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LÍPIDOS ALIMENTARES ÓLEOS E GORDURAS ABRANGIDOS NESTE ESTUDO

2.3. ALTERAÇÕES VERIFICADAS NA COMPOSIÇÃO DOS ÁCIDOS GORDOS COM O PROCESSAMENTO CULINÁRIO

2.3.1. Consequências do processamento culinário

Para o alimento se tornar edível é necessário verificar-se a cisão parcial das ligações moleculares. A radiação infravermelha tem capacidade quase imediata de cisão de moléculas.

A energia fornecida pelas microondas não é responsável directamente por qualquer alteração química que ocorre no alimento. Todas as reacções são atnbuidas a energia térmica gerada da absorção das radiações de microondas.

A temperatura atingida pelo alimento, resultante do seu processamento, é o principal factor a influir no tipo e extensão da reacção química de alteração.

Um factor importante também é a presença do oxigénio atmosférico nas proximidades do alimento em preparação. A alteração deste, expressa em indice de peróxido, é superior quando essa preparação ocorre em recipientes em contacto com o ar, mesmo a 30°C, Armstrong et ai, 1992.

A resposta do alimento à temperatura depende da sua composição.

Alimentos ricos em água sofrem uma pequena subida de temperatura devido ao elevado calor específico da água. Pelo contrário, usando microondas este tipo de alimentos gera calor mais eficientemente devido à grande polaridade das moléculas de

d

"Í A A composição em ácidos gordos, a quantidade de gordura e a quantidade de ácidos gordos expostos à radiação são também factores com influência na temperatura atingida pelo alimento, quer usando métodos convencionais quer usando microondas.

Nos alimentos com fraco teor de lípidos uma significativa proporção de calor e absorvida por moléculas não lipídicas e como tal os fenómenos de oxidação sao retardados.

As características físicas do alimento, tal como a massa, a espessura, o volume, a superfície de exposição e a composição não homogénea, afectam também a temperatura que o alimento atinge com o processamento e interferem na distribuição do calor através dele.

Está estabelecido que a temperatura atingida pelo alimento é o principal iniciador da sua alteração química. Torna-se então de grande interesse compreender o processo de resposta dos ácidos gordos ao calor e para evitar interferências da matriz alimentar foi feito o seu estudo isoladamente.

Efeitos do processamento

No aquecimento por microondas de soluções de ácido oleico e ácido linoleico verificou-se que o último atingiu uma temperatura final mais elevada.

Usando esta mesma técnica aplicada a ácidos gordos saturados com diferentes comprimentos de cadeia, de Cg a Cjg, verificaram-se também diferentes comportamentos. As cadeias mais curtas sofrem um maior incremento de temperatura.

De acordo com o referido, parece poder afirmar-se que a energia das radiações de microondas é mais eficientemente convertida em calor pelos ácidos gordos, quanto menor for a sua cadeia carbonada e quanto maior fôr o seu grau de insaturação.

Segundo Yoshida et ai, 1992, quanto menor fôr a cadeia carbonada e maior o teor de ácidos gordos livres, mais rápida será a oxidação térmica do óleo, dado o efeito catalítico dos grupos carboxilo.

A deterioração do óleo também aumenta com o teor de ácidos gordos polinsaturados.

Relativamente às técnicas convencionais, parece possível afirmar que os ácidos gordos saturados são razoavelmente estáveis, considerando as temperaturas normalmente usadas em culinária.

À temperaturas de 150°C e em presença de ar podem já ser detectados produtos de oxidação, aldeídos, cetonas, lactonas e séries homólogas de hidrocarbonetos.

Os ácidos gordos insaturados são bastante mais lábeis, aumentando a sua instabilidade com a insaturação.

Na ausência de oxigénio os ácidos gordos polinsaturados formam dímeros, polímeros e monómeros cíclicos. Este tipo de compostos é também encontrado em níveis significativos em gorduras sujeitas a altas temperaturas, em fritura profunda.

Em presença de oxigénio os ácidos gordos polinsaturados degradam-se mais rapidamente. Originam produtos semelhantes aos que se formam na autoxidação, aldeídos, cetonas, ácidos, ésteres, álcoois, hidrocarbonetos, lactonas, compostos cíclicos, dímeros e polímeros. Os níveis destes compostos dependem da temperatura atingida mas surgem mesmo entre 25 e 80°C.

Nos próprios tecidos biológicos dos alimentos existem componentes que afectam a integridade dos ácidos gordos, como por exemplo as enzimas endógenas. A cozedura pode inibir a sua actividade autolítica, no entanto, dependendo da enzima, o processamento terá de ser mais ou menos drástico.

O efeito mais divulgado, das práticas culinárias, nos lípidos alimentares é a sua perda por saída para o exterior. Estas perdas são mais acentuadas nos alimentos lipídicos. Embora não seja uma alteração de estrutura, o que se verifica é uma alteração da composição do alimento.

A perda mais acentuada verifica-se nos lípidos neutros localizados no espaço intercelular, e dentro desta classe, a perda atinge selectivamente as moléculas com

polinsaturados estão preferentemente ligados às moléculas dos fosfolípidos que entram na composição das membranas celulares e que consequentemente não gotejam para o exterior.

Esta diminuição do teor lipídico do alimento e o aumento da relação entre ácidos gordos polinsaturados e ácidos gordos saturados pode considerar-se não só nutricionalmente significativa como também benéfica.

Na fritura verifica-se a introdução de ácidos gordos exógenos ao alimento e como tal o contacto do alimento com um óleo ou gordura altera o seu conteúdo de ácidos gordos. Este facto pode dever-se a absorção por parte do alimento de óleo ou gordura, cedência de lípidos do alimento para o meio e catalização, por intermédio de radicais livres formados no óleo quente, de reacções oxidativas no alimento.

Os fenómenos de difusão que ocorrem entre os gliceridos endógenos do alimento e os gliceridos exógenos dos banhos de fritura tendem para um equilíbrio.

Absorção do óleo ou gordura pelo alimento

Foi demonstrado em estudos de fritura de filetes de peixe panados, quer por imersão parcial quer por imersão total, que a absorção de ácidos gordos do óleo de fritura pelo alimento varia inversamente com o seu conteúdo lipídico. Essa absorção aumenta em produtos panados.

Cedência de lípidos para o meio

Num estudo feito em quatro tipos de filetes de peixe que sofreram fritura verificou-se que o tipo mais rico em gordura foi o que evidenciou maior perda. O acido linoleico relativamente ao ácido araquidónico sofreu uma perda superior. Este facto evidencia a já referida, perda selectiva, preferencialmente de gorduras intercelulares ricas em ácidos gordos, onde o ácido linoleico predomina. Por sua vez o acido araquidónico está preferentemente ligado aos fosfolípidos membranares.

De acordo com o referido em Armstrong et ai, 1992, embora ocorra a absorção de ácidos gordos do óleo de fritura para o alimento, a perda de lípidos nativos e mais intensa, especialmente quando se trata de peixe.

A absorção ou perda de determinado ácido gordo depende da sua abundância relativa, facto que parece ser confirmado por Sánchez-Muniz et ai, 1992, no trabalho em que descreve a fritura de sardinhas em diferentes tipos de matéria gorda.

Quando a fritura ocorria em banha, o teor de ácidos gordos monomsaturados aumentava 8 vezes e o teor de ácidos gordos polinsaturados (n-6) aumentava 6,3 vezes; o teor de ácidos gordos polinsaturados (n-3) não sofria alteração.

Efeitos do processamento No caso da fritura em azeite verificava-se um aumento de 10 vezes no teor de ácidos gordos monoinsaturados, de 4 vezes no teor de ácidos gordos polinsaturados (n- 6) e os ácidos gordos polinsaturados (n-3) sofreram uma diminuição no seu teor de 2,2 vezes.

Na fritura com óleo de girassol os ácidos gordos monoinsaturados aumentaram 4,2 vezes, os ácidos gordos polinsaturados (n-6) 19,9 vezes e os ácidos gordos polinsaturados (n-3) diminuíram o seu teor 3,3 vezes.

Efeitos oxidativos

Está estabelecido que a oxidação de ácidos gordos pode ocorrer como resultado de práticas culinárias, contudo não tão acentuadamente como previam os primeiros estudos efectuados.

No caso da oxidação a perda verifica-se preferencialmente nos fosfolípidos, em detrimento dos lípidos neutros. Este facto é explicado pela maior susceptibilidade dos ácidos gordos polinsaturados e pela presença de maiores quantidades destes na fracção membranar dos fosfolípidos.

O aquecimento a seco de sardinhas fornece resultados equivalentes aos anteriormente descritos. Os efeitos são mais acentuados quanto maior fôr a temperatura usada.

Está descrito que a oxidação sofre um grande incremento durante o armazenamento, subsequente ao processamento, mesmo em condições normais de refrigeração.

Efeitos secundários da oxidação de ácidos gordos são também possíveis levando à formação de uma vasta gama de compostos resultantes da cisão dos hidroperóxidos. A partir de determinadas concentrações, produzem odores desagradáveis e cores intensas que provocam a rejeição organoléptica do alimento.

Está aceite que ocorrem alterações nos ácidos gordos durante as práticas culinárias. O problema actualmente põe-se em saber se estas são ou não significativas em termos nutricionais.

Não é fácil eleger a prática culinária ideal uma vez que não há condições padronizadas e pelos estudos efectuados não se consegue obter consenso.