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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 COMPORTAMENTOS DE CIDADANIA ORGANIZACIONAL

2.2.1 Confiança interpessoal

O interesse pelo conceito de confiança no ambiente organizacional tem crescido nos últimos anos, como resultado da busca de novas formas de promover a cooperação entre indivíduos e grupos nas organizações, e das intenções de introduzir modelos mais participativos de gestão (GUINOT et al., 2014). Nesse sentido, a confiança interpessoal tem sido considerada um dos motores por trás da vontade das pessoas de cooperar uns com os outros no ambiente de trabalho (Lee et al., 2011).

A confiança interpessoal refere-se à vontade de um indivíduo em estar vulnerável às ações de outra parte, baseada na expectativa de que esta realizará uma ação particular

importante para aquele que confia, independente de sua habilidade para monitorar ou controlar a outra parte (MAYER, DAVIS e SCHOORMAN, 1995). Para Costa (2003), confiança interpessoal refere-se à confiança entre indivíduos, e suas bases são as percepções pessoais ou do grupo em relação aos motivos e intenções da outra parte.

Ainda, considerando as definições de confiança interpessoal, McAllister (1995) defende a perspectiva de que este nível de confiança está relacionado a bases cognitivas e afetivas. Para o autor, a confiança interpessoal está associada à extensão em que uma pessoa está segura e disposta a agir, considerando como referencial as palavras, ações e decisões dos outros, tendo alicerces cognitivos e afetivos.

A confiança é baseada em cognição quando se escolhe em quem confiar e respeitar e em que circunstâncias, baseando a escolha em boas razões que provem o merecimento da confiança (MCALLISTER, 1995). Em ambientes organizacionais a competência, a responsabilidade e a segurança são elementos centrais quando a confiança é baseada em cognição. Por outro lado, as bases afetivas sugerem que a confiança está associada a laços emocionais entre os indivíduos. Para McAllister (1995), as pessoas que fazem investimentos emocionais em relações de confiança expressam genuíno cuidado e preocupação com o bem- estar dos parceiros, acreditando na virtude intrínseca de tais relações, sendo normalmente sentimentos recíprocos. A confiança afetiva caracteriza-se por sentimentos estáveis e força percebida no relacionamento, tendo maior associação a experiências sociais com o outro do que a confiança cognitiva (JOHNSON e GRAYSON, 2005).

Independente de suas bases, as relações de confiança reproduzem um conjunto institucionalizado de valores, ou seja, normas que tornam estáveis e ordenam a interação social, construindo e reforçando um quadro de obrigações e expectativas compartilhadas em que os atores sociais podem investir (REED, 2001). Para Oliveira e Tamayo (2008), ao confiar, o indivíduo acredita que o outro não agirá de modo oportunista, vindo a prejudicá-lo, sendo a confiança um indicador de que a interação social poderá ser estabelecida e mantida ao longo do tempo.

Ao considerar a confiança como uma das bases da interação social, alguns autores associam o construto à norma de reciprocidade (RENNÓ, 2011; REED, 2001; MCALLISTER, 1995). “Nessa perspectiva, uma pessoa age de certa forma esperando que outros reagirão de forma semelhante no futuro e essa predisposição leva os indivíduos a “darem um voto de confiança” aos demais” (RENNÓ, 2011, p. 401). Conforme Gouldner (1960), a reciprocidade, caracterizada como princípio universal e norma social, define como obrigação o ato de retribuir um favor recebido. O autor sugere que uma unidade social se

torna mais disposta a prestar auxílio à outra unidade, quando a última se mostra capaz de retribuir-lhe o benefício.

Assim, a norma de reciprocidade pode ser considerada como um elemento da cultura que estabelece uma configuração estável de direitos e obrigações com base no princípio normativo de mutualidade, ou seja, as pessoas devem ajudar aqueles que as ajudam (GOULDNER, 1960). Como afirma Reed (2001), Gouldner percebe a norma de reciprocidade como um mecanismo de construção de confiança que estabiliza e mantém sistemas sociais. A norma da reciprocidade oferece aos indivíduos uma base para a confiança, uma vez que as partes envolvidas em uma relação tenham internalizado essa norma, que obriga o receptor de um benefício a retribuí-lo (GOULDNER, 1960).

Ao investigar a influência da expectativa de reciprocidade sobre o comportamento confiante, Tanis e Postmes (2005) buscaram comprovar a perspectiva de Gouldner (1960) sobre confiança e reciprocidade. Os resultados do referido estudo confirmaram que o comportamento confiante foi, em grande parte, determinado pela expectativa de reciprocidade dos indivíduos. No entanto, na situação em que o confiado não pertencia ao grupo de trabalho, a reciprocidade exerceu impacto pouco significativo sobre o comportamento confiante. Tais achados revelam que a reciprocidade tende a ser esperada quando o indivíduo possui certa familiaridade em relação ao confiado, podendo ter desenvolvido, desta forma, alguma base de confiança (disposicional, baseada no histórico, em terceiros na categoria, no papel ou em regras) em relação ao outro.

A confiança interpessoal nas organizações tem sido considerada um fenômeno complexo e dinâmico (MCCAULEY e KUHNERT, 1992; OH e PARK, 2011), sugerindo a necessidade de novos estudos que busquem ampliar a compreensão sobre este fenômeno. Contudo, a confiança interpessoal tem sido tradicionalmente associada a consequências favoráveis, tanto para o indivíduo, quanto para a organização (ALTUNAS e BAYKAL, 2010). A confiança tem sido positivamente relacionada com o desempenho organizacional (DAVIS et al. , 2000), satisfação no trabalho (GUINOT et al., 2014), cooperação entre os membros da equipe (LEE et al,. 2011), comprometimento organizacional (PILLAI, et al., 1999), compromisso com as metas (SHOLIHIN et al., 2011) e Comportamento de Cidadania Organizacional (PILLAI et al., 1999; SINGH e SRIVASTAVA, 2009).

Ainda, como afirma McAllister, (1995), a comunicação aberta, a demonstração de preocupação com o outro e o oferecimento de ajuda para alcançar os objetivos são consequências típicas e observáveis de relações de confiança. Sob este aspecto, a confiança interpessoal pode funcionar também como um catalisador das interações sociais, permitindo

que os membros da equipe estejam mais dispostos a oferecer ajuda e apoio um ao outro (LEE

et al,. 2011).

Ao constatar que a confiança interpessoal, exerce impacto sobre o desempenho das equipes, Ding e Ng (2009) sugerem uma reflexão sobre o papel dos gestores. Para os autores, os gestores de equipe possuem o papel de incentivar as interações sociais entre indivíduos e fornecer orientação sobre atitudes desejáveis em relação ao trabalho, como responsabilidade, seriedade e empreendedorismo, de tal forma que o nível de confiança interpessoal possa ser melhorado. Além disso, a confiança nos próprios gestores poderá contribuir também, para incentivar comportamentos interpessoais e voluntários que favoreçam as relações sociais (ERTÜRK, 2007).

Em relação aos elementos da confiança interpessoal, McCauley e Kuhnert (1992) e Ting (1997) indicam que a confiança interpessoal é composta pela confiança vertical e lateral. A confiança vertical refere-se à relação de confiança entre um subordinado e seu superior (supervisor ou gestor) direto. Já a confiança lateral refere-se à relação de confiança entre um colaborador e seus colegas de trabalho. Como afirma Guinot et al. (2014) estas sub categorias de confiança interpessoal sugerem que existem diferentes dimensões das relações sociais entre os trabalhadores no local de trabalho. Assim, um indivíduo pode confiar em seus colegas de trabalho, mas ter certa desconfiança em seu superior ou vice versa (GUINOT et al., 2014).

Com a intenção de examinar as medidas relacionadas à confiança, Dietz e Hartong (2006) destacaram que os modelos propostos na literatura analisam a confiança tendo como referência as relações de trabalho entre: a) colaboradores e seu superior imediato; b) colaboradores e colegas de trabalho; c) colaboradores e seu empregador ou gestor; d) colaboradores e a organização; e) departamentos da organização; e f) múltiplas relações em toda a organização. O Quadro 7 ilustra tais referências, bem como os autores, o número de variáveis de cada medida e sua confiabilidade.

Quadro 7 - Medidas sobre confiança interpessoal

(continua)

Autores Referência Número de itens Confiabilidade

(Alpha de Cronbach)

McAllister (1995) Um colega de trabalho (par) 11 0,91 e 0,89

Robinson (1996) Empregador 7 0,88

Cummings e Bromiley (1996) Outros departamentos 12 0,90

Nyham e Marlowe (1997) Supervisor imediato,

departamentos e organização 12 0,95

(conclusão)

Autores Referência Número de itens Confiabilidade

(Alpha de Cronbach)

Nyham (2000) Superior imediato 4 0,86

Gillespie (2003) Supervisor imediato e membros

da equipe 10 0,88

Oh e Park (2011) Colegas de trabalho 4 0,85

Fonte: elaborado a partir de Dietz e Hartong (2006); Nyham e Marlowe (1997); Nyham (2000); Oh e Park (2011)

Como podem ser visualizadas no Quadro 4, as medidas de confiança interpessoal destacam inúmeras referências de interações no trabalho, sendo que algumas dessas, mesmo apresentando confiabilidade satisfatória, possuem algumas fragilidades. Destaca-se inicialmente, que a referência de algumas medidas podem ser consideradas ambíguas, como por exemplo, o modelo proposto por Robinson (1996) em que os indivíduos avaliam a confiança em seu empregador. Dietz e Hartong (2006) afirmam que não é possível saber o que o entrevistado tinha em mente quando respondeu ao instrumento, podendo ter personificado o empregador (empresa), seus gerentes ou seu supervisor. Da mesma forma, a medida de Mayer e Davis (1999) implica certa ambiguidade, uma vez que os indivíduos podem não ter o conhecimento de quem considerar como “alta gestão”.

Já a referência proposta por Cummings e Bromiley (1996) somente poderá ser utilizada para respondentes que tenham informações ou experiências em relação a outros departamentos, caso contrário tal avaliação não pode ser considerada fidedigna (DIETZ e HARTONG, 2006). Outro aspecto destacado por Dietz e Hartong (2006), está associado as múltiplas referências, como por exemplo, o modelo proposto por Nyham e Marlowe (1996) e Gillespie (2003). Esta diversidade de referências pode ocasionar dificuldade para o respondente, podendo torná-lo suscetível a erros ao analisar diferentes relacionamentos.

Assim, pode-se inferir que as medidas que tem como foco uma referência única (NYHAM, 2000; OH e PARK, 2011) facilitam a avaliação do respondente, minimizando possíveis ambiguidades ou complexidade ao avaliar a confiança nos relacionamentos interpessoais. Assim, no presente estudo, a confiança interpessoal será analisada por meio da confiança nos colegas de trabalho e da confiança no superior imediato.