• Nenhum resultado encontrado

CONFUSÃO SEXUAL DA TRAÇA-DA-UVA, Lobesia botrana, COM DIFUSORES ISONET-LTT

Fátima Gonçalves1, Cristina Carlos2, Susana Sousa3, Maria Carmo Val2, Rui Soares3e Laura Torres1

1

CITAB – Centro de Investigação e de Tecnologias Agro-Ambientais e Biológicas, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, 5001-801, Vila Real, Portugal. mariafg@utad.pt

2

ADVID – Associação para o Desenvolvimento da Viticultura Duriense, Quinta de Santa Maria, Apt. 137, 5050-106 Godim, Portugal.

3

Real Companhia Velha- R. Azevedo Magalhães, n.º 314 Oliveira do Douro, 4430-022 Vila Nova de Gaia.

RESUMO

O projeto Ecovitis, em curso desde 2011, tem como um dos seus objetivos a aplicação do método da confusão sexual da traça-da-uva, na Região Demarcada do Douro, com recurso a difusores ISONET- LTT (300 mg (E,Z)-7,9-dodecadienil acetato). No presente trabalho, apresentam-se os resultados da sua aplicação na Quinta dos Aciprestes em 2012 e 2013. A eficácia do método avaliou-se por análise da curva de voo e por quantificação dos estragos. As taxas de desorientação dos machos foram de 99,4 ± 0,30% em 2012 e 99,9 ± 0,02% em 2013, tendo-se à vindima registado reduções de ataque de 50,0 ± 18,89% e 88,7 ± 5,03% em 2012 e 2013, respetivamente. Verificou-se que as parcelas onde o método se mostrou menos eficaz foram as localizadas junto ao rio Douro, pelo que se admite que possa aí ter lugar um arrastamento da nuvem de feromona, devido à ocorrência de ventos ascendentes, ficando essa área desprotegida.

Palavras-chave: confusão sexual, ISONET-LTT, Lobesia botrana, traça-da-uva

ABSTRACT

One of the main objective of Ecovitis project, ongoing since 2011, is the use of mating disruption for the European Grapevine Moth, in the Douro Demarcated Region, using ISONET-LTT dispensers (300 mg (E, Z) - 7,9-dodecadienil acetate). In this work, we present the results of its application in Quinta dos Aciprestes, during 2012 and 2013. The effectiveness of the method was evaluated by analyzing the insect flight curve and the infestation levels. The male disorientation was of 99.4 ± 0.30% in 2012 and 99.9 ± 0.02% in 2013, while the attack reductions were of 50.0 ± 18.89% and 88.7 ± 5.03% in 2012 and 2013 respectively. The plots where the method was less effective were those located near the Douro River, and therefore it is admissible that the cloud of pheromone may be being dragged due to the occurrence of updrafts, leaving the area unprotected.

130

INTRODUÇÃO

A traça-da-uva é considerada praga-chave da vinha na Região Demarcada do Douro (RDD), bem como no conjunto dos países do Sul da Europa. A proteção contra esta praga era, até finais do século passado, tradicionalmente feita na RDD com recurso à luta química. Porém, dadas as preocupações de carácter ambiental e de saúde pública e as exigências dos consumidores por produtos de qualidade, livres de resíduos químicos, cada vez mais produtores têm procurado utilizar meios de proteção capazes de responderem a estas preocupações/exigências.

O método da confusão sexual, com recurso a difusores de feromona, encontra-se homologado em Portugal desde 2002. Na RDD, estima-se que, atualmente, esteja a ser implementado numa área que ronda os 300 ha (Eira, com. pess). Contudo, os resultados do seu emprego nem sempre se têm mostrado satisfatórios, em virtude de determinadas condicionantes da região, nomeadamente: (i) as altas temperaturas de Verão e os ventos fortes, que conduzem à rápida exaustão da feromona nos difusores; (ii) o longo período de atividade da traça-da-uva, por vezes superior à vida útil dos difusores; (iii) a elevada sensibilidade de algumas castas, como a Touriga Franca; (iv) a orografia e declive acentuado das vinhas localizadas em encosta; (v) e a estrutura fundiária da maioria das vinhas, caracterizada por elevada fragmentação e heterogeneidade de parcelas, frequentemente rodeadas de manchas de vegetação semi-natural e outras culturas (Carlos et al., 2010).

Com vista a ultrapassar estas condicionantes, desde 2011 que, no âmbito do projeto Ecovitis, a confusão sexual tem vindo a ser implementada, com recurso a um novo difusor de feromona, desenvolvido pela Shin-Etsu Chemical Co, o ISONET-LTT (com 300 mg do ingrediente ativo (E,Z)-7,9- dodecadienil acetato). O dispositivo está a ser atualmente aplicado numa área com cerca de 180 ha de vinha repartidos por cinco explorações localizadas no Cima Corgo. No presente trabalho, apresentam-se os resultados do seu emprego na Quinta dos Aciprestes, no biénio de 2012 e 2013.

MATERIAL E MÉTODOS

O presente trabalho decorreu em 2012 e 2013, na Quinta dos Aciprestes (41o12’N, 7o26’O), propriedade da Real Companhia Velha e localizada na freguesia de Soutelo do Douro, concelho de S. João da Pesqueira. As parcelas sujeitas a confusão sexual (parcelas CS) estão maioritariamente plantadas em sistema de vinha ao alto, com as castas Touriga Franca, Touriga Nacional, Tinta Roriz e Tinta Amarela, totalizando 18,7 hectares de vinha (Quadro 1; Figura 1). Com o objetivo de avaliar a eficácia do método, selecionou-se uma parcela de referência, afastada cerca de 120 m da área em confusão sexual, com a mesma sistematização e plantada com a casta Touriga Franca, usada como testemunha. Considerou-se suficiente a distância entre a área tratada e a testemunha, dado o delineamento experimental para estudos de confusão sexual (Efficacy Guideline 220, 2010), indicar que a distância requerida, embora dependa da espécie, deve ser no mínimo de 100m.

Os difusores foram instalados em meados de Março (a 26 em 2012 e a 16 em 2013), à razão de 455 difusores por ha, valor superior ao recomendado pelo fabricante, i.e., 400 difusores por ha.

A monitorização dos adultos fez-se através da sua captura em armadilhas sexuais do tipo delta instaladas, em 23 de Março em 2012 e em 8 de Março em 2013, no centro de cada uma das parcelas. Em 2012, os difusores foram colocados quando o voo dos adultos hibernantes já se tinha iniciado. O

131

registo das capturas fez-se semanalmente, sendo as bases de cola substituídas sempre que necessário e as cápsulas de feromona a cada cinco ou seis semanas, consoante as temperaturas. A intensidade do ataque avaliou-se por observação visual de uma amostra de cachos por parcela e por geração que variou entre 100, em 2012, e 50, em 2013. Na primeira geração a quantificação do ataque foi efetuada através do registo do número de ninhos por 100 cachos e na segunda e terceira gerações através da contabilização da percentagem de cachos atacados (com perfurações ou presença de ovos viáveis).

A eficácia da aplicação do método avaliou-se através do cálculo da taxa de desorientação dos machos nas parcelas CS (com base no número de capturas) e da taxa de redução do ataque, tendo como referência a testemunha, com base na seguinte equação:

((test.-CS)/test.)*100

O efeito do tratamento, quer no número de capturas nas armadilhas sexuais, quer no ataque, comparou-se por análise de χ2 com correção de Yates.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Curva de voo e taxa de desorientação dos machos

A análise da curva de voo mostra que em 2012 os níveis populacionais de adultos de traça-da-uva foram baixos (total de 98 capturas na testemunha), comparativamente a 2013 (total de 750 capturas na testemunha).

A análise da curva de voo da testemunha (Figura 2) mostra a ocorrência de três voos durante 2012 (o primeiro entre 26 de Março e 25 de Maio com um pico a 5 de Abril; o segundo entre 8 de Junho e 19 de Julho com um pico a 15 de Junho; e o terceiro entre 16 de Agosto e 16 de Setembro com um pico a 7 de Setembro). Neste ano, as taxas de desorientação variaram entre 97,6±2,4% no terceiro voo e 100% no segundo voo (Quadro 2). O total de capturas por voo foi sempre mais elevado na testemunha comparativamente às parcelas em confusão sexual (χ2 = 478,5, g.l = 7, P < 0,001 no primeiro voo, χ2 = 148,8, g.l = 7, P < 0,001 no segundo voo, χ2 = 37,6, g.l = 7, P < 0,001 no terceiro voo).

Em 2013 também ocorreram, aparentemente, três voos (o primeiro entre 5 de Abril e 24 de Maio com um pico a 19 de Abril; o segundo entre 7 de Junho e 19 de Julho com um pico a 5 de Julho; o terceiro entre 26 de Julho e 18 de Outubro com um pico a 9 de Agosto) (Figura 3). Neste ano, e apesar da elevada pressão da praga, as taxas de desorientação variaram entre 99,9±0,03% no terceiro voo e 100 % no primeiro e segundo voos (Quadro 3). O total de capturas por voo foi significativamente maior na testemunha comparativamente às parcelas em confusão sexual (χ2 = 210,5, g.l = 7, P < 0,001 no primeiro voo, χ2 = 1624,1, g.l = 7, P < 0,001 no segundo voo, χ2 = 3407,1, g.l = 7, P < 0,001 no terceiro voo).

As taxas de desorientação observadas sugerem que, o tratamento impediu quase completamente que os machos localizassem as armadilhas. Contudo, de acordo com Ioriatti et al. (2011) uma redução no número de capturas pode não resultar numa redução do ataque comparável, isto porque a quantidade de feromona necessária para o macho localizar a fêmea é inferior à necessária para localizar a armadilha sexual é superior à necessária para o impedir de encontrar as fêmeas.

132 Avaliação da intensidade do ataque

À semelhança da curva de voo, a intensidade do ataque foi muito baixa em 2012, não se tendo observado diferenças significativas entre a testemunha e as parcelas em confusão sexual (χ2 = 4,0, g.l = 7, P > 0,05 na primeira geração, χ2 = 1,2, g.l = 7, P > 0,05 na segunda geração, χ2 = 11,6, g.l = 7, P > 0,05 na terceira geração) (Quadro 4). Em 2013, a intensidade do ataque, contabilizada na primeira geração, foi inferior ao nível económico de ataque, i.e., 100-200 ninhos por 100 cachos, em todas as parcelas, não se tendo também observado diferenças significativas entre parcelas (χ2 = 6,1, g.l = 7, P > 0,05). Nas parcelas em confusão sexual, apenas se observou ataque em duas parcelas (T18 e T19B), embora em percentagem bastante inferior ao observado na testemunha (Quadro 5). Na segunda geração ocorreram diferenças significativas entre parcelas (χ2 = 29,9, g.l = 7, P < 0,001), tendo o ataque, na maior parte das parcelas em confusão sexual, sido inferior ao observado na testemunha; porém, em duas das parcelas em que se aplicou a técnica (T14 e T15) o ataque não diferiu do da testemunha (χ2 =0,7, g.l = 1, P > 0,05) e a redução do ataque foi de apenas 28,9%. À vindima, o ataque na testemunha foi significativamente superior ao registado nas parcelas em confusão sexual (χ2 = 23,8, g.l = 7, P < 0,001); apesar de se terem observado ataques da ordem dos 6% de cachos atacados em duas parcelas (T15 e T19B), estes revelaram-se significativamente inferiores aos registados na testemunha (20% de cachos atacados) (χ2 =0,7, g.l = 1, P < 0,001) (Quadro 5).

Em conclusão, as taxas de desorientação dos machos de traça-da-uva nas parcelas onde se aplicou a confusão sexual, variaram entre 99,4 ± 0,30% em 2012 e 99,9 ± 0,02% em 2013, tendo-se à vindima registado reduções de ataque de 50,0 ± 18,89% e 88,7 ± 5,03% em 2012 e 2013, respetivamente. Contudo, os resultados obtidos em 2012 devem ser analisados com precaução, dada a baixa intensidade de ataque registada, tanto nas parcelas testemunha como nas parcelas em confusão sexual.

Em 2013, os resultados mostraram-se mais animadores em virtude, admissivelmente, do efeito cumulativo do método, que ocorre quando aplicado sucessivamente no mesmo local (Mochos et al., 2004; Carlos et al., 2010). As parcelas onde a confusão sexual se mostrou menos eficaz foram as localizadas junto ao rio Douro, pelo que, à semelhança do referido por Carlos et al. (2014) se admite que possa aí ter lugar um arrastamento da nuvem de feromona, devido à ocorrência de ventos ascendentes, ficando essa área desprotegida.

AGRADECIMENTOS

Trabalho realizado no âmbito do projecto “EcoVitis - Maximização dos Serviços do Ecossistema Vinha na Região Demarcada do Douro”, co-financiado pelo Programa de Desenvolvimento Rural – Ministério da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território – Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural – “A Europa investe nas zonas rurais”.