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3 ESTRUTURA FUNDIÁRIA E AS TRANFORMAÇÕES NAS RELAÇÕES DE PRODUÇÃO NO CAMPO DE JAGUAQUARA (BA)

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os trabalhos de pesquisa trazem em sua essência as inquietações, uma problemática que movimenta no sentido da investigação. Na perspectiva de não uma análise fechada, pronta e acabada, mas sim, de uma discussão sobre o que foi pesquisado e analisado a partir de uma proposta de dissertação, pode-se concluir que entender o espaço agrário de Jaguaquara é retomar os elementos fundamentais de sua composição, é resgatar as transformações ocorridas nesse espaço com a instalação do Núcleo Colonial de Jaguaquara, tanto no passado como no presente. Assim, podendo elaborar a compreensão de que esse elemento fundante é resultado da unidade dialética sujeição e (re) criação.

O temor de uma repetição de análises e dados pode ter minimizado, nesse trabalho, um aprofundamento de questões teóricas, históricas e empíricas amplamente debatidas e aceitas no debate que envolve o campesinato, a questão agrária e a estrutura fundiária. Apesar do receio inibidor diante da riqueza do campo e das contribuições teóricas, a presente dissertação buscou entender o sujeito que foi o fio condutor para a produção desse espaço agrário, vinculado a um dos projetos de colonização do campo, apresentando uma nova dominação, abrindo possibilidades de apreensão do real.

O trabalho efetuou, portanto, uma investigação do sujeito camponês-colono como elemento fundamental para a recriação de um campesinato formado a partir de práticas sociais de colonização. Pode-se afirmar que, nesse campo, repleto de contradições, reconheceu-se na figura do colono um tipo de campesinato advindo de formas diferenciadas de reprodução.

Ainda que em períodos históricos diferenciados e categorias sociais distintas, permitiu-se a formação de áreas de agrícolas; de fazendas tradicionais de pecuária e de produção agrícolas tipo exportação; de áreas de colonização camponesa com populações estrangeiras e nacionais; áreas de “posseamento” recentes e implantação de projetos agropecuários. A pesquisa de campo nessa área, e com o recorte de classe, mais especificamente de uma categoria dessa classe (camponês-colono), aqui permitiu pensar a persistência não no sentido de manutenção, mas no da recriação, constatando sempre a incorporação de elementos novos.

No âmbito de transformações da sociedade civil e no cenário da globalização, o colono guardou e guarda identidade própria, multifacetada, em gênero, gerações e crenças, cujas representações não estão vazias de conteúdo ideológico, são justamente reflexo dele. No campo das lutas pela terra e pelos direitos, o campesinato, representado por sujeitos sociais e históricos, como é o caso do camponês-colono, é capaz de traduzir a tradição em modernidade – no caminho de elaborar projetos alternativos à ordem instituída, que não representa

necessariamente a destruição dessa mesma ordem, mas o estabelecimento de limites à expansão avassaladora da sociedade capitalista.

Em compreensão, o modo de vida camponês sobrevive, ainda que mantendo relações diretas com o espaço urbano (algumas moradias de colonos - mesmo no contexto urbano, tais características se mantinham.) e o mercado, por meio do trabalho familiar, ainda de idade avançada sentem a necessidade de se sentirem produtivos (mesmo que fazendo a comida), do ritmo da produção, das relações sociais e parte do que se consome provém do trabalho na terra.

Primeiro, chama a atenção o fato de que o campesinato dessa região tenha passado por vários momentos de crise durante sua história sem, contudo, desaparecer integralmente. A colonização em Jaguaquara teve por finalidade última a localização de imigrantes europeus em terras públicas, na forma da pequena propriedade familiar. Pode ser definida como um processo contínuo de ocupação territorial, baseado na imigração dirigida, que durou mais de 30 anos. A configuração espacial do núcleo colonial obedeceu às normas legais e seus elementos constitutivos, deram os contornos de uma formação camponesa. Apesar das diferenças culturais relacionadas à própria imigração, que deram respaldo para a distinção entre os colonos.

A continuidade da ocupação territorial, por sua vez, garantiu o acesso a terra para a segunda e a terceira geração, dispostas a migrar para novas frentes de expansão agrícola. Daí a migração tornou-se um elemento constitutivo desse campesinato e forma de preservar a reprodução social na condição camponesa.

A intensidade da imigração rural aponta para as limitações da reprodução social em uma conjuntura em que esta só pode ser assegurada com a exclusão da população excedente, mediante mecanismos costumeiros de transmissão do patrimônio (herança), ou busca pela terra em outro lugar, refazendo o ciclo pioneiro em lugares cada vez mais distantes.

O Núcleo Colonial de Jaguaquara, em boa medida, apenas ensinou que é assim que o capital sempre se lembra do trabalhador rural. Mas a formação camponesa e seus ajustamentos na situação colonial têm suas próprias características estruturais e, além do que já foi mencionado, deve-se destacar, ainda, a migração, que atualmente aparece na discussão teórica sobre campesinato, e sobre a categoria social “camponês-colono”.

Em síntese, além dos aspectos mencionados e do papel de determinadas conjunturas econômicas desfavoráveis, decorrentes da falta de uma política agrícola e fundiária, voltada para a pequena produção, e da ausência de medidas governamentais que dessem conta dos aspectos estruturais, isto é, da dominação histórica a que são submetidos os camponeses, os

agricultores familiares da região, em análise, aspiram e desejam permanecer como agricultores, como colonos-camponeses.

Os valores camponeses prevalecem no delineamento da identidade desses sujeitos. O colono não se considera apenas um pequeno produtor rural; enfatiza a ascendência européia e a simbólica do pioneirismo vinculado à colonização, conferindo a ela um caráter civilizatório. De fato, categorizar por oposição faz parte da dinâmica identitária e colonos costumam considerar-se social e culturalmente distintos de outras categorias de produtores rurais, daqueles que produzem essencialmente para o mercado.

Assim, as terras que hoje ocupam, fruto da conquista de seu próprio trabalho e de seus pais, têm, para além de seu lugar de produção e da garantia de sua reprodução social, o sentido de “patrimônio familiar” e, como tal, não está à venda, não tem preço. Agrega, também, muitos outros sentidos, uma vez que ultrapassam seus limites geográficos, abarcando outros espaços domésticos – o dos vizinhos –, os espaços comunitários que abrigam seus bens culturais e as marcas de sua religiosidade, constituindo-se esse conjunto em “seu território”.

A terra supera seu significado original de matéria-prima e meio de produção. Passa a incorporar, enquanto feixe de significados, o processo de trabalho e sua inscrição na vida cotidiana, o tempo que ocupa e o lugar que tem no cotidiano familiar. O campesinato é assim percebido na figura do colono.

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