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2- CENÁRIO DA POLÍTICA DE COMPRAS GOVERNAMENTAIS COMO INSTRUMENTO DE INOVAÇÃO NO BRASIL – APARATO

2.2 Configuração do cenário da política de compras governamentais no Brasil como fomento à inovação

O setor público, em sua função administrativa, adquire bens e serviços como insumos necessários para realização de uma ampla gama de funções estatais. A variedade dessas funções e abrangência da atuação do Estado geram um mercado de compras governamentais, responsável por uma percentagem significativa do produto interno bruto (PIB) de vários países, inclusive no Brasil, com impacto direto sobre a economia, conforme Tabela 5.

Ano

União1 Estado Municípios Total

PIB Valor %/ PIB Valor %/ PIB Valor %/ PIB Valor % PIB

2006 176 7,4 59 2,5 85 3,6 320 13,5 2.369 2007 194 7,3 58 2,2 96 3,6 347 13,0 2.661 2008 242 8,0 76 2,5 117 3,9 436 14,4 3.032 2009 253 7,8 88 2,7 103 3,2 444 13,7 3.239 2010 305 8,1 103 2,7 121 3,2 529 14,0 3.770 2011 309 7,5 92 2,2 141 3,4 542 13,1 4.143 2012 381 8,7 94 2,1 161 3,7 637 14,5 4.392 Total/média 1.861 7,9 571 2,4 823 3,5 3.255 13,8 23.608

Tabela 5: Compras governamentais do Brasil segundo entes (em R$ bilhões – preços correntes. Fonte: Ribeiro & Junior (2017, p. 266).

De acordo com Ribeiro & Junior (2017, p. 266), as compras realizadas pelo setor público são relevantes para promoção de indústrias domésticas, considerando o tamanho

desse mercado, e são indutoras do desenvolvimento tecnológico de fornecedores locais (Hommen; Rolfstan, 2009; Edquist; Zaballa-Iturriagagoitia, 2012). Analisando o caso brasileiro, aqueles autores sustentam:

“O aproveitamento do potencial econômico e a constatação das possibilidades subjacentes às aquisições de bens e serviços do setor público têm ganhado destaque no Brasil em anos recentes, o que pode ser constatado a partir das diretrizes do Plano Brasil Maior - PBM) e do Inova Empresa. No PBM, política industrial, tecnológica e de comércio exterior do governo federal lançado em 2011, o mercado representado pelas compras do setor público brasileiro é apontado como oportunidade para o estímulo à competitividade do parque produtivo do país (BRASIL, 2011). Ainda em 2011, foi lançado o Plano Inova Empresa, por meio de uma parceria entre o Banco Nacional de Desenvolvimento e Social (BNDES) e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), o qual explicita a importância da utilização do poder de compra do Estado, sobretudo por meio de aquisições estratégicas. Diante dessa importância, tal programa se propõe a estimular a inovação e a competitividade empresarial a partir das aquisições realizadas pelo Estado. (RIBEIRO & JUNIOR, 2017, p. 266)

É forçoso reconhecer que, no Brasil, as compras governamentais passaram a ser tratadas como instrumentos de políticas públicas para inovação em passado recente. É que, somente em 2008, com os primeiros relatos de experiências bem-sucedidas da utilização desse instrumento em outros países, o governo brasileiro anunciou a adoção das compras governamentais como instrumento prioritário para impulsionar a economia por meio da inovação.

Ao analisar o processo de formulação das políticas de inovação no primeiro decênio do século XXI, Moreira e Vargas (2012, p. 235) registram que: “no caso brasileiro, o estímulo à atividade inovadora das empresas é uma diretriz política considerada desde a proposição da Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), em 2004 (SALERNO; DAHER, 2006)”.

Por sua vez, Cano & Silva (2010, p. 19) apontam, ao discorrerem sobre política industrial no governo Lula, que houve ampliação das metas da PITCE de quatro para sete. Entre as razões, destacam que o aumento apontou na direção certa para o preenchimento de lacunas importantes, dentre as quais, “destaca-se o uso tímido do poder de compra do Estado, até agora muito pouco aproveitado”.

Ademais, esses autores revelam que o uso do poder de compra como instrumento de inovação, a exemplo do que já ocorria em países como Estados Unidos da América e Inglaterra, já estava em discussão no governo central. Nesse sentido, citam: d) elaboração de anteprojeto de lei para regular compras governamentais na área de saúde; e) no complexo

de defesa, início dos trabalhos de transferência de tecnologia e desenvolvimento de fornecedores do projeto HXBR. Por fim, Cano & Silva (2010, p. 19) recordam que:

“Há setores em que o Estado tem um papel particularmente importante na demanda. Por exemplo, no Brasil, o setor governamental é responsável por mais de 50% de todas as compras de produtos da área de tecnologia de informação (incluindo software, hardware e serviços). Aliás, o uso do poder de compra é amplamente utilizado nos países desenvolvidos, compondo parte essencial de suas políticas industriais. Os EUA e a Inglaterra têm experiências relevantes, notadamente pelo seu impacto no desenvolvimento da inovação. Por exemplo, todo o setor de tecnologia de informação dos EUA sempre foi fortemente impulsionado por este instrumento (principalmente em projetos no âmbito do Departamento de Defesa). O Brasil tem já em andamento a experiência do PROMINP, programa voltado para a indústria do petróleo. Neste sentido, a Petrobrás tem assumido papel ativo na política industrial, por meio da demanda de novas plataformas, sondas etc. e sua canalização para a indústria local (siderurgia, naval etc.). (CANO & SILVA, 2010, p. 19).”

Dessa maneira, em 2010, o governo federal deu um importante passo na direção da aquisição de bens e serviços inovadores ao permitir contratações – desde que devidamente atestadas – na ordem até 25% superiores ao menor lance obtido em certame regular, a exemplo de pregões. Por essa razão, a partir dos resultados decorrentes dessas ações, começam a surgir os primeiros estudos sobre experiências de aquisições públicas de soluções inovadoras, (Moreira e Vargas, 2012, p. 235).

Santos et al. (2017) a respeito do uso do poder de compra pelo Estado, na perspectiva da implementação de outra forma de custeio das atividades de inovação das empresas, apontam, no caso brasileiro, que:

“[...] não se trata exatamente da ausência de um aparato normativo que permita fazê- lo.13 Entretanto, o desafio maior consistiria em expandir e eventualmente aprimorar

instrumentos já à disposição da Administração Pública para uma utilização plenamente satisfatória desse instrumento de fomento à inovação”. (SANTOS et al, 2017)

Assim, a utilização do poder de compra pelo Estado na aquisição de bens ou serviços com conteúdo inovador, importaria em um relevante incentivo para as empresas fornecê-los, já vista que “a garantia da demanda diminui os riscos associados ao desenvolvimento da

13 Registra-se a menção explícita ao uso do poder de compra pelo Estado como um dos princípios orientadores

do fomento à inovação, entre os instrumentos de fomento à inovação atualmente arrolados na Lei n. 10.973/2004 e enquanto até mesmo hipótese extensiva da utilização dos instrumentos explicitamente arrolados na Lei, conforme os artigos 1º, XIII, e 19, § 2º-A, VIII, e § 6º, IX.

atividade empreendedora, mitigando o alto risco imanente à inovação” (SANTOS et al., 2017, p. 207).

Nessa ordem de ideias, consoante destacado por Macedo (2017); Santos et al. (2017), impende reforçar que o uso das compras governamentais no Brasil - como instrumento de política de inovação -, está lastreado em arcabouço legal, atraindo, portanto, o âmbito de incidência da Lei de Licitações,14 haja vista que se trata de uma aquisição efetuada pelo setor público, guiado pelo princípio da legalidade, consoante preconizado pelo Constituição Federal de 1988.

Assim é que, desde a Lei nº 12.349, de 15 de dezembro de 2010, que alterou a Lei de Licitações e Contratos na Administração Pública, o ordenamento jurídico brasileiro passou a prevê a possibilidade de se estabelecer um sistema de margem de preferência específica para produtos manufaturados e serviços nacionais resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País, (Santos et al., 2017)15. Com o advento dessa nova

legislação, a promoção do desenvolvimento nacional sustentável passou a ser um dos objetivos das licitações públicas.

2.3 Análise do arcabouço jurídico-institucional de compras governamentais para