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5 ANÁLISE DOS DADOS

5.1 CONHECIMENTOS PRÉVIOS

Analisaremos os dados obtidos durante a pesquisa a partir dos referenciais teóricos já abordados neste trabalho, começando pelo diagnóstico que fizemos sobre os conhecimentos prévios dos educandos a respeito dos povos indígenas do Estado.

Por meio do questionário (Apêndice C) – cujas respostas sintetizamos nos Quadros: 4 a 107 – e participação dos estudantes nas aulas iniciais, foi possível identificar que os mesmos demonstraram, em suas respostas e comentários, terem pouco conhecimento e uma visão ingênua sobre os indígenas. Entretanto, concordamos com Freire (2005) quando afirma que a “[...] educação é possível para o homem, porque este é inacabado e sabe-se inacabado” (FREIRE, 2005, p. 27-28). Além disso, os educandos em suas representações indicaram a necessidade de um trabalho pedagógico que lhes possibilitassem a superação desse saber inicial. Para Freire (2005), o “[...] saber se faz através de uma superação constante. [...] Todo saber humano tem em si o testemunho do novo saber que já se anuncia” (FREIRE, 2005, p. 29).

No Quadro 4 apresentam-se algumas respostas dos estudantes, para cuja classificação criamos as categorias: Aspectos Físicos, Aspectos Culturais e Modo de

Produção e Subsistência. Por meio dessas categorias foi possível mostrar como os

estudantes identificavam um indígena. Em suas respostas disseram que reconhecem um “índio” pela cor da pele, por ter cabelos lisos, olhos puxados, pelo modo de se vestir, pela linguagem diferente, por usar pouca ou nenhuma roupa, por sobreviverem da caça e da pesca e por usarem arco e flecha.

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Nos quadros, a quantidade de ocorrência varia de acordo com a pergunta. Nas questões fechadas número de ocorrências equivale ao número de estudantes que participaram do questionário (32 alunos). Entretanto, nas questões abertas, as citações e o número de ocorrências estão organizados por quantidade de vezes em que as palavras aparecem nas informações obtidas nas respostas dos educandos.

Quadro 4: Percepção dos estudantes sobre os indígenas obtidas no Questionário Diagnóstico

Como os estudantes identificaram os indígenas:

Categorias Citação Quantidade de ocorrências:

a) Aspectos físicos: Os traços/características 7 Cor da pele 5 Cabelos 9 Olhos 3 b) Aspectos Culturais: Vestimentas diferentes 10 Linguagem 2 Tatuagem 3

Usam pouca/nenhuma roupa 3

Pelo jeito de ser/agir 8

c) Modo de produção e subsistência:

Caçam 3

Pescam 1

Produzem seus alimentos 1

Fazem as próprias ferramentas 1

Fazem suas roupas 1

Constroem suas casas 1

Usam arco e flecha 1

Fonte: Elaborado pelo autor (2017)

No questionário inicial (Apêndice C), além de perguntas diretas, utilizamos imagens, fotografias e desenhos para que os estudantes escolhessem e, dessa forma, conseguíssemos obter o maior número de dados, conforme defende Lüdke e André (1986), o pesquisador que faz um estudo de caso, deve buscar informações “[...] numa variedade de formas, tais como dramatizações, desenhos, fotografias, colagens, slides, discussões, mesas-redondas etc.” (LÜDKE & ANDRÉ, 1986, p. 20).

No intuito de obtermos mais informações sobre as representações dos educandos, utilizamos imagens de indígenas em diferentes situações e momentos. Selecionamos fotografias que apresentavam um indivíduo com o rosto pintado, segurando um arco e flecha e sem camisa; uma pessoa utilizando terno e gravata e crianças estudando. Sugerimos assim, que cada estudante deveria escolher uma das imagens que representava um indígena. Após a escolha, eles deveriam justificar suas respostas (Quadro 5).

Quadro 5: Imagem escolhida pelos estudantes e suas justificativas

Opções para marcarem: Quantidade de ocorrências: Primeira imagem: indígena segurando um arco e flecha 32

Segunda imagem: indígena usando terno e gravata Nenhuma Terceira imagem: crianças indígenas em uma sala de aula Nenhuma

Justificativas da escolha:

Categorias Respostas Quantidade de ocorrências:

a) Aspectos físicos:

Lembra um índio 1

Características físicas de índio 8

Pele 1

b) Aspectos Culturais:

Vestimentas: Usam pouca/nenhuma roupa 12

Pinturas e adereços 9

Possui uma cultura 1

c) Modo de produção e subsistência:

Caçam 3

Usam arco e flecha 11

d) Aspectos sociais:

Os índios são diferentes 1

Não se juntaram a civilização 1

Vivem na natureza 1

Não tem estudo fechado 1

Não se dedica ao trabalho 1

Fonte: Elaborado pelo autor (2017)

A indicação da primeira imagem pelos 32 alunos confirmou as representações apresentadas anteriormente (Quadro 4). Entretanto, nas justificativas dadas pelos educandos, podemos perceber o quanto eles carregam uma visão estereotipada, que não reconhece a diversidade dos povos indígenas. Amorim (2003) critica essa imagem do “índio” presente nos meios de comunicação e ensinada nas escolas.

Na conjuntura oficial, a imagem produzida e propagada do índio pelos meios de comunicação e divulgada pelo sistema educacional é marcada,estereotipada, persistindo a descrição dos primeiros cronistas coloniais, políticos, viajantes, artistas e cientistas naturais, que veem "o índio" e não os índios em sua diversidade e particularidades históricas, culturais, étnicas (AMORIM, 2003, p. 22).

Pimentel (2012) analisa que existe uma “fixação” da mídia em manter a figura do “índio original”, “puro” criando a impressão de que eles só existem na Amazônia, desconsiderando os demais povos. O autor apresenta dados do IBGE (2010), que demonstram que “[...] mais da metade da população indígena não vive na Amazônia” (PIMENTEL, 2012, P. 56). Entretanto, para Pimentel (2012) esses indígenas “não

amazônicos” não costumam aparecer na mídia, fato que tem contribuído para o não reconhecimento de populações que vivem em outras regiões do país.

Essa falta de conhecimento dos educandos sobre a diversidade e manutenção de um modelo de “índio puro”, imposto pelos meios de comunicação e construído a partir do olhar dos primeiros colonizadores, foi reforçada quando a maioria reconheceu a floresta como espaço de vivência indígena e a oca, como moradia dessas populações (Quadro 6).

Quadro 6: Ambiente de moradia indígena e tipos de habitações

Ambiente onde os indígenas vivem: Respostas:

Floresta 24

Periferia urbana 4

Cidade litorânea Nenhuma

Vila 4

Características de suas habitações: Respostas:

Casa simples de um conjunto habitacional Nenhuma

Casa de praia Nenhuma

Casa de madeira e barro 3

Oca 29

Fonte: Elaborado pelo autor (2017)

Ao serem indagados sobre os tipos de trabalhos desenvolvidos pelos indígenas e suas estratégias de sobrevivências atuais, a maioria respondeu que eles ainda vivem da caça e pesca (Quadro 7).

Quadro 7: Tipos de trabalho realizado pelos indígenas atuais

Estratégias de sobrevivência dos indígenas: Quantidade de ocorrências:

Caçam 30

Pescam 31

Produzem farinha de mandioca 1

Comercializam 1

Fazem artesanatos 4

Constroem cabanas 2

Coletam 1

Praticam agricultura 2

Alguns educandos indicaram outros tipos de trabalho como “produzem farinha de mandioca”, “fazem artesanatos”, “constroem cabanas” e “coletam”, no entanto, essas atividades mesmo estando presentes nas comunidades indígenas e não indígenas, representam geralmente um modo de produção de sociedades primitivas, seminômades ou neolíticas.

Por meio do questionário ainda verificamos o pouco conhecimento dos educandos sobre os indígenas que habitaram Vila Velha e o estado do Espírito Santo. Muitos deles demonstraram saber que no passado existiram grandes populações nativas no município e no Estado, entretanto, quando questionados sobre o que aconteceu com essas populações e os locais onde estão atualmente, a maioria não soube responder (Quadro 8).

Quadro 8: Demonstrativo dos saberes dos educandos sobre os indígenas do ES

Sobre a existência de populações indígenas em Vila Velha e no Espírito Santo:

Citações: Quantidade de alunos:

Responderam que sabiam da existência das populações indígenas

20

Responderam que não sabiam 12

Sobre o que aconteceu com os povos indígenas:

Citações: Quantidade de ocorrências:

Não sabem dizer o que aconteceu 7

“Sumiram porque os portugueses estavam desmatando para vender os troncos das árvores, o pau-brasil e estavam matando os índios porque queriam seu território”.

1

“Eles sofreram, lutaram e venceram para continuar no Brasil e

agora conseguiram um lugar nos nossos corações”. 1

“Esses povos foram diminuindo”. 1

“Foram mortos” 5

“Porque Pedro Álvares descobriu o Brasil e fez os índios de escravos”

2

“Deve ter mudado para outro lugar” 1

Sobre os indígenas atuais do Espírito Santo:

Citações: Quantidade de ocorrências:

Sabem que existe no ES 27

Desconhecem a existência de grupos indígenas no ES 5

Indicações dadas pelos estudantes dos locais onde vivem os indígenas do ES:

Locais citados: Quantidade de ocorrências:

Aracruz 14

Vera Cruz 4

Bahia 2

Na Tribo 1

Não souberam responder 8

Ao final da atividade diagnóstica, foi sugerido aos alunos que fizessem um desenho que representasse o indígena. As ilustrações feitas por eles contribuíram para confirmar o que já haviam indicado nas respostas anteriores. A fim de registrar os resultados obtidos por meio dos desenhos e facilitar ao leitor com uma síntese visual, fizemos um quadro (Quadro 9), no qual ressaltamos as principais características apontadas pelos educandos.

Quadro 9: Dados obtidos a partir dos desenhos feitos pelos educandos

Caracterização dos indígenas pelos estudantes por meio de desenhos:

Categorias Figuras desenhadas Quantidade de ocorrências:

a) Aspectos físicos: Homem 14 Mulher 5 Criança (menino) 5 Cabelos lisos 10 Olhos puxados 5 b) Aspectos Culturais: Pintura no rosto 2 Usando enfeite 6

Oca/cabana como moradias 10

Usando poucas roupas 15

Fumando um cachimbo 2

Fogueira 2

Local de moradia mais parecido com um ambiente de floresta 8 c) Modo de produção e subsistência: Caçando 2 Pescando 1

Usando arco e flecha 16

Segurando um machado 1

Usando uma lança 2

Fonte: Elaborado pelo autor (2017)

As representações dos indígenas feitas pelos educandos, no primeiro momento da pesquisa, vêm ao encontro das ideias defendidas por Bittencourt (2005) em relação ao papel dos livros didáticos no ensino de História. Para a autora, esses livros quando tratam da temática envolvendo os indígenas os apresentam de maneira generalizada, com ênfase ao período colonial, utilizando como referências informações e dados produzidos a partir do olhar do europeu, sendo comum nesses materiais a falta de discussões atuais sobre esses povos.

Santomé (1995) nos ajuda a entender como são construídas imagens, valores e significados que damos aos grupos humanos. Concordamos com o autor queo autor o grande destaque dado à cultura dos grupos dominantes contribui para invisibilizar minorias, ao mesmo tempo em que abre espaço para preconceitos raciais ou estereótipos dos povos dominados. A imagem do “índio selvagem e primitivo” foi construída ao longo dos séculos que se seguiram após a colonização com o propósito de impor a dominação sociocultural e os valores “eurocêntricos” para atender aos interesses econômicos das grandes potências mundiais.

Sabe-se que as instituições educacionais são um dos lugares mais importantes de legitimação dos conhecimentos, procedimentos, destrezas e ideias de uma sociedade ou, ao menos, das classes e dos grupos sociais que possuem parcelas decisivas de poder. Todos aqueles conteúdos e formas culturais que são considerados como relevantes por tais grupos são facilmente encontrados como parte de alguma disciplina ou tema de estudo nas salas de aula. Basta observar as disciplinas dos distintos cursos e níveis do sistema educacional e seus correspondentes ternários para logo nos darmos conta do tipo de cultura que a escola valoriza e contribui para reforçar, ao mesmo tempo que também podemos observar as ausências, ou seja, tudo aquilo que essa mesma instituição não considera merecedor de ocupar sua atenção.

O ensino e a aprendizagem que ocorrem nas salas de aula representam uma das maneiras de construir significados, reforçar e conformar interesses sociais, formas de poder, de experiência, que têm sempre um significado cultural e político (SANTOMÉ, 1995, p. 161).

No propósito de superar esses estereótipos e a visão ingênua recorremos aos ensinamentos de Paulo Freire, na medida em que suas obras apresentam uma pedagogia transformadora e problematizadora da realidade. Freire acreditava na ação dialógica, que coloca o educador e educandos na mesma posição, rompendo com as práticas de ensino “bancárias” que hierarquizam relações humanas, conteúdos, saberes, culturas, ao mesmo tempo em que essa educação tradicional fortalece hegemonias e justifica a existência de classes dominantes e dominadas.

Em conformidade com a educação dialógica defendida por Freire (1996, 2005), aceitar e respeitar a diferença é condição sinequa non para escuta. A dialogicidade, o saber falar e saber ouvir aos grupos minoritários são atitudes que sustentam propostas de transformação social. Se aos grupos minoritários não forem dadas condições de falarem e de serem ouvidos, não haverá diálogo; antes se criará um terreno fértil para a imposição de valores, a invasão cultural e a dominação (SANTOS & DEORCE, 2016, p. 96).

Além da ação dialógica, Freire (2005) defendia a autonomia dos sujeitos após a ampliação de seu conhecimento sobre o mundo, permitindo que ele tenha uma leitura de mundo que dê sentido à compreensão e ação sobre a realidade. Essa autonomia torna os sujeitos capazes de intervir criticamente na realidade, sabendo que seu “[...] papel no mundo não é só o de quem constata o que ocorre mas também o de quem intervém como sujeito de ocorrências [...]” (FREIRE, 2005 p. 76).

5.2 A IMPORTÂNCIA DAS AULAS DE CAMPO EM ESPAÇOS FORMAIS E NÃO