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Esta tese teve por objetivo verificar a existência de assimetrias nas relações comerciais entre os agentes da cadeia da carne bovina no Brasil. Foram averiguadas duas formas de assimetria: diferença de conteúdo informacio nal entre os agentes econômicos e possibilidade de exercício de poderes de mercado e de barganha nas relações comerciais dentro dessa cadeia.

Os agentes econômicos participantes da cadeia da carne bovina, objetos da análise, foram os pecuaristas, os frigoríficos e os supermercados. Esses agentes tiveram suas relações comerciais avaliadas em dois ambientes de interação: nos mercados físico e futuro, sendo este representado pelo contrato futuro de boi gordo da BM&F.

A elaboração da tese coincide com um momento de transformação da pecuária brasileira, em que as exportações se torna m mais significativas, e na consolidação de uma estrutura de mercado mais concentrada na ponta da indústria frigorífica, como decorrência da necessidade de ampliação das escalas dos frigoríficos e de redução de seus custos fixos. Portanto, a organização desta indústria parece se encaminhar para a acomodação através de um oligopólio com franja, no qual algumas empresas serão líderes e as demais (franja) seguirão o seu comportamento.

O cenário atual já sinaliza quais empresas serão as líderes na indústria frigorífica, e este papel caberá aos exportadores, que se posicionam de maneira privilegiada em termos de informação, se comparado aos demais agentes da cadeia. Os principais grupos frigoríficos exportam para diversos países, o que lhes permite observar o comportamento da demanda internacional. Possuem contratos com as grandes redes de supermercado, o que lhes favorece na visão da demanda por carne no varejo. Como têm plantas nas principais regiões produtoras, passam a obter uma visão unificada da oferta de bois. Nesse sentido, os frigoríficos exportadores parecem ter mais clareza quanto ao quadro de oferta e demanda de bois e carne.

Portanto, a tese foi original ao trazer a discussão sobre a existência de assimetrias de poder de mercado e informacionais nesta cadeia, no momento em que se verifica a transformação da organização dessa indústria. A partir da estrutura analítica proposta na tese concluiu-se que os frigoríficos detêm mais informação no mercado futuro e exercem poder de mercado na compra dos bois junto aos pecuaristas. Já na relação com os supermercados, verificou-se que o último possui poder de barganha.

A partir destes resultados, a tese poderá contribuir para o debate sobre os rumos da cadeia pecuária e servirá para amparar estudos que visem auferir se os ganhos conquistados com a concentração do mercado, que permitirá redução de custos fixos, serão repassados ao consumidor final.

A análise de poder de mercado, implementada no capítulo 2, mostrou que o boi não é adquirido de forma competitiva nas mesorregiões dos estados de São Paulo, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Foi feita uma análise complementar sobre transmissão de preços que constatou que São Paulo é a região formadora de preço, e evidenciou que esta sofre influência das regiões produtoras como Campo Grande, Dourados, Goiânia, Noroeste do Paraná, Rio Verde, Três Lagoas e Triângulo Mineiro. Já para outras localidades, São Paulo não é formadora de preço. Este é o caso de Bahia, Erechim, Marabá, Norte de Tocantins, Paragominas, Pelotas, Redenção, Rio de Janeiro e Rondônia. No caso de Marabá, Norte de Tocantins, Paragominas, Redenção e Rondônia são influenciadas pelo Mato Grosso; como São Paulo forma preço para o Mato Grosso, indiretamente as variações em São Paulo são percebidas em menor intensidade nessas localidades. Espera-se uma integração maior entre essas regiões e São Paulo em face dos investimentos de ampliação e instalação de novas plantas frigoríficas nessas localidades, o que gerará um fluxo produtivo dessas plantas para São Paulo.

Portanto, a estrutura analítica da tese permite inferir que existe poder de mercado na aquisição de bois pelos frigoríficos, o que vai ao encontro de resultados de outros oligopólios, cujas estruturas caracterizam-se por um mercado pulverizado na ponta fornecedora e por um processo local, isto é, na própria região, de escoamento da produção.

O capítulo 3 analisou as relações entre os preços no atacado e no varejo, com o intuito de verificar qual era a relação comercial entre frigoríficos e supermercados. Como resultado, observou-se que os supermercados conseguem reter para si as reduções no preço do atacado e repassam para o varejo as elevações dos preços no atacado. Portanto, é possível inferir que os supermercados têm poder de barganha junto aos frigoríficos, o que era esperado, pelo fato dos supermercados adquirirem volumes significativos e se posicionarem como principal canal de distribuição da carne. Este resultado é favorecido pelo fato da carne no Brasil ainda ser considerada uma commodity, e sofrer a concorrência com a carne de frango, em função da elasticidade-preço entre as carnes de dianteiro bovino e de frango.

Os resultados encontrados foram interessantes e mostraram que a cadeia da carne bovina se acomoda, em termos de organização industrial, de forma semelhante a outras cadeias agropecuárias. A estrutura dessa indústria é de uma produção pecuária pulverizada,

um número elevado de frigoríficos, mas que já apresenta sinais de concentração, e passa a se estruturar como um oligopólio com franja, o que coincide com a estrutura do varejo. O varejo detém poder de barganha junto ao frigorífico, e este, pelo fato de se localizar próximo às regiões produtoras, e ser a opção de escoamento da produção, consegue exercer poder de mercado.

O capítulo 4 investigou a existência de assimetrias informacionais entre os participantes do mercado futuro de boi gordo da BM&F. Para mensurar tais diferenças, foi realizada uma análise sobre a relação entre a volatilidade dos preços futuros e as posições por tipo de participante no mercado futuro de boi gordo da BM&F, o que é um indicativo do conteúdo informacional dos diversos participantes.

Os resultados encontrados no capítulo 4 corroboraram a visão de que os frigoríficos têm mais informação, no mercado futuro, que os demais agentes. E, portanto, estes agentes contribuem de forma negativa para a volatilidade. Já a pessoa física contribui de forma positiva para a volatilidade. Também verificou-se que em função a volatilidade é conduzida pelas informações do mercado físico, como o preço a vista e a escala de abate.

Além disso, o avanço desta tese foi utilizar metodologias que não haviam sido aplicadas ao agronegócio brasileiro, como a forma de mensuração de poder de mercado baseado em Crespi, Gao e Peterson (2005), que possibilitou trabalhar com uma estrutura limitada de dados, além de trazer a discussão da microestrutura dos mercados para os derivativos agropecuários no Brasil.

Estas metodologias permitirão implementar uma série de pesquisas que possam estender a aplicação da mensuração de poder de mercado para as demais cadeias do agronegócio. A análise sobre a questão da informação privada nos deriva tivos permitirá estender a análise para outros produtos, e especialmente fazer uma análise conjunta entre o mercado de ações e as negociações nos mercados futuros. O JBS lançou ações e outros frigoríficos estão seguindo os mesmos passos; será uma linha de pesquisa identificar se as notícias que impactam as ações dos frigoríficos se transmitem para os preços do boi negociado no futuro, e vice-versa, além de permitir análises sobre o impacto de uma notícia pública na formação do preço futuro.

A pecuária vive um momento de transformações, especialmente, na indústria frigorífica. A tese proporcionou uma visão da cadeia da carne bovina, no que se refere às assimetrias de poder de mercado e informação. Dessa forma, trouxe discussões e resultados que serão relevantes para o entendimento deste processo de mudança na cadeia.

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