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2. BASE TEÓRICO-EMPÍRICA

2.2. Confiança

2.2.1. Definições de confiança

2.2.1.3. Confiança interorganizacional

Confiança é tida como mecanismo central de coordenação das relações interorganizacionais ou das formas híbridas (BRADACH & ECCLES, 1996;

POWELL, 1996). Estas relações manifestam-se entre o âmbito do mercado, caracterizado pelo sistema de preço em que o ator busca seus interesses próprios sem quaisquer considerações, além das legais, pelos demais atores econômicos, e o da hierarquia, caracterizado pela coordenação através da autoridade investida aos membros do topo da organização e pelo controle através de procedimentos burocráticos. Para Bachmann (2001, p. 338-9, tradução livre, grifos no original):

em ambos os casos, confiança pode desempenhar algum papel como um útil lubrificante para evitar tensões extremas, mas somente formas

híbridas de co-ordenação das interações são vistas como sendo baseadas na confiança como o modo central de controle delas. Em outras palavras, esta – e somente esta – forma de co-ordenação e controle da estrutura e dinâmicas dos relacionamentos é constitutivelmente dependente da existência de uma considerável quantia de confiança entre atores econômicos

De fato, em alguns estudos a confiança nas relações interorganizacionais é encarada como decorrente do sucesso da relação, atuando como um feedback que realimenta um sistema, e em outros como um necessário pressuposto para a relação (ARAÚJO, 2000). Segundo revisão do campo de estudos das relações interorganizacioais realizada por Oliver (1998) nos principais periódicos internacionais a confiança é citada em 18,4% do total de artigos publicados, sendo em 10,8% como antecedente das relações interorganizacionais e em 7,6% como resultado dos mesmos.

Porém, para Carvalho (2002) estudos como que trabalham a confiança relações e/ou redes interorganizacionais das maneiras descritas acima reduzem deliberadamente a complexidade da questão da confiança. Posições como as dos autores citados acima tornam ainda mais complexa a definição de confiança interorganizacional e a análise das implicações da confiança nas relações interorganizacionais.

Adaptando a definição de Giddens (1989) para o nível interorganizacional, Sydow (1998) define confiança entre organizações como “a confiança de uma organização na confiabilidade de outras organizações, considerando uma série de resultados ou eventos” (SYDOW, 1998, p.35, tradução livre)6. Percebe-se a forte relação das definições de Sydow e Giddens com a perspectiva de análise estruturalista que ambos defendem.

Alguns autores destacam o caráter interpessoal da confiança interorganizacional. Para Child (1999) e Mariz (2002), a confiança é propriedade dos indivíduos, portanto são os indivíduos que confiam, o objeto pode mudar, mas o agente é sempre a pessoa, a “confiança é exercida por pessoas; são as pessoas que confiam” decretou Mariz (2002, p. 04). Assim a confiança interorganizacional

6 No original “interorganizational trust,..., is the confidence of an organization in the reliability of other organizations, regarding a given set of outcomes or events”.

incorpora elementos das relações indivíduo-indivíduo, indivíduo-organização e indivíduo-sistema (rede).

Similares a Mariz (2002), Child (1999) e Barney e Hansen (1994) acreditam que, como as relações interorganizacionais cabem aos indivíduos que estão nas fronteiras da organização, a confiança interorganizacional origina-se a partir da confiança entre estes, geralmente no topo das organizações, num processo de institucionalização para o nível interorganizacional de padrões do relacionamento interpessoal, como descrito por Zucker (1986).

Para Kale et al. (2000) a confiança mútua e a interação entre indivíduos, especialmente os do topo da hierarquia organizacional, constrói o que ela denomina capital relacional. O capital relacional refere-se ao nível de confiança mútua, respeito e amizade que surgi da forte interação entre os indivíduos parceiros em uma aliança (KALE et al., 2000, p.218).

Este capital implica em boas relações entre empresas nas alianças e joint ventures, na medida em que equilibra, por um lado a busca da organização em agregar valor para si a partir da relação com a outra parte e, por outro a necessidade de proteger suas competências centrais. Por um lado, o capital relacional facilita o aprendizado interorganizacional através de uma forte relação um a um entre os parceiros da aliança. O contato face a face, segundo Bachmann (2001), ajuda a absorção do risco por parte do ator que confia. Por outro lado, o capital relacional minimiza a probabilidade do parceiro agir oportunisticamente para unilateralmente apreender informações ou know–how que se caracterize como competência central de seu parceiro.

Para Casson e Cox (1997), as redes interpessoais entre empresários e homens de negócio são uma eficiente maneira de conseguir informações que são necessárias para coordenar a alocação de recursos. Já Eisenhardt e Schoonhoven (1996) apontam que as características sociais dos membros do topo das organizações influenciam e podem guiar a formação de alianças.

Ring e Van de Ven (1994), por sua vez, enfatizam possíveis problemas para as relações interorganizacionais dependentes da confiança entre indivíduos. Se a

transação é baseada nas relações de confiança interpessoal pode-se ocorrer um desvio dos interesses organizacionais para os individuais, incluindo desfalques e corrupção.

Mesmo que não haja má fé dos indivíduos, a confiança presente nas relações interorganizacionais não deve se estagnar ao nível interpessoal sob pena de se romper parcial ou totalmente a relação, numa eventual mudança de pessoal. Tal percepção é compartilhada por Jeffries e Reed (2000) para os quais a solução de problemas em contratos relacionais tende a ser ótima quando a confiança interorganizacional e a confiança interpessoal estão no mesmo nível.

Já Cunha (2004), em sua pesquisa no Brasil, identificou que as empresas de pequeno e médio porte tendem a confiar em pessoas e não nas organizações, concluindo que a confiança interpessoal reflete significativamente na confiança interorganizacional, devido entre outros aspectos a características culturais como o personalismo, a tomada do público pelo privado e a falta de instituições mais próximas a prática cotidiana dos atores.

Confiança e tempo também se relacionam, usualmente de forma positiva.

Child (1999), assim como Lane (1998), acredita na construção da confiança a medida que os relacionamentos entre as organizações sucessivamente ocorrem. Para Child ao firmarem um contrato de aliança buscando atingir seus interesses e objetivos as organizações não necessariamente se conhecem ou tem pouco conhecimento mútuo.

Nesta fase de formação contratual predomina o cálculo. Com o decorrer da relação entre as organizações a implementação do contrato ocorre e desta maneira, os atores passam a ter conhecimento mútuo baseado na própria experiência vivenciada. Em seguida, num terceiro passo, a relação pode se findar, evoluir para outro tipo de aliança ou ser repetida nos mesmos moldes. Nestes dois últimos casos, é possível que uma confiança baseada na identificação mútua ocorra entre as organizações. O formato em fases de Child (1999) transforma a tipologia de Lane (1998), anteriormente apresentada em uma série seqüencial crescente, aplicando-as as relações interorganizacionais, mais especificamente nas alianças estratégicas. Segundo Cunha (2004, p. 254) analisar as alianças interorganizacionais como um processo permite

entender que a confiança exerce funções distintas em cada uma das fases, assim como é diferente sua base principal em cada etapa do relacionamento.

Rousseau et. al. (1998, p. 401) também relacionam o desenvolvimento da confiança ao passar do tempo. Na figura 01 a confiança institucional embasa a transformação da confiança calculativa para a relacional, como suporte de uma confiança institucional, que é derivada das normas e regras da sociedade e do próprio setor que ordenam e limitam o comportamento dos atores.

Figura 01: Modelo de confiança de Rousseau et. al.

Relacional Cálculo

Institucional

tempo Fonte: ROUSSEAU et. al. 1998. p. 401.