prova testemunhal, avaliar as provas em espécies, bem como os sistemas de valoração das provas, quanto à confiabilidade e a credibilidade da prova testemunhal, buscou-se verificar como na prática é ponderada dita prova, de que forma lhe é dada credibilidade, e qual o sistema de

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