• Nenhum resultado encontrado

Consequências da inversão do contencioso

Desde logo, de acordo com o que se extrai do n.º 3 do artigo 369.º, estando o direito acautelado sujeito a caducidade, esta interrompe-se com o pedido de inversão do contencioso, reiniciando-se a contagem a partir do trânsito em julgado da decisão que indefira o pedido de inversão59. Trata-se de um caso de interrupção do prazo de

caducidade ressalvado pelo artigo 328.º do CC.

Assim, se o direito acautelado estiver sujeito a prazo substantivo de caducidade, como é o caso, v.g., da ação de anulação de deliberação social (artigo 59.º, n.º 2, do

57 Cfr. art. 295.º do CPC.

58 Na opinião de PAULO RAMOS DE FARIA e ANA LUÍSA LOUREIRO, Primeiras Notas, ob.

cit., pp. 303-304, apesar desta ser a solução legislativa, quanto mais tarde for o requerido

confrontado com o pedido da inversão do contencioso mais complicada, por um lado, se torna a tarefa do juiz de, através da matéria adquirida no procedimento, formar convicção segura acerca da existência do direito e, por outro lado, maior será a potencial agressão ao direito fundamental a um processo equitativo, imposto pelo art. 20.º, n.º 4, da CRP, o qual compreende a garantia de um acesso à justiça informado e esclarecido. Para o Conselho Superior do Ministério Público, no seu Parecer sobre o “Projecto de Lei 113/XII/2.ª (GOV)

que aprova o Código de Processo Civil”, disponível in

http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/ProcessoCivil/parecer_CSMP.pdf, p. 47, um prazo tão amplo para requerer a dispensa de propor a ação principal pode “colocar o requerido

perante uma decisão-surpresa, pelo que seria eventualmente preferível que tal requerimento devesse ter lugar logo na petição inicial”.

59A redação do art. 369.º, n.º 3, foi introduzida no âmbito da discussão parlamentar na

especialidade da Proposta de Lei n.º 113/XII/2.ª (Gov.), a qual substituiu a redação originária que era a seguinte: “se o direito acautelado estiver sujeito a caducidade, esta interrompe-se

com o pedido de inversão do contencioso, reiniciando-se a contagem do prazo a partir do trânsito em julgado da decisão proferida sobre a questão”. Ora, esta primeira redação criava

uma situação anacrónica, já que após a obtenção de uma decisão sobre o pedido, ainda que esta fosse favorável, reiniciava-se o prazo tendo o requerente de propor a ação principal de forma a impedir a caducidade, para que desta forma não visse extinguido o seu direito. Vide, sobre esta questão, o Parecer da Associação Sindical dos Juízes Portugueses apresentado à Assembleia da República, em janeiro de 2013, pp. 29-30, disponível in http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/ProcessoCivil/Parecer-ASJP-Janeiro-2013.pdf.

CSC)60 e das ações possessórias (artigo 1282.º do CC), este interrompe-se com o pedido de inversão do contencioso. A formulação deste pedido traduz, em concreto, o ato a que se alude no artigo 331.º do CC. Apenas o trânsito em julgado que negue o pedido de inversão do contencioso tem por efeito marcar o reinício do prazo de caducidade.

Tendo em consideração que esse pedido provoca a interrupção do prazo de caducidade, se o houver, o requerente deverá formular o respetivo requerimento antes daquele se esgotar61. Se assim não fizer e o pedido de inversão de contencioso for indeferido, já não poderá fazer valer o direito substantivo numa ação principal.

Se o juiz decretar a medida cautelar e inverter o contencioso, o primeiro efeito processual dessa decisão será a dispensa do requerente do ónus de intentar a ação

principal, nos termos previstos no artigo 373.º, n.º 1, do CPC. O ónus de propositura

de uma ação é transferido para o requerido que deve intentar uma ação destinada a impugnar a existência do direito acautelado, se não quiser que a providência decretada se consolide como composição definitiva do litígio. Se o requerido não tomar a iniciativa de propor aquela ação, o litígio ficará resolvido nos termos fixados na providência cautelar decretada, de acordo com o disposto no artigo 371.º, n.º 1, do CPC.

Daqui decorre o segundo efeito do decretamento da inversão do contencioso. Se o requerido não propuser tal ação no prazo previsto, a providência decretada consolida-se como solução definitiva do litígio. O mesmo efeito processual verificar-se-á no caso de a ação de impugnação ser proposta, mas o processo ficar parado por mais de trinta dias por negligência do autor ou o réu ser absolvido da instância (artigo 371.º, n.º 2, do CPC).

60 Voltaremos a este ponto mais adiante, ao analisarmos a aplicação do instituto da inversão

do contencioso no âmbito da suspensão das deliberações sociais.

61 PAULO RAMOS DE FARIA e ANA LUÍSA LOUREIRO, Primeiras Notas, ob. cit., p. 305,

entendem que esta solução legal abre caminho a estratégias processuais indesejadas: “Se o

titular do direito quiser que o prazo de caducidade seja estendido, bastar-lhe-á instaurar um procedimento cautelar, formulando o pedido de inversão do contencioso no requerimento inicial, assim conseguindo o efeito pretendido, ainda que o requerimento seja liminarmente indeferido”. Contudo, conforme relembram os próprios autores, a interrupção do prazo só

ocorrerá uma vez, dado que o art. 362.º, n.º 4, do CPC veda a possibilidade de repetição, na pendência da mesma causa, de providência que haja sido julgada injustificada ou tenha caducado.

A nosso ver, a expressão consolidação da providência como composição

definitiva do litígio (artigo 371.º, n.º 1, do CPC) significa que esta adquire a qualidade

de caso julgado material, nos termos dos artigos 580.º e 581.º do CPC, pois, conforme melhor veremos, já não poderá ser revogada, salvo por recurso extraordinário62. O juízo que permite a prolação da decisão é um juízo de certeza e, por isso, transformada a tutela cautelar em tutela definitiva, não poderá ser proposta uma ação destinada à apreciação da mesma questão jurídica (artigos 577.º, al. i), e 578.º do CPC).

1.8. A propositura da ação de impugnação do direito acautelado