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A digitalização de documentos, no âmbito arquivístico, foi uma estratégia para preservação, substituição e difusão de acervos. A aderência desse recurso ampliou a interpretação de seu uso e atribuiu significados que se estendem desde uma simples captura a impactos sobre narrativas sociais, entre disputas de poder e domínio de acesso. A partir dessas questões, foi possível justificar essa pesquisa. Com a edição da Lei nº 12.682/2012, observou-se a possibilidade de investigar a proximidade com a arquivologia brasileira ou mesmo com as orientações internacionais para os procedimentos de digitalização de documentos arquivísticos, tema desta pesquisa.

Diante disso, observar os dispositivos editados a nível nacional e em outros países poderia ser de utilidade para identificar o quão próximos estão da arquivologia ao legislarem sobre documentos produzidos por instituições, na esfera pública e privada. Assim, a pesquisa teve como objetivo geral identificar se há lacunas em leis e normas de três países quanto à aplicação das recomendações arquivísticas nos normativos de três países: Brasil, representado pela Lei nº 12.682/2012; Canadá, pela norma CAN/CGSB-72.34, 2018; e Espanha retratada pela Norma de Interoperabilidade Técnica de Digitalização.

Dado o entendimento pacífico do conceito de documento arquivístico, possibilitou- se atingir o primeiro objetivo específico. O exame da natureza do documento arquivístico digitalizado permitiu conferir sua identidade arquivística e a capacidade de alegar sua essência e exigir o tratamento específico por meio da gestão documental, independente de seu título de substituto ou representante e contudo, atribui-lhe a confiabilidade necessária. Constatou-se que o seu valor como documento arquivístico deve ser reconhecido por quem o produz, gere ou preserve, principalmente por ser objeto de leis e normativos legais.

Para a sistematização das recomendações internacionais, buscou-se instrumentos que pudessem estar disponíveis a qualquer país que pretende empreender em processo de digitalização de documentos arquivísticos. Por meio de publicações que tinham o escopo de orientar o processo de digitalização, foi possível atingir o segundo objetivo específico. A sistematização das recomendações foi essencial para observar a conformidade com a arquivística. Identificou-se que em todos os instrumentos coletados havia a participação de projetos de cunho arquivístico, conselhos nacionais e internacional de arquivos e arquivos nacionais, o que permite concluir que as recomendações tinham vínculo arquivístico e possibilitaram chamá-las de recomendações arquivísticas.

A sistematização permitiu recolher os requisitos mínimos, entretanto, essenciais para se empreender um processo de digitalização de documentos arquivísticos nos segmentos púbico e privado. Requisitos mínimos, uma vez que as tecnologias permitem aos arquivistas elaborarem outras recomendações sobre o amparo de suas pesquisas. Essenciais pelo fato de que, sem qualquer um deles, o processo pode ser comprometido em sua eficiência e prejudicar a confiabilidade do documento para fins de testemunho fidedigno das ações de seus produtores.

A verificação de atendimento aos requisitos foi o terceiro objetivo específico e pôde- se concluir a frágil representatividade da arquivologia brasileira diante da canadense e espanhola. Também foi possível, por meio de análises como essas, perceber como se encontram as relações entre a arquivologia e o Estado. A pesquisa teve por indagação se as legislações propostas por governos têm considerado as recomendações arquivísticas para dispor sobre digitalização de documentos arquivísticos. Conclui-se que, por meio da análise comparativa, ainda há diálogos a serem postos e caminhos a serem percorridos, esforços a serem empreendidos e lutas a serem travadas.

Diante da metodologia proposta, pôde-se identificar uma limitação quanto à análise dos resultados, o que poderia ser resolvido por meio de visita técnica a instituições arquivísticas responsáveis por implementações de políticas e legislações voltadas ao tema e aplicação de entrevistas, uma vez que a correspondência eletrônica nem sempre é respondida. As limitações encontraram amparo no que diz respeito ao tempo, à delimitação geográfica e à restrição de recursos financeiros. Ainda, assim, pôde-se observar, como em uma fotografia, a representação de cada contexto.

A análise comparativa, aqui, foi uma interpretação de realidades distintas. Foi um capaz de responder ao problema de pesquisa. Pode-se afirmar que há lacunas nas leis e na norma brasileira, canadense e espanhola, em menor ou maior grau, verificaram-se lacunas quanto à observância das recomendações técnicas arquivísticas para o processo de digitalização de documentos arquivísticos.

O Estado, como maior instituição a produzir documentos no uso das suas atribuições, encontra, no âmago do conceito de documento arquivístico, a apropriação do seu poder informacional. De forma que esse poder deveria emergir das mãos daqueles que estão legitimados cientificamente para exercê-lo e assim contribuir para a democracia transparente e participativa, não apenas envolvidos em discursos, mas com espaço para reflexão de

políticas arquivísticas bem-sucedidas, para efetivamente garantir uma produção do saber do Estado (JARDIM, 1999), de forma autêntica e de valor.

Sobre as possibilidades de reflexões resultantes desta pesquisa, admitiram-se algumas recomendações para futuros estudos sobre essa temática: investigação sobre políticas de Estado para digitalização de documentos de arquivo; legitimidade arquivística na elaboração de leis ou outros normativos que dispõem sobre digitalização de acervos multimídia; a autenticidade dos documentos digitalizados diante da sumerização; a digitalização de documentos arquivísticos e sua preservação em nuvem.

Por meio do conceito de documento arquivístico, produzido ou recebido no cerne das atividades de órgãos ou de pessoas, estabelece-se o tipo de tratamento que esse documento receberá. Embora em realidades diferentes, o conceito e a função do documento arquivístico ainda não mudaram, de forma que, com a interlocução internacional, o estabelecimento de padrões, os diálogos acadêmicos e a produção de literatura, indicam que os esforços devem ser perseverantes. Esta pesquisa teve o intuito de ser mais uma voz a ecoar na realidade arquivística brasileira e contribuir não somente para motivar o diálogo acadêmico, mas também unir esperanças de que o Estado brasileiro possa prestar atenção à voz da Arquivologia.