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Ao se tratar do pensamento de Gramsci, enfatizando os conceitos de hegemonia e revolução passiva, estabelecendo-se uma relação com o Paraguai, é possível observar que estes constituem aspectos negativos para a efetivação da democracia; verifica-se que a continuação do autoritarismo e das outras misérias políticas que o país vem passando se dá devido ao prevalecimento da hegemonia desenvolvida pela classe capitalista dominante.

Além disso, pode-se ver que as mudanças institucionais, superficiais e as pseudo- revoluções, chamadas por Gramsci de falsas revoluções, propostas pela classe dominante, são práticas que massificam a sociedade e inibem a luta pelo desejo de melhores condições de vida das classes menos favorecidas.

181 Esse autor também distingue dois tipos de soberania: “La soberanía individual, que consiste en el libre

ejercicio del conjunto de derechos co-naturales y inalienables que tienen el hombre sólo por lo hecho de tener nacido -, y la soberanía nacional es la soma de todas las soberanías individuales” MELGAREJO, Ramón. A mis compatriotas: El Liberalismo Paraguayo. Buenos Aires: [s. n.],1913. p. 23-24.

182 José Luiz Mora afirma que a política paraguaia pode ser estudada e compreendida pelos seus políticos, mais

que pelas ideologias: “Sin embargo, la politica siguió enmarcada dentro de figuras más que de ideologías. Ello motivó el que los golpes e contragolpes, destituciones y motines, produjeran la mas larga lista de presidentes que habia conocido un país hispanoamericano en esa época” (MORA, Jose Luiz. Conceptos

Quando Gramsci desenvolve seu conceito de hegemonia, que basicamente consiste em pensar o processo de perpetuação e manutenção da exploração de uma classe social dominante sobre a outra, propicia uma reflexão para a compreensão do fenômeno político paraguaio, baseado na preocupação constante de gerar consenso entre os valores das classes dominantes e as dominadas, o que culminou com a aceitação das decisões políticas por todos, criando um conformismo social, bastante útil ao desenvolvimento do grupo dominante.

Assim, a concepção de Estado de Gramsci, o Estado ampliado, que tem como função, incutir uma nova concepção de mundo, concebido como um organismo que cria as condições para a permanência e a expansão de uma determinada classe social hegemônica, pode servir de suporte teórico para se compreender os problemas concernentes ao Paraguai, através, primeiramente, da economia de tipo capitalista.

Desse modo, o Estado paraguaio, criado após o fim da guerra de 1870, nasceu para ser um instrumento de hegemonia da classe dominante, o que fez através do controle da consciência das pessoas, utilizando-se, além dos mitos já citados, da colaboração da Igreja, principalmente.

O efeito adverso da revolução passiva, por assim dizer, com falsas promessas de melhoria, fez com que a classe dominada não estivesse atenta à rapina da classe dominante, e a cultura não democrática ganhou uma aliada, predominando, através da falta de liberdade de expressão, em vários momentos da história, principalmente quando a hegemonia da classe dominante ficava ameaçada, e na contenção aos movimentos populares.

Segundo Goiris, a revolução verdadeira, do tipo jacobino, aconteceu no Paraguai com Francia. Ele foi também chamado de jacobino, por vários historiadores estrangeiros, como Paul Lewis, Donghi, Trias e outros.

Gramsci não trata dessa modalidade, por ver, na revolução passiva, a melhor forma de caracterizar as mudanças levadas a efeito pelo capitalismo. Ele a utiliza, sem o momento jacobino, referindo-se sempre à falsa revolução, pois, diferentemente daquela, de estilo jacobino, esta é de cima para baixo, geralmente elitista e conservadora.

A partir do que já foi discutido, defende-se, portanto, a proposição de que o Partido Liberal, que é objeto deste estudo, pode ser estudado e compreendido com base nessas concepções, levando-se em conta sua inserção no período liberal da história paraguaia, para não se cair no risco de repetir o que foi criticado anteriormente com relação à sua historiografia. Procurar-se-á estabelecer a história do partido em conjunção com a história do país, de modo a inseri-lo no contexto da América Latina e das revoluções e guerras entre os países que o compunham, considerando-se o fato de que se incorre em uma simplificação quando se trata de uma história nacional sem estabelecer-se contato com o contexto externo.

Ao se ter presentes as considerações possíveis à análise das interpretações sobre o Partido Liberal, no período em que este almejava o poder, e quando nele se encontrou, será possível ver que a historiografia à disposição pode ser melhor vista e entendida se houver o propósito de se identificar a formação e o crescimento do partido que se constituiu com o objetivo de reformar a tradição autoritária do país, procurando transformar a velha maneira de fazer política, e colocar o Estado dentro de patamares mais racionais, com uma administração mais condizente aos novos tempos do liberalismo e do capitalismo.

Os dois lados desses objetivos interpenetram-se, então, ao se considerar como positivo o fim do autoritarismo; de outro lado, o advento das relações capitalistas vem em um só “pacote”, que, no caso paraguaio, acabou por precipitar o país em uma nova espécie de autoritarismo.

Será possível verificar, também, que, mesmo sendo os membros do partido pertencentes à classe dominante, mais tarde este se abriu para outros segmentos sociais, conseguindo o apoio dos destituídos de suas terras, e das classes trabalhadoras, inclusive mostrando preocupação com a população tanto rural como urbana, pois precisava de uma base social e eleitoral para chegar ao poder.

A abertura do Partido Liberal para a participação de outras classes, e sua intenção de transformar o modo de fazer política no país, atraiu uma legião de descontentes com o governo estabelecido de então, do Partido Colorado. Essa situação ajudou mais a concretizar sua entrada no poder do que operar sobre a questão social e mudar a estrutura política da nação, de maneira a unir diversas classes de trabalhadores, e melhorar seu nível de vida.

AO PODER

“[...] além das misérias modernas, nos oprime toda uma série de misérias herdadas”. Karl Marx

2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Compreender o Partido Liberal inserido no contexto do período liberal no Paraguai, de 1870 a 1940, sua formação, fundação, chegada ao poder, sua política de governo e queda, eis o âmbito da temática desse capítulo.

Para melhor entender a conjuntura em que se deu sua fundação, bem como os tipos de problemas que o Partido Liberal paraguaio enfrentou antes e durante sua permanência no poder, este capítulo foi dividido em duas partes. Na primeira, será feita uma rápida digressão, enfocando o período de 1811 a 1870, durante o qual, após a emancipação, o país foi governado por três ditadores, que o privaram do contato externo, isto é, das lutas que eram empreendidas em toda a América Latina, no sentido de consolidar os Estados nacionais, enquanto que, internamente, não permitiram a formação de uma classe de políticos.

Essa situação gerou um retardo na estruturação do Estado-nação paraguaio, e os problemas para que ele se concretizasse só começaram a ser sentidos com a saída do último ditador, após 1870, com o fim da guerra contra a Tríplice Aliança, em conseqüência de sua política externa. A reestruturação do Estado, nos moldes da democracia representativa detendência liberal, efetivada pelos novos donos do poder, aconteceu em uma época que o capitalismo já havia assentado suas bases no mundo inteiro.

O objetivo, portanto, dessa digressão é apresentar os condicionamentos sócio- econômicos e políticos a que foi submetido o Paraguai, elementos sem os quais não seria possível compreender o período liberal de forma satisfatória.

Na segunda parte, será apresentada a trajetória do Partido Liberal, desde sua fundação, em 1887, inserida no contexto da reconstrução do país, a qual que teve início em 1870, com o fim da guerra, na qual se encontram, também, os antecedentes de sua criação, pois seus fundadores fizeram parte do processo de estruturação do novo Estado paraguaio.

Os membros do futuro Partido Liberal e do Partido Colorado estavam reunidos em torno de diferentes clubes políticos, que tiveram, como primeira função, redigir uma constituição para o país. Os dois partidos que surgiram desses clubes dominam a cena política paraguaia até os dias atuais. Assim o Partido Colorado e o Partido Liberal seguiram sem rival desde a fundação, em 1887, até 1936, quando o partido Febrerista tomou o poder, em fevereiro de 1936, e governou por menos de um ano, após a guerra que o país enfrentou contra a Bolívia (1932-1935). O Partido Comunista, fundado em 1928, não chegou a atuar, pois foi colocado na ilegalidade logo ao nascer.

2.2 PARAGUAI – DA INDEPENDÊNCIA À ORGANIZAÇÃO NACIONAL (1811 A