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No inventário realizado, foram assinaladas, no Centro de Endemismo Pernambuco, todas as subclasses e ordens de mixomicetos e 9 das 12 famílias reconhecidas para a classe, correspondendo cerca de 82% do total referido para o Brasil. Considerando a riqueza da mixobiota, apesar do presente inventário estar restrito a poucos grupos ecológicos (lignícolas, foliícolas e florícolas) e do período relativamente curto de coletas, obteve-se um número bem maior de espécies que os até agora atingidos em estudos mais longos e intensivos, onde foram

explorados diversos microhabitats; de fato, para florestas úmidas de diferentes regiões do país, como as estudadas no Sul por Rodrigues & Guerrero (1990), no Sudeste por Maimoni-Rodella & Gottsberger (1981) e no Nordeste por Mobin (1997), são referidas entre 20 e 45 espécies. Resultados mais próximos foram obtidos por Bezerra (2003), que refere 53 espécies ocorrendo principalmente em matas ciliares no Centro - Oeste (Brasília - DF) e por Pôrto (1982) que, trabalhando com coletas quinzenais por 12 meses consecutivos e explorando microhabitats muito mais variados, registrou 70 espécies na Reserva Estadual de Dois Irmãos, Recife, PE.

Dentre as espécies inventariadas no Centro de Endemismo Pernambuco, que correspondem à cerca de 1/3 do total conhecido para o Brasil, boa parte é cosmopolita, como

Arcyria cinerea, A. denudata, Ceratiomyxa fruticulosa, Lycogala epidendrum e Stemonitis fusca,

presentes não somente em florestas úmidas tropicais (Ogata et al. 1996; Schnittler et al. 2002) como em regiões temperadas e mesmo frias, como na Rússia e Casaquistão (Novozhilov et al. 2000). Outras, porém, têm distribuição mais restrita e sua ocorrência no Brasil ou na região Nordeste só foi conhecida com as coletas efetuadas no Centro de Endemismo Pernambuco, como

Physarum penetrale e Lycogala conicum.

Na coleção de 471 espécimes obtidos no inventário, oito não se enquadram em nenhuma das espécies descritas até o momento, sendo muito provavelmente novas para a Ciência; todavia, de acordo com o pensamento atualmente vigente para a descrição de novos táxons, que leva em consideração a grande capacidade de dispersão dos mixomicetos, a elevada plasticidade de alguns caracteres de valor diagnóstico e a elevada incidência de apomixia, as duas prováveis novas espécies do gênero Physarum encontradas no Centro de Endemismo Pernambuco somente serão descritas após a obtenção de mais amostras, procedentes de outros locais.

Como já foi anteriormente comentado, muitas espécies de mixomicetos são cosmopolitas, porém umas poucas são restritas a determinadas condições ambientais, como as encontradas apenas em altitudes elevadas ou em regiões onde é comum uma acentuada restrição hídrica; com base nestes pequenos grupos, é possível que existam espécies endêmicas em algumas partes do mundo, porém a comprovação desta suposição é difícil, assim como a interpretação da biogeografia dos mixomicetos no momento atual (vide Adamonyte & Mitchell 2000), pois muitas regiões do globo ainda se encontram inexploradas.

Apesar de constituírem um dos maiores grupos de seres vivos (ca. 1,5 milhões de espécies) e poderem contribuir com informações valiosas, estão ausentes no Brasil, ou não se encontram com freqüência, espécies de fungos, liquens e mixomicetos nas listas de espécies ameaçadas, vulneráveis, extintas ou endêmicas; desse modo, não é possível, no momento, enquadrar nestas categorias as espécies inventariadas no Centro de Endemismo Pernambuco.

O grupo dos mixomicetos, todavia, é considerado na análise de espécies endêmicas, ameaçadas, vulneráveis ou em extinção em países da Europa e também nas Américas. A Lista Vermelha para Essex, UK, por exemplo, que inclui duas espécies extintas (Badhamia populina (Lister) G. Lister e Stemonitopsis microspora (Lister) Nann.-Bremek.), três vulneráveis (Didymium

laxifilum G. Lister & J. Ross, Oligonema flavidum (Peck) Peck e Physarum straminipes (Lister) e

inclusão: espécie incluída na Lista Vermelha Nacional, ou considerada nacionalmente rara ou escassa, qualquer que seja o local ou que em Essex preencha estas condições; dependendo do grau de conhecimento regional, esta condição para Essex se aplica a espécies registradas em uns poucos locais atualmente; com distribuição restrita, ocorrendo em habitats altamente ameaçados; com distribuição ampla mas que iniciaram um acentuado declínio em número ou distribuição; e localmente extintas, mas com potencial para re-introdução. Considerando os critérios acima apontados, espécies assinaladas no Centro de Endemismo Pernambuco, como Lycogala

conicum, com apenas três registros em todo o Brasil, o último efetuado há 20 anos, poderiam

constar em listas semelhantes.

s, Lamproderma arcyrionema, Stemonitis fusca

entre as Stemonitomycetidae; Arcyria cinerea, A. denudata, Didymium squamulosum, Hemitrichia

calyculata, Perichaena depressa, Physarum cinereum e Lycogala epidendrum, entre as

Myxogastromycetidae. Em nível de família, dentre as Trichiaceae, com exceção de Hemitrichia

pardina, todas as espécies são de ampla distribuição mundial; o mesmo acontece com as

Enteridiaceae (exceto Tubifera bombarda e Lycogala conicum), Cribrariaceae (exceto Cribraria

confusa), Ceratiomyxaceae (exceto Ceratiomyxa morchella e C. sphaerosperma) e as espécies de

Stemonitaceae.

As principais conclusões que podem ser tomadas no momento são:

A riqueza da mixobiota do Centro de Endemismo Pernambuco é semelhante à registrada Nas Américas, pode-se tomar como exemplo uma base de dados sobre a flora fanerogâmica, ficoflora e micobiota de Jalisco, México, com a qual foram gerados mapas, gráficos de diversidade e listas de espécies raras da flora vascular, endêmicas ou em perigo de extinção aos níveis local, estadual e regional. Nesta lista, conta-se com uma base de dados de mais de 8.000 espécimes de fungos, que correspondem aproximadamente a 800 espécies; embora a grande maioria se refira aos basidiomicetos, 11 espécies de mixomicetos, distribuídas em cinco famílias, são relacionadas como raras para os municípios de Autlán de Navarro (Cribraria purpurea Schrad., Diderma hemisphaericum (Bull.) Hornem., Didymium ovoideum Nann.-Bremek.,

Lamproderma columbinum (Pers.) Rostaf., Physarum melleum, Physarum notabile T. Macbr., Trichia favoginea (Batsch) Pers.), Guadalajara (Arcyria cinerea, Lycogala exiguum Morgan),

Mazamitla (Trichia varia (Pers. ex J.F. Gmel.) Pers.) e Tequila (Trichia lutescens (Lister) Lister). Dentre as espécies citadas, Physarum melleum e Trichia favoginea também se mostraram raras a ocasionais no Centro de Endemismo Pernambuco no presente inventário, porém Arcyria cinerea e

Lycogala exiguum são abundantes ou comuns, não somente no Centro de Endemismo

Pernambuco como em toda a região Nordeste do Brasil.

Contrastando com o elevado endemismo, freqüentemente reportado para diferentes grupos que habitam a Floresta Atlântica, a análise da distribuição geográfica das espécies de mixomicetos, que ocorrem no Centro de Endemismo Pernambuco, indica que um elevado percentual (50%) é cosmopolita, embora muitas (40%) se apresentem como raras ou ocasionais e registradas em apenas um dos 12 fragmentos analisados; muito comuns em distintos ecossistemas, podem ser citadas como exemplos: Ceratiomyxa fruticulosa, entre as Ceratiomyxomycetidae; Comatricha typhoide

para florestas úmidas neotropicais, porém mais elevada em relação ao que se conhece para o Brasil.

O método de amostragem empregado, explorando-se apenas troncos mortos e folhedo, este último exclusivamente através do cultivo em câmara-úmida, permitiu o registro de aproximadamente um terço do total de espécies referido para o país e cerca de 70% do conhecido para Floresta Atlântica.

As matas da Reserva do Gurjaú apresentaram maior riqueza e diversidade de espécies que os demais fragmentos analisados, apesar de se encontrarem visivelmente alteradas, confirmando que, de modo geral, os mixomicetos apresentam grande tolerância aos distúrbios provocados pelo homem no ambiente.

No que se refere à abundância, predominam as espécies raras, representadas por menos de cinco indivíduos na amostragem.

Considerando as espécies em comum, seja entre as três Unidades de Conservação, seja entre os 12 fragmentos analisados, as comunidades são distintas, com baixos índices de similaridade.

A ampla distribuição geográfica da maioria das 78 espécies, que ocorrem no Centro de Endemismo Pernambuco, contrasta com o elevado endemismo freqüentemente encontrado para outros grupos de organismos que compõem a flora e fauna de Floresta Atlântica.

AGRADECIMENTOS

Aos proprietários e administradores da Usina Serra Grande, RPPN Frei Caneca e Reserva Ecológica de Gurjaú, pelas facilidades concedidas, que permitiram o desenvolvimento deste estudo; à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), CNPq e Ministério do Meio Ambiente, pelo apoio financeiro e bolsas concedidas a Laíse de Holanda Cavalcanti e Hely Fabian Muniz Tavares. Os autores agradecem ainda a: Alessandra de Alencar Parente, Cecília de Lima Barros, Marcela Regina de Melo Daher, Marcio Ulisses de Lima Rufino, Maria de Fátima de Andrade Bezerra, Thiers Araújo Campos e Waldemir Pereira de Souza, integrantes da equipe do Laboratório de Myxomycetes da UFPE, pela participação nas coletas; Dr. Carlos Lado, do Real Jardín Botánico de Madri, pela discussão dos dados preliminares, fotografias de esporocarpos e confirmação da identificação de algumas das espécies.

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